REVISÃO RÁPIDA E INTEGRADA DA GESTÃO DE RISCOS AGROPECUÁRIOS NO BRASIL Caminhos para uma visão integrada COORDENAÇÃO Diego Arias (Banco Mundial) Paulo Mendes (MAPA) Pedro Abel (Embrapa) COLABORADORES Fatima Amazonas, Pablo Valdivia, Barbara Farinelli, Vinícius Cruvinel, Carla Zardo, Fernando Silva, Luiz Daniel de Campos e Jorge Caballero (Banco Mundial); Eliana Figueredo, Daniela Lopes, Danielle Torres, Rosana Guiducci, Vanessa Pereira, Geraldo Souza, André dos Santos, Maria Quiteria Marcelino, Rosaura Gazzola e Sílvia Kanadani Campos (Embrapa); Alexandre Gedanken, Marcel Moreira Pinto e Helia Lemos da Silva (MAPA). AGRADECIMENTOS Agradecemos aos especialistas, parceiros e representantes que colaboraram de forma substancial para o desenvolvimento e realização dos diversos painéis da Oficina Técnica e demais reuniões de trabalho. A preparação deste relatório somente foi possível pela dedicação destes profissionais. Agosto 31, 2015 ©Banco Mundial — Brasília, 2015 As opiniões, interpretações e conclusões aqui apresentadas são dos autores e não devem ser atribuídas, de modo algum, ao Banco Mundial, às suas instituições afiliadas, ao seu Conselho Diretor, ou aos países por eles representados. O Banco Mundial não garante a precisão da informação incluída nesta publicação e não aceita responsabilidade alguma por qualquer conseqüência de seu uso. É permitida a reprodução total ou parcial do texto deste documento, desde que citada a fonte. Coordenação da Série Riscos Agropecuários no Brasil Diego Arias (Banco Mundial) Paulo Mendes (MAPA) Pedro Abel (Embrapa) Equipe de Apoio da Série Riscos Agropecuários no Brasil Carla Zardo, Vinicius Cruvinel e Wanessa de Matos (Banco Mundial) Projeto Gráfico da Série André Maya, Pablo Julio e Vitor Teles Ferreira / ����  Consultoria Criativa & Design Capa, Diagramação e Gráficos Pablo Julio / ����  Consultoria Criativa & Design Foto da Capa Flavia B. Fiorini / Embrapa Fotos Páginas 4 e 56 (Paulo Kurtz), página 6 (Luiz Henrique Magnante e Luiz Eduardo Menegue�i), páginas 8 e 9 (João Costa Jr.), página 10 (Fabiano Bastos), páginas 13, 20, 29 e 69 (������/Emprapa), página 16 (Zineb Ben�ek�ou), página 30 (Barbosa de Menezes), página 40 (Liliane Bello) e página 74 (A. L. Ferreira). Todas as fotos da Embrapa. Ilustrações Todas as ilustrações por Varijanta, exceto o Fazendeiro por Iain Hector (Noun Proje�). Composição e colorificação por Pablo Julio (����). Impressão Gráfica Qualytá Banco Mundial ��� Quadra 2 Lote � Ed. Corporate Financial Center, 7º andar 70712-900 — Brasília ��, Brasil Fone: (61) 3329 1000 www.worldbank.org Banco Mundial Revisão Rápida e Integrada da Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil. Caminhos para uma visão integrada — 1ª Edição — Brasília — 2015 76p. ���� ���-��-�����-��-� Comentários e sugestões, favor enviar para Diego Arias, darias@worldbank.org. SUMÁRIO LISTA DE ABREVIATURAS  5 PREFÁCIO  7 SUMÁRIO EXECUTIVO  11 1. CONTEXTO E OBJETIVOS  17 1.1 Objetivos da revisão rápida 1.2 Importância econômica e social e volatilidade do setor agropecuário 1.3 As políticas e os programas públicos de gestão de riscos agropecuários no Brasil 2. METODOLOGIA  31 2.1 Antecedentes 2.2 Conceitos metodológicos 2.3 Etapas do trabalho 3. RESULTADOS  41 3.1 Mapeamento das principais políticas e programas públicos 3.2 Síntese da percepção de riscos do setor 3.3 Percepção da inter-relação dos riscos 4. AGENDA PARA O FUTURO  57 4.1 Recomendações para uma gestão integrada de riscos agropecuários no Brasil 4.2 Elementos básicos para uma gestão integrada de riscos agropecuários no Brasil 4.3 Proposta de um plano estratégico para maior integração das políticas e programas públicos 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS  75 LISTA DE ABREVIATURAS AGR Faturamento Bruto Ajustado (Adjusted Gross Revenue) ANA Agência Nacional de Águas ANATER Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural ATER Assistência Técnica e Extensão Rural BB Banco do Brasil BID Banco Interamericano de Desenvolvimento BM Banco Mundial CBOT Bolsa de Valores de Chicago (Chicago Board of Trade) CEPEA Centro de Pesquisa Econômica da ESALQ CNA Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil CONAB Companhia Nacional de Abastecimento CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Embrapa Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESALQ Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” FAO Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura FENSEG Federação Nacional de Seguros Gerais IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IFC Corporação financeira Internacional IICA Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura INMET Instituto Nacional de Meteorologia MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário MME Ministério de Minas e Energia OCB Organização das Cooperativas Brasileiras OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico PIB Produto Interno Bruto PSA Pagamentos Por Serviços Ambientais RRN Recursos Naturais Renováveis SISDAGRO Sistema de Suporte à Decisão na Agropecuária SRB Sociedade Rural Brasileira SUSEP Superintendência de Seguros Privados USP Universidade de São Paulo ZARC Zoneamento Agrícola de Risco Climático Prefácio Colegas, É indiscutível o relevante papel do agronegócio para a sociedade brasileira. O setor movimenta mais de 7 bilhões de dólares em exportações, o que representa cerca de 46% do total das exportações do País e, assim, contribui sobremaneira para o superávit da balança comercial brasileira. Os números da participação do setor são tão expressivos que cerca de 23% do Produto Interno Bruto (PIB) e 33% dos empregos têm origem no agronegócio. Essa importância vai além, haja vista a demanda crescente de alimentos no mundo. Um exemplo prático é que no ano de 2050 a população mundial totalizará 9,5 bilhões de habitantes, ou seja, aproximadamente 35% maior quando comparada aos dias de hoje. Paralelamente, a produção agropecuária deverá se elevar em 80%, abrindo caminhos para que o Brasil se torne o maior produtor e exportador de alimentos do mundo. Atualmente, o País é o segundo maior exportador de alimentos, porém, as projeções já o colocam em primeiro lugar para o próximo decênio. Em meio ao dinamismo inerente à produção agropecuária é impossível desconsiderar a competividade e os desafios cada vez mais complexos, os quais exigem competência e profissionalismo para o aporte devido de melhorias nos sistemas produtivos. Além disso, promover a integração das cadeias de valor, a inclusão de pequenos e médios produtores, e o estabelecimento de políticas públicas eficientes são ações preponderantes e que necessitam de ferramentas adequadas para o retorno desejado. O Brasil perde em média anualmente mais de R$ 11 bilhões devido aos riscos extremos, o que corresponde a 1% do PIB Agrícola. As ameaças são em parte bem conhecidas e permitem identificar as oportunidades e as ações necessárias para mitigá-las, respondê-las ou transferi-las. A gestão dos riscos agropecuários se apresenta como ferramenta urgente e sua adoção possibilita o aumento da eficiência das políticas e dos programas públicos e, simultaneamente, o planejamento e a integração das mais diversas ações voltadas, prioritariamente, para a estabilidade da renda do produtor. É certo que muito já existe quando nos propomos a identificar os esforços para a redução dos riscos nas atividades agropecuárias, mas também é certo que muito há que ser feito ainda. De imediato, a gestão integrada dos riscos nas diferentes políticas e programas já viabiliza a melhoria nos processos de articulação e de governança, considerados também os diferentes níveis de governo. Do contrário, a manutenção de aspectos indesejáveis e desprovidos de uma visão sistêmica para a condução do tema pode transformar os avanços até o momento alcançados pelo agronegócio em prejuízos incalculáveis para a sustentabilidade do setor e, consequentemente, do País. Kátia Abreu,  ministra da agricultura Maurício Antônio Lopes,  presidente da embrapa Martin Raiser,  diretor do banco mundial no brasil 7 8 Sumário Executivo O Banco Mundial, em conjunto com o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA) e a Embrapa, apoiados pela Sociedade Rural Brasileira, Organização das Cooperativas Brasileiras, Confederação Nacional da Agricultura, Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, Federação Nacional de Seguros Gerais, Banco do Brasil, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, Organização das Cooperativas Brasileiras e Companhia Nacional de Abastecimento, desenvolveu uma metodologia que possibilitou a revisão rápida e integrada da gestão de riscos agropecuários no Brasil, de modo a obter uma visão integrada do processo. Esse trabalho foi motivado pela importância econômica e social do setor agropecuário para o Brasil, assim como por sua volatilidade econômica. Perdas anuais extremas (acima de um desvio padrão) da produção agrícola brasileira e crescimento (%) do PIB agrícola (IBGE, 2015). 3.50% 30% 3.00% 20% 2.50% 10% 2.00% 0% 1.50% -10% 1.00% -20% 0.50% 0.00% 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 -30% Perdas % do PIB Agrícola PIB Agrícola (% crescimento) O Brasil perde anualmente, em média, mais de R$ 11 bilhões (1% do PIB Agrícola) devido a riscos extremos que poderiam ser geridos de forma mais eficaz (Fonte de dados: IBGE, 2015). Atualmente (2014) o setor agrícola responde por mais de 23% do PIB, 33% dos empregos e 43% das exportações brasileiras, representando uma importante parcela da produção agropecuária global (maior produtor de açúcar, café e suco de laranja; segundo maior produtor de carne bovina e soja; terceiro maior produtor de carne de aves e milho; e quarto maior produtor de carne suína). Porém, há alguns anos, com crescimento do PIB agrícola negativo. Essa situação pode ser minimizada apenas com uma melhor gestão dos riscos extremos. Sumário Executivo 11 Foi proposta uma metodologia inovadora para identificarem-se as oportunidades e os desafios da atual gestão de riscos agrícolas no Brasil. Sobre a base de consultas com especialistas (mais de 100), representantes dos setores público e privado, da academia e de produtores (Ver Anexos) e uma enquete eletrônica de abrangência nacional, foram identificados os principais riscos agropecuários e sua importância econômica em âmbito nacional. Ainda, esse trabalho foi substanciado por uma avaliação empírica desses riscos em dois Estados (Bahia e Paraíba) e um Município (Piquet Carneiro, Ceará). Os resultados da consulta com especialistas e da enquete foram confrontados com uma revisão bibliográfica 1 Políticas dedicadas à prevenção das principais políticas públicas nacionais dedicadas a mitigação1, transferência2 da ocorrência de eventos extremos e resposta3 dos riscos agrícolas. Depois de sistematizados, os resultados com potencial de prejudicar a renda do produtor rural. Cita-se preliminares foram apresentados (Ver Anexos) a várias instituições relacionadas como exemplo as ações de defesa com o setor agrícola e com políticas públicas (CGEE — Ministério da Ciência e sanitária e o zoneamento agrícola. Tecnologia, BNDES, CGU e TCU) para validação e melhoria dos resultados obtidos. 2 Políticas dedicadas ao comparti- lhamento de prejuízos sobre a renda do produtor rural decorrentes de Ederson Jesus / Embrapa eventos extremos, a exemplo do seguro rural. 3 Políticas dedicadas a indenizar prejuízos sobre a renda do produtor rural decorrentes de eventos extremos, a exemplo dos programas de garantia de preços e do Garantia Safra. Os resultados demonstram que o Brasil dispõe de muitas e boas políticas públicas para a gestão de riscos agropecuários e que essa situação pode melhorar, sem aumentar o gasto público, apenas com planejamento no sentido de melhorar a integração entre elas. Os resultados possibilitaram elencar os desafios para a gestão dos principais riscos agropecuários no Brasil (foram consideradas oito dimensões de risco segundo os grupos ‘risco de produção’, ‘risco de mercado’ e ‘risco do ambiente de negócios’ em âmbito nacional), indicando oportunidades de aperfeiçoamento das políticas e programas públicos vigentes. Mais do que as oportunidades, os resultados apontam para a necessidade de integração da gestão de riscos agropecuários, uma vez que, sem o atendimento integrado dos riscos, é di�cil reduzir as perdas de forma sistemática no setor. 12 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil GRUPOS DE RISCOS RISCOS EXEMPLOS DE EVENTOS RISCO DE PRODUÇÃO Climáticos e Incêndios Secas prolongadas, geadas, excesso de chuva e inundações, ventos fortes. Sanidade Animal Surtos de febre aftosa, BSE (vaca louca), Newcastle, etc. Sanidade Vegetal Introdução de novas pragas e doenças no País (ex.: lagarta Helicoverpa armigera). Gestão da Produção Mudanças nas outorgas de água, na assistência técnica, e de Recursos Naturais na fiscalização e na disponibilidade de mão de obra, além da má gestão dos recursos naturais, a exemplo da seca no RS, que não foi decorrente apenas de evento climático, mas, em grande parte, do manejo inadequado dos solos e, consequentemente, da água. RISCO DE MERCADO Comercialização (preço Variação significativa dos preços dos produtos e insumos, de insumos e produtos) nas taxas de câmbio, nas taxas de juros e nas mudanças e Credito nos termos dos créditos. Comercio Exterior Fechamento de mercados para exportação e mudanças no acesso à importação de insumos. RISCO DO Logística e Infraestrutura Greves nos portos, fechamentos em rodovias/hidrovias/ AMBIENTE DE NEGÓCIOS ferrovias e mudanças nos incentivos à armazenagem. Marco Regulatório, Mudanças em leis/regulações (ambientais, trabalhista, Politicas, Instituições e insumos, terra), mudanças de orientação em instituições Grupos de Interesse públicas de apoio (MDA, MME, ANA), modificações na interpretação de normativas. Sumário Executivo 13 GEOEYE / Embrapa Os resultados da percepção de riscos dos diferentes atores do setor demonstram que, enquanto a sanidade é um risco com elevado potencial de dano, sendo relativamente bem atendida por políticas públicas, programas públicos federais para a gestão de riscos de logística e infraestrutura, ainda não cumprem plenamente os seus objetivos. Também foi evidenciado que ‘novos’ riscos, a exemplo da mão de obra e gestão dos recursos naturais, são tão importantes quanto riscos ‘tradicionais’, como o clima. É importante destacar que a redução dos riscos de crédito e de comercialização requer a gestão de múltiplos riscos, assim como a redução dos riscos climáticos e do marco regulatório têm o maior efeito multiplicador sobre os demais riscos agropecuários e, portanto, deveriam receber atenção especial. Para responder ao risco de ambiente de negócios, é preciso uma maior estabilidade e planejamento do marco regulatório, sem criar necessariamente mais normas ou regulações. A agenda para o futuro está baseada em recomendações para reduzir perdas de forma sistemática no Brasil por meio de uma gestão integrada de riscos agropecuários no Brasil. Um plano estratégico para uma melhor gestão de riscos agropecuários no Brasil deve ser implementado paulatinamente, iniciando-se pela integração e pela articulação de algumas políticas e programas públicos em que a gestão integrada de riscos já vem sendo realizada na prática pelo setor. Esse plano deve ter como palavras �ave a ���������� e o ������������ com vistas à estabilidade da renda do produtor rural. Finalmente, é importante considerar que essa integração, além da articulação e coordenação entre os diferentes políticas e programas, deve considerar também os diferentes níveis de Governo Federal, Estatal e Municipal e os diferentes sistemas produtivos (agricultura empresarial, familiar, autoconsumo). 