Notas técnicas para discussão dos DESAFIOS DO CONTRIBUIÇÕES PARA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS SETOR ÁGUA O Banco Mundial está produzindo quatro notas técnicas para lham os desafios da prestação dos serviços de abastecimento o setor de água com vistas a contribuir para as discussões so- de água e esgotos em áreas urbanas e rurais: “Sustentabilidade bre segurança hídrica e universalização de acesso a serviços no e eficiência dos serviços urbanos de abastecimento e esgoto no Brasil. Especificamente, uma das notas foca nos principais de- Brasil” e “A busca da sustentabilidade e da eficiência para o sa- safios na gestão de recursos hídricos: “Aperfeiçoando a gestão neamento rural”. Espera-se que as notas possam ser finalizadas de recursos hídricos no Brasil”. Outra está voltada aos desafios até junho de 2018, após discussão e consulta com instituições do “Nexo Água-Energia-Alimento”. E as duas últimas deta- e parceiros-chave no país para cada um dos temas abordados. Aperfeiçoando a gestão de recursos hídricos no Brasil A Constituição Federal de 1988 definiu que à União compete, privativamente, OBJETIVOS DA POLÍTICA NACIONAL a competência de legislar sobre águas. Define também que são bens da União: DE RECURSOS HÍDRICOS: lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que Assegurar à atual e às futuras gerações • banhem mais de um estado, sirvam de limites com outros países ou se estendam a a necessária disponibilidade de água, território estrangeiro ou dele provenham, bem como as águas minerais. Bens dos em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; estados são águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósi- to, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União, que A utilização racional e integrada dos recursos • pertencem ao domínio desta, ainda que situadas em rios de domínio estadual. hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; A Constituição Federal também estabeleceu que competiria à União instituir sistema na- A prevenção e a defesa contra eventos • hidrológicos críticos de origem natural cional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de ou decorrentes do uso inadequado dos seu uso. A União, por meio da Lei nº 9.433/97 instituiu a Política Nacional de Recursos recursos naturais; Hídricos (PNRH), reformulando e modernizando o marco normativo da gestão das águas Incentivar e promover a captação, a preservação • no país, o qual foi seguido em linhas gerais por todos os estados e pelo Distrito Federal por e o aproveitamento de águas pluviais. meio da edição de leis estaduais e distrital análogas, dentro dos limites a eles facultados. Além de instituir a Política, a Lei nº 9.433/97 criou o Sistema Nacio- (os Comitês de Bacia Hidrográfica). Inclui também a Secretaria de nal de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH), definin- Recursos Hídricos e Qualidade Ambiental (SRHQ) com a princi- do as instâncias administrativas e competências específicas para a pal atribuição de formular a Política Nacional de Recursos Hídricos implementação da Política, abrangendo a esfera da União e a esfera e subsidiar a formulação do Orçamento da União; a Agência Nacio- dos Estados e do Distrito Federal. O Sistema compreende a partici- nal de Águas (ANA), que é a entidade federal de implementação pação da União, estados, Distrito Federal, municípios, usuários e so- da Política e coordenação do Sistema, e as agências de água, com ciedade civil, em fóruns colegiados em âmbito nacional (o Conselho atuação no âmbito das bacias hidrográficas. No âmbito estadual, os Nacional de Recursos Hídricos, CNRH), nos Estados (os Conselhos órgãos gestores estaduais teriam a atribuição de outorgar e fiscalizar Estaduais de Recursos Hídricos, CERH) e nas bacias hidrográficas o uso de recursos hídricos de domínio do Estado. 