59356 v2 Eliminando as barreiras para o desenvolvimento inclusivo sumário do relatório económico de Moçambique The world bank Mozambique Eliminando as barreiras para o desenvolvimento inclusivo sumário do relatório económico de Moçambique Ficha Técnica Título: Eliminando as barreiras para o desenvolvimento inclusivo (sumário do relatório económico de Moçambique) Março, 2010 Autor: Banco Mundial Design: Sérgio Jeremias Langa (Pixel Design & Serviços ) sumário do relatório económico de Moçambique Introdução 1. O desenvolvimento económico é, necessariamente, um processo a longo prazo que requer a convergência de factores deliberados e fortuitos, que transformam uma economia no sentido de um melhoramento das condições de vida e do bem-estar dos seus par- ticipantes. Para que o resultado desta transformação a longo prazo não fique entregue ao acaso, é impor- tante que o país tenha uma visão clara e uma estraté- gia que garanta que os benefícios de acções políticas deliberadas excedam as consequências negativas de situações não desejadas ou imprevistas. O desem- penho da economia de Moçambique, principalmente após o Acordo Geral de Paz em 1992, é testemunho do compromisso determinado que o país tem para com o desenvolvimento, conseguindo ultrapassar os difíceis desafios criados por choques exógenos e pela capacidade interna genericamente reduzida. 2. Moçambique é um país dotado de abundantes e ainda relativamente inexplorados recursos naturais e estrategicamente situados próximo de um vasto mer- para financiar a transformação da sua economia. O cado da África austral e ao longo de uma rota de nave- percurso no sentido de um novo paradigma de cresci- gação marítima global. No âmbito da África, tem um mento e desenvolvimento rápido e sustentável vai dos maiores potenciais para se tornar numa economia requerer uma utilização ponderada e táctica desses de rendimento médio no decorrer das próximas dé- escassos fundos. Se forem gastos imprudentemente, cadas. Neste domínio, Moçambique está também num o sistema poderá ver-se preso numa armadilha de ponto de viragem crítico, em que políticas prudentes equilíbrio de baixo crescimento, sujeito a implosões podem significativamente acelerar a transformação periódicas ou dependente de resgate pela comuni- estrutural necessária para alcançar essa meta. O país dade internacional (como o alívio da dívida aos PPME/ necessita superar os obstáculos à um crescimento mais HIPC). rápido, e de criar um clima em que uma vasta maioria dos seus cidadãos faça poupança e invista no aumento 4. Nenhum país conseguiu manter o crescimento du- das suas competências, conhecimentos e tecnologia, rante 25 anos ou mais, sem tirar partido da economia de forma a melhorarem o seu rendimento. global. Esta foi uma das conclusões fundamentais da Comissão para o Crescimento liderada por Michael 3. Lançar a semente da mudança implica custos mon- Spence,1 laureado com um Prémio Nobel. Desde 1950, etários, até que se criem as raízes que tornem o pro- 13 economias apresentaram crescimento a uma taxa gresso virtualmente irreversível. Mas Moçambique é média de 7 por cento ao ano, durante pelo menos 25 actualmente um país de escasso capital, dependendo praticamente de poupança externa (Ajuda e IDE/FDI) 3 1 Comissão para o Crescimento e Desenvolvimento 2008. anos.2 A Comissão para o Crescimento concluiu que Taiwan (China) e da Coreia que perderam a vantagem todas estas 13 economias importaram ideias, inovação, de preços devido a elevados custos da mão-de-obra conhecimento, tecnologia e IDE/FDI do estrangeiro, e nos seus países, conseguiram reconquistar a competi- exportaram bens e serviços para os vastos mercados tividade em países como as Honduras, Vietname, Sua- globais de acordo com as suas vantagens comparati- zilândia, e Bangladesh. Haverá razões que neguem tais vas. Os mercados internos são demasiado pequenos oportunidades a Moçambique? Este relatório defende para permitir a especialização necessária para se atin- o contrário. gir a competitividade. Exportar para o resto do mundo proporciona não só um mercado quase ilimitado para 6. Este relatório analisa alguns dos mais visíveis con- produtos e serviços, como também expõe as empre- strangimentos à um crescimento e transformação sas, grandes e pequenas, a novas ideias, conhecimen- económica mais rápidos em Moçambique. As questões to, tecnologia e fontes de financiamento. apresentadas no relatório, são aquelas que podem ser caracterizadas como “fruta ao alcance da mão” – ou 5. Existem amplas oportunidades, mesmo durante seja, mudanças que não requerem um desmedido in- o desenrolar da crise financeira global. Em primeiro vestimento em dinheiro ou esforço para implementar. lugar, os padrões sempre em mudança da procura Afastar estes constrangimentos não é condição sufi- internacional podem agir em favor de Moçambique ciente para um crescimento mais rápido, mas é uma como importador líquido de mercadorias primárias. E condição essencial para permitir a segunda ronda de proporcionam também aos empresários de Moçam- reformas e investimentos, no sentido de alcançar um bique um estímulo para diversificarem o cabaz de impacto máximo de benefícios. exportações de Moçambique, de forma a mitigar os 7. Moçambique registou já 15 anos de rápido cresci- choques da procura, assim como tirarem partido de mento. Parte dele, foi a recuperação dos efeitos de um mais vasto leque de produtos nos quais Moçam- uma guerra devastadora; desde 1999, aproximada- bique dispõe já dos ingredientes para desenvolver mente, uma parte tem resultado do desbloquear de uma vantagem competitiva. Em segundo lugar, com potenciais recursos naturais através de megaprojectos criterioso planeamento e pesquisa, será possível atrair de capital intensivo. A questão colocada é como sus- para Moçambique linhas de produção em retracção tentar um crescimento elevado e alterar o seu modelo de economias desenvolvidas e emergentes, e formar de forma a gerar mais emprego. Há quatro dimensões com elas “clusters” (agrupamentos) de indústria ligei- na resposta a este desafio. (1) As macropolíticas e a ra. O potencial de migração de