14 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil FORAM IDENTIFICADAS SEIS ÁREAS ONDE UMA MAIOR INTEGRAÇÃO NA GESTÃO DE RISCOS SERIA POSSÍVEL AO NÍVEL FEDERAL NO CURTO PRAZO Sistema integrado de informação de riscos agropecuários 39% Integração de sistemas existentes agroclimáticos, dos agricultores de preço, de sanidade animal, vegetal e de crédito. têm acesso à internet Sistema integrado de geração e transferência de tecnologias específicos à gestão de riscos Priorização e coordenação de geração e Entidades de ATER transferência de tecnologias, principalmente para a agricultura familiar. 656 hoje credenciadas (públicas, ONGs, privadas) Sistema integrado de transferência de riscos agropecuários Melhora do sistema de seguro rural e coberturas de preços, com ampla participação do setor privado e focado na agricultura familiar. 25% da área cultivável com seguro Planejamento integrado da logística agropecuária e de investimentos em infraestrutura rural Melhorar o sistema de compartilhamento 40 milhões de informações em tempo real e o de toneladas de déficit de armazenagem 61% planejamento estratégico de investimentos em transporte e armazenagem. e de do transporte e rodoviário Integração das ferramentas de gestão de risco climático às de gestão de recursos naturais Integração de ferramentas na gestão de recursos he�ares são equipados naturais, como, por exemplo, do zoneamento agroclimático às outorgas de água. 250.000 com sistemas de irrigação por ano Integração das iniciativas de promoção e monitoramento do comércio exterior relacionados à gestão de riscos US$ 96 bilhões Integrar as agendas de sanidade animal e de agroexportações em 2014 79% vegetal nas negociações e nas estratégias de comércio externo. do superávit do Brasil Sumário Executivo 15 Contexto & Objetivos 1 Uma gestão integrada de riscos pode viabilizar uma melhoria de renda ao agricultor. O setor agropecuário do Brasil enfrenta um número grande de riscos ligados ao processo produtivo, que têm ocasionado perdas significativas ao País nos últimos anos. Uma gestão adequada e integrada desses riscos pode deixar a renda do agricultor menos exposta a perdas, beneficiando o setor e o País como um todo. Nesse sentido, dada à limitação sempre presente de recursos, é importante maximizar o retorno econômico das ações de gestão de riscos agropecuários. O Brasil construiu importantes políticas e programas de gestão de risco (Capítulo III), mas são vários os indicativos de que é possível aumentar a eficiência e a efetividade dessas políticas com avanços nos processos de coordenação e priorização e no tratamento de lacunas e de oportunidades de melhoria. Fabiano Bastos / Embrapa Contexto & Objetivos 17 1.1  Objetivo da revisão rápida DEFINIÇÃO DE RISCO AGROPECUÁRIO O risco implica um conhecimento numérico sobre a probabilidade e o impa�o do evento, enquanto a incerteza implica resultados que não são ainda conhecidos (Knight, 1921). Neste relatório, a definição de risco na agricultura está associada a resultados negativos decorrentes e imprevisíveis nas variáveis biológicas, climáticas, reguladoras e de mercado. Essas variáveis incluem adversidades naturais (por exemplo, pragas e doenças), fatores climáticos não controláveis aos produtores agrícolas (por exemplo, secas e inundações) e mudanças nos preços de insumos e/ou dos produtos finais. Ainda, o risco institucional, ou seja, o risco gerado por mudanças inesperadas nos regulamentos que afetam a atividade constitui outra importante fonte de incerteza. As mudanças nos regulamentos, incluindo as regulações sanitárias, podem ter um impa�o significativo sobre a renda agrícola. Isto é particularmente impa�ante para os regimes de importação/ exportação e para os regimes de apoio a preço e/ou compras de commodities. Outra consideração importante é a diferenciação entre risco e limitante. Por exemplo, no setor agropecuário, o escoamento de produtos é peça �ave para a venda. Se um produtor não tem um bom acesso logístico aos mercados (i.e. estradas pavimentadas), isso é considerado uma limitante para o produtor. Porém, se frequentemente o produtor dispõe de boa logística e inesperadamente a estrada fica interditada produzindo perdas à logística, isso é um risco. Finalmente, é importante diferenciar os riscos das tendências. Por exemplo, se numa zona geográfica existe um aumento gradual e previsível da frequência e impa�o das secas (devido a mudança climática ou outros fatores), essa tendência não é considerada risco. O risco de seca nessa zona seria somente os desvios em relação a essa tendência. Outro exemplo de tendência no Brasil é a diminuição na disponibilidade de mão de obra em zonas rurais, somente a falta inesperada de mão de obra (desvio em relação à tendência) foi considerada como risco. 18 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil O objetivo do trabalho foi realizar uma revisão rápida e integrada da gestão de riscos agropecuários no Brasil, facilitando a identificação de lacunas e oportunidades que contribuam para o aperfeiçoamento, vigentes em curto e longo prazos, dos programas e políticas⁴ públicas federais. Além de possíveis 4 O trabalho se centrou sobre políticas e programas públicos melhoras em políticas e programas específicos de gestão de riscos agropecuários federais (sem entrar em políticas/ na propriedade rural, uma melhor articulação e integração das ferramentas programas estaduais ou municipais). existentes pode reduzir o perfil de riscos do setor. Diante desse contexto, Porém, no trabalho, somente se listaram, descreveram e mapearam o Banco Mundial, juntamente com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária os programas (e planos) públicos (Embrapa), empresa pública de pesquisa e difusão de tecnologia agropecuária federais por ter orçamento, mesmo e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), propuseram que diferentes políticas públicas sejam mencionadas no documento. uma revisão rápida e integrada da gestão de riscos agropecuários no Brasil, com as seguintes etapas: i) enquete eletrônica com representantes do setor agropecuário; ii) análise da percepção de especialistas do setor agropecuário; iii) análise documental; e iv) validação dos resultados preliminares pelas várias instituições da sociedade em geral. Essa análise, que visa a contribuir para uma visão sistêmica da gestão de riscos agropecuários, contou com apoio de várias instituições ligadas ao setor agrícola, a exemplo de Banco do Brasil, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg), Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO), Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Sociedade Rural Brasileira (SRB) e Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB). Os riscos do setor agropecuário podem ser agrupados em riscos de produção, de mercado e do ambiente de negócios. Segundo a tipologia do Banco Mundial5, 5 Documento do Marco de Gestão de Riscos Agropecuários: h�ps:// os riscos de produção dizem respeito à produção e a sua gestão propriamente www.agriskmanagementforum.org/ dita, podendo incluir eventos climáticos extremos e incêndios, eventos inespe- content/basic-concepts rados relacionados às áreas de sanidade animal e vegetal, além de mudanças repentinas na gestão da propriedade e dos recursos naturais devido a mudanças regulatórias ou de assistência técnica, por exemplo. Os riscos de mercado incluem principalmente as variações significativas nos preços de produtos e insumos, mudanças não previstas no acesso ao crédito e questões que afetem a comercialização, incluindo o comércio exterior. Finalmente, os riscos do ambiente de negócios incluem os eventos que mudam o contexto de políticas e instituições (mudanças no marco legal/regulatório, nas instituições do setor, na interpretação de normas e leis), incluindo acesso a infraestrutura e a logística (Quadro 1). O Capítulo II apresenta uma descrição detalhada da metodologia utilizada. Contexto & Objetivos 19 Quadro 1.  Tipologia de riscos agropecuários no Brasil (Autores, 2015). GRUPOS DE RISCOS RISCOS EXEMPLOS DE EVENTOS RISCO DE PRODUÇÃO Climáticos e Incêndios Secas prolongadas, geadas, excesso de chuva e inundações, ventos fortes. Sanidade Animal Surtos de febre aftosa, BSE (vaca louca), Newcastle, etc. Sanidade Vegetal Introdução de novas pragas e doenças no País (ex.: lagarta Helicoverpa armigera). Gestão da Produção Mudanças nas outorgas de água, na assistência técnica, e de Recursos Naturais na fiscalização e na disponibilidade de mão de obra, além da má gestão dos recursos naturais, a exemplo da seca no RS, que não foi decorrente apenas de evento climático, mas, em grande parte, do manejo inadequado dos solos e, consequentemente, da água. RISCO DE MERCADO Comercialização (preço Variação significativa dos preços dos produtos e insumos, de insumos e produtos) nas taxas de câmbio, nas taxas de juros e nas mudanças e Credito nos termos dos créditos. Comércio Exterior Fechamento de mercados para exportação e mudanças no acesso à importação de insumos. AMBIENTE DE NEGÓCIOS Logística e Infraestrutura Greves nos portos, fechamentos em rodovias/hidrovias/ ferrovias e mudanças nos incentivos à armazenagem. Marco Regulatório, Mudanças em leis/regulações (ambientais, trabalhista, Politicas, Instituições e insumos, terra), mudanças de orientação em instituições Grupos de Interesse públicas de apoio (MDA, MME, ANA), modificações na interpretação de normativas. 20 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil 1.2 Importância sócio-econômica e volatilidade do setor agropecuário A produção agropecuária é uma das principais bases da economia brasileira. A participação do setor agropecuário representa cerca de 6% do PIB brasileiro e o agronegócio representa o 23% do PIB, sendo a base de uma importante cadeia de valor que responde por mais de 32% dos empregos nacionais. Além da capacidade multiplicadora na geração de renda e de empregos, historicamente o setor agropecuário tem importante contribuição para a balança comercial do Brasil. Nos últimos 10 anos, o volume de produtos agropecuários exportados cresceu mais de 200% e o saldo comercial, 468%, fazendo com que, em 2013, as exportações do setor atingissem a cifra de US� 100 bilhões, representando quase 42% das exportações totais do País. O Brasil é o maior exportador do mundo de café, açúcar, suco de laranja e carnes (bovina e de frango); segundo maior exportador de milho e soja (grãos, farelo e óleo), além de se destacar na exportação de carne suína e algodão, entre outros itens da produção rural. Gráfico 1.  Crescimento do PIB agrícola no Brasil (R$ constantes 2000) (IBGE, 2014). 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 -5% -10% Crescimento PIB Agrícola Crescimento PIB Indústria Crescimento PIB Total Contexto & Objetivos 21 Apesar de o setor agropecuário ser um dos motores da economia brasileira, é também o mais volátil em termos econômicos. Essa volatilidade tem impa�os no País em função: i) da capacidade multiplicadora e da consequente dependência de outros setores do setor agropecuário; ii) da importância do setor na arrecadação fiscal; iii) do impa�o no aumento de preços domésticos, 6 Refere-se somente ao PIB da principalmente dos alimentos; e iv) da importância do setor na renda das agricultura. Não foi considerada famílias rurais. A volatilidade no setor agropecuário é produzida por diferentes a pecuária, devido à relação mais complexa e à defasagem entre os grupos de riscos, que podem resultar em perdas econômicas extremas. eventos de risco e a perda real. 7 Inicialmente, foram distinguidos O Brasil perde, em média, 1% ao ano no valor da sua produção agrícola⁶ devido �oques climáticos de variações interanuais menores. Os dados a eventos extremos. Seguindo uma metodologia simples⁷ para calcular as disponíveis sobre as perdas reais perdas agrícolas em função de eventos extremos, pode-se observar (Gráfico 2) nem sempre são precisos ou que os eventos extremos não se limitaram a causar perdas de produção consistentes o suficiente para facilitar a comparação e a classifi- agrícola propriamente dita, pois, nesses anos, o crescimento do PIB agrícola cação dos custos de eventos foi negativo. Nos anos em que ocorreram as maiores perdas, 2004–2006 e adversos. Essa análise, portanto, 2012–2013, elas foram relacionadas principalmente a secas severas, ocasionando baseou-se em estimativas do valor das perdas ao longo do período até três pontos percentuais de redução da produção agrícola. Em 2004–2006 de 15 anos (1999-2013), a partir de esse impa�o foi ocasionado pela seca no Sul e no Sudeste do País, enquanto dados da Informação Municipal em 2012–2013 a redução da produção está associada à então recente seca de Produção do IBGE. Um grupo de culturas foi selecionado em extrema no Nordeste. É importante considerar que esses valores das perdas função da importância em seu extremas podem ser maiores sobre a renda do produtor rural das regiões e/ou Estado em relação ao Valor Bruto produtos mais carentes e com menor acesso aos mecanismos para mitigação da Produção de 2013. A perda anual da produção agrícola foi calculada desses riscos. Além das perdas estimadas devido aos eventos climáticos como o desvio do rendimento extremos, a agricultura do Brasil sofre outros prejuízos por riscos como real do valor de tendência de mudanças no marco regulatório, na gestão da produção e recursos naturais rendimento. Um limiar de perda de 0,33 de desvio padrão de tendência e por outros de di�cil quantificação. foi definido para distinguir entre perdas devido a �oques extremos Sebastião José de Araújo / Embrapa e aqueles que refletem oscilações normais ou recessões absorvíveis. A diferença de rendimento nos anos em que os rendimentos reais estavam abaixo do limite de perda foi então multiplicada pela área real daquele ano, sendo os valores pagos ao produtor os do ano de 2013, convertidos em US$, com a taxa de câmbio de 2013. Os valores de perda obtidos foram comparados ao PIB agrícola no ano em causa, a fim de fornecer uma medida relativa da perda. 22 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Gráfico 2.  Perdas anuais extremas (acima de um desvio padrão) da produção agrícola brasileira e crescimento (%) do PIB agrícola (IBGE, 2015). 