1 A gestão de recursos hídricos na agenda estratégica nacional Decorridos 20 anos da aprovação da Lei nº 9.433/97, é reconhecido que a gestão de recursos hídricos no Brasil ainda não conseguiu se tornar uma prioridade estratégica Recomenda-se um maior esforço de comunicação e articulação na agenda política nacional (Empinotti et al., 2014 e 2015; OCDE, 2015). Tampouco por parte do setor de recursos sua importância e necessidade são plenamente valorizadas pelos próprios usuários de hídricos para elevar a gestão de água ou compreendidas pela sociedade em geral. Contudo, não é fácil dar visibilidade recursos hídricos na agenda política nacional, deixando claros seus política à gestão de recursos hídricos nem mesmo de construir uma articulação go- resultados e benefícios e sobretudo vernamental horizontal (em nível federal, por exemplo). OCDE (2015), em sua extensa os custos de não fazê-la de modo integrado. análise sobre a governança no Brasil, ressalta o isolamento setorial dos ministérios e órgãos públicos e o quanto isso dificulta a coerência política entre o setor de recursos Neste sentido, a SRHQ/MMA e a ANA deveriam liderar hídricos e outros setores estratégicos para a água (agricultura, energia, licenciamento uma articulação entre setores ambiental, saneamento e uso do solo). do Poder Executivo Federal, propondo diálogos políticos e institucionais para discutir Faz-se, portanto, necessário um grande esforço de comunicação e articulação por parte questões estratégicas da gestão de do setor de recursos hídricos para elevar a gestão de recursos hídricos na agenda políti- recursos hídricos, de modo a elevar a importância política do setor nas ca nacional, deixando claros seus resultados e benefícios e sobretudo os custos de não macrodecisões do país. fazê-la de modo integrado. Modelo de Gestão de Recursos Hídricos GESTÃO COMPARTILHADA EM UM CONTEXTO DE DUPLO DOMÍNIO A União, os estados e o Distrito Federal têm o poder-dever de zelar pelas suas águas. Ressal- ta-se, contudo, que em se tratando do sistema hídrico, isto é, a bacia hidrográfica formada por um rio do domínio da União e por seus afluentes de domínio estadual, estabelece-se o duplo domínio administrativo das águas, que aumenta o seu grau de complexidade quando vários estados compartilham a bacia hidrográ- fica, situação que impõe desafios consideráveis à atuação conjunta da União e dos estados ou do Distrito Federal naquele âmbito. A gestão das águas que banham mais de um estado deve ser compartilhada entre a União, os respectivos estados e Distrito Federal, de forma descentralizada e participativa, sem- pre considerando a bacia hidrográfica como unidade territorial para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atu- Rios federais (em vermelho) e estaduais ação do Sistema Nacional de Gerenciamento (em verde). Fonte: ANA de Recursos Hídricos, SINGREH. 2 RIO ESTADUAL E5 RESERVATÓRIO E4 FEDERAL E3 E2 RIO ESTADUAL E1 F NECESSIDADE DE COORDENAÇÃO E As águas em depósito decorrentes de obras da União, quando cons- GESTÃO ESTADUAL ADEQUADAS PARA truídas em rio de domínio estadual, apresentam o aspecto particular, CUMPRIR COM AS METAS PACTUADAS. pois o controle das águas nelas acumuladas, embora seja estadual na origem, deixa de ser do estado e é exercido pela União dentro do re- servatório, voltando ao domínio estadual quando liberadas a jusante. E1 E2 Apesar da complexidade, o duplo domínio é uma situação comum com a qual é preciso aprender a conviver, buscando e aperfeiço- ando instrumentos de colaboração, articulação e pactuação que ALOCAÇÃO F permitam conduzir a gestão compartilhada a bom termo. Deve-se ressaltar que outras alternativas ao domínio das águas proposto E3 E4 E5 na Constituição terão outros tipos de complexidade. Neste sentido, recomenda-se construir regras de Possibilitar a delegação de competência para conceder a • compartilhamento e cooperação no contexto de duplo domínio outorga de direito de uso das águas da União, acompanhada dos recursos hídricos, com definição clara de papeis e atribuições: da devida fiscalização; Esclarecer as atribuições federativas relacionadas com a • Finalmente, uma alternativa também seria subtrair do • gestão de recursos hídricos onde coexistam águas de domínio domínio da União as águas decorrentes de obras por ela da União e de Estados (Lei Complementar conforme feitas em rios de domínio estadual, por meio de Emenda previsto no Art. 23 da Constituição); Constitucional. Intensificar e fortalecer a construção de mecanismos • de pactuação; ADAPTAÇÃO DO MODELO ÀS ESPECIFICIDADES DA REGIÃO NORDESTE A PNRH foi construída sob inspiração do modelo francês a grande extensão territorial do Brasil abrange regiões com de gestão de recursos hídricos, uma das experiências mais diferentes características hidroclimáticas e socioeconômicas referenciadas do mundo. Ao buscar inspiração em um país que terminam impactando os recursos hídricos diferente- desenvolvido, rico, altamente urbanizado e industrializado, mente e demandam estratégias e soluções distintas de gestão. o Brasil privilegiou o enfrentamento de situações mais típi- As principais dificuldades de adequação se observam princi- cas das regiões Sudeste e Sul, onde predominam problemas palmente nas regiões Norte e Nordeste do país. Esta nota foca de qualidade das águas, motivação principal da criação do em alguns dos principais aspectos necessários para a adapta- sistema francês de comitês e agências de água. No entanto, ção para a região Nordeste. 