unidades fabris não é regulamentação de negócios necessitam tornar-se trivial, dados os recursos naturais de Moçambique o mais abrangentes em relação às empresas e reduzir os baixos níveis salariais. Foi há apenas uma década a tendência para um crescimento de capital intensivo, que a indústria de fabrico de sapatos coreana emigrou (2) os mercados de factores de produção devem per- em massa para a China, onde os factores de produção mitir uma atribuição mais eficiente de recursos para representavam uma fracção dos custos na Coreia. os usos mais produtivos, (3) as infra-estruturas da Presentemente, quase todo o calçado vendido no logística devem permitir a redução dos custos de im- mercado coreano é produzido na China. Do mesmo portação, exportação e transportes e melhorar a sua modo, os fabricantes de vestuário e de chapéus de confiabilidade, e (4) é fundamental que haja institu- 2 As 13 economias qualificadas são: Botsuana; Brasil; China; ições de apoio à exportação para que as pequenas e Hong Kong, Indonésia; Japão; República da Coreia; Malásia; médias empresas possam ter sucesso a exportar e a Malta; Oman; Singapura; Taiwan, e Tailândia. Dois outros paí- compreender e dominar a cadeia de fornecimento/ 4 ses, Índia e Vietname, poderão em breve juntar-se a este grupo. valor. sumário do relatório económico de Moçambique 8. A mais vasta temática, não tratada neste relatório, para mais de 90 por cento em 2008. A taxa líquida de como a transformação rural, diversificação de expor- matrícula de raparigas subiu de 40 por cento para 93 tações, dimensões espaciais da pobreza e implantação por cento nesse mesmo período. O número de profes- de activos de infra-estruturas, o aprofundamento do sores primários aumentou de 30 000 em 1992, para os sector financeiro, a ascensão de empresas informais à actuais 73 900. economia formal, todos carecem ser analisados num programa contínuo de trabalho analítico, preparado 11. O investimento directo estrangeiro teve um acentu- para estabelecer uma visão clara de desenvolvimento ado incremento a partir de 1998, com o arranque dos e uma estratégia para que Moçambique cresça mais megaprojectos e atingiu US$ 587 milhões em 2008 rapidamente. Neste aspecto, o principal objectivo (Figura 1) e um valor estimado de US$ 532 milhões em deste relatório é ajudar os moçambicanos a criarem 2009. A ajuda externa foi crescendo regularmente, al- um fórum para rigorosos debates sobre prioridades, cançando US$ 1,65 mil milhões em 2008. Estes fluxos escolhas e contrapartidas (tradeoffs). De certo modo, apoiam a convicção de que Moçambique conseguiu o relatório representa o ponto de partida de um es- com êxito estabelecer a sua imagem como economia forço renovado do Banco Mundial para apoiar uma orientada para o mercado, com fortes perspectivas de robusta visão de desenvolvimento em Moçambique. transformações estruturais e de elevado crescimento. Figura 1. Investimento Directo Estrangeiro, 1990-2009 Principais Observações (Em milhões de Dólares US) 9. Moçambique tem, desde 1992, um registo excelente de crescimento e redução da pobreza. A média do crescimento do PIB real disparou de zero por cento (1981-92), para 8,1 por cento (1993-2008) e o PIB real per capita quase duplicou desde 1992. Embora estes números tenham crescido a partir de uma base muito baixa, os fenómenos descritos foram acompanhados de melhoramentos no desempenho de Moçambique, no âmbito da África Subsariana (SSA). Além disso, o número de pobres desceu de 69 por cento (1996), para 54 por cento (2002) à medida que o consumo per Fonte: Banco de Moçambique capita subia, em 50 por cento cumulativos, ao longo do mesmo período. 12. Em paralelo a este impressionante desempenho o rendimento per capita continuou a crescer desde 1992. 10. Registou-se uma mudança impressionante no PIB per capita, medido em dólares constantes de US$ ingresso de estudantes em todo o sistema, sobre- 2000, mais do que duplicou durante os 15 anos desde tudo depois de Moçambique se ter qualificado para da restauração da paz em Moçambique. Isso incluiu o o alívio da dívida ao abrigo da Iniciativa para PPME/ breve período de recuperação pós-guerra entre 1992- HIPC. No ensino primário (1a – 7a classe), o número de 1997, e o período de elevado crescimento sustentado estudantes cresceu de cerca de 1,3 milhões em 1992, desde 1998, alimentado por grandes fluxos de inves- para 4,2 milhões em 2008. A taxa líquida de matrícula timento directo estrangeiro. No entanto, em termos no ensino primário subiu de 45 por cento em 1998 de paridade de poder de compra, o PIB per capita de 5 Moçambique, cifrado em US$ 855 em 2008, foi o déci- Figura 3: Principais Exportações de Moçambique em 2008 mo primeiro mais baixo entre os países da África Sub- sariana e representava apenas 1,8 por cento do dos Estados Unidos e 8,2 por cento da média mundial. Figura 2 Fonte: ONU COMTRADE Fonte: Banco Mundial 14. É necessário fazer maiores e mais investimentos es- tratégicos na educação e na formação profissional, de 13. O cabaz de exportações é extremamente limitado, forma a aumentar a qualificação das competências com somente catorze produtos a apresentarem ex- básicas da força de trabalho moçambicana. Mais de portações superiores a US$ 1 milhão. Cerca de metade 90 por cento da força de trabalho ou não tem qualquer das exportações de Moçambique estão concentradas educação formal ou tem apenas cinco anos de ensino numa operação de fundição de alumínio, que empre- formal (Tabela 1). A indústria transformadora requer ga não mais de 1100 trabalhadores moçambicanos. um perfil de educação mais elevado (6º-12º ano ou Para que se crie um círculo virtuoso de rendimentos mais) do que o que se encontra geralmente na mão- que originem poupança privada para investimento, as de-obra do país (Fox e Oviedo 2008). O investimen- exportações de Moçambique precisam de ser mais di- to e a prioridade atribuídos à educação são a chave versificadas, com mercadorias tradicionais com acesso para um crescimento abrangente mas, a prazo, a real garantido ao mercado e mercadorias não tradicionais, procura de mais educação só poderá ser sustentada com maior componente de valor acrescentado, de se tiver por resultado um aumento de rendimentos preferência tirando maior partido da mão-de-obra disponíveis. relativamente barata. 