3.50% 30% 3.00% 20% 2.50% 10% 2.00% 0% 1.50% -10% 1.00% -20% 0.50% 0.00% 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 -30% Perdas % do PIB Agrícola PIB Agrícola (% crescimento) As consequências dos riscos no setor agropecuário variam por região, por tipo de produtor e por cadeia de valor. A agricultura da Região Nordeste, com perdas de 90% na produção de grãos de sequeiro em 2012⁸, teve crescimento 8 Informação da CONAB apresen- tada em: http://wrld.bg/Ucabw negativo nos últimos três anos, com perda média de três dias de trabalho/ano das famílias rurais devido à baixa produção e a escassez de água. A agricultura familiar, por dispor de menor acesso aos instrumentos financeiros de transferência de riscos, sofre grande impa�o de certos riscos na renda. Este fato contribui no Estado de São Paulo para o aumento da pobreza rural 9 Estudo MBAgro, 2012. h�p://www.fenseg.org.br justamente nas regiões mais carentes do País, assim como para a redução de 10 Costa, R., David A. Bessler, David um desvio padrão na produtividade de lavouras permanentes e temporárias, A. and C. Parr Rosson, C. Parr. comprometendo até 42.000 empregos⁹. Finalmente, certos riscos podem ter “�e Impa�s of Foot and Mouth Disease Outbreaks on the Brazilian consequências severas em cadeias inteiras. Por exemplo, o surto de febre aftosa Meat Market.” Sele�ed Paper em Mato Grosso do Sul e no Paraná em 2005 fe�ou o mercado de exportação prepared for presentation at the para a Rússia, que só foi recuperado 28 meses depois¹⁰. A redução na exportação Agricultural & Applied Economics Association’s 2011 AAEA & NAREA de carne nesse período foi de um terço do volume exportado, tendo um Joint Annual Meeting, Pi�sburgh, impa�o significativo na renda dos produtores e também na posição competitiva Pennsylvania, July 24-26, 2011. da cadeia nos mercados internacionais. Contexto & Objetivos 23 Tanto para o Governo Federal quanto para os governos estaduais, os riscos agropecuários implicam em gastos fiscais importantes. Do lado do gasto público, eventos que afetem a renda do setor agropecuário, a exemplo de desastres naturais, ataques de pragas e/ou doenças, variações significativas nos preços agrícolas, da mão de obra, dos insumos e de energia, além da produção agrícola propriamente dita, implicam em gastos públicos emergenciais em todos níveis de governo, com impa�os significativos para a economia como um todo. O Governo Federal estima que, somente para o Nordeste, a resposta à seca dos 11 h�p://www.brasil.gov.br/ últimos anos representou gastos adicionais da ordem de R$17 bilhões¹¹. observatoriodaseca/index.html Ainda no Nordeste, a frequência de estiagens aumentou em cerca de 50% os gastos públicos com o programa Garantia Safra, uma vez que a frequência dos sinistros passou de um a cada seis anos para um a cada três anos. Os riscos também impa�am a receita fiscal. Do lado da renda fiscal, uma redução da ordem de 10% na produção brasileira de soja pode resultar em redução anual de R$ 1,6 bilhão na arrecadação federal, o equivalente a 16% do orçamento anual do MAPA (Gráfico 3). Se as perdas ocorrem em vários produtos agropecuários ao mesmo tempo, os impa�os fiscais, tanto na receita quanto na despesa fiscal, são significativos. Alfredo do Nascimento Junior / Embrapa 24 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Gráfico 3.  Perda de arrecadação fiscal em função da redução de 10% na produção agropecuária (R$ milhões) (MB Agro, 2012). Cana de Algodão Arroz Feijão Milho Soja Trigo açúcar Café 0 -169 -234 -43 -200 -293 -400 -600 -720 -717 -800 -1000 -1200 -1367 -1400 -1620 -1600 -1800 1.3  As políticas e os programas públicos de gestão de riscos agropecuários no Brasil O setor agropecuário brasileiro dispõe de apoio anticíclico relativamente elevado. Em relação a outros países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a países em desenvolvimento, o Brasil tem um nível relativamente elevado de apoios agropecuários anticíclicos ou “variáveis” (apoios que variam segundo o nível de produção e/ou o nível de renda dos agricultores). Os apoios anticíclicos (pagamentos variáveis) incluem Contexto & Objetivos 25 políticas e programas de resposta a desastres naturais, compensação (garantia) de preços de produtos e programas emergenciais. Somente o Japão, a Rússia e o Canada têm níveis de apoios anticíclicos mais altos que o Brasil (Gráfico 4). 12 Pagamentos variáveis são Porém, o nível de apoio anticíclico no Brasil teve uma queda de 50% entre apoios a produtores que somente 1995–97 e 2010–2012 em relação ao nível total da renda de produtor, passando disparam em situações especificas, geralmente com �oques negativos, de 5% para 2,5% da renda dos produtores. como climáticos, preços, crises. Exemplos no Brasil incluem programas como PROAGRO, Garantia Safra, Garantias de Preço Mínimo, etc. Apoios agropecuários anticíclicos (pagamentos variáveis¹²) Gráfico 4.  como % da renda dos produtores excluindo apoios ao preço de mercado (Agricultural Policy Monitoring and Evaluation — OCDE 2013). 1995—97 2010—12 8% 7% 6% 5% 4% 3% 2% 1% 0% o a da ia n il lia y es ay an d l1 2 ne il e d ina ia a nd 3 rke az re ric an xic lan pa io n CD ss es ae rw tra t at Ch na rai is t ela Ch Ko Br erl Ja Af Ru on Me Tu Isr Ice Un OE No Ca kh Uk s dS wZ Au it z u th Ind za an ite Sw Ne Ka So pe Un ro Eu 26 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil O Brasil dispõe de diversas políticas e programas públicos agropecuários que Kim-Ir-Sen Leal / Embrapa têm impa�o na gestão de riscos do setor de forma direta ou indireta. Esses programas e políticas abrangem as várias dimensões da gestão de riscos, incluindo mitigação, transferência e resposta¹³, e também se dirigem aos 13 A definição das estratégias de risco está na seção 2.2. diferentes atores do setor: agricultores familiares, produtores médios e empresariais. Alguns dos programas e das políticas públicas federais mais importantes no Brasil relacionados aos três grupos de riscos agropecuários (produção, mercado e ambiente de negócios) são apresentados no Quadro 2. Para tanto, foram consideradas as 25 principais políticas, segundo critérios de orçamento e cobertura. Uma descrição de cada programa/plano é apresentada no Anexo Técnico e o mapeamento deles em relação à estratégia de gestão do risco está no Capítulo III. Apesar do trabalho se ater às políticas federais, existem múltiplos programas e políticas estaduais, e até municipais, com impa�o na gestão de riscos, tornando o mapeamento das ações do governo um grande desafio. Contexto & Objetivos 27 Quadro 2.  Os 25 principais planos e programas públicos federais para a gestão de riscos agropecuários no Brasil GRUPOS DE RISCOS PLANOS / PROGRAMAS Zoneamento Agrícola de Risco Climático — ZARC RISCO DE PRODUÇÃO Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural — PSR Programa de Garantia da Atividade Agropecuária — PROAGRO Programa de Garantia da Atividade Agropecuária da Agricultura Familiar — PROAGRO MAIS Garantia Safra — GS Fundo de Catástrofe (não regulamentado) Programas Nacionais de Saúde Animal Programas fitossanitários Plano Nacional de Recursos Hídricos Programa Nacional de Combate à Desertificação Programa de Modernização da Frota de Tratores Agrícolas e Implementos Associados e Colheitadeiras — MODERFROTA Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar — PRONAF Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural — PRONAMP Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação as Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura — Plano ABC Programa de Modernização da Agricultura e Conservação de Recursos Naturais — MODERAGRO Prêmio Equalizador Pago ao Produtor — PEPRO RISCO DE MERCADO Aquisição do Governo Federal — AGF Contrato de Opção de Venda — COV Programa de Equalização de Preço de Produto — PEP Prêmio de Risco para Aquisição de Produto Agrícola Oriundo de Contrato Privado de Opção de Venda — PROP Programa de Garantia Preços para a Agricultura Familiar — PGPAF BRASIL EXPORT Programa de Investimento em Logítica — PIL RISCO DO AMBIENTE DE NEGÓCIOS Programa para Construção e Ampliação de Armazéns — PCA Programa de Incentivo à Irrigação e à Armazenagem — MODERINFRA 28 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Metodologia 2 2.1 Antecedentes Existem várias metodologias e enfoques para fazer uma revisão integrada de riscos no setor agropecuário. Nos últimos anos, a OCDE tem proposto um marco conceitual holístico para a gestão de riscos agropecuários¹⁴ e o Banco 14 http://wrld.bg/UcagS 15 http://wrld.bg/Ucamb Mundial desenvolveu uma metodologia¹⁵ para a avaliação integrada de riscos em cadeias agropecuárias. Recentemente, o Banco Mundial está usando essa metodologia de avaliação integrada para apoiar os governos na priorização de ações e investimentos públicos para a gestão de riscos¹⁶. No segundo 16 Ver o recente trabalho no Paraguai: http://wrld.bg/Ucarn semestre de 2014, o Banco Mundial, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) optaram por adaptar a metodologia de avaliação integrada de riscos no setor para obter, de forma rápida, resultados para usar como base de diálogo sobre políticas públicas do setor com as novas autoridades no início de 2015. Uma metodologia de revisão rápida foi desenvolvida para conseguir mapear as principais políticas e programas públicos e identificar os desafios e oportunidades para uma melhor gestão de riscos agropecuários. Normalmente a avaliação de riscos inclui quantificação, priorização, análises de capacidades e busca de soluções de gestão de riscos. Porém, dada a riqueza de informação, estudos e análises prévias a esse trabalho no Brasil, optou-se por realizar uma revisão rápida baseada em consultas com cerca de 100 especialistas e numa enquete eletrônica lançada a mais de 5000 representantes do setor, dos quais mais de 10% responderam. Esse trabalho foi substanciado por uma avaliação empírica desses riscos em dois Estados (Bahia e Paraíba) e um Município (Piquet Carneiro, Ceará). Os resultados da consulta com especialistas e da enquete foram confrontados com uma revisão bibliográfica dos estudos recentes de avaliação de riscos e dos principais planos e programas, segundo critérios de orçamento e cobertura (Quadro 2) dedicadas a mitigação, transferência e resposta dos riscos agrícolas. Após sistematizados, os resultados preliminares foram apresentados (Ver Anexo Técnico) à a várias instituições relacionadas com o setor agrícola e com a execução das políticas públicas (CGEE — Ministério da Ciência e Tecnologia, BNDES, CGU e TCU) para validação e melhoria dos resultados obtidos. Metodologia 31 2.2  Conceitos metodológicos Para reduzir a complexidade do trabalho, foram analisados somente eventos com impa�os econômicos ‘dentro da porteira’. Embora o Banco Mundial tenha desenvolvido uma metodologia para a análise dos riscos ao longo das cadeias produtivas e, para um país, os riscos ‘fora da porteira’ são tão ou mais importantes que os ‘dentro da porteira’, devido aos recursos exíguos, notadamente o tempo, somente os riscos para o produtor rural foram considerados. Isso inclui eventos que podem se originar fora da porteira (por exemplo, fe�amento inesperado de uma rodovia, mudanças na normativa de agrotóxicos, etc.), desde que tenha impa�o na renda do produtor (por meio dos custos ou das receitas). Considerando que o setor agropecuário tem variações cíclicas, neste trabalho foi somente considerado o risco associado com eventos extraordinários e sistêmicos que afetam a renda dos produtores rurais. Os eventos extraordiná- rios e sistêmicos (ou extremos) foram definidos como aqueles produzindo perdas de mais de um desvio padrão da média ou tendência histórica. Reduções de renda menores que um desvio padrão, cerca de 10%, não foram consideradas. Perdas catastróficas, mas localizadas regionalmente, não foram consideradas quando não tiverem impa�o no âmbito nacional. Como exemplo de eventos considerados estão a seca prolongada recente no Nordeste e as secas no Sul/Sudeste, pois, mesmo cara�erizadas como eventos regionais, tiveram impa�o no setor agropecuário ao nível nacional. O fato do trabalho não considerar eventos de pequena escala, a exemplo de eventos climático ou sanitários localizados e tratados pelos governos subnacionais, não significa que são menos importantes. Outras limitantes da metodologia incluíram (i) não analisar impa�os no resto da cadeia agropecuária (somente dentro da porteira); (ii) ser influenciada por eventos recentes na memória dos atores (seca, logística, etc.); e (iii) não poder ter certeza da interpretação correta da definição de risco, respondendo no âmbito de limitantes estruturais do setor e não de eventos adversos inesperados. 32 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Figura 1.  Visão integrada da Gestão de Riscos Agropecuários (Banco Mundial, 2014). INSTRUMENTOS Investimento Assistência Técnica Políticas ATORES SETORIAIS RISCOS ESTRATÉGIAS Produtores Rurais Produção Setor Privado Mitigação Mercado Setor Público Transferência Ambiente Institucional Resposta A gestão dos riscos agropecuários requer diferentes estratégias, instrumentos, riscos e atores (stakeholders) — figura 1. Para conseguir reduzir as perdas no setor de forma agregada, todos os riscos (climático e incêndios, sanidade vegetal, sanidade animal, gestão da produção e dos recursos naturais, crédito e comercialização, comércio exterior, logística e infraestrutura e marco regulatório) devem ser considerados (ver Capítulo I para uma tipologia dos riscos) segundo diferentes estratégias e instrumentos de gestão. Os principais instrumentos de gestão dos riscos disponíveis para o setor público podem ser resumidos em investimentos, assistência técnica e ações de política. As estratégias de gestão de riscos agropecuários podem ser agrupadas como segue. MITIGAÇÃO: ações que acontecem antes da outra (ex-ante) para prevenir, reduzir ou eliminar a ocorrência de eventos/impa�os econômicos negativos à produção agropecuária, como investimentos em infraestrutura e logística para escoamento da produção e Metodologia 33 armazenamento; infraestrutura de dados agroclimáticos e sistemas de informação (zoneamentos, alertas), de drenagem, em sistemas de irrigação, na diversificação da produção, no melhoramento genético preventivo, na adoção de práticas e sistemas mais adaptados e conservacionistas, etc. TRANSFERÊNCIA: ações para transferir o risco a uma terceira parte, com um custo (prêmio). Como exemplo, citamos instrumentos financeiros como seguros, resseguros, coberturas de preço, etc. RESPOSTA: ações que acontecem durante ou depois do evento (expost), voltadas para reconstruir ou compensar perdas ocasionadas pela ocorrência, que podem ser exemplificadas em apoio emergencial aos produtores, reestruturação de dívidas, reconstrução de infraestrutura produtiva ou de transporte, etc. Uma importante ação de resposta que acontece de forma ex-ante é o planejamento estratégico ou planejamento contingente, em que mecanismos de resposta são delineados antecipadamente para que se possa responder de forma mais eficiente e efetiva à ocorrência do evento (ex.: planos de contingência para combate a incêndios ou para o controle e contenção de pragas quarentenárias). 2.3  Etapas do trabalho A revisão rápida de gestão de riscos agropecuários foi dividida em cinco etapas, que se sucederam em um período de 7 meses. As etapas (figura 2) incluem: (i) a identificação das principais dimensões temáticas dos riscos agropecuários e os especialistas a serem consultados, (ii) a revisão bibliográfica de estudos e avaliações de riscos recentes e a descrição das políticas e programas públicos federais; (iii) a realização de uma enquete da percepção de riscos agropecuários do setor; (iv) a realização de um evento de consulta com os especialistas identificados; e (v) a sistematização dos resultados. 34 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Figura 2.  Etapas da revisão rápida de gestão de riscos agropecuários no Brasil � Identificação das oito dimensões temáticas de riscos agropecuários › mais importantes. Identificação de especialistas nas várias dimensões do risco agropecuário › (10 x risco). � Identificação dos principais programas e políticas públicas ligadas às oito › dimensões temáticas de riscos. Revisão bibliográfica e de estudos/avaliações recentes das políticas/programas. › � Questionário sobre a percepção do setor agropecuário encaminhado › para mais de 5000 pessoas. � Evento (novembro 25–26, 2014 — Brasília, Embrapa Sede). › 8 painéis com especialistas sobre cada risco e identificação de lacunas › e oportunidades. � Sistematização dos resultados em um relatório para apresentação › ETAPA 1. IDENTIFICAÇÃO DAS PRINCIPAIS DIMENSÕES TEMÁTICAS DOS RISCOS E DE ESPECIALISTAS A premissa básica dessa etapa foi que, dada a exiguidade do tempo, a consulta com especialistas pode substituir, ainda que com limitações, a pesquisa empírica sobre os prejuízos causados pelas diversas dimensões de riscos à renda do produtor rural. Para tanto e com base em um trabalho prévio realizado pela Embrapa junto às Câmaras Setoriais do MAPA e os impa�os conhecidos sobre a renda do produtor rural, foram estabelecidos oito temas de risco (Quadro 3), agrupados em três dimensões (risco de produção, mercado e ambiente de negócios). Metodologia 35 Quadro 3.  