3 Compreendendo nove unidades da federação1, o Nordeste repre- hidrologia da região, de clima semiárido. A baixa disponibilidade senta 18,3% da área do Brasil; grande parte da região encontra-se hídrica decorrente dessas características hidrológicas limita o de- no bioma Caatinga. Chuvas irregulares, solos rasos, rochas aflo- senvolvimento socioeconômico, e em situações de secas prolonga- rantes e altas taxas de evaporação são características que marcam a das, inviabiliza diversas atividades econômicas. $ $ $ $ $ $ $ Em função das características regionais, a seca é um fenômeno natural e cíclico e nessas condições as atividades humanas pre- cisam se adaptar a essa característica climática, minimizando a vulnerabilidades das populações e respectivas atividades eco- nômicas. As demandas hídricas têm crescido continuamente, acompanhando o processo de urbanização que atingiu, em 2010, uma taxa média de 73% (IBGE, 2010). Recentes estudos mostram que o impacto das mudanças climáticas no Nordeste2 e na bacia do Rio São Francisco3 resultarão em uma diminuição da preci- pitação, intensificando as secas no futuro. O Brasil vem avançando nos últimos anos na mudança de uma Recomenda-se continuar desenvolvendo e institucionalizar a gestão com uma postura mais proativa e de preparação para gestão reativa de secas (emergencial) para uma gestão proativa de as secas, principal estressor para a gestão dos recursos hídricos secas, aprimorando ferramentas tais como o monitoramento de na região semiárida. Esta postura proativa pressupõe ações secas no Nordeste (monitordesecas.ana.gov.br.) e a elaboração de de preparação e mitigação na perspectiva de gestão do risco. Especificamente, propõe-se a promoção de ações por meio dos planos de preparação para as secas em diferentes níveis (munici- órgãos gestores nos três pilares mostrados na figura a seguir. pal, hidrosistema e bacia). 1 Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. “Planejamento de recursos hídricos e adaptação a variação climática e as mudanças climáticas em bacias selecionadas no Nordes- 2 tes do Brasil” (P123869). 3 “Cenário de baixa hidrologia para o setor elétrico brasileiro (2016-2030) – impacto do clima nas emissões de gases de efeito estufa”. 4 TRÊS PILARES DE PREPARAÇÃO PARA A SECA  ONITORAMENTO E 1. M 2. VUNERABILIDADE/RESILIÊNCIA MITIGAÇÃO E PLANEJAMENTO 3.  PREVISÃO/ALERTA PRECOCE E AVALIAÇÃO DE IMPACTOS DE RESPOSTA E MEDIDAS Fundamento de um plano de preparação Programas pré-seca e ações para reduzir para seca riscos (curto e longo prazo) Identifica quem e o que está em risco e porquê Indices/indicadores ligados a impactos e Programa de resposta operacional bem- Envolve monitoramento/arquivo de gatilhos de ação definido e negociado para quando a seca iniciar impactos para melhoria da caracterização de secas Entrada para o desenvolvimento/produção de Programas de rede de segurança e social, informação e ferramentas de suporte à decisão pesquisa e extensão Os três pilares da preparação para a seca que fundamentam uma mudança de paradigma, da gestão reativa da crise para abordagens mais proativas aos eventos de seca. Fonte: Gutiérrez et al. 2014 Com relação ao modelo institucional previsto nas leis das águas, para todos os comitês estaduais4. Por outro lado, o modelo de a maior dificuldade de aplicação nos estados do Nordeste semi- agência única com aplicação solidária dos recursos mostrou que árido concerne as agências de bacia, previstas em lei para dar tem grande potencial de dar uma sustentabilidade mínima ao apoio técnico e operacional aos comitês mediante a implantação órgão gestor estadual e às ações básicas de gestão, um grande da cobrança pelo uso da água. gargalo para a PNRH. Quando se instituiu a PNRH, depositou-se enormes expectativas de que a cobrança pelo uso da água, a exemplo da experiência Recomenda-se que o órgão gestor, de administração inspiradora da França, daria sustentabilidade financeira e viabi- indireta, assuma as competências das agências de bacia lidade aos novos modos de gestão, integrados e participativos em para todo o estado e implemente a cobrança, utilizando pelo menos parte dos recursos arrecadados nas bacias nível de bacia