6 sumário do relatório económico de Moçambique 15. O Governo terá de manter a mente aberta quanto to, transferidos entre si pelos trabalhadores, têm um à possibilidade de recorrer temporariamente a mão- papel muito importante para a circulação (spillover) de-obra qualificada importada. Isto é tanto mais ver- de tecnologia. Em economias constrangidas nas suas dade quanto o recurso a mão-de-obra qualificada capacidades (conhecimentos), os factores de imitação estrangeira é um importante canal de aquisição de e assimilação através da importação de competências competências em funções, por parte dos trabal- não existentes e a adopção de tecnologia com base hadores locais. Num ambiente sem constrangimentos em remuneração, podem constituir medidas tem- quanto a mobilidade no trabalho, em particular nos porárias, até que se consolide a capacidade local (Ex. A clusters industriais, as competências e o conhecimen- indústria africana de exportação de flores). Tabela 1: Nível de educação por tipo de emprego, 2003 (percentagem) Nível de educação Mão-de-Obra Agricultura Auto-emprego Assalariado Assalariado (média) (não-agrícola) (privado) (público) Nenhum ou menos do ensino primário 78,0 86,6 55,4 37,4 10,9 1a –5a Classe Ensino primário 1a –5a Classe 13,4 10,4 27,3 31,8 18,2 Ensino primário 6 –7 ou mais a a 8,6 3,0 17,3 30,8 70,9 Fonte: Banco Mundial (2008). 16. O impacto no crescimento resultante em transferir Figura 4 pessoas de uma agricultura de baixa produtividade para indústrias e serviços de elevado valor acrescen- tado, não será provavelmente conseguido sem uma importante revisão do modelo de crescimento de Moçambique. Em termos de crescimento de emprego e produtividade, a agricultura apresenta o mais baixo nível de produtividade de todos os sectores, e entre 1993 e 2006 a sua produção e participação no empre- go declinou. Enquanto as quotas de produção foram ganhas principalmente pelo sector industrial, os gan- hos em quota de emprego deveram-se sobretudo ao sector de serviços privado (figura 4). O quadro a seguir mostra que a mão-de-obra se deslocou da agricultura Nota: Serviços (privado) inclui comércio, transportes e serviços. Serviços (público) inclui saúde, educação e administração pública. Quanto e das grandes indústrias para os sectores de serviços maior o círculo mais elevada a produtividade do sector laboral. de baixa produtividade, incluindo o sector público. 7 Figura 5 crescimento, os decisores de políticas compreen- dem que o desenvolvimento bem-sucedido implica Produtividade Laboral (Normalizada para Agricultura) um compromisso ao longo de décadas.”3 Moçam- bique tem um notável historial de reformas políticas económicas graduais mas consistentes, desde que iniciou o seu Programa Económico e de Reabilitação Social em 1987. Não tem havido reversões de políticas económicas nos últimos 20 anos. No entanto, as di- ficuldades experimentadas por Moçambique no mel- horamento do seu ambiente de negócios, de acordo com as avaliações dos Indicadores Doing Business (Fazer Negócios), ou do Índice de Competitividade do Fórum Económico Mundial, apesar das intenções explícitas declaradas pelos responsáveis do governo, Fonte: Banco Mundial (2008). são indício de que a liderança e a coordenação inter- Nota: Serviços (privado) incluem comércio, transportes e serviços. ministerial precisam de ser reforçadas.4 Serviços (público) incluem saúde, educação e administração pública. Sintomas de um Potencial 17. Examinando os factores que impedem um mais Inexplorado rápido crescimento, há dois temas que surgem con- sistentemente em todos os sectores analisados neste 19. Moçambique tem um vasto mas inexplorado po- relatório. Em primeiro lugar, o governo é visto como tencial para desenvolver uma base diversificada de tendo “uma mentalidade de controlo e castigo” em exportações em mineração, energia, agronegócios, vez de facilitar e regular as actividades económicas. Em pescas, silvicultura, turismo, indústria ligeira e serviços, segundo, as instituições de implementação são muito servindo de portal a países vizinhos. Tem também débeis, o que faz com que as políticas e estratégias do uma posição geográfica privilegiada, pois está próxi- governo não sejam executadas e a aplicação das leis e mo dos vastos mercados de Gauteng e Mpumalanga regulamentos seja muitas vezes arbitrária, com conse- na África do Sul. Os custos do trabalho são na generali- quências não desejadas. A actual iniciativa do governo dade competitivos, embora a produtividade e a quali- para melhorar o clima de negócios é bem-vinda, mas ficação da mão-de-obra sejam inferiores às de países é preciso fazer mais e mais depressa, para eliminar os semelhantes. Vastas áreas de terra arável e fértil estão generalizados e prevalecentes controlos burocráticos por explorar, sendo cultivados actualmente apenas por entre os quais as empresas têm de navegar. 4,5 milhões de hectares de um total de 36 milhões. Grandes rios passam por estas terras agrícolas, mas o 18. Essas reformas facilitadoras para as empresas nível actual de irrigação é inadequado para uma agri- requerem liderança política e um governo empen- cultura comercial em larga escala e os pequenos pro- hado, credível e eficaz. O Relatório da Comissão para prietários continuam vulneráveis a frequentes secas e o Crescimento referia que os decisores políticos de inundações. economias de elevado crescimento “compreendem 3 Relatório da Comissão para o Crescimento, p.26. que o crescimento não acontece, simplesmente. Tem 4 Moçambique posicionou-se em 135 lugar de 183 economias de ser conscientemente escolhido como meta abran- no relatório Doing Business 2010. E ocupou a 129a posição de 8 gente pelos líderes do país. Nas economias em rápido 133 países no Índice de Competitividade Global 2009-10 sumário do relatório económico de Moçambique 20. Verifica-se um desolador contraste ao longo da Figura 7: Corredor Uganda - Quénia Auto-estrada Maputo-Witbank (também