Grupos de risco, representantes setoriais e instituição moderadora. PAINEL TEMÁTICO INSTITUIÇÕES REPRESENTADAS PELOS ESPECIALISTAS INST. MODERADORA Eventos climáticos UDOP, Apassul, FUNCEME, Embrapa, MAPA, UNICAMP, ESSOR, BM extremos e incêndios SWISS RE, CORSO, Clone, ESALQ/USP, FAEP Sanidade animal OCEPAR, ABIEC, Instituto Pensar Agro, Embrapa, CNA, UNB, MAPA BM Sanidade vegetal IMA-APROSOJA, Embrapa, MAPA, Multiplanta, Agropec BM Gestão da produção FGV/AGRO, ABRASS, ANDA, ESALQ/USP, UFSCAR, FAPCEN, IICA e dos recursos naturais Embrapa, OCB, CNA Mercado — Aprosoja/MT, FAEG, Rabobank, Banco do Brasil, Ministério da IFC crédito e comercialização Fazenda, Sicredi, MAPA, UNB, COCAMAR, COOXUPÉ, IBRAF, Ministério da Fazenda, OCB, FAEP; CONAB Comércio exterior MAPA, Instituto Pensar Agro, MRE, CNA, FGV/AGRO BID Logística e infraestrutura UNICAMP, CGEE, IPEA, Ministério Transportes, OCEPAR, BM ESALQ/USP, COMIGO Marco regulatório e Grupos CNA, CT — AGRO, Inst. Pesq. Pernambuco, BB Mapfre Seguradora, BM SRB, USP, Instituto Pensar Agro, Embrapa ABRAPA, FAEP, OCB, BNDES ETAPA 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA E IDENTIFICAÇÃO DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS FEDERAIS 17 O levantamento dos programas Concomitantemente à consulta aos especialistas, foram identificados os e a revisão bibliográfica também 25 principais programas e políticas públicas vigentes, com base no dispêndio podem ser acessados no web site: h�ps://www.embrapa.br/eventos/ público e na abrangência, segundo as oito dimensões temáticas de riscos avaliacao-de-riscos-agropecuarios por meio de uma revisão bibliográfica (Ver Anexo Técnico)¹⁷. 36 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil ETAPA 3. ENQUETE ELETRÔNICA SOBRE A PERCEPÇÃO DE RISCOS DO SETOR Além da consulta aos especialistas, foi aplicado um questionário eletrônico¹⁸ 18 O questionário da enquete pode ser acessado em: http://wrld.bg/Ucaxf a mais de 5 mil pessoas representantes do setor agropecuário. Esse questionário teve por objetivo captar a percepção quanto à severidade e a frequência de ocorrência dos eventos associados a cada um dos riscos elencados. As respostas obtidas foram estatisticamente analisadas, de forma a permitir o ordenamento dos riscos segundo as percepções dos participantes da enquete, bem como foram identificados os vieses regionais e setoriais. Importante ressaltar que foi solicitado aos participantes responderem com uma visão nacional, suprimindo ao máximo aspe�os regionais, mas, como os participantes foram identificados segundo a região do País, sua atividade principal (produtor rural, indústria, logísticas, etc.) e produção (grãos, carnes, hortaliças, frutas, energia e etc.), foi possível aplicar uma análise psicométrica identificando os vieses regionais, da atividade principal e da produção (Ver Anexo Técnico). Foram recebidas mais de 700 respostas (de um total de mais de 5 mil) representando todas regiões do País (Gráfico 5). A enquete foi composta por perguntas relativas a cada um dos temas, considerando a escala de intensidade das perdas provocadas e a frequência em que ocorrem, sendo 1=muito baixa; 2=baixa; 3=média; 4=alta e 5=muito alta. Com base nessas informações, calculou-se o impa�o médio e a frequência média de cada evento, bem como a regionalização das respostas. Impa�o do evento X = ∑ impa�o do evento X (nº de respostas) Frequência do evento X = ∑ frequências do evento X (nº de respostas) Metodologia 37 Gráfico 5.  Respostas da enquete eletrônica sobre percepção de riscos agropecuários por região do Brasil Sul Centro-Oeste 18% 29% 23% Sudeste 9% 20% Norte Nordeste ETAPA 4. CONSULTA COM ESPECIALISTAS Foi realizada uma oficina técnica que contou com a presença de mais de 100 representantes do setor. Após algumas palestras conceituais, foram reunidos cerca de 10 especialistas em cada um dos riscos, representantes de diversos segmentos do setor agropecuário (Quadro 3), divididos em oito painéis temáticos. A seleção dos especialistas foi feita em consulta com instituições representantes dos diferentes atores do setor, assegurando assim a representatividade dos diferentes atores: instituições públicas, setor privado (agronegócio), academia, setor produtivo, instituições financeiras e de pesquisa. O princípio básico adotado foi que os especialistas têm grande conhecimento sobre a respe�iva temática de risco e que, estimulados a participar de um minucioso processo colaborativo, poderiam identificar os principais desafios e oportunidades para o setor agropecuário. Cada painel contou com um moderador independente (funcionários do IICA, BID, IFC, ou Banco Mundial) e um relator (pesquisadores da Embrapa). Um roteiro de perguntas foi elaborado para guiar as discussões dos especialistas que, sob a orientação do moderador, analisaram o levantamento bibliográfico de políticas, dos resultados da enquete, e identificaram desafios e oportunidades referentes ao seu risco. Os painéis debateram as diferentes percepções, procurando, quando possível, �egar a conclusões e recomendações. 38 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Foram encaminhadas previamente aos especialistas algumas perguntas orientadoras, com a finalidade de tornar mais objetiva e qualificada a participação de cada um em seu respe�ivo painel temático. As respostas enviadas, mesmo por parte daqueles que não puderam comparecer ao evento, foram analisadas e consideradas no presente trabalho. Dentre as questões apresentadas aos especialistas nos painéis temáticos, duas delas foram tabuladas estatistica- mente: i) Quais as principais interações que existem entre o painel temático de que o(a) especialista estava participando com os demais painéis; e ii) Definir dois ou três principais riscos do painel temático de que o(a) especialista estava participando em ordem de prioridade. Os resultados dos painéis foram apresentados em uma plenária onde todos os especialistas opinaram (Ver Anexo Técnico). Essa oficina permitiu uma grande interação entre os participantes, bem como garantiu uma representa- tividade mais equilibrada de todos os segmentos interessados: empresas, academia, terceiro setor e governo. Durante a plenária, vários temas levantados por grupos específicos foram confirmados pelos demais participantes, o que garantiu legitimidade aos resultados. Aqueles temas que não foram consenso e/ou geraram polêmica foram eliminados. Após o evento, um relatório da síntese de cada painel temático foi submetido pelos moderadores e relatores para avaliação de todos os participantes dos painéis temáticos. Os especialistas retornaram com suas contribuições para a versão final dos relatórios de todos os painéis, encontrados no Anexo Técnico. ETAPA 5. VALIDAÇÃO DOS RESULTADOS Depois de compilados e sistematizados, os resultados preliminares da enquete eletrônica e da oficina técnica foram apresentados (Anexo) a várias instituições relacionadas com o setor agropecuário e com políticas públicas (CGEE — Ministério da Ciência e Tecnologia, BNDES, CGU, TCU, PGU, ESALQ, UFSCAR, MDA e Ministério dos Transportes), obtendo-se, assim, os resultados finais que espelham uma síntese da enquete, da oficina e da validação. Nessa oportunidade, além de validar os resultados, foram obtidas várias sugestões sobre melhoria das políticas públicas existentes e necessidades de novas políticas. Metodologia 39 Resultados 3 Os resultados finais são uma síntese da enquete, da oficina e da validação. Após a validação com as diversas instituições, os resultados foram compati- bilizados de modo a obter-se uma síntese das percepções. Os resultados divergentes, quando não foi possível um consenso, foram eliminados. Essa síntese dos resultados, notadamente durante a oficina e a validação, levou em consideração a revisão das 25 principais políticas e programas públicos. 3.1  Mapeamento das principais políticas e programas públicos Apesar do grande número das políticas e programas públicos do Brasil, existem lacunas e oportunidades. A estratégia de mitigação (figura 3) é a mais bem amparada por políticas e programas públicos. A predominância da mitigação é coerente com qualquer política para gestão de risco. Mas, existem inúmeras oportunidades importantes nas estratégias de transferência e de resposta. No caso da resposta, notadamente em casos de riscos com baixa frequência e alto impa�o econômico, a exemplo de problemas sanitários ainda não constatados no Brasil, o País dispõe de um número relativamente baixo de planos de contingência. Ainda se considerando que nem todos os riscos agropecuários podem ser transferidos, existem oportunidades nas áreas de riscos de produção e mercado, a exemplo do acesso aos mercados futuros. Essa realidade é uma excelente oportunidade tanto para a geração de renda fiscal a partir de ‘novos’ negócios, a exemplo dos serviços financeiros e de assistência técnica, quanto para a redução dos dispêndios fiscais pela simples integração das estratégias existentes. Importante destacar que a implementação dessa integração não requer aplicação significativa de recursos públicos adicionais. As políticas e os programas públicos mapeados não �egam a cobrir as perdas dos pequenos e médios produtores de forma integrada. Os grandes agricultores têm acesso a sofisticados instrumentos financeiros de coberturas de preço e seguro a que os médios e os pequenos não têm. Os agricultores familiares dependem de apoios como o programa Garantia Safra, em que os produtores recebem pagamentos indenizatórios a partir de perdas acima de 50%, e que Resultados 41 mesmo assim não �egam a cobrir o valor perdido. Outros programas como o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) somente cobrem o custo do crédito, mas não compensam a perda da renda do produtor. Uma situação similar acontece com os riscos de mercado e o risco de logística. Figura 3.  Principais políticas e programas de gestão de risco agropecuário no Brasil RISCOS DE PRODUÇÃO RISCOS DE MERCADO RISCOS DO AMBIENTE INSTITUCIONAL TRANSFERÊNCIA PSR (Subvenção ao Premio do Seguro Rural) — MAPA/Min. Fazenda Proagro (Seguro para o credito agropecuário) — MAPA/BACEN Proagro + (Seguro para o credito agropecuário da agricultura familiar) — MDA/BACEN Garantia Safra — MDA RESPOSTA Estratégia de Gestão de Risco Programas de Programas Programas de Preços Saúde Animal — Fitossanitários — (PEPRO, AGF, PROP, PGPAF, COV) MAPA MAPA /Embrapa — CONAB Legislação/ Legislação/ regulação regulação de agrotóxicos, PCA — BNDES de agrotóxicos, recursos genéticos, recursos genéticos, etc. PIL etc. Zoneamento Pronaf — MDA Min. Transportes Agroclimático — Legislação/ Legislação/ MITIGAÇÃO MAPA/Embrapa regulação da regulação da propriedade (terra) Moderfrota — Brasil Export — Moderfrota — propriedade (terra) BNDES MDIC BNDES Código Florestal Código Florestal Plano Nacional Moderagro — Moderagro — de RRHH — ANA BNDES BNDES Lei Trabalhista Plano ABC — Plano ABC — Programas de Red de Armazens BNDES/MAPA BNDES Comercialização da CONAB da CONAB Combate à Combate à (PAA, SDPE, Desertificação — Desertificação — Refap, Prohort) MMA MMA Eventos Climáticos Sanidade Animal Sanidade Vegetal Gestão da Produção Credito e Comércio Logística e Grupos de Interesse Extremos e Recursos Naturais Comercialização Internacional Infraestrutura e Marco Regulatório Nota: Frecha significa a ligação entre os programas e políticas que tem influência em mais de um grupo de risco. A operacionalização dos programas é complexa e necessita de maior articulação. A integração dos programas de risco de preço com os programas de seguro pode e deve resultar na cobertura de renda do produtor. Porém, como ilustra a 42 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil figura 4, os programas dependem de diferentes instituições, são operacionalizados por diferentes intermediários e �egam de forma desmembrada aos agricultores. A fim de evitar duplicação de ações — e buscando potencializar a cobertura e os serviços para viabilizar uma melhoria na renda ao produtor —, a coordenação interinstitucional entre os diferentes programas mostra-se fundamental para maior eficiência e efetividade de operacionalização. Figura 4.  Sistema de seguro agropecuário e garantia de preço Garantia Safra Proagro+ / Proagro PSA Fundo de Catástrofe Programa Garantia Preços Banco Central Reasseguradoras CONAB Estados / Municípios Banco Empresas de Seguros Agricultura Familiar NE Pequena Agricultura Agricultura Familiar Comercial Agricultura Comercial 3.2  Síntese da percepção de riscos Riscos ligados à gestão da produção (a exemplo da inexistência ou inadequação de projetos e planejamento da propriedade, mão de obra, capacitação do produtor e assistência técnica) podem ser tão importantes quantos outros riscos agropecuários ‘tradicionais’, como os eventos climáticos e a sanidade. No Brasil, apesar da dificuldade em quantificar as perdas dos riscos ligados à gestão da produção (Gráfico 6), a percepção dos impa�os econômicos desses riscos na Resultados 43 Gráfico 6.  Percepção de impacto e frequência 100 (nível de criticidade) de riscos agropecuários Percepção de perdas e do impacto do Risco (%) (enquete eletrônica, 2014.) 80 60 40 20 0 20 40 60 80 100 Percepção da frequência de ocorrência do risco (%) MUITO BAIXO Granizo Mudanças padrões classif. Geada Mudanças Promoção Comercial Vento Chuva Insuficiência Mecanização Calote Anti-dumping/Salvaguardas Inundação Inadequação Mecanização Ação inesp. Atravessadores Assinatura Acordos Comerciais Incendio Falta/dificuldade insumos Insuficiência Crédito Interrupção Ferrovias BAIXO Brucelose/Tuberculose Inadequação Insumos Mud. Exig. Obtenção Crédito Interrupção Hidrovias/Aerop. Newcastle Man. Inad. Insumos Pecuários Juros Nematóides Demora/não pg. Preço Mín. Não Obtenção Cadastro Pos. Níveis de Criticidade Plantas Invasoras Var. Impostos, Taxas, Tarifas Cresc. Inesperado Importação Aftosa Falta Mão de Obra Mud. Reg. Social/Trabalhista Insuf/Inad/Indef. Marco Reg. BSE Oscilações Cambiais Diputas Orgãos Políticas Públ. MÉDIO Gripe Aviária Harmonização Sanit/Fitossanit. Insuf Marco Reg. Temas Febre Suína Mudanças Burocracia Insuf/Inad Fiscalização Pragas Falta Assist. Técnica Queda de Preços Greve Portos/Motoristas Doenças Manejo Inadequado água Liberação Créd. Período Inad. Interrupção Rodovias ALTO Capacidade Gerencial Manejo Inadequado Solo Mud. Barreiras Tarifárias Oscilação Energia Desqualificação M.d.O. Man. Inad. Fertilizante/Semente Mud. Barreiras Não-Tarifárias Redução/Infraest. Armazen. Tecnologia Inadequada Man. Inadequado Defensivos Mud. Intp. Regras Ambientais MUITO ALTO Seca 44 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil renda do produtor rural vem aumentando quanto aos artigos na média brasileira (Ver Anexo Técnico). Ainda, os resultados indicam que o setor atribui impor- tância a uma visão sistêmica e integrada sobre todos os riscos, sem privilegiar apenas os mais tradicionais como riscos climáticos, de sanidade e de preço. Riscos associados à infraestrutura e logística são prioritários. A visão setorial revela que os riscos de infraestrutura e logísticos têm maior impa�o na economia e menor atendimento das políticas públicas do que os demais riscos avaliados (Gráfico 6 e Quadro 4). Não obstante, foi ressalvado que essa percepção pode estar enviesada por notícias e problemas atuais sobre logística no Brasil. Ainda, os riscos associados a eventos climáticos extremos foram considerados pelos especialistas como o segundo mais importante, recebendo a nota “muito alta” de prioridade, assim como os riscos associados a crédito e comercialização. Quadro 4.  