hidrográfica. Poucas iniciativas são atualmente ope- hidrográficas para financiar custos dos serviços de gestão e racionais no país, em geral, e no Nordeste, em particular. No en- criar uma solidariedade financeira na escala do estado. tanto, já se sabe que muitas bacias hidrográficas dificilmente terão recursos suficientes da cobrança em seu território para sustentar o modelo de gestão descentralizada (comitê/agência/cobrança). $ A experiência do Ceará é particularmente ilustrativa de uma possível alternativa para esse problema. Ao centralizar os recur- $ $ sos da cobrança em nível estadual, no bojo da Companhia de $ $ Gestão de Recursos Hídricos (COGERH, vinculada à Secretaria de Recursos Hídricos do estado do Ceará), o estado estabele- $ $ ceu uma solidariedade financeira entre bacias hidrográficas, por meio de subsídios cruzados, e promoveu uma economia de escala para a gestão das águas ao assumir as funções de agência de água  nalisando a distribuição espacial da arrecadação da cobrança no Ceará, verificou-se, com base na arrecadação em 2016, que 4A R$88,76 milhões (88,8% do total arrecadado) tem origem nas bacias metropolitanas, sendo que os 11,2% restantes vem das 10 bacias restantes (dessas, 2,58% Salgado, 2,02% médio Jaguaribe e 2,07% Acaraú. As demais contribuem com até 1% cada). 5 Por outro lado, devido à condição de intermitência de rios e de secas periódicas, MEIO AMBIENTE a região tem recorrido historicamente à construção de açudes e reservatórios de POPULAÇÃO grande e médio portes para diminuir o déficit hídrico, permitir a perenização de RURAL rios e acumular água na estação chuvosa para uso na estação de estiagem. INDÚSTRIA Portanto, ao observar a implementação da Lei nº 9.433/97 no cenário das caracterís- ticas regionais do semiárido nordestino, observa-se que, além da bacia hidrográfica, os vales perenizados e principalmente os açudes ganham importância estratégica como sistemas hídricos e unidades hidrográficas para a gestão dos recursos hídricos. PISCICULTURA Nesse contexto, outras entidades foram inseridas no sistema, mediante a necessida- POPULAÇÃO URBANA de local, principalmente ao considerar a importância dos açudes e reservatórios no contexto da gestão dos recursos hídricos do Nordeste, as denominadas Comissões IRRIGAÇÃO Gestoras (de açudes, vales perenizados, etc.), sendo usualmente vinculadas aos co- mitês de bacia. No estado do Ceará, onde surgiu a primeira experiência, as comis- sões gestoras são instâncias do comitê de bacia, regulamentadas por resolução do Conselho Estadual de Recursos Hídricos. São elas que fazem a alocação negociada Recomenda-se permitir, em escalas locais, de água, com apoio técnico da COGERH e posteriormente validada pelo comitê a criação de outras instâncias de gestão participativa que sejam adequadas às da bacia. O que é pactuado na alocação negociada deve ser respeitado pelos usuá- especificidades regionais. rios, pelas regras de operação dos reservatórios e na emissão de outorgas. Órgãos Gestores Estaduais de Recursos Hídricos Dentre os atores do SINGREH, os órgãos gestores estaduais e federal (ANA) foram estabelecidos nos Poderes Executivos com competências de executar/implementar a respectiva política de re- Exemplo de serviço de gestão: serviço de cursos hídricos, conforme disposto na Lei nº 9.433/97 e nas leis e decretos estaduais que criam e regulação dos usos dos regulamentam a atuação do órgão gestor nos estados e Distrito Federal. recursos hídricos que permite o conhecimento e controle do uso, bem como Na implementação dessa gestão, os atores institucionais prestam os chamados serviços de gestão, busca garantir água em que são as conhecidas atividades, medidas e instrumentos de gestão que são prestados ao cidadão quantidade e qualidade adequada aos usos. Isto é e a sociedade, na perspectiva de implementação da gestão de recursos hídricos para atender os um serviço prestado pelo objetivos da política no âmbito da governança hídrica. Assim, no modelo brasileiro, os serviços de órgão ao usuário. gestão são aqueles prestados para atingir os objetivos da Lei nº 9.433/97. Para atingir os objetivos da Lei, o órgão gestor precisa ser uma ins- cidade e limitações (devido à falta de recursos e pessoal técnico tituição forte e autônoma, adequada à complexidade de gestão a ser qualificado, vulnerabilidade à ingerências políticas e demandas enfrentada, com independência financeira, dotada de recursos hu- por coordenação/articulação), têm dificuldades ao executar suas manos técnicos