conhecida como o Corredor de Maputo). A imagem de satélite (Figura 6) mostra a pressão de ocupação de terra sent- ida pelos agricultores do lado sul-africano da fronteira, em comparação com a quase total inexistência de quintas ou actividade industrial ao longo dos 90 km de auto-estrada entre Ressano Garcia e Matola. Esta área é considerada como o principal palco de lançamento da produção e de exportação de bens para o mercado da África do Sul mas, até ao presente, a realidade não é encorajadora. Um corredor de comércio ou uma zona de processamento de exportações precisa de estar povoada por actividades comerciais (quintas, fábricas e povoações). Um corredor semelhante, entre o Ugan- da e o Quénia, mostra uma elevada concentração de negócios ugandeses que formam agrupamentos ao longo do corredor e, mais recentemente, bem perto da fronteira, para abastecerem o mercado queniano (Figura 7). Figura 6: Utilização da Terra ao Longo da Fronteira Moçam- bique - África do Sul Fonte: Banco Mundial, 2008 21. Para além do corredor praticamente deserto mostrado acima, há outros sintomas importantes de como se mantém inexplorado o potencial de cresci- mento de Moçambique. Em primeiro lugar, o grosso das famílias rurais dedica-se à agricultura (70 por cento dos moçambicanos) e estão geralmente encurralados numa agricultura de subsistência de baixa produtivi- dade, utilizando sementes, plantas, alfaias e técnicas de há 50 anos. Como os campos são lavrados, sem- eados e ceifados pela família rural, com pouco mais que enxadas e foices, a área média de terra cultivada por família é relativamente pequena (>10 hectares). Consequentemente, são escassas as oportunidades de melhorar a produtividade ou introduzir culturas de maior valor ou para exportação. Além disso, o poten- Fonte: Google EarthTM, 2008 cial custo da incerteza na adopção de tecnologia ou 9 diversificação de culturas, é muitas vezes a fome, no 24. Quarto, mesmo após a privatização e a desregula- caso dos que praticam uma agricultura de subsistên- mentação, as infra-estruturas ferroviárias e portuárias cia. Embora este relatório não estude a agricultura em operam abaixo da sua capacidade. Este é um fenó- pormenor, esta mantém-se uma questão importante meno particularmente estranho dado que Moçam- e urgente para uma visão estratégica do governo no bique faz fronteira com três países interiores (Malawi, sentido de uma transformação estrutural acelerada. Zâmbia e Zimbabué), que, historicamente, dependi- am dos portos de Moçambique para o seu comércio 22. Em segundo lugar, a mão-de-obra que é dispen- e existem linhas de caminho de ferro entre os portos sada da agricultura, não está a ser eficazmente ab- de Moçambique e aqueles países. Se uma ligação sorvida por indústrias de alto valor acrescentado, e norte-sul for construída, interligando os 3 principais as pequenas empresas que realmente absorvem uma corredores ferroviários, permitirá aos países vizinhos boa parte desta mão-de-obra preferem manter-se na encaminhar os seus carregamentos para qualquer um economia informal, trabalhando linhas de produtos de de três portos que se mostre mais eficiente e com- baixo valor, com escassa probabilidade de exportação. petitivo a nível internacional. Facilitaria também uma O resultado é que há pouco incremento de competên- movimentação livre de produtos domésticos entre as cias através da formação em funções, e um insuficiente diferentes províncias e cidades, permitindo a especial- desenvolvimento de “clustering” (agrupamento) verti- ização e a concorrência interna. cal ou horizontal. Um excesso de regulamentação, leis laborais muito rígidas e inspecções arbitrárias, prevale- 25. Este relatório apresenta uma longa lista de con- centes na economia formal, desencorajam as micro e strangimentos que parecem impedir um crescimento pequenas empresas de se registarem. mais dinâmico de negócios e criação de emprego, e que inclui o regime de comércio e fiscal; o tratamento 23. Em terceiro lugar, a aquisição de títulos de arren- preferencial dado a investimentos em megaprojectos; a damento de terra (administrada pelo Estado), surge ainda inadequada e ineficiente logística de transportes; como um dos grandes obstáculos ao desenvolvimento a falta de articulação, normas e agilização na difusão de dos negócios, tanto em vários inquéritos às empresas tecnologia; a rigidez do sistema de acesso às terras; e realizados pelo Banco Mundial, como em estudos a falta de competências profissionais qualificadas na específicos do sector efectuados para este relatório mão-de-obra. O excesso de regulamentação e a inter- (ver o Capítulo 7 do Volume 2). Não só a extrema pretação arbitrária das regras acrescentam um fardo complexidade de navegar pelo sistema de atribuição significativo ao arranque e funcionamento de empre- de terra (DUAT) desmotiva os investidores, como os sas, particularmente para os investidores estrangeiros custos de imobilização do seu capital, enquanto es- que trazem capital e conhecimentos muito necessários peram por todas as autorizações necessárias, tornam para quem quer ser fornecedor no mercado global. pouco atraentes os investimentos em Moçambique. O sistema de terrenos urbanos também não está pre- parado para absorver grandes influxos de migração de mão-de-obra rural para zonas industriais urbanas. Os terrenos costeiros, com elevado potencial para o desenvolvimento de turismo organizado, continuam por aproveitar e entretanto só cerca de 10 por cento de áreas costeiras estão disponíveis para arrendamen- 10 to adicional. sumário do relatório económico de Moçambique Oportunidades de 28. O número de sucessos nos agronegócios que se verificaram no país nos últimos vinte anos é limitado. Exportação O leque de produtos pouco mudou desde os tempos 26. Moçambique tem um potencial largamente inex- coloniais, a evolução tecnológica tem sido muito limi- plorado de produção de electricidade, desde a hidráu- tada e poucos investimentos feitos na agro-indústria, lica à de carvão, bem como na mineração em geral. com raras excepções como as plantações de açúcar Além disso, está em curso a pesquisa de petróleo