Percepção de especialistas sobre o impacto dos riscos associados às dimensões temáticas abordadas no estudo e o grau de atendimento das atuais políticas públicas para o setor. (Oficina técnica, 2014). IMPACTO DOS RISCOS ATENDIMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS BAIXO MODERADO ALTO ALTO Comércio exterior › Crédito › MÉDIO Marco regulatório › Sanidade animal › Gestão de RRN e › Sanidade vegetal › da produção Mercado › BAIXO Eventos climáticos › Logística e › infraestrutura Para todas as dimensões de riscos agropecuários, foram identificadas oportunidades de melhoria de políticas e programas públicos federais vigentes. Principalmente a oficina e a validação tiveram alguns pontos divergentes Resultados 45 João Costa / Embrapa sobre os desafios e as oportunidades de aperfeiçoamento de políticas públicas e programas federais vigentes para a gestão de riscos (ver Anexo com relatórios sobre cada painel de risco para maiores detalhes). Porém, foi consenso a necessidade da implementação de um Sistema de Gestão Integrada dos Riscos Agropecuários. O Quadro 5 apresenta o resumo de cada painel de risco, incorporando os resultados de cada relatório, aos insumos encaminhados pelos especialistas que não puderam participar da oficina técnica e da validação. Integração foi a tônica das discussões. Uma conclusão importante, respaldada pelos especialistas, é que, apesar de ainda existirem lacunas, o Brasil dispõe de bons mecanismos para mitigação do risco, mecanismos regulares para transferência do risco e insuficiência de mecanismos para resposta — entretanto, não sendo possível tratar esses mecanismos de forma isolada. Por exemplo, no painel de comércio exterior, ficou clara a necessidade de integração e coordenação desse tema com a agenda de gestão de riscos de sanidade animal e vegetal. Outro exemplo são as recomendações do painel de riscos de gestão de recursos naturais em relação à incorporação de ferramentas de gestão de riscos climáticos no setor. 46 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Quadro 5.  Resumo de desafios e oportunidades de melhorias de políticas e programas públicos federais identificados pelos especialistas para cada painel (Oficina técnica, 2014). PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS A EVENTOS CLIMÁTICOS EXTREMOS Planejamento estratégico inadequado Elaboração de um Plano Safra Plurianual. Para estruturação do Plano, › da gestão de riscos climáticos as informações devem ser analisadas, integradas e levar em conta o estágio atual das cadeias produtivas e do impacto futuro dos riscos. Falta de articulação e integração Desenhar/implementar mecanismos de articulação/integração › entre os vários setores do governo dos setores públicos para coordenar ao nível do Governo Federal o monitoramento e gerenciamento dos riscos climáticos e de preço para oferecer informação integrada e de fácil acesso. Secas extremas É necessário avançar para um sistema de previsão climática global › baseado em modelagem numérica de clima. Falta de conhecimento do produtor sobre Priorizar a difusão e a utilização das ferramentas integradas de › as ferramentas de monitoramento climático monitoramento climático e de previsão de safras e promover e previsão de safras mecanismos/instrumentos para aumentar o conhecimento sobre gestão de riscos dos produtores. Falta de quantificação dos efeitos dos riscos Dimensionamento (quantificação) das perdas, as áreas de planejamento › climáticos nas cadeias produtivas e gestão de riscos do Governo Federal nas cadeias produtivas para direcionar melhor as ações público-privadas. RISCOS ASSOCIADOS À SANIDADE ANIMAL Conjunto de zoonoses com tendência a Implantar Programa de Educação Sanitária, de âmbito nacional para › aumentar nos próximos anos. reverter a tendência e a ocorrência de surtos. Ex.: brucelose, tuberculose, cisticercose e raiva Ampliar o número de pesquisadores e Constituir e consolidar grupos capacitados em emergência zoossanitária, › especialistas em doenças exóticas e emergentes bem como em doenças exóticas. Melhorar a constância Aperfeiçoar o Sistema de Defesa Agropecuária com mecanismos › do monitoramento sanitário de monitoramento associados à previsão do clima e intensificação e epidemiológico da fiscalização. Ampliar e qualificar as barreiras nas fronteiras; Integrar de forma efetiva as informações das alfândegas com › a Defesa Agropecuária; Aprimorar a integração sanitária com os países vizinhos. › (continua) Resultados 47 (continuação) PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS À SANIDADE ANIMAL (continuação) Aumentar a participação do setor privado na Os produtores devem encontrar um ambiente favorável e seguro para › Vigilância Sanitária contribuir com suas informações. Ausência de uma agenda nacional de con- É importante manter e ampliar um adequado status sanitário, agregando › quista de novos mercados, baseada no status valor à produção nacional e criando uma agenda nacional de conquista zoossanitário de novos mercados. RISCOS ASSOCIADOS À SANIDADE VEGETAL A resistência de pragas e doenças Para diminuir a resistência a agrotóxicos, é importante implementar › a agrotóxicos e eventos transgênicos uma ‘nova’ indústria de proteção de plantas baseada no controle está se intensificando biológico, moléculas da biodiversidade, ‘novas’ máquinas e equipamentos; estruturação da assistência técnica rural e de um programa de educação sanitária, para a adoção de boas práticas de controle e manejo de pragas e doenças. Processo regulatório para produtos de Ampliar a interação e integração entre os atores do processo de registro: › proteção sanitária é complexo e moroso unificação de requisitos para registro para produtos de proteção sanitária para reduzir os tempos nos processos. Entrada de pragas, doenças e Reforçar a estrutura de Defesa Agropecuária na fronteira norte e incluir › plantas daninhas ausentes do País os estudos de impactos sanitários nos projetos de logística (estradas, portos, aeroportos, etc.); reforçar a elaboração de planos de contingência para pragas quarentenárias ausentes do País; Implantação de programa de melhoramento genético preventivo; políticas › de manejo de problemas fitossanitários a nível de território/paisagem (a exemplo do vazio sanitário, manejo de moscas das frutas com liberação de macho estéreis). Progressivo distanciamento da realidade Dar racionalidade no entendimento da realidade e das demandas, › e das demandas práticas pelo setor público ampliando os quadros da defesa agropecuária nas fronteiras do País da defesa e nas regiões onde a produção é intensa e está em expansão. Retirada repentina de produtos químicos Melhorar a estratégia de retirada de produtos químicos do mercado, › do mercado sem disponibilidade de incluindo planejamento e associada à disponibilização de informações substitutos efetivos validadas de produtos alternativos, com antecedência de dois a três anos. (continua) 48 caminhos para uma visão integrada (continuação) PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS À GESTÃO DA PRODUÇÃO E DE RECURSOS NATURAIS Limitações na capacidade operacional e Criar capacidade operacional e interpretativa, realizando › interpretativa da área de licenciamentos que treinamentos e atividades de capacitação contínuos, no âmbito envolvem recursos naturais no meio rural da legislação federal, estadual e municipal. Deficiência nos processos de gestão Melhorar a capacidade de gestão dos pequenos e médios agricultores, › das propriedades rurais, entre pequenos dando ênfase à formação de multiplicadores qualificados para a difusão e médios agricultores de tecnologia voltada para a gestão das propriedades rurais. Diversificar e intensificar uso da terra. Soja, Pesquisas avançadas e validadas demonstram que existem culturas › milho (incluindo a 1ª e 2ª safras) e cana de com potencial para diversificação da produção e aumento do período açúcar representam 75% da área cultivada de ocupação da terra, principalmente nos cerrados. Os Estados aplicam políticas diferenciadas Adotar políticas regionais coerentes entre si para a agroindustrialização, › que interferem na agroindustrialização como ser a unificação das políticas de incentivo à agroindustrialização por meio de marco regulatório. Falta de integração de programas e políticas › Integrar as ações do setor público e privado voltadas para públicas na área de gestão da propriedade e sustentabilidade e agregação de renda ao produtor. de recursos naturais com o setor privado Ex: Algodão Brasileiro Responsável (ABR). RISCOS ASSOCIADOS A CRÉDITO E COMERCIALIZAÇÃO Falta de políticas de acesso Dotar as políticas de acesso ao crédito de meios mais estruturantes e › a crédito mais estruturantes, com normas mais estáveis, aumentando a previsibilidade, a segurança com normas mais estáveis das operações e, consequentemente, maior aporte de financiamento privado, reduzindo o montante de “dinheiro novo” para o setor; Realizar uma ampla revisão no Manual do Crédito Rural, consolidando › uma abordagem de médio e longo prazos para o financiamento agropecuário; Disponibilizar recursos financeiros no volume e na época apropriada › para as ações de apoio à comercialização. Os elementos registrados pela Central Atualizar os dados do Anuário Estatístico do Banco Central, › de Risco do Banco Central estão sempre até atingir a periodicidade mensal. Disponibilizar de forma integrada defasados do calendário agropecuário e simultânea os dados do Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) do IBGE e dos Levantamentos de Safra da CONAB. (continua) Resultados 49 (continuação) PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS A CRÉDITO E COMERCIALIZAÇÃO (continuação) Nas operações de barter e de “soja verde”, Disponibilizar informações aos produtores rurais sobre a formação › os pequenos e médios ficam mais expostos de preços de produtos agrícolas, insumos, etc.; para reduzir os riscos aos riscos nas operações de barter e de “soja verde”; Criar mecanismos, como a subvenção ao PSR, que incentivem › o acesso dos pequenos e médios produtores a ‘novas’ operações, a exemplo do mercado de futuros. Vincular crédito para infraestrutura de Aperfeiçoar ferramentas de crédito que atendam às especificidades › armazenagem com financiamentos para de cada cadeia. Exemplo disso são as necessidades dos cafeicultores, a estocagem e/ou exportação geralmente diferentes das dos sojicultores. Grande parte dos financiamentos Ampliar as operações do Pronaf para as cooperativas, visando › disponibilizados pelo Pronaf ainda é ao fortalecimento das organizações associativas e a uma maior realizada na pessoa física competitividade da agricultura familiar. As coberturas de preço são pouco conhecidas Buscar soluções para a promoção dos instrumentos de proteção › pelos pequenos e médios produtores de preços, como mercados futuros e de opções. RISCOS ASSOCIADOS AO COMÉRCIO EXTERIOR A defesa agropecuária tem estruturas Compatibilizar as estruturas de verificação de conformidade, › distintas de verificação de conformidade de avaliação de risco e de gerenciamento de risco com outros países, e de avaliação e gerenciamento de risco, para reduzir sua exposição a mecanismos de barreiras não tarifárias. deixando o Brasil mais exposto que seus Há necessidade de uma estrutura específica que unifique esses concorrentes três pilares da gestão de risco, como ocorre em blocos como a União Europeia ou países como os Estados Unidos e a Austrália. A exportação é geralmente condicionada É necessário que o Brasil intensifique as negociações de novos › a cotas, havendo dificuldade de acesso a acordos comerciais para o setor e flexibilize as exportações com mercados quando não são realizados bons novos mecanismos ou meios além dos bons acordos comerciais. acordos comerciais A ocorrência de surtos de febre aftosa O monitoramento dos riscos sanitários de interesse para o comércio › exterior brasileiro deve ser consolidado. O Brasil é altamente dependente da Implementar planejamento estratégico e articulado, visando a reduzir › importação de insumos e de alguns a dependência e o impacto das importações de insumos e produtos. produtos agropecuários (trigo) Realizar acordos comerciais com países que têm economia comple- mentar à brasileira, por exemplo, países produtores de fertilizantes. Melhorar a coordenação das autorizações de importações (trigo) com redução de impostos para não gerar impacto na produção nacional (continua) 50 caminhos para uma visão integrada (continuação) PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS AO COMÉRCIO EXTERIOR (continuação) Conhecimento insuficiente dos  umentar o conhecimento dos produtores rurais sobre as políticas ›A produtores rurais sobre as políticas públicas no comércio exterior. Alguns exemplos bem-sucedidos públicas no comércio exterior de empresas e cooperativas brasileiras podem ser aperfeiçoados e difundidos. RISCOS ASSOCIADOS À LOGÍSTICA E INFRAESTRUTURA O marco regulatório para investimentos  ever e aprimorar a legislação que respalda os contratos, como a ›R em infraestrutura e logística precisa ser Lei 8666/93 (Lei de Licitações), que pode acabar elegendo o melhor aprimorado preço em detrimento da qualidade da obra. O nível de capacidade de armazenamento  reparação de planos de armazenamento regionais e por cadeia ›P para algumas regiões e cadeias cria perdas produtiva para identificar a necessidade de apoio ao financiamento para o setor para construção de estruturas de armazenagem, com investimentos nos sistemas de escoamento de produtos (rodovias, ferrovias, portos e hidrovias), especialmente os grãos, e de fomento de longo prazo para ampliação e melhoria do parque armazenador brasileiro por meio de linhas de financiamento perenes, buscando sempre a adequação das estruturas às exigências regulatórias e de mercado. Implementar incentivos à armazenagem na fazenda. Reestruturar a rede pública de armazenagem. Melhorar a qualificação da mão de obra para operacionalização dos complexos armazenadores. Eliminar o impedimento legal de pessoas físicas em atuarem como prestadores de serviço de armazenagem, aumentando assim a capacidade estática disponível para uso por terceiros. Homogeneizar as legislações que tangem à matéria ambiental e de combate a incêndio, dificultando a implantação de projetos de armazenagem. O produtor rural é o elo menos beneficiado  isponibilizar informações aos produtores sobre a disponibilidade ›D pela melhoria da logística, pois não coordena de crédito para armazenagem pode resultar em ganhos, sobretudo a cadeia na comercialização durante a entressafra. Interrupções de fluxo nas rodovias  ções de curto prazo são o monitoramento e a divulgação da ›A informação sobre ocorrências de interrupção de rodovias, nas épocas críticas para o escoamento da safra — a médio e longo prazos, a diversificação de modais com maior participação das ferrovias e hidrovias. (continua) Resultados 51 PRINCIPAIS DESAFIOS NA GESTÃO OPORTUNIDADES (AÇÕES) DE APERFEIÇOAMENTO DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS DE POLÍTICAS E PROGRAMAS PÚBLICOS VIGENTES RISCOS ASSOCIADOS À LOGÍSTICA E INFRAESTRUTURA (continuação) Irregularidade no fornecimento A matriz energética deve considerar a demanda para a produção › de energia elétrica e a industrialização nas regiões de elevada produção, com custos competitivos. Greves nos portos Dar continuidade ao aperfeiçoamento da infraestrutura e das › relações de trabalho na área portuária. Algumas ações de curto prazo têm dado resultados, como o agendamento nos portos. RISCOS ASSOCIADOS A MARCO REGULATÓRIO, POLÍTICAS E GRUPOS DE INTERESSE Papéis e responsabilidades institucionais Integrar e harmonizar a governança fundiária e fortalecer › sem clara definição na legislação as instituições responsáveis pela aplicação dessa legislação. fundiária vigente A legislação sanitária apresenta Atualizar e dar efetividade ao sistema de defesa agropecuária, › defasagens e inconformidades em considerando as novas tecnologias disponíveis, notadamente as relação às novas tecnologias tecnologias da informação. Lentidão na adequação da legislação. Reduzir a demora no aperfeiçoamento dos marcos legais, amenizando › As instituições brasileiras não estão a insegurança jurídica e possibilitando atrair investimentos. preparadas para fazer as atualizações necessárias na mesma velocidade em que as mudanças sociais, ambientais e tecnológicas impactam o setor Relações de conflito entre Melhorar a comunicação do setor rural com a sociedade urbana, › grupos de interesse embasada em dados científicos. Demonstrar, por exemplo, que a área rural pode contribuir para a gestão sustentável dos recursos hídricos. Grande parte da legislação que dá suporte Diagnosticar e atualizar a legislação dos instrumentos de apoio › às operações de apoio a à comercialização, à comercialização dos produtos agropecuários. armazenagem, logística, etc. estão defasadas, pois foram produzidas em momentos diversos do atual A gestão integrada de riscos requer Propiciar organicidade e coordenação ao sistema de pesquisa › coordenação e aperfeiçoamento dos e inovação (estratégia continuada de gestão) com ênfase no marcos regulatórios desenvolvimento rural sustentável e na integração de melhores práticas agropecuárias no marco regulatório do setor. 52 caminhos para uma visão integrada 3.3  Percepção da inter-relação dos riscos Segundo os especialistas da oficina, todos os riscos agropecuários estão inter- relacionados. Durante a oficina com especialistas, identificaram-se (Gráfico 7) as relações, a intensidade e as direções das relações (influências) existentes entre os riscos considerados (eventos climáticos e incêndios, sanidade animal, sanidade vegetal, gestão da produção e dos recursos naturais, crédito e comercialização, comércio exterior, logística e marco regulatório e grupos de interesse). Percebe-se (coluna) que o risco de crédito é influenciado pela maioria dos outros riscos. Assim, o crédito pode servir como ferramenta para promover a gestão integrada de riscos, premiando/incentivando os produtores a adotar melhores práticas e tecnologias para reduzir a probabilidade de perdas. Os riscos associados ao clima influenciam os demais riscos e, portanto, devem receber atenção especial. Ainda da consulta com especialistas, ficou claro que o risco climático não se limita a influenciar somente a produção, mas também pode influenciar os riscos associados à sanidade animal/vegetal, de logística e da gestão da propriedade e dos recursos naturais. Esses outros riscos também podem influenciar o risco de comercialização (por meio do preço e/ou a qualidade dos alimentos). Outro exemplo apresentado pelos especialistas foi a influência dos riscos climáticos na ocorrência e na disseminação de doenças/ pragas em animais e plantas e as opções de logística, requerendo rotas alternativas de escoamento. Assim, a conjugação do risco climático com os riscos sanitários e de logística pode contribuir para a disseminação de eventos sanitários inesperados em regiões isentas do problema em questão. Mudanças no marco regulatório afetam todos os outros riscos, assim como políticas e programas que apoiam a sua gestão. Por exemplo, mudanças inesperadas no Código florestal, no zoneamento agroclimático ou na fiscalização sanitária podem ter impa�os diretos sobre a gestão de riscos climáticos, de crédito, de sanidade animal, de sanidade vegetal, de gestão da produção e dos recursos naturais, de comercialização e de logística e infraestrutura. Resultados 53 Gráfico 7.  Relações entre as dimensões temáticas de riscos agropecuários no Brasil (Oficina técnica, 2014). ic a l na ís t se s cio dio ão e i io e res og s e icos rna uç ais ên l o el eta al nte r çã i t o lató rod m o mát t ur nim inc nte ra eg za utu ap na u oI ea ev li ali sd rec o de reg ex os c od os str r ci rci ad ad i to ur s rco stã stã me mé r ae t nid nid tre nf l en éd Ma Ge Ge Co Co Inf co Sa Sa Ev Cr Eventos climáticos extremos e incêndios Sanidade animal Sanidade vegetal Comercialização Crédito Comércio Internacional Marco regulatório e conflitos de interesse Infraestrutura e logística Gestão da produção Gestão de recursos naturais Exerce influência Influência mútua É influenciado Probabiliade média, baixa ou muito baixa de influência 54 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Zineb Benchekchou / Embrapa Importante observar que, além da influência direta estabelecida pelos especialistas, as relações entre esses riscos podem retroalimentar o sistema, criando impa�os de várias ordens, além do impa�o inicial. O trabalho ora apresentado não �egou a identificar esses efeitos de retroalimentação na inter-relação de riscos agropecuários, porém, ficou patente essa possibilidade. A redução dos riscos associados a crédito e comercialização requer uma gestão de múltiplos riscos agropecuários. As relações de influência entre os riscos agropecuários (Gráfico 7) mostram que riscos de crédito e de comercialização (preços) têm alta dependência dos demais riscos. Por exemplo, um aumento na ocorrência de eventos climáticos extremos em uma região pode aumentar a inadimplência do setor, mudando os termos e o acesso ao crédito para todo o setor. Cita-se como exemplo de influência positiva do crédito o caso da cana-de-açúcar, em que uma melhor gestão de riscos climáticos (por meio do zoneamento agroecológico) e o fomento à bioeletricidade influenciaram positivamente a expe�ativa dos investidores e mudaram os termos e acesso a crédito para o setor. Por outro lado, um exemplo de influência negativa é o caso em que mudanças na política macroeconômica de redução da inflação afetaram negativamente os termos e o acesso ao crédito do setor. Resultados 55 Agenda para o Futuro Recomendações para uma gestão integrada de riscos agropecuários no Brasil 4 4.1 Elementos básicos para uma gestão integrada de riscos agropecuários no Brasil O Brasil dispõe de várias políticas e programas exemplares de gestão dos riscos agropecuários. O País apresenta uma grande diversidade de programas e políticas que apoiam o setor agropecuário de forma anticíclica, sendo algumas delas exemplos para outros países em desenvolvimento e até desenvolvidos. Porém, ficou claro haver várias oportunidades de melhorias nas políticas e nos programas existentes, principalmente em relação à integração, que, além de não gerarem gastos públicos significativos, podem trazer um ambiente de maior estabilidade para a produção agropecuária, garantindo, assim, um crescimento mais robusto e sustentável do setor. Segundo o mapeamento das políticas e dos programas que têm influência na produção agropecuária, existem lacunas na gestão de riscos, notadamente a insuficiência de planos de contingenciamento. Para conseguir gerir os riscos de forma integrada, o grupo de políticas e programas públicos deve considerar estratégias de mitigação, resposta e transferência. Estudos têm demonstrado que, apesar das estratégias de mitigação, em geral, ter um retorno econômico maior do que a transferência e a resposta (cada R$1,00 investido na mitigação de riscos poupa até R$7,00 em ações de resposta emergencial)¹⁹, existem casos 19 “Natural Disasters: Counting the Cost” Mar� 2, 2004. Banco em que a mitigação e a transferência não são aplicáveis. No Brasil, por exemplo, Mundial. existem riscos e eventos (um exemplo são os eventos sanitários que ocorrem nos países vizinhos) pouco conhecidos, mas com grande potencial de dano econômico ao produtor rural. Apesar do mapeamento desses eventos e da adoção de estratégias de mitigação serem desejáveis, é imprescindível a adoção de planos de contingenciamento. As ações de alguns Estados do Nordeste (Pernambuco e Ceará) na preparação de planos agropecuários estaduais de preparação e resposta a secas são exemplos de planejamento contingente necessário para diminuir as perdas no setor. Agenda para o Futuro 57 PLANO AGROPECUÁRIO MUNICIPAL DE PREPARAÇÃO E RESPOSTA A SECA, PIQUET CARNEIRO, CEARÁ Na última década, os eventos de seca extrema foram observados com maior frequência no Nordeste do Brasil. Esses eventos impa�aram negativamente na economia dos Estados e municípios integrantes dessa região, principalmente naquelas áreas com maior dinâmica agropecuária. Nesse contexto, a prefeitura do Município de Piquet Carneiro uniu esforços às ações dirigidas por entidades estaduais e nacionais com vistas a fortalecer as condições de gestão de riscos agropecuários. Tais empenhos buscam complementaridade de ações em todos os níveis administrativos do País, visando a reduzir a vulnerabilidade da população nordestina diante de eventos de seca. Essa conquista será possível não só por meio da execução de ações de resposta, mas, também, com ações de preparação, mitigação e transferência do risco da seca. Consciente da importância socioeconômica do setor agropecuário em Piquet Carneiro, a prefeitura municipal elaborou o Plano Agropecuário Municipal de Preparação e Resposta às Secas (2015-2018). Esse documento compreende estratégias e ações acordadas entre atores da sociedade civil e entidades públicas para reduzir a vulnera- bilidade dos produtores rurais e diminuir os efeitos ocasionados por secas extremas no setor agropecuário de Piquet Carneiro. Além disso, o plano identifica uma série de recomendações de atividades de mitigação, transferência e resposta que as autori- dades estaduais e federais devem ter em conta para apoiar tal plano. A metodologia utilizada para a construção desse documento contemplou a elaboração de ferramentas de trabalho (ex. tabelas, apresentações) e a revisão dos aspe�os legais, institucionais e operacionais nos níveis municipais, federal e estadual que incidem principalmente na gestão de riscos da seca no Município de Piquet Carneiro. Como parte desse processo, foi trabalhada a identificação dos principais problemas que impedem a existência de uma eficiente e efetiva gestão do risco das secas no setor agropecuário do município. As entidades que participaram da preparação do plano foram: ›  Secretaria do Desenvolvimento Agrário do Ceará (SDA); ›  Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (EMATERCE); ›  Comitê Integrado de Combate à Seca; ›  Sistema Estadual de Defesa Civil (SEDC); ›  Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME); ›  Projeto São José III; ›  Universidade Federal do Ceará (UFC); ›  Associação dos Municípios do Estado do Ceará (APRECE); ›  Banco Mundial. 58 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Existe um nível insuficiente de atendimento das políticas e dos programas públicos para a gestão de: i) riscos de logística e infraestrutura e ii) gestão da produção e de recursos naturais. Os riscos associados a logística e infraestrutura (a exemplo do fe�amento de portos e rodovias) e as incertezas sobre custos de logística (armazenagem e transporte) foram identificados com a maior prioridade relativa e com um nível insuficiente de atendimento das políticas e dos programas públicos. Uma agenda futura precisa incluir gestão de riscos de logística e infraestrutura e gestão da produção e dos recursos naturais (ações de mitigação e de adaptação) para diminuir as perdas e a percepção de incerteza do setor. O desafio na gestão desses riscos é melhorar a coordenação interinstitucional entre diferentes setores do governo (Ministério de Transporte, ANA, Ministério de Meio Ambiente, Ministério de Agricultura, Ministério de Desenvolvimento Agrário, Banco Central, BNDES, Banco do Brasil e outros agentes financeiros) que atuam nesse tema. A criação de espaços e ambiente de discussão entre esses atores e deles com representantes do setor, permitirá um salto qualitativo na possibilidade de gestão integrada desses riscos. Para responder aos riscos associados ao marco regulatório é preciso maior estabilidade e transparência das regras, gerando assim um ambiente favorável aos negócios sem onerar as despesas públicas. Os riscos associados ao marco regulatório foram identificados como os de maior potencial para influenciar a gestão dos demais riscos. Para diminuir esses riscos (ou a percepção deles), é preciso reduzir a incerteza sobre as mudanças nas regras, tratando com maior transparência as mudanças. Durante a oficina técnica e a validação foram citados exemplos como o Código florestal e a legislação trabalhista. O Código florestal continua trazendo uma percepção de insegurança jurídica ao setor, mas, devido a sua abordagem sistêmica (meio ambiente, econômica, tecnológica e social, entre outras), o código tem grande potencial de reduzir os riscos agropecuários, orientando a produção agrícola nacional no sentido da sustentabilidade, além de ser um poderoso instrumento para a produção agropecuária brasileira no cenário internacional. O exemplo dos contratos de trabalho também foi citado como uma área de incerteza que pode impa�ar significativamente a renda dentro da porteira, já que alguns aspe�os da lei trabalhista não levam em consideração os períodos de safra da produção agropecuária. Agenda para o Futuro 59 RR Rufino / Embrapa Uma gestão integrada de riscos por parte do governo requer não somente a articulação e a coordenação entre os diferentes políticas e programas, mas também entre os diferentes níveis de governo. O presente trabalho se focalizou em programas e políticas públicas ao nível federal, mas a coordenação das ações federais com as iniciativas estaduais e municipais de gestão de riscos é tão fundamental, como a coordenação entre ministérios e agências nacionais. Foi identificada a necessidade de aproximação do MAPA com os órgãos nacionais descentralizados, mas também de uma maior presença de órgãos federais para a gestão de riscos nas regiões de expansão da agricultura (maior impa�o de riscos ao nível nacional) e de agricultura familiar (maior impa�o na pobreza). Neste trabalho, não foi possível o mapeamento de inciativas subnacionais, mas iniciativas como a subvenção estadual que complementa a subvenção federal ao prêmio do seguro rural e a preparação de planos de gestão de riscos agropecuários municipais e estaduais (como a experiência de Pernambuco e do Ceará) deveriam também ser parte da agenda do futuro. Os investimentos em bens públicos (pesquisa, transferência tecnológica, investimentos em infraestrutura e logística, informação e sanidade, entre outros) 20 Lopez, Ramón. Why gover- têm maiores retornos econômicos ao sistema do que os apoios diretos²⁰. naments should stop non-social Além dos investimentos em bens públicos, a participação do setor privado, subsidies. University of Maryland, College Park. 2004. a exemplo do seguro rural, pode alavancar recursos privados para gestão de riscos, diminuindo a pressão sobre os recursos públicos. Essas modalidades, além de aliviar a pressão sobre os gastos públicos, geram ‘novos’ negócios, a exemplo da assistência técnica e a peritagem das seguradoras, contribuindo assim para aumentar a arrecadação fiscal. 