qualificados e efetivos (em quantidade adequada), funções conforme estabelecida em lei. estrutura física e logística robustas. Esses elementos devem permitir ao órgão tomar decisões transparentes e com qualidade a partir de A figura mostra como os órgãos estaduais devem se organizar em informações sólidas, considerando uma postura proativa, de plane- função da complexidade de gestão de recursos hídricos, indican- jamento e de pactuação com outros atores do SINGREH. do equipe mínima, instrumentos de gestão de recursos hídricos prioritários e serviços de gestão mínimos para cada um dos níveis. De forma geral, os órgãos gestores estaduais, por sua baixa capa- 6 TIPOS DE ÓRGÃO GESTOR BÁSICO INTERMEDIÁRIO AVANÇADO Órgão central Órgão central Órgão central e gerências Corpo técnico mínimo: Corpo técnico mínimo: Corpo técnico mínimo: Especialistas em Recursos Hídricos, Especialistas em Recursos Hídricos, Especialistas em Recursos em Qualidade de água e em em Qualidade de água, em Hídricos, em Qualidade de água, Mobilização Mobilização, Tecnologia da Informação, em Mobilização, Tecnologia da Geólogo Informação, Geólogo, Economista, Instrumentos de Gestão Prioritários: Especialista em Planejamento • Outorga Instrumentos de Gestão Prioritários: •Planos de Recursos Hídricos • Outorga Instrumentos de Gestão Prioritários: •Planos de Recursos Hídricos • Outorga Serviços de Gestão: •Sistema de Informações •Planos de recursos hídricos • Planejamento de Recursos Hídricos •Sistema de Informações • Monitoramento • Cobrança de Recursos Hídricos • Gestão da informação • Cobrança (Banco de dados) Serviços de Gestão do OG Básico: • Enquadramento • Regulação e fiscalização • Gestão da informação (Sistema de • Gestão participativa Informações) Serviços de Gestão do OG • Comunicação • Gestão financeira intermediário: • Articulação • Capacitação •Gestão da informação (Sistema de • Gestão de eventos críticos Suporte a Decisão) • Gestão da demanda Média e Alta Complexidade de Gestão Baixa Complexidade de Gestão Muito Alta Complexidade de Gestão (Conflitos pelo uso da água em subbacias (Bacia com usos pontuais e dispersos, (Bacia com conflitos pelo uso da água críticas ou com maior intensidade e ausência de conflitos) generalizados e com maior complexidade) abrangência) EVOLUÇÃO DOS ORGÃOS DE GESTÃO ESTADUAL Complexidade da gestão e sustentabilidade institucional e financeira Com vistas a cumprir com os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos Nesse sentido, recomenda-se: Capacitação de técnicos dos órgãos gestores estaduais; • Estruturar o órgão gestor estadual que disponha de pessoal • técnico e administrativo adequada ao nível de complexidade; Apoio técnico ao órgão gestor estadual na implementação •  da política estadual, em especial nas bacias compartilhadas; Dar transparência às ações desenvolvidas pelo órgão de • gestão estadual por meio da prestação de contas de suas Assistência e assessoria técnica no pla­ • nejamento atividades e do demonstrativo financeiro correspondente; institucional e no desenvolvimento das ações de gestão; Dar visibilidade aos “serviços de gestão” prestados • • Disponibilização de equipamento; pelo orgão gestor estadual e esclarecer seus papéis e responsabilidades na gestão de recursos hídricos e no • Promoção da troca de experiências entre órgãos gestores. atendimento aos objetivos da PNRH. Além disso, programas de repasses de recursos aos estados Por outro lado, o papel da Agência Nacional de Águas é condicionados ao atingimento de resultados, nos moldes chave no fortalecimento dos órgãos gestores estaduais. do Progestão (http://progestao.ana.gov.br), devem ser Recomenda-se que a ANA dê continuidade e intensifique seu intensificados, focando no fortalecimento dos sistemas apoio aos órgãos gestores estaduais para que o SINGREH seja estaduais de gerenciamento de recursos hídricos. implementado na sua plenitude, por meio de, entre outros: 7 Os Planos de Recursos Hídricos em Bacias Hidrográficas O Plano de Recursos Hídricos é um dos instrumentos de ges- tão mais executados no Brasil. Além do Plano Nacional e dos EN Planos Estaduais, a ANA aponta que já foi concluída a elabo- QU ração de 176 planos de bacia hidrográfica, sendo 164 Planos ÇA AD AN RECURSOS de Recursos Hídricos de Bacias Hidrográficas Estaduais e 12 RA E COBR Planos de Recursos Hídricos de Bacias Hidrográficas interes- D MENTO HÍ S taduais (ANA, 2017). DR PLANO SISTEMA DE ICOS INFORMAÇÕES No entanto, os Planos de Recursos Hídricos em bacias hidrográ- ficas não