e e o processamento de tabaco. Entre os constrangi- foram já identificados novos campos de gás natural. mentos que desencorajam o investimento nos agron- Estes projectos são importantes para o país mas criam egócios destacam-se: (i) os procedimentos para obter relativamente pouco emprego. Enquanto florescem acesso a terra apropriada e direitos da água; (ii) eleva- os megaprojectos ligados à mineração e à produção do custo da extensão de estradas rurais, irrigação e in- de energia, o turismo e os agronegócios crescem a fra-estruturas de electricidade; (iii) limitado acesso ao ritmo lento e a indústria de transformação (particular- financiamento através de bancos comerciais e progra- mente o vestuário) debate-se com dificuldades. mas de garantia ao crédito; (iv) logística inadequada e complexos processos burocráticos, afectando uma gestão eficaz da cadeia de abastecimento; e (v) salário Agronegócios mínimo estipulado para a mão-de-obra, que frequen- 27. O potencial inexplorado de Moçambique, situa-se temente está acima da produtividade do trabalho. talvez mais acentuadamente na área dos agronegóci- Estas dificuldades e constrangimentos poderiam os.5 Moçambique continua a oferecer algumas vanta- ser ultrapassados através de uma série de reformas, gens especiais aos investidores nas indústrias agríco- programas de investimento prioritizados e parcerias las – incluindo extensos e férteis terras agrícolas livres, público-privadas para criar o necessário apoio a insti- abundância de água para irrigação e uma diversidade tuições e mobilizar recursos financeiros. de ambientes agro-ecológicos apropriados para a cul- 29. Para que o agronegócio moçambicano possa pen- tura de uma grande variedade de produtos agrícolas. etrar no mercado regional e global, é preciso criar uma Análises mais detalhadas que foram efectuadas para atitude mental diferente, para além da necessária elim- os sectores de horticultura, aves, caju e pescas (ver inação dos constrangimentos. Vejamos, por exemplo, Volume 2) confirmam não somente o seu grande po- o algodão, 5º maior produto de exportação moçam- tencial, mas também os grandes obstáculos. bicano. Presentemente, a engenharia genética criou tecnologia que produz flores de cor ou fibras mais longas. A revolução verde na Coreia, em meados da década de 1970, quase duplicou a produção de arroz por hectare, de tal forma que novos produtos (como bolachas de arroz e vinho de arroz) foram desenvolvi- 5 O termo “agronegócios” refere-se a uma diversidade de acti- dos para absorver o excedente. O mercado norte- vidades comerciais conduzidas dentro ou fora das explorações americano está inundado de fruta do Chile de grande agrícolas. Estas actividades incluem culturas, criação de ani- qualidade, tirando partido da inversão das épocas de mais, silvicultura, fornecimento de produtos agrícolas, agro- produção. Moçambique precisa de tirar a venda e ol- processamento, comercialização, exportação e retalho, bem har em busca de oportunidades em todos os recantos como as operações dos que prestam serviços especializados que apoiam os agronegócios, através de transportes, financia- da sua ecoesfera, de forma a penetrar o mercado glo- mento, informação e outros serviços de importância crítica. bal com produtos agrícolas diferenciados. Se os cajue- 11 32. A aquisição de bons terrenos na costa, para a con- strução de empreendimentos, é particularmente prob- lemática. São frequentemente emitidos múltiplos DU- ATS (Direitos de Uso e Aproveitamento da Terra) para áreas costeiras de maior interesse. Há também riscos associados a terrenos mais vastos, necessários para investimentos em empreendimentos de uso múltiplo, de tipo resort (campos de golfe, complexos comerciais, hotéis, casas de férias, etc.) porque a terra disponível, ao longo da linha da costa, está a ser dividida em lotes mais pequenos, que são propriedade de diversas entidades, o que exige prolongadas negociações pelas partes iros moçambicanos estão velhos e dão escassos frutos interessadas em áreas mais vastas de terreno. O proc- e com fraco aspecto, então terão de ser feitos esforços esso legal completo, para obter um DUAT, é moroso bem coordenados para os substituir por árvores novas e envolve negociações com comunidades, indivíduos e de superior qualidade. e governo local – havendo escassa orientação quanto a esses meandros que guie os intervenientes interes- sados. O processo torna também as comunidades vul- Turismo neráveis a pressões políticas ou económicas. Este clima 30. Moçambique tem excelentes perspectivas como afasta os empresários investidores de mais qualidade. destino de praia de elevada qualidade, apoiadas pela atracção de uma excepcional ecologia marinha e o po- 33. A viabilização de investimentos de destacados in- tencial de Maputo para se posicionar como um novo vestidores internacionais, “colocaria” Moçambique no destino regional MICE (a sigla em inglês para Reuniões, mapa do turismo internacional, reduziria os custos de Incentivos, Conferências e Eventos). O governo estabe- transporte e construção, e estimularia o crescimento leceu um objectivo de 4 milhões de turistas até 2020, de operadores nacionais de qualidade. Uma abord- em comparação com cerca de 1 milhão em 2006. agem do tipo “cluster” (agrupamento) âncora de in- vestidores, como o que está a ser efectuado pela SFI/ 31. O actual desempenho do turismo está, no entanto, IFC em colaboração com FUTUR, é prometedora e muito abaixo do seu potencial e os investimentos têm pode servir como modelo. tido resultados lentos. Só 18 por cento dos investimen- tos no turismo aprovados entre 2005 e 2007 se con- 34. Outras acções imediatas deveriam incluir o estí- cretizaram realmente.6 O sector precisa de se focalizar, mulo à concorrência entre transportadoras aéreas requalificar e criar “clusters” (agrupamentos). As princi- (em particular entre Maputo e Joanesburgo), requali- pais razões para este desempenho abaixo do óptimo ficando os aeroportos, melhorando os processos de são: (i) o complexo processo de aquisição de terra; (ii) imigração e alfândega, liberalizando mais a internet inadequadas infra-estruturas de transportes, em par- de banda larga, melhorando o retalho e a construção, ticular do transporte aéreo para as zonas costeiras; e que são pilares chave de uma indústria de turismo de (iii) o elevado custo de obter os produtos desejados sucesso e erradicando a malária e a cólera, começando pelos turistas da África do Sul. pelas áreas chave. Melhorar a gestão e a taxa de utiliza- ção do centro de conferências Joaquim Chissano, em 12 Maputo, daria à cidade um melhor posicionamento 6 Dados de FUTUR. no competitivo mas lucrativo mercado MICE. sumário do relatório económico de Moçambique O Vestuário como Exemplo electricidade), e melhoramento na logística comercial (procedimentos alfandegários simplificados, crédito da Indústria Ligeira comercial, etc.). 