PROGRAMA PILOTO DA FLORESTA TROPICAL BRASILEIRA CASO DE SUCESSO 7 RESERVAS EXTRATIVISTAS: CONCRETIZAR O SONHO DE CHICO MENDES1 A Inovação Uma "reserva extrativista" é um modelo que combina a conservação efetiva de recursos naturais com o desenvolvimento socioeconômico, baseado em parcerias entre as comunidades locais que moram na reserva e as instituições do setor público. As reservas extrativistas demonstram que a proteção da biodiversidade e dos recursos naturais pode vir de par com a redução da pobreza. Os Impactos Após seis anos de testes e avaliações deste novo tipo de unidade de conservação, feitas pelo Programa Piloto, as reservas extrativistas foram amplamente aceitas pelo governo brasileiro e pelos governos municipais, como sendo uma maneira adequada de promover o desenvolvimento sustentável, reduzir a pobreza e proteger os recursos naturais. O envolvimento direto da população local garante a manutenção das reservas a um custo baixo, e, às vezes, com uma conservação mais eficaz dos recursos naturais do que no caso dos parques, sobretudo em áreas distantes, que possuem pouca infraestrutura pública e privada. Nos últimos oito anos, foram criadas 16 reservas extrativistas na Amazônia, em um total de área protegida de nove milhões de hectares. Estão sendo criadas outras 20 reservas. Antecedentes Os seringueiros e os moradores da floresta estabeleceram-se na Amazônia no fim do século XIX, atraídos pelo crescimento da extração da borracha. Desde o fim do ciclo da borracha, a floresta tropical vem sofrendo constante pressão da indústria madeireira e dos criadores de gado. Os moradores locais, sob a liderança de Chico Mendes, opuseram-se à destruição da floresta, que era a sua única fonte de renda. Após o assassinato de Chico Mendes, organizações brasileiras e a comunidade internacional fizeram pressão para que se encontrassem soluções adequadas para os moradores locais ­ e para a floresta. Em 1995, sob forte oposição das autoridades locais e regionais, que queriam um uso diferente para a floresta, o governo federal havia criado apenas quatro reservas extrativistas. O desafio era capacitar e treinar a comunidade local para que pudesse opor-se de maneira eficaz aos assentamentos irregulares, à extração ilegal da madeira e à indústria pecuária. O fato de que esses moradores tradicionais não estivessem organizados, com um nível de analfabetismo perto de 80%, tornava ainda mais duvidoso que esse tipo de modelo participativo de proteção pudesse funcionar, sobretudo nas regiões com pouca, ou nenhuma, infraestrutura. 1Esta nota faz parte de uma série especial produzida pelo Programa Piloto das Florestas Tropicais do Banco que destaca exemplos de casos de sucesso e de melhores práticas de projetos financiados pelo Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil. A Iniciativa O Programa Piloto aceitou o desafio de apoiar o movimento dos seringueiros e, junto com a população local e o IBAMA, criou um modelo inovador de unidade de conservação que levasse em consideração as necessidades e práticas da população local das florestas. O objetivo era testar se parcerias entre as instituições públicas e a população local para o manejo das reservas levariam a uma proteção efetiva da floresta virgem, resultando em uma melhoria das condições de vida para as comunidades da floresta. O passo inicial e mais importante foi o de dar direito de posse da terra à população, o que, pela primeira vez na vida dessas pessoas, era uma garantia de uma certa proteção jurídica. A fim de garantir a proteção real dos recursos naturais, os títulos das terras estão ligados ao uso sustentável dos recursos da floresta, baseado nos planos de manejo. A maior parte das normas foi definida pela própria população, com base nas melhores práticas tradicionais, sendo apenas posteriormente aprovadas pelo IBAMA. A fim de oferecer condições para o desenvolvimento econômico e social dessas regiões, os moradores da floresta receberam treinamento e se organizaram em associações. Considerando-se o baixo nível educacional e de capacidade técnica dessas pessoas, que vivem em áreas afastadas, onde faltam comunicação e transporte, o processo foi bastante lento e passou por vários revezes. Entretanto, foram implantadas durante o projeto 672 ações de treinamento e capacitação, aumentando assim a capacidade e a habilidade das organizações locais. Atualmente, a maior parte das tarefas administrativas foi entregues às organizações de seringueiros. O mais difícil era gerar renda para a população, a fim de evitar a migração das reservas para a periferia das cidades amazônicas, o que deixaria a floresta sem proteção. O projeto tomou várias medidas para promover produtos alternativos oriundos da floresta, tal como aumentar o caráter comerciável das frutas tropicais, da pesca, do artesanato, das nozes e de outros produtos sustentáveis. Mais recentemente, a extração madeireira mais sustentável está sendo testada como alternativa econômica por algumas das comunidades que vivem nas reservas extrativistas. Além de promover outros produtos da floresta, além da madeira, fez-se um esforço para melhorar a agricultura de subsistência, a fim de garantir uma renda mínima de subsistência. Em muitos casos, a agricultura de subsistência havia sido proibida pelos proprietários rurais (em geral, os "barões da borracha") para manter a população em estado de penúria alimentícia. As tarefas de monitoramento ambiental e de aplicação da lei foram divididas entre o IBAMA e as comunidades, que receberam treinamento para monitorar as áreas e evitar invasões, a pesca comercial, a caça e a extração da madeira. Os habitantes das reservas extrativistas que não seguirem as regras correm o risco de perder seu direito de posse e de ter de deixar a terra. As quatro reservas totalizam dois milhões de hectares, para uma população de 2.900 famílias. No início do projeto, os moradores das florestas não tinham acesso aos serviços municipais. Foi portanto um grande desafio