têm exercido em sua plenitude a função de ser o instru- mento da PNRH portador de maior conteúdo estratégico, pois devem orientar a aplicação coordenada dos instrumentos da Polí- tica Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), bem como se articu- OUTORGA lar com a gestão ambiental, setorial e municipal, de modo a tornar efetiva a gestão integrada por bacia hidrográfica. Especificamente, devem nortear os instrumentos da outorga de direitos de uso de recursos hídricos, do enquadramento dos corpos de água em clas- ses, segundo os usos preponderantes da água e da cobrança do uso de recursos hídricos. CONC EPÇ Falta compreensão de que o planejamento é um processo cícli- ÃO ENTAÇÃO co e de que o documento Plano é “um momento estanque de EM PL ELA um processo contínuo”. IM BOR 4a6 AÇÃO Recomenda-se que os Planos sigam um processo cíclico, anos 0 contínuo e dinâmico e não devem ser aceitos como um 4a6 documento estanque e pontual. anos 0 Nesse sentido, propõe-se: adotar quatro fases para o RE ciclo de planejamento: (i) concepção; (ii) elaboração; SÃ VI (iii) implementação; (iv) atualização e/ou revisão; e O reiniciar o ciclo de planejamento a cada 4 ou 6 anos, mesmo que tenham ações planejadas de longo prazo para 10, 15 ou 20 anos. IMP LEMENTAÇÃO Cabe aos Comitês de Bacia Hidrográfica decidirem sobre ela- à implementação dos planos, entende-se que as diversas ações boração, aprovarem e fazerem o acompanhamento do anda- propostas no plano estão sob a responsabilidade de execução mento de todas as fases, sendo um ator-chave na articulação e de entes tanto do SINGREH como de outros setores, mas em pactuação. As fases de concepção e elaboração estão sob res- última instância, a coordenação, o monitoramento e o acompa- ponsabilidade das agências de água ou entidades delegatárias nhamento da implementação das ações do plano devem estar de suas funções, com apoio do respectivo órgão gestor de recur- sob a responsabilidade prioritária da agência de água (ou enti- sos hídricos de acordo com o domínio das águas, ou do órgão dade delegatária) e do(s) órgão(s) gestor(es). gestor apenas, em caso de não ter agência de água. Já quanto 8 Recomenda-se definir Planos de Ação realistas e operacionais quanto a sua implementação PLANO DE AÇÃO para os 4 - 6 anos seguintes, devendo-se garantir uma maior vinculação de recursos QUEM QUE QUANDO QUANTO CUSTA financeiros para a implementação e dos agentes responsáveis por sua execução mediante articulação e pactuação. Existem fragilidades no processo de articulação e pactuação do setor de recur- sos hídricos com setores usuários e outras políticas setoriais. Faltam mecanis- mos vinculantes que impulsionem a articulação entre os setores, sob a coorde- CONCEPÇÃO nação do setor de recursos hídricos. A realização de pactos institucionais no ELABORAÇÃO processo de elaboração dos planos temse demonstrado um ambiente eficiente IMPLEMENTAÇÃO para discussão dos problemas da bacia hidrográfica e criação de meios para execução das ações. Os mecanismos de articulação e coordenação são chaves em todas as fases do ciclo de planejamento. Recomenda-se que: Realizar pactos entre os órgãos gestores de recursos hídricos, • Durante o processo de elaboração do Plano, órgãos gestores • a agência de bacia, onde houver, e outros órgãos setoriais de recursos hídricos, comitês de bacia e agências de água, para implementação do plano, com apoio e concordância do onde houver, devem liderar e aprimorar a articulação com Comitê de Bacia. outros setores (saneamento, energia, irrigação/pecuária, indústria, infraestrutura hídrica de uso múltiplo e meio Regulamentar os diferentes tipos de instrumentos de • ambiente) visando integrar os planejamentos setoriais ao contratualização dos pactos a serem adotados, prevendo plano de recursos hídricos da bacia hidrográfica e vice-versa. mecanismos de monitoramento, sanções e indenizações. Sustentabilidade financeira Do ponto de vista financeiro, para que a gestão dos recursos hí- para a disponibilização ao setor (nem todos os estados dispo- dricos seja efetiva, é preciso garantir a sustentabilidade de suas nibilizam) e são vulneráveis ao contingenciamento e ainda às ações, o que pressupõe a existência de fontes e canais de recursos mudanças nas regras de cálculo e distribuição. e (ii) a cobrança para tornar sustentáveis: (i) as instituições; (ii) a implementação pelo uso da água, instrumento ainda de baixa aplicação que tem dos instrumentos de gestão, inclusive programas e investimentos apresentado