35. A indústria do vestuário é um portal de entrada 38. O objectivo inicial de Moçambique deverá ser a para uma larga gama de indústrias ligeiras de mão- exportação de vestuário para o mercado da África de-obra intensiva e tem capacidade para desencadear do Sul. A exportação para consumidores no mercado o potencial de crescimento e competitividade da global mais exigente, através da AGOA e UE-APE/EPA, economia. Ainda que Moçambique tenha falhado as pode ser alcançada uma vez que exista massa crítica anteriores oportunidades proporcionadas pela AGOA de investimento no sector e a logística comercial se em 2000-01, pode ainda oferecer vantagem com- tenha tornado mais eficiente. A criação de um “cluster” parativa na produção e exportação de vestuário. Em (agrupamento) do vestuário atrairia também serviços 2005 havia ainda 5 fábricas, empregando 2000 trabal- especializados, como a embalagem, acabamento e hadores; actualmente, existe apenas uma fábrica de lavandaria, bordados e serigrafia, camionagem e ar- confecções, com cerca de 300 trabalhadores. Vários mazenagem. investidores estrangeiros têm mostrado um renovado interesse em fabricar de novo vestuário em Moçam- bique e é por isso importante compreender os con- Serviços Comerciais strangimentos que obrigaram as fábricas a fechar 39. Moçambique tem também um grande potencial num passado recente. para a exportação de serviços de transportes, devido 36. Os custos de mão-de-obra são bastante competi- à sua localização, bem como às infra-estruturas ex- tivos: o salário-hora é mais baixo que no Quénia ou istentes. Essas facilidades incluem serviços portuários, na Suazilândia, mas mais elevado que no Gana e no ferroviários e de camionagem. Por exemplo, se apenas Bangladeche. Mesmo ajustada a diferenciais de prod- 1% do volume de carga da região nordeste da África utividade, a mão-de-obra em Moçambique é ainda do Sul pudesse ser atraída para Maputo, o volume de competitiva, mas a produtividade do trabalho precisa trânsito do porto de Maputo passaria logo ao dobro. de ser aumentada. Alugar fábricas ou obter acesso a No entanto, apesar de haver agora autoridades alfan- um parque industrial com serviços é extremamente degárias no porto de Maputo que se mostram mais caro e por vezes demorado; a logística comercial que actuantes, graças ao recente programa de moderniza- envolve os portos de Maputo e Beira não é competi- ção da Autoridade Tributária, os operadores privados tiva, atendendo à sensibilidade a prazos que a con- que fornecem os serviços de cais, scanning, e arma- fecção de vestuário requer. zenagem instituíram sistemas complicados que en- gendram longas esperas e tarifas máximas antes que 37. Estes constrangimentos existiam também em out- as mercadorias sejam entregues, quer a produtores ros países em desenvolvimento que entretanto atin- quer a consumidores. A indústria da camionagem giram o estatuto do rendimento médio. Constrangi- também deveria estar mais bem integrada na região; mentos semelhantes, nesses países, foram superados alguns países cobram tarifas muito elevadas de entra- através de parcerias público-privadas, envolvendo a da no território a camiões estrangeiros, e os camionis- formação de trabalhadores e gerentes para elevar a tas moçambicanos que não tenham seguro COMESA produtividade e a qualidade, a criação de parques in- contra terceiros são penalizados. dustriais com infra-estruturas fiáveis (estradas, água e 13 Megaprojectos Macropolíticas 40. Os megaprojectos existentes mudaram o padrão 43. Moçambique estabeleceu um historial de sólidas do crescimento e das exportações de Moçambique políticas macroeconómicas e instituiu um dos regimes a partir de 1999 e colocaram o país no mapa global de comércio mais abertos da África Subsariana. Out- dos investidores internacionais. No entanto, na gener- ras reformas poderão, no entanto, melhorar o clima alidade, criaram poucos empregos e pagam impostos de negócios e atrair potenciais investidores, O sistema baixos graças a generosos incentivos fiscais. Vários out- moçambicano de impostos e tarifas caracteriza-se por ros megaprojectos estão em preparação, relacionados muitas isenções diferentes, cujos efeitos cumulativos sobretudo com a exploração dos minérios do país e o não são claros. E os pequenos empresários geralmente potencial de energia. A base de recursos naturais em não são beneficiados por essas isenções, uma vez que que muitos dos megaprojectos que estão planeados há um custo fixo implicado na sua aplicação, o qual se apoiam, deveria agora servir de tesouro para finan- não podem suportar. ciar a dispendiosa expansão de infra-estruturas e a transformação estrutural da economia. 