60 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil 4.2  Proposta de plano estratégico para uma maior integração das políticas e programas públicos Um elemento básico para uma boa gestão de riscos é ter políticas e programas em um contexto de planejamento estratégico de longo prazo. No painel sobre riscos climáticos, apesar de ser um grupo eminentemente técnico, foi discutida a importância de um plano safra plurianual para planejamento estratégico da gestão de riscos (Anexo Técnico e Quadro 5). Essa questão foi respaldada durante a plenária dos especialistas, assim como enfatizada em todas as reuniões de validação. Ainda, na maioria das validações, a sugestão se estendeu para além da gestão de riscos, ficando explicita a necessidade de uma nova Lei Agrícola, com horizonte mínimo de cinco anos, que se integre às questões relacionadas aos oito temas de risco considerados nesse trabalho, além de outros aspe�os como o desenvolvimento rural e a mobilidade social no setor agrícola. Uma maior integração entre os programas e as políticas públicas de gestão de risco também pode permitir ao setor público priorizar ações, investindo onde o retorno econômico e social é maior. Uma gestão integrada de riscos, mais do que decisões técnicas, requer uma decisão política, que tem que ser parte da agenda do futuro da agricultura brasileira. O Brasil tem vários exemplos (Brasil Sem Miséria, o Sistema Único de Saúde e o Sistema Único de Educação) de integração entre políticas e programas, em diferentes esferas, mas com um objetivo comum, que podem servir de exemplo para implementação de um sistema integrado de gestão do risco agropecuário. Exemplos internacionais de integração na gestão de riscos agropecuários podem ser úteis para uma agenda de futuro no Brasil. Para coordenar as ações de seguro rural, maximizando cobertura e instrumentos financeiros, a Espanha criou uma empresa, a Agroseguro, composta por seguradoras, governo e produtores rurais. O Governo de Chile criou um comitê de seguro rural para coordenar as ações público-privadas. A fim de compartilhar as informações agroclimáticas e as ferramentas de analises de risco agropecuário, a Argentina criou a Oficina de Riesgo Agropecuario (ORA)²¹, que coleta, analisa e dissemina 21 Ver: h�p://www.ora.gov.ar Agenda para o Futuro 61 informações e análises sobre os efeitos de riscos agropecuários como clima, rendimentos, custos de produção e variabilidade de preços a diferentes usuários (seguradoras, bancos, produtores, setor público e empresas). As experiências internacionais e o número e a diversidade de políticas e programas públicos já existentes no Brasil mostram que a integração tem que ser feita de forma paulatina. Normalmente, em outros países do mundo, os riscos são geridos integrados ao setor privado. A exemplo da maioria dos países da OCDE, as políticas e os programas de gestão de riscos: i) enfatizam a renda do produtor como objetivo final; ii) buscam soluções de mercado com parcerias público-privados para adaptar-se às demandas dos produtores e alavancar financiamento privado para a gestão de riscos; e iii) enfatizam a coordenação e o compartilhamento da informação entre as diversas instituições participantes a partir da base, o produtor rural. Muitos dos riscos e sua gestão são transversais aos temas agropecuários, com implicações políticas e econômicas intrassetoriais e intersociais, o que torna complexa a implementação de uma política completamente integrada de gestão do risco agropecuário. Assim, é desejável que uma política de gestão do risco agrícola seja implementada paulatinamente, na medida em que as relações e as instituições dentro do setor agrícola e do setor agrícola com os demais segmentos da sociedade vão se consolidando. A gestão de certos riscos e a integração de um número de políticas e programas é possível e recomendável dada a inter-relação natural entre elas ao nível do setor e, em particular, do produtor. Para os especialistas consultados na oficina e durante as reuniões de validação, existem oportunidades para uma gestão integrada de longo prazo. Para promover e implementar uma gestão integrada de riscos de longo prazo, a criação de uma unidade de gestão de riscos, com pessoal capacitado e um plano diretor, dará sustentabilidade a uma visão integrada permanente. Essa unidade de gestão do risco agropecuário, que deve ser orientada por um plano diretor plurianual, pode iniciar-se pela implantação dos seis macro-objetivos identificados durante o trabalho e listados a seguir. 62 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil A.  SISTEMA DE INFORMAÇÃO INTEGRADA DOS RISCOS AGROPECUÁRIOS O Brasil já possui vários sistemas de informação de riscos agropecuários, alguns deles integrando informações sobre diferentes riscos. A Embrapa, o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE) dispõem de sistemas de informação e análises probabilísticos sobre riscos climáticos em escala municipal, a exemplo do Agritempo²² e do SISDAGRO²³, que não são utilizados em sua plenitude 22 h�p://www.agritempo.gov.br/ agritempo/index.jsp pelo produtor rural. Esses sistemas, além do objetivo primário que é orientar 23 h�p://sisdagro.inmet.gov.br/ a tomada de decisão da produção agrícola com relação ao clima, poderiam sisdagro/app/index estar integrados com outros sistemas já existentes e ainda não dedicados à gestão de risco, a exemplo das informações de mercado, de gestão dos recursos naturais, de sanidade (animal e vegetal) e de logística. Nesse caso, e retomando o exemplo da Oficina de Riesgo Agropecuario da Argentina, o Brasil poderia ter um sistema de informação integrado a uma base de dados única, reunindo e disponibilizando a informação e as ferramentas de análise dos diferentes riscos. Algumas das informações sobre riscos que poderiam ser integradas são: i  LIMA , divulgando sistematicamente informações de tempo (até 15 dias) C e de clima (acima de 15 dias) e seus impa�os sobre a atividade agropecuária, considerando as diversas produções. Nessa situação, o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos dispõe de previsões climáticas para até 140 dias de antecedência com boa acurácia em muitas regiões do Brasil, incluindo fenômenos como El Niño, que podem ser tratados com foco nos impa�os para o setor agropecuário pelo Sistema de Monitoramento Agrometeorológico, ‘Agritempo’ e pelas ferramentas do INMET. SANIDADE , considerando a presença/ausência dos agentes causais ii  e das condições climáticas, entre outros aspe�os epidemiológicos, e seus impa�os sobre a atividade agrícola nas diferentes culturas. Nesse caso, os Sistemas de Alerta desenvolvido com a participação da Embrapa, entre outras instituições de pesquisa, para a ferrugem da soja, da maçã e da batata são exemplos a serem perseguidos. Agenda para o Futuro 63 MERCADO, considerando aspe�os de oferta, demanda, estoque, preços iii  e principais tendências dos diversos mercados agrícolas globais das diversas cadeias de valor agropecuária. Nesse caso, as informações econômicas disponibilizadas pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) da ESALQ/USP sobre diversos produtos agropecuários podem ser a base para o sistema de análise de risco dos mercados nacional e internacional, incluindo informações atualizadas sobre as opções de comercialização para o setor agrícola. iv CRÉDITO e SEGURO, embora não exista exemplo no Brasil, a disponibili- zação e a divulgação ampla de informações sobre crédito e seguro, informações atualizadas sobre opções de crédito e alguns indicadores do seguro (prêmio, condições de segurança e etc.) para o setor agrícola seriam úteis. v LOGÍSTICA , a iniciativa de agendamento antecipado de caminhões nos portos é um exemplo de potenciais ganhos no compartilhamento de informações sobre a situação de transporte, armazenagem e infraestrutura da cadeia logística para diferentes produtos e regiões. Aplicativos para compartilhar informações pelos mesmos usuários do sistema logístico podem servir para reduzir os riscos associados à logística do setor. Ainda, ficou patente a necessidade de estudos considerando o crescimento da produção agrícola vis a vis a necessidade logística, destacando-se aspe�os econômicos, sociais e ambientais para a implementação da estrutura logística necessária. CENSO, o Censo Agropecuário do IBGE, com a última edição em vi  2006 e periodicidade, incerta, de 10 anos, é uma importante fonte de informação histórica no nível municipal. Devido à dinamicidade e à importância estratégica do setor agropecuário para o País, é extremamente importante para o setor que o Censo Agropecuário seja realizado com maior frequência. 64 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil B.  SISTEMA INTEGRADO DE GERAÇÃO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIAS PARA A GESTÃO DE RISCOS A adoção de tecnologias para a redução de perdas depende da capacidade de inovação e transferência e da integração na gestão de múltiplos riscos. 24 http://wrld.bg/UcaAK 25 Grupamento de cooperações Hoje, no Brasil, o sistema de pesquisa e transferência de tecnologia agropecuária públicas e/ou privadas visando não possui ferramentas de análises integrada de riscos (ver item A acima) a integrar instituições e dar nem a capacidade de interação com os produtores para uma gestão integrada capilaridade para o processo de inovação, que deve fluir no sentido de riscos, em particular para a agricultura familiar. do produtor rural. Esses núcleos devem operar no sentido de Há que se buscar a estruturação das ATERs, em especial das Regiões Norte regionalizar sistemas integrados de produção. e Nordeste, a motivação do quadro funcional, bem como a atuação integrada 26 Lopes, M.A. Alianças para na gestão de riscos do setor. Ainda que, no Brasil, haja alguns sistemas inovação agropecuária no Brasil: dedicados à transferência de tecnologia, a exemplo do sistema web Agência propostas de aprimoramento do sistema de pesquisa e inovação Embrapa de Informação Tecnológica (Ageitec²⁴), eles não estão integrados agropecuária. Apresentação e poderiam ser melhor utilizados. realizada à ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento em abril de 2015. Existem iniciativas no Brasil que podem ser utilizadas como referências 27 Unidades de produção agrope- para uma integração dos aspe�os de gestão de risco na geração e transferência cuária privadas, acompanhadas de tecnologia agropecuária. Um exemplo são os Núcleos Territoriais de sistematicamente por um técnico, onde são aplicadas as tecnologias Inovação e Referência Tecnológica²⁵ (NUTIR), propostos pela Embrapa²⁶, disponíveis com ênfase na produção que podem ser complementados pelas Unidades de Referência²⁷. A questão dos integrada frente às cara�erísticas núcleos e da Unidade de Referência remete à cara�erização e regionalização regionais, visando a validação, demonstração e transferência de do produtor rural, dos sistemas de produção e dos padrões tecnológicos, tendo tecnologias geradas, adaptadas como objetivo a adequação dos zoneamentos agroecológicos considerando, e/ou recomendadas pelo sistema por exemplo, aspe�os socioeconômicos e ambientais além dos climáticos e de inovação agropecuária. Agenda para o Futuro 65 Guadalupe Noriega / Embrapa tecnológicos disponíveis atualmente. Outro exemplo são os condomínios 28 Para detalhes consultar: Cruz, adotados na produção de grãos e de maçã²⁸ no Paraná e em Santa Catarina. M.R.; Camargo, M.E.; Malafaia, G.C.; Nesse caso, é um programa público estadual de subvenção à assistência técnica, Zanadrea, G. Produção integrada de maçã (PIM) — processo inovador semelhante à subvenção ao prêmio do seguro rural, em que um grupo de produ- na cadeia produtiva da maçã tores rurais contrata um técnico dedicado à gestão integrada dos riscos agrope- brasileira. Revista de Administração cuários. Esse técnico é capacitado para a gestão integrada dos riscos agropecuá- e Inovação, São Paulo, v. 9, n. 3, p. 213–230, 2012. rios e tem seus rendimentos subvencionados em parte pelo governo estadual. Outra oportunidade para conseguir uma maior integração na gestão de riscos na geração e transferência de tecnologias é a recente criação da ANATER. O objetivo da ANATER é contribuir para a adequação da transferência de tecnologia com impa�os positivos sobre a produtividade e, consequentemente, sobre a renda agrícola, sobretudo dos pequenos e médios produtores. Uma gestão integrada de riscos ao nível do produtor rural poderia ser uma peça �ave do mandato da ANATER. Importante destacar que essa ação requer extensionistas capacitados, motivados e com infraestrutura adequada, de modo a possibilitar ao produtor rural informação qualificada e suficiente para lhe garantir ‘acesso amplo’ aos mercados e, assim, desenvolver seu empreendedorismo. 66 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil C.  SISTEMA INTEGRADO DE TRANSFERÊNCIA DE RISCOS AGROPECUÁRIOS Existe a oportunidade no Brasil de transferir-se um maior nível de riscos de produção por meio de parcerias público-privadas. A cobertura do seguro agropecuário oferecido por empresas de seguro privado �ega a 8% da super�cie cultivada. Porém, os programas de seguro público e compensação a renda (Proagro e Garantia Safra) representam mais que o dobro do coberto pelas seguradoras privadas. Os Programas Proagro e Garantia Safra não transferem o risco fora do governo nem do País. O Governo Federal absorve 100% do risco de eventos catastróficos, sendo que os prêmios pagos pelos beneficiários não são suficientes para cobrir as indenizações (o custo do resto do prêmio é pago pelos Governos Federal, Estaduais e Municipais)²⁹. Para atrair ao setor 29 Nesses programas, a taxa paga pelo agricultor não é o prêmio de assegurador privado para oferecer coberturas nos segmentos de agricultores seguro. O prêmio tem uma outra de menor escala, o governo poderia transferir parte do risco catastrófico componente que é subvenção do aos mercados internacionais por meio do setor privado (seguradoras e governo. No caso do Proagro, não há um cálculo formal de prêmio. resseguradoras), aumentando a sustentabilidade financeira dos programas e Mas o prêmio é implicitamente melhorando a eficiência do gasto público em anos com perdas catastróficas. Em calculado quando o BACEN faz a casos como do Peru e do México³⁰, programas públicos em que coberturas estimativa de orçamento público necessário para subvenção do catastróficas são adquiridas de seguradoras privadas pelo governo incentivam programa. O "prêmio" é igual ao a participação de seguradoras no ramo agropecuário. valor arrecadado dos agricultores mais o valor do orçamento do governo federal para a subvenção Os sistemas de seguro rural e de garantia de preços poderiam ser conjugados do Proagro. Esse "prêmio" tem sido para oferecer um seguro de renda ao produtor. O sistema do seguro rural suficiente para cobrir as indenizações. brasileiro está compartimentalizado em vários programas distintos: i) o subsídio Raramente é necessário solicitar complementação orçamentária. ao prêmio do seguro rural (PSR); ii) o seguro para crédito da agricultura No agregado dos últimos anos, familiar (Proagro Mais); e iii) a compensação de perda de renda por eventos desde a safra 2004-2005, esse valor climáticos extremos (seca ou excesso de �uva) para agricultores familiares do foi suficiente. 