potencial de financiamento de diversas ações em propostos nos planos de recursos hídricos; e (iii) a operação e várias bacias hidrográficas e estados no Brasil e que permanece manutenção de infraestrutura de uso múltiplo. globalmente modesto ou insignificante em relação à demanda to- tal de investimento; São várias as instituições do SINGREH que A sustentabilidade financeira passa por uma maior alocação de enfrentam dificuldades no uso dos recursos públicos: (i) órgãos recursos financeiros do Poder Público para garantir a implemen- gestores estaduais enfrentam dificuldades no uso de recursos já tação dos serviços da gestão e os benefícios para a sociedade. disponíveis e na implementação dos instrumentos de gestão devi- do à falta de pessoal (em quantidade e qualidade); (ii) comitês de Somente dois canais de recursos financeiros estão sob o controle bacias enfrentam dificuldades em sua capacidade organizacional, do SINGREH: (i) a Compensação Financeira pela Utilização de por falta de apoio financeiro, para deliberação sobre emprego de cursos Hídricos para Geração de Energia Elétrica (CFURH), Re­ recursos disponíveis; (iii) as entidades delegatárias5, nas bacias cujos recursos dependem de decisão do estado (e municípios) onde operam, enfrentam limitações no uso de dinheiro público  Lei 10.881, de 2004, dispõe sobre os contratos de gestão entre a Agência Nacional de Águas e entidades delegatárias das funções de 5A Agências de Águas relativas à gestão de recursos hídricos de domínio da União. 9 originado da cobrança pelo uso da água; (iv) órgãos com função Finalmente, de um modo geral percebe-se ainda um desconheci- de formulador da política e secretaria executiva do CNRH, como mento sobre os custos e gastos associados à gestão dos recursos o SRHQ, enfrentam limitações orçamentárias em vista de suas hídricos (transparência), desconhecimento sobre os benefícios competências institucionais, o que reduz também a capacidade que a gestão traz aos usuários e ausências de um planejamento fi- de suporte ao ente colegiado; e (v) ao CNRH, faltam também nanceiro integrado que norteie a implementação de instrumen- recursos para alcançar maior capacidade de articulação nacional, tos econômicos como a cobrança pelo uso da água bruta. Essa visando maior coerência com as demais políticas setoriais cujos última ainda não cumpre a função de indutor do uso racional e investimentos trazem reflexos para os recursos hídricos. internalização de impactos ambientais do uso da água, sem os quais a gestão da água se torna mais cara e mais complexa. Recomenda-se comunicar aos usuários que a gestão dos recursos hídricos é Serviços de um serviço prestado, que tem valor e também custos. É preciso: Gestão Melhorar o conhecimento sobre a estrutura de custos necessária ao fornecimento • dos serviços de gestão e dos benefícios associados e comunicá-los aos usuários. É importante mostrar que a gestão é um fator fundamental para reduzir o risco da escassez e seus efeitos econômicos e sociais negativos; Cobrança Transparência Dar transparência ao uso dos recursos disponíveis e na prestação dos serviços • de gestão sob sua responsabilidade, mostrando a qualidade dos serviços prestados e os esforços para a sua melhoria contínua. Os recursos da CFURH têm hoje uma função de grande relevân- Apesar dos estados receberem o repasse, a disponibilização dos re- cia no financiamento de vários serviços de gestão das águas no cursos para o setor de recursos hídricos por meio dos fundos esta- Brasil, embora somente parte do montante global seja disponi- duais ainda não ocorre de forma ampla no país. Em 2012, apenas bilizada ao setor de recursos hídricos. os seguintes estados fizeram repasse dos recursos da CFURH aos fundos: MG (repasse de 50%), SP (70%), BA (até 11%), RS (100%), SE A CFURH, estabelecida no § 1º do art. 20 da Constituição Federal, é (5%), RJ (94%) e ES (100%). Nos demais estados, o repasse não ocorria devida pelos concessionários de geração de energia hidrelétrica e, con- ou era indefinido, nessa data. Segundo ANA (2012), os estados de forme disposto na Lei nº 9.648/1998, na Lei nº 9.984/2000 e na Lei nº PE, TO, PR e SC têm efetuado depósitos da CFURH nos fundos. 