44. Apesar de um progresso positivo na reforma da sua política fiscal ao logo dos últimos 15 anos, o regime fis- 41. O clima de investimento para grandes projectos cal estatutário (excluindo incentivos) continua a rep- melhorou significativamente desde a década de 1990, resentar um encargo substancial para os investidores, e não se justifica agora dar incentivos extra a projectos em particular para os pequenos empresários nacion- de capital intensivo. Dado o papel dos incentivos fis- ais. A combinação de um sistema fiscal estatutário de cais e os potenciais passivos contingentes para o Gov- níveis de tributação relativamente elevados, com um erno, a sua monitorização, através do Ministério das sistema generoso de incentivos fiscais, tem impactos Finanças, deveria ser intensificada. O revisto código de nas decisões de investimento e atribuição de recur- beneficio fiscal de 2009 prevê que futuros megapro- sos de uma forma que não é imediatamente aparente jectos tenham os mesmos incentivos ao investimento mas que tem efeitos de distorção a longo prazo. Uma que todos os outros investimentos. No entanto, o das distorções que é largamente apontada, é que o processo administrativo para acesso a benefícios fis- anterior regime de imposto encorajau indústrias a us- cais, de facto, continua sendo a discriminação contra arem mais capital do que mão-de-obra. os pequenos investimentos que são geralmente de menor capital-intensivo. Constrangimentos ao Crescimento 42. Terá de ser resolvida uma série de constrangimen- tos para que se possa explorar o potencial de cresci- mento através de uma combinação simultânea de reformas políticas, investimentos e reforço de institu- ições. Podem ser categorizados como macropolíticas, mercados de factores de produção, logística comer- cial e instituições de apoio à exportação. 14 sumário do relatório económico de Moçambique complicados; dificuldade em obter os reembolsos do IVA; e procedimentos inadequados para resolução de disputas. 47. O clima de regulamentação é ainda hostil a peque- nas e médias empresas e o licenciamento, inspecções e burocracia são um pesado fardo. Embora Moçam- bique esteja empenhado em melhorar o ambiente de negócios e tenha posta a si próprio a meta de se tornar no melhor entre os países da SADC nos Indica- dores de Doing Business (Fazer Negócios), a realidade é que caiu na classificação desses indicadores, de 2007 para 2008. Isto sugere que outros países melhoraram o seu ambiente de negócios mais rapidamente que 45. O clima fiscal de Moçambique poderá melhorar Moçambique. consideravelmente através de uma redução simul- tânea de incentivos fiscais e do número e nível de im- Factores de Produção postos, sem comprometer as receitas do estado. Se não for viável efectuar uma reorganização dos incentivos 48. Os mercados de factores – terra, mão-de-obra e fiscais – e a literatura sobre a matéria apresenta provas capital – têm de atribuir os seus recursos às utilizações contra os incentivos – podem no entanto ser tomadas mais produtivas. Uma nova lei de terras foi aprovada medidas para limitar os seus impactos mais negativos. em 1997, a nova lei do trabalho em 2007, a legislação Por exemplo os cálculos efectuados para este relatório relativa ao sector financeiro está em contínua ev- mostram que as taxas máximas de impostos podiam olução e todos os bancos foram privatizados na dé- ser reduzidas a 10 por cento, sem qualquer perda de cada de 1990. No entanto, os mercados de factores receita, desde que as isenções fiscais fossem também poderiam e deveriam trabalhar melhor para atrair eliminadas. Se as taxas máximas fossem reduzidas para mais investimento interno e estrangeiro e sustentar cinco por cento, a perda de receita seria de menos de elevadas taxas de crescimento. um quarto de ponto percentual das receitas totais. 49. A Lei de Terras de 1997 é considerada geralmente 46. A administração fiscal continua a ser um im- como exemplar, em África. No entanto, dez anos após pedimento à competitividade e produtividade de a sua aprovação, é patente que a sua implementação Moçambique. A redução do número de impostos e é fraca e que a realidade, no terreno, é a existência de a simplificação dos vários passos necessários para numerosos mercados imobiliários extra-legais, múlti- cumprir com as obrigações fiscais, reduziria os custos plos títulos de posse dos mesmos lotes de terreno e de transacção das empresas. Um grande número das a falta de orientação quanto à forma de proteger ou firmas entrevistadas na recente Avaliação do Clima de compensar direitos de ocupação costumeira e de Investimento (ICA 2008) revelou que a administração boa-fé. Esta situação tem conduzido a uma intensa fiscal é um grande ou grave obstáculo a fazer negó- especulação e corrupção no imobiliário, que poten- cios. Os problemas identificados incluem a imple- cialmente conduzirão no futuro a conflitos e privação mentação arbitrária do código tributário; inspecções de terras. No curto prazo, funciona como um desin- fiscais frequentes e morosas; inspectores fiscais não centivo aos investidores, particularmente do turismo 15 qualificados; procedimentos burocráticos demasiado e agronegócios. 50. É necessário melhorar o acesso à terra para fins epidemia é outra prioridade para que se possa garantir produtivos. Clarificar o direito de uso e aproveita- um crescimento com emprego intensivo. mento de terra onde existam múltiplas contestações de direitos; esclarecer as condições de desenvolvi- 54. Os mercados de capital são ainda muito diminu- mento para que os DUAT provisórios se convirtam em tos.7 O sistema bancário ultrapassou já a crise de permanentes; reforçar instituições como o cadastro 2000-01 e tornou-se sólido e altamente lucrativo. predial; fazer a colecta de taxas sobre a terra; atribuir Um coeficiente de adequação dos fundos próprios uma maior fatia das receitas das taxas sobre terrenos excepcionalmente elevado (17 por cento, segundo a ao cadastro e aos governos locais; acelerar o planea- metodologia de Basileia I) e o rácio de liquidez (55,4 mento urbano para permitir uma mais rápida emissão por cento) dos bancos comerciais, levanta legitima- de DUAT urbanos, em vez de continuar com o actual mente a questão se existe suficiente intermediação fi- sistema extra-legal em que funcionários ao nível de nanceira para uma economia em rápido crescimento. autoridades locais cobram rendas privadas para pas- O crescimento dos micro-financiamentos em anos sar certificados de utilização de terrenos. recentes é muito positivo, e o empenho do governo em desenvolver a intermediação financeira nas zo- 51. A criação de emprego não-agrícola no sector for- nas rurais começa a mostrar resultados. No entanto, mal, não tem acompanhado o crescimento da mão- só um quarto de todos os distritos tem actualmente