30 Para detalhes sobre o sistema Nordeste (Garantia Safra). Os riscos associados a preço e surtos/epidemias de seguros agropecuários no México graves de pragas ou doenças estão excluídos dos programas de seguro e ver: http://wrld.bg/UcaGE contam com políticas e programas próprios (administrados pela Conab, no caso da maioria dos programas de garantia de preços, e pela Secretaria de Defensa Agropecuária do MAPA, no caso da sanidade). Os especialistas consultados identificaram a oportunidade de articular os programas de seguro, de garantia de preço e de defesa agropecuária para permitir oferecer seguros de renda aos produtores. Agenda para o Futuro 67 SEGUROS DE RENDA NOS ESTADOS UNIDOS Existem quatro tipos de seguro de renda promovidos por políticas e programas públicos de gestão de riscos nos Estados Unidos: �.  Proteção da Renda (Income Prote�ion) É um plano de multirrisco que garante a renda do produtor com base na produtividade e no preço projetado da commodity. O nível de cobertura varia de 50% a 80% da renda histórica. O preço projetado garantido é baseado nos contratos futuros da CBOT, variando de um ano ao outro, calculado com base nos preços de fe�amento, à época da contratação do seguro, de contratos futuros com vencimento em um mês próximo à colheita. A unidade de seguro disponível para este tipo de programa é a empresa (em inglês, enterprise), que se refere a toda área cultivada por determinada cultura em um município. A indenização é paga quando a receita realizada é menor do que a garantida, equivalendo-se à diferença entre elas. �.  Seguro da Renda (Revenue Assurance) Semelhante ao IP, o seguro da renda também garante a renda do produtor com base na sua produtividade e nos preços projetados. Este programa diferencia o tipo de unidade de seguro (no inglês, insurance units), que podem ser quatro: i) Básica (Basic): unidade que compreende a toda a extensão de terra pertencente ou arrendada pelos produtores dentro de um município e a produtividade efetiva é registrada para cada unidade, independentemente das outras, podendo-se gerar diferentes apólices e níveis de cobertura, e, logo, diferentes indenizações; ii) Opcional (Optional): compreende todas as propriedades pertencentes ou arrendadas pelos produtores e localizadas em diferentes áreas de um determinado distrito. Neste tipo de unidade são enquadradas as diferentes tecnologias de produção; iii) Empresa (Enterprise): refere-se a toda área cultivada por determinada cultura em um município, independentemente do número de proprietários envolvidos; iv) Fazenda (Whole Farm): este tipo de unidade compreende a área de todas as culturas do produtor. A indenização também é paga quando a receita realizada é menor do que a garantida, equivalendo-se à diferença entre elas. 68 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil �.  Cobertura da Renda Agrícola (Crop Revenue Coverage) É um seguro que também cobre a renda do produtor quando há variações na produtividade, ou oscilações no preço, ou ambos. O nível de cobertura é de 50% a 85% e abrange as coberturas para plantio preventivo, tardio e replantio. O valor garantido é o nível de produtividade (APH) multiplicado pelo nível de cobertura, multiplicado pelo maior valor entre o preço projetado e o preço da safra, vezes a área segurada. O preço projetado, assim como no seguro RA e no IP, é calculado com base nos preços de fe�amento, à época da contratação, de contratos futuros. O prêmio é baseado no preço base, independentemente do preço da colheita. As unidades de seguro disponíveis para esse tipo de seguro são a Básica, a Opcional e Empresa. �.  Renda Bruta Ajustada (Adjusted Gross Revenue) É um plano multirrisco que garante a renda bruta ajustada de toda a propriedade rural e não por cultura segurada. O programa cobre um percentual da renda bruta decorrente das atividades exploradas dentro da propriedade. A renda tida como parâmetro é o histórico das rendas informadas nas declarações de imposto de renda da atividade agropecuária, ou a renda projetada, informada no relatório agropecuário anual (em inglês, AFR). Para adquirir o contrato de seguro AGR, o produtor deve ter declarado no mínimo cinco anos consecutivos de imposto e não exceder a responsa- bilidade de US$ 6,5 milhões. O rendimento garantido é a renda bruta (ajustada) multiplicada pelo nível de cobertura. Se houver perda de renda devido aos fatores previstos, o valor a ser indenizado é o rendimento garantido menos a renda contabili- zada vezes a taxa de pagamento. O plano básico tem nível de cobertura/taxa de pagamento de 65%/75%, mas também há opções de 65/90; 75/75; 75/90; 80/75; e 80/90. Fonte: http://wrld.bg/UcaLy Agenda para o Futuro 69 D.  PLANEJAMENTO INTEGRADO DA LOGÍSTICA AGROPECUÁRIA E DE INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA RURAL A ampliação do sistema agrologístico no Brasil carece de planejamento e integração. Os investimentos atuais em logística no Brasil levam em conta um horizonte de tempo curto e uma abrangência espacial e da produção restrita. Embora esse aspe�o não represente um risco segundo o conceito adotado nesse trabalho, é importante ressaltar que os investimentos atuais estão centrados em grãos, fibras e carnes na região do cerrado e não consideram outras regiões e a diversificação da produção, a exemplo da aquicultura e da produção de dendê na Região Norte. Ainda, os investimentos realizados podem ser distorcidos por não considerarem adequadamente questões ambientais e de infraestrutura, entre outras. Cita-se como exemplo que a maioria dos financiamentos do Plano Nacional de Armazenagem são destinados para as Regiões Sul e Sudeste, as que dispõem de boa infraestrutura e marco legal ambiental, em detrimento de regiões de fronteira como o ��������. O sistema de logística e infraestrutura agropecuária no Brasil sofre riscos que poderiam ser reduzidos pelo compartilhamento de informações e pela articulação com a gestão de outros riscos. Esses riscos causam perdas dentro da porteira, aumentando custos de transporte e logística, especialmente para os produtores que não possuem capacidade de armazenagem. Há também os riscos na cadeia logística devido à incerteza e à sazonalidade dos custos logísticos, em particular do transporte. Os pontos de estrangulamento no sistema logístico (rodovias, portos e hidrovias), que geram incertezas sobre tempos de espera e custos de transporte e armazenagem, são conhecidos. Assim, o compartilhamento da informação entre o sistema de logística e o planejamento de safras e vendas poderia diminuir a incerteza para o produtor. 70 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil Uma experiência recente que pode servir como exemplo de maior e melhor integração do risco de logística com os riscos de comercialização e gestão da produção é o agendamento antecipado de caminhões nos portos, ��������³¹. 31 http://wrld.bg/UcaQV As ações para a redução de riscos associados à logística devem considerar o impa�o na gestão de outros riscos agropecuários, em particular aqueles associados à sanidade animal e vegetal. A abertura de mais e melhores rodovias, ferrovias ou hidrovias pode reduzir riscos de logística, mas pode estar aumentando os riscos de disseminação de pragas e enfermidades, e expondo uma região a uma maior pressão sobre seus recursos naturais. Assim, a melhor articulação entre as políticas e os programas de logística com as iniciativas de planejamento regional e de transferência de tecnologia, em particular na Região Norte do País, pode ser muito estratégica para a redução das perdas agropecuárias e o enfrentamento das consequências das mudanças climáticas. Olímpio Filho / Embrapa Agenda para o Futuro 71 E.  A INTEGRAÇÃO DE FERRAMENTAS DE GESTÃO DE RISCO CLIMÁTICO À GESTÃO DOS RECURSOS NATURAIS Existe uma oportunidade no curto prazo para reduzir o risco de gestão de recursos naturais, em particular dos recursos hídricos, e o risco de seca, utilizando ferramentas existentes de gestão de riscos climáticos nas decisões de outorgas de água. Uma melhor coordenação entre a ANA e o MAPA seria fundamental para prevenir o desabastecimento futuro de água para o setor agropecuário (e mesmo para consumo humano) e otimizar a alocação dos recursos produtivos dentro da porteira. As dificuldades com a gestão do recurso água no Brasil são históricas, a exemplo das secas na Região Nordeste, e crescentes, a exemplo da recente estiagem incomum no Sudeste e no Centro-Oeste. Além do risco climático propriamente dito, cuja gestão depende de um sistema de informações eficiente e acessível, persiste o risco na gestão desse recurso natural, uma vez que os sistemas de outorga de água não utilizam ferramentas de avaliação de risco, como o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC) e os modelos de mudanças climáticas, na tomada de decisões. O ZARC poderia ter um maior impa�o na redução de perdas se fosse incorporada informação mais detalhada sobre uso de solos. As informações, em uma menor escala, sobre usos de solos estão disponíveis a nível estadual, mas o ZARC é feito em âmbito nacional. Existe uma oportunidade em se buscar um ZARC mais efetivo, integrando a informação mais detalhada ao nível estadual e de microbacias para poder dar melhor informações de zoneamento, reduzindo perdas no setor. Nesse sentido, seria recomendável que o ZARC pudesse ser atualizado ao nível das microbacias pelos governos estaduais, para oferecer uma melhor ferramenta para o financiamento e a gestão de riscos agropecuários. 72 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil F.  INTEGRAÇÃO DE RISCOS DO SETOR ÀS INICIATIVAS DE PROMOÇÃO E MONITORAMENTO DO COMÉRCIO EXTERIOR As políticas de comércio exterior dedicadas à agricultura no Brasil são pouco integradas com as políticas e os programas de gestão dos riscos no setor. Em particular, existem oportunidades no curto prazo para uma maior e melhor integração das políticas de sanidade animal e vegetal, com as ações de comércio exterior, facilitando iniciativas como as certificações sanitárias regionais e seu reconhecimento nos mercados. Também existe a oportunidade de reduzir as perdas dos produtores agropecuários por eventos como fe�amento de mercados coordenando o comércio exterior com programas de gestão de riscos de comercialização (garantia de preços) e produção (seguro). Essas medidas de integração na gestão de riscos do setor com as políticas de comércio exterior poderiam produzir uma maior e mais assertiva participação do Brasil nos fóruns internacionais de negociação comercial. Ou seja, o Brasil poderia substituir a postura de rule taker por rule maker no cenário internacional e uma melhor gestão dos riscos do setor pode permitir essa mudança de postura. Agenda para o Futuro 73 Considerações Finais 5 A importância do setor agropecuário ao Brasil exige definições importantes. Essa importância transcende as questões socioeconômicas. Na atualidade, o setor agropecuário contribui inclusive para o meio ambiente, a exemplo dos bene�cios gerados pelo plantio direto para sequestro de carbono e para o abastecimento de água. Não obstante essa importância e a despeito de carecer de melhor qualificação, esse trabalho sugeriu que o setor agropecuário é o mais volátil economicamente (Gráfico 2), �egando a apresentar crescimento negativo em alguns períodos. Esse trabalho também identificou que a volatilidade tem estreita relação com eventos climáticos, notadamente as secas, e, portanto, ações de gestão desse risco teriam grande retorno para o País nas mais variadas dimensões, no mínimo econômica, social e ambiental. Além de apontar a importância de riscos ‘tradicionais’, como a seca e a sanidade, o trabalho identificou a crescente importância de ‘novos’ riscos, a exemplo da gestão da propriedade, notadamente o risco da mão de obra, e dos recursos naturais renováveis (Quadro 4 e Gráfico 6). Foram identificadas lacunas das principais políticas e programas públicos, impedindo uma gestão de risco agropecuária com ampla atuação. Quando analisadas as principais políticas públicas voltadas para a gestão dos oito riscos considerados (clima e incêndio, sanidade animal, sanidade vegetal, crédito e comercialização, comércio exterior, logística e marco regulatório), fica evidente que, em sua maioria, as políticas são dedicadas à estratégia da mitigação, com menor participação das estratégias de transferência e resposta (figura 3). Também fica evidente a complexidade, bem como o potencial de maior coordenação na gestão dessas políticas (figura 4). Se, por um lado, ambas as questões (diversificação das estratégias de gestão e complexidade da gestão) são um entrave para o desenvolvimento do setor agropecuário e, consequen- temente, do País, por outro lado, representam uma oportunidade que transcende o setor agrícola devido à geração de ‘novos’ negócios. Esses ‘novos’ negócios, notadamente para a estratégia de transferência de risco com impa�os positivos sobre o setor de serviços (a exemplo da assistência técnica, peritagem e tecnologia da informação), além de contribuírem para reduzir a volatilidade e as perdas no setor agrícola, contribuem para a geração de receita fiscal. Ainda quanto às estratégias de gestão, o trabalho identificou alguns riscos potenciais para o País, notadamente sanitários, que não contam com ações efetivas de mitigação (um exemplo de mitigação que carece de atenção no caso sanitário são os programas de melhoramento preventivo) e que também não dispõem de um plano de contingenciamento. Considerações Finais 75 A importância de um planejamento estratégico, um plano direto e uma Lei Agrícola garantindo a visão de longo prazo das ações sugeridas no trabalho. Essa breve análise evidencia que ações no sentido da implementação de uma gestão integrada do risco agropecuário são amplamente respaldadas pela sociedade e de interesse do Estado. Por outro lado, o trabalho também sugere que essa gestão integrada deve ser implementada paulatinamente, iniciando por: i) geração e transferência de tecnologias para a gestão de riscos; ii) transferência de riscos agropecuários; iii) planejamento integrado da logística agropecuária e de investimentos em infraestrutura rural; iv) integração de ferramentas de gestão de risco climático na gestão dos recursos naturais; e vi) integração de riscos do setor às iniciativas de promoção e monitoramento do comércio exterior. Na medida em que essas medidas iniciais forem sendo implementadas, torna-se possível explorar soluções mais complexas, como a promoção do mercado de seguros no sentido do seguro de renda para o produtor rural e uma agrologística que vá além da agricultura atual, considerando novas produções, a exemplo da aquicultura e do dendê, em outras regiões, a exemplo da Região Norte. Essas sugestões de médio e longo prazos remetem à necessidade de planejamento, o que remete à necessidade de um melhor funcionamento tanto das leis como do aparato burocrático do Estado, gerando um ambiente de negócios próspero. Finalmente, a questão do planejamento remete à necessidade de uma institucionalidade estável, o que implica em um Plano Diretor e uma Lei Agrícola, com vigência mínima de cinco anos, que considere, além das questões relacionadas ao risco, aspe�os como o desenvolvimento rural. ANEXOS TÉCNICOS Os anexos técnicos e as referências bibliográficas podem se encontrados no seguinte website: www.embrapa.br/eventos/avaliacao-de-riscos-agropecuarios 76 Gestão de Riscos Agropecuários no Brasil