13.360/2016. Esses recursos correspondem à 7,0% do valor da energia ge- rada, sendo 0,75% destinados à Agência Nacional de Águas (ANA) e 6,25% destinados aos Estados, Municípios e Distrito Federal atingidos pelas águas represadas ou que abrigam as instalações de usinas hidrelé- Recomenda-se ampliar e tornar a CFURH mais segura tricas com potência superior a 30MW, além de órgãos da administração como recurso para o setor de recursos hídricos. pública da União. A essa arrecadação financeira soma-se a arrecadação Na esfera estadual, cabem aos órgãos gestores e aos de royalties de Itaipu, normatizada pelo Tratado de Itaipu (1973). CERHs articularem-se e mobilizarem-se com o objetivo de vinvular (carimbar) uma parte da CFURH-Estados para ações de interesse de recursos hídricos Um total de 22 estados e 711 municípios receberam recursos em 20166. Em relação aos valores totais repassados aos estados, Na esfera municipal, propõe-se aos comitês de bacias e órgãos gestores articular-se com municípios para em 2016, os maiores montantes foram repassados para o Para- vincular legalmente uma parte de CFURH-Municípios ná (R$ 133,273 milhões), seguido de Minas Gerais (R$ 108,278 em açòes de interesse do setor de recursos hídricos. milhões) e de São Paulo (R$ 93,165 milhões).  endo o maior número de municípios nos estados de São Paulo (193 municípios, que receberam um total de R$ 106,409 milhões, incluindo 6S royalties de Itaipu), Minas Gerais (150 municípios, que receberam um total de R$ 137,870 milhões, incluindo royalties de Itaipu) e Paraná (69 municípios, que receberam um total de R$ 468,133 milhões, incluindo royalties de Itaipu) 10 A cobrança pelo uso da água tem apresentado potencial de quando da aprovação da lei das águas, quanto à viabilidade financiamento de diversas ações resultando em diferentes ní- de novos modos de gestão baseados essencialmente no poder veis de implementação no Brasil, constituindo uma fonte de financiador da cobrança pelo uso da água. Sua implementação financiamento estratégica para a gestão das águas por ser o ainda esbarra em limitações de uso dos recursos, metodologias único recurso totalmente sob a governabilidade do SINGREH. de cálculo e aceitação por parte dos usuários. São necessários Entretanto, poucas iniciativas são atualmente operacionais no modelos diversificados, desenhados dentro de uma lógica de país e a arrecadação anual da cobrança corresponde à parcela financiamento integrado e indução do uso racional da água insignificante da demanda total de investimento nas bacias hi- que dê aos usuários alternativas de participação. Portanto, drográficas apontada pelos planos de recursos hídricos. De um seu aprimoramento e ampliação devem ser prioridades para o modo geral, percebe-se hoje a falta de uma avaliação prévia, aperfeiçoamento da Política e do SINGREH. Recomenda-se aprimorar a implementação do instrumento Rreduzir o risco de contingenciamento dos recursos • cobrança pelo uso da água de forma integrada ao da cobrança; compatibilizar a aplicação dos recursos planejamento financeiro. da cobrança conforme os serviços de gestão sob responsabilidade do órgão gestor estadual e da entidade Onde ainda não existe a cobrança, deve-se: delegatária (onde ela estiver presente); Elaborar estudo do potencial de arrecadação da cobrança, • em diferentes escalas de gestão; Revisar a metodologia em vigência, ampliar a base de • cálculo do fato gerador da cobrança de qualidade, para Simular o potencial de financiamento da cobrança; • além da DBO; Onde o potencial de financiamento for relevante frente • Revisar a estrutura tarifária para tornar o sistema mais • a ações previstas e demais canais de financiamento, flexível e facilitar a aceitação por parte dos usuários; implementar a cobrança. Essa ação depende em grande parte da demonstração de resultados, pelo lado do órgão Ampliar o universo de usuários pagadores; • gestor estadual, para aumentar a aceitação da cobrança. Revisar a estrutura tarifária para variar conforme a • Onde a cobrança já se encontra implantada, deve-se: garantia do abastecimento, por meio da integração da Dar mais celeridade à aplicação dos recursos da cobrança • cobrança ao sistema de outorgas e facultando ao usuário com foco em resultados claros para os usuários; outorgas com níveis diferentes de garantia, sendo as maiores garantias atreladas às tarifas maiores. 11 SOBRE ESTE DOCUMENTO Este sumário executivo é um documento em elaboração que se baseia nos trabalhos técnicos que o Banco Mundial vem desenvolvendo e na experiência adquirida com o apoio à implementação de projetos no setor de água no Brasil. Foi preparado pela equipe da Prática Global de Água do Banco Mundial. Em caso de dúvidas ou comentários, por favor, entrar em contato com Paola Carvalho Costa (pcarvalhocosta@worldbank.org). Março / 2018 12