fornecer infraestrutura básica, como escolas, transportes, radiocomunicação e postos de saúde. Esses investimentos foram realizados em cooperação com a população local, que, em contrapartida, colaborou com dinheiro e trabalho, para garantir o direito de posse. Ao todo, mais de 4.500 projetos de pequena escala foram implantados pela população, incluindo mais de 2000 atividades de subsistência, tais como apicultura, fazendas de plantio e projetos agroflorestais, além de 2.500 projetos de pequena infraestrutura. Impacto Após seis anos de testes e monitoramento das atividades e resultados do projeto, as conclusões e impactos são excelentes e revelam que o modelo de reserva extrativista é factível, podendo ser copiado na Amazônia, em outras regiões brasileiras e também em outros países, em condições semelhantes. O monitoramento dos dados indica que a cobertura florestal permaneceu igual durante todo o projeto. Os indicadores da biodiversidade indicam que em três de cada quatro reservas o número de mamíferos aumentou, embora seja permitida a caça de subsistência. Os custos do desenvolvimento social e econômico e de manutenção das reservas, são inferiores a US$1 por hectare. Esse baixo custo só pôde ser atingido graças à cooperação com a população local. A população da floresta aumentou nas reservas, o que é um bom indicador de que o modelo vem sendo bem aceito pelas pessoas. Moradores que haviam migrado para as cidades voltaram às suas antigas casas. Também houve aumento da renda. A renda mensal por família chegou a $100, incluindo-se o valor das atividades de subsistência como a caça e a pesca. Comparada à renda da população das cidades vizinhas, a renda média nas reservas é superior à das áreas periurbanas. Após vários anos de implantação do projeto, graças à organização eficaz de associações e à melhoria da infraestrutura e condições de vida, a maior parte dos governos municipais e estaduais começou a perceber a importância deste modelo e a assumir a responsabilidade dos investimentos em infraestrutura nas reservas. Atualmente, as quatro reservas podem contar com parcerias com os seus respectivos governos municipais, o modelo de reservas extrativistas foi adotado e está sendo financiado e copiado em outras áreas. Após o sucesso do Programa Piloto nas quatro reservas extrativistas, foram criadas mais 17 reservas e outras 20 estão na prancheta. Além disso, o modelo foi ampliado para outras regiões, sobretudo na zona costeira do Atlântico, onde estão sendo criadas 15 reservas extrativistas marinhas, em cooperação com as comunidades pesqueiras locais. Lições aprendidas · O desenvolvimento econômico e social das populações locais e a proteção ambiental da floresta virgem não precisam entrar em conflito. As reservas extrativistas podem obter resultados ambientais melhores a um custo menor de manutenção do que os modelos clássicos que operam sem a participação dos residentes locais. · As reservas extrativistas são possíveis somente se houver participação da comunidade local. Para que o modelo seja bem-sucedido, é primordial que haja participação das partes interessadas, com formação de capacidade. · É essencial haver compreensão e integração das melhores práticas tradicionais no plano de manejo floresta de uma reserva. · A sustentabilidade duradoura só é possível com a participação das prefeituras, por meio de investimento e manutenção da infraestrutura básica e prestação de serviços de saúde e educação. · A posse da terra da população local é uma forma adequada de assegurar o uso sustentável dos recursos naturais, sobretudo quando a agência de proteção ambiental mantém o seu direito de intervir. · O monitoramento efetivo de grandes áreas florestais é praticamente impossível, sem a ajuda da população local. A integração dos moradores da floresta no sistema de monitoramento ambiental já demonstrou ser a ferramenta mais eficaz na prevenção da destruição da floresta, sobretudo por reduzir a pressão externa. Futuros Desafios · O número de produtos comercializáveis da floresta terá que ser aumentado. Grandes distâncias de transporte e infraestrutura precárias apresentam desvantagens. Será essencial continuar a pesquisa sobre a tecnologia adequada, encontrar parceiros na iniciativa privada e explorar novos produtos da floresta encontrados nas reservas, para que os moradores das comunidades da floresta continuem a viver de maneira sustentável, a partir dos recursos ali encontrados. · É necessário monitorar de maneira mais profunda o impacto de um maior desenvolvimento econômico e da melhoria do nível de vida sobre a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais. O modelo baseia-se em um número limitado de pessoas que tiram o seu sustento dentro de uma área delimitada. Se a população crescer, aumentará também a pressão sobre os recursos naturais. Será necessário observar se há um limite ou uma compensação entre a riqueza econômica e a conservação da floresta, baseada no modelo atual. · As reservas extrativistas nas florestas exigem zonas-tampão, para que haja recuperação da fauna. As reservas devem ser integradas em uma estratégia ampla de proteção e desenvolvimento, para evitar a criação de ilhas protegidas, porém vulneráveis. · Embora a conservação por meio de reservas extrativistas custe apenas US$ 1, por hectare/ano, é necessário um financiamento a longo prazo para que, com o passar do tempo, o processo continue sustentável. Para maiores informações, visitar as seguintes páginas na internet: http://www.bdt.fat.org.br/ibama/flonas/ http://www2.ibama.gov.br/resex/resex.htm http://www.worldbank.org/rfpp/projects/projetos.htm Para obter outras informações sobre o Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, ou para receber cópias dos Casos de Sucesso já publicado, visite nossa página no endereço www.worldbank.org/rfpp, ou entre em contato com nossos escritórios em Brasília, (55-61) 329-1015 e Washington, D.C., (202) 458-8012. 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