de-obra, mas uma análise desagregada mostra que qualquer tipo de serviços bancários, e os correios já há uma resposta de geração de emprego em vários não desempenham as funções de transferências mon- subsectores. À medida que a economia evoluiu, a etárias e poupanças. O financiamento imobiliário está mão-de-obra foi redistribuída, de sectores com baixo a deparar com grandes dificuldades8 e o financiamen- crescimento para sector com crescimento mais eleva- to comercial está ainda muito pouco desenvolvido. do. Numa perspectiva de oferta, os níveis de educação em Moçambique são ainda muito baixos e constituem um constrangimento estrutural à criação de emprego Logística do Comércio no sector formal. Apesar de um significativo progres- 55. Moçambique tem potencial para se tornar num so, os níveis de educação em Moçambique requerem importante escoamento para a África do Sul, dada a um melhoramento drástico. Continuar a investir e a sua localização estratégica e a congestão do porto de dar prioridade à educação é um factor chave para um Durban, desde que torne mais adequada a sua logísti- crescimento inclusivo. ca. O porto de Maputo é a rota mais curta para a maior região mineira e industrial da África do Sul, enquanto a 52. Os regulamentos da imigração para especialistas Beira e Nacala são os portos mais próximos dos outros qualificados, que possam trazer perícia em gestão e países vizinhos. técnica às empresas moçambicanas, são ainda muito restritivos, em particular no caso de empresas que prestam serviços profissionais. A nova lei laboral não 7 Este CEM não fornece uma análise aprofundada do sector alterou significativamente esta situação; na realidade, financeiro, porque foi efectuada, pelo Banco Mundial e pelo FMI/IMF, uma avaliação muito abrangente, em 2009. há muitas queixas de que se tornou ainda mais difícil 8 Foi realizado um estudo detalhado sobre financiamento imobi- contratar estrangeiros altamente qualificados. liário, o qual está incluído no Volume II. Mostra a interligação entre políticas sectoriais (ausência de uma política e estratégia 53. O VIH/SIDA representa outra séria ameaça ao nacional actualizada), falta de clareza na implementação da lei crescimento económico de Moçambique, através do de terras, investimento insuficiente em infra-estruturas urbanas, 16 seu efeito sobre a força de trabalho. Lutar contra esta e o sector financeiro. sumário do relatório económico de Moçambique 56. No entanto, o tráfego potencial do corredor Em resultado, as companhias de navegação não mantém-se quase inexplorado. O tráfego originado aportam directamente a Maputo e a carga tem de ser em/para as províncias de Gauteng e Mpumalanga é transferida em Durban ou Mombaça. Este problema de pelo menos 700 milhões de toneladas. Se Mapu- não se resolve com pequenas medidas. Têm de ser to conseguir captar 1 por cento deste tráfego, o seu feitos investimentos físicos e reformas de processos processamento total duplicará e as receitas portuárias alfandegários simultaneamente, até se atingir uma aumentarão em várias dezenas de milhões de dólares. massa crítica em volume de transportes portuários. Não obstante um processo de concessão bastante Atingindo esse ponto, as linhas de navegação pas- bem sucedido, o tráfego em trânsito pelo porto sarão a fazer escalas directas, o que melhorará muito de Maputo continua relativamente baixo e opera a a previsibilidade. menos de 30 por cento da sua capacidade. O porto da Beira também tem funcionado 40 por cento abaixo 59. A construção do Posto de Fronteira de Paragem da sua capacidade ao longo dos últimos 5 anos. Mas Única em Ressano Garcia, para o comércio com a África é também claro que a concorrência nos serviços por- do Sul, é da mais elevada prioridade e deverá rapida- tuários é forte e vai tornar-se ainda mais intensa com a mente ser também seguida por outros grandes postos entrada em funcionamento do novo porto de Coega, fronteiriços. Simultaneamente, todos os procedimen- na África do Sul. tos de tramitação alfandegária, inclusive nas docas se- cas, têm também de ser revistos. A longa imobilização 57. As principais deficiências de Moçambique resul- da camionagem cria atrasos desnecessários e custos tam sobretudo de problemas de logística e da baixa para os expedidores e transportadores. A dragagem fiabilidade dos transportes. As baixas classificações de profundidade no porto da Beira é também muito no índice de desempenho logístico (LPI) (2,29) e no importante, tal como a reconstrução da estrada entre a índice de pontualidade (2,83) colocam os portos de cidade de Nampula e a fronteira com o Malawi. Moçambique em desvantagem em comparação com o porto de Durban (com um LPI de 3,53 e um índice de pontualidade de 3,78). Os Indicadores de Doing Business (Fazer Negócios) 2008, publicados pelo Ban- co Mundial, revelam uma teia de procedimentos que demoram 27 dias no caso das exportações e 38 dias para as importações. Alguns grandes expedidores sul- africanos têm ainda relutância em alterar as suas rotas, de Durban para Maputo, pois consideram o clima de negócios como sendo ainda imprevisível e com uma mais elevada incidência de pagamento de subornos (Sequeira e outros 2008). Além disso, as elevadas taxas de scanning e a deficiente integração dos serviços de camionagem com o resto da sub-região explica as razões da relutância de expedidores da África do Sul em utilizarem os portos de Moçambique. 58. A elevada imprevisibilidade dos transportes está estreitamente ligada aos baixos volumes de tráfego. 17 Instituições de Apoio à etrarem nos mercados estrangeiros. O PTIS implica também uma assistência à criação de capacidades, Exportação com formação, desenvolvimento de produtos, em- 60. O reforço de instituições especializadas no apoio a balagem, rotulagem, etc. O actual instituto de pro- pequenos e médios exportadores é importante para o moção da exportação (IPEX) não tem capacidade ou desenvolvimento de produtos e mercados. Isto inclui recursos para preencher uma tal função. um sistema nacional de normas e controlo de quali- dade; um sistema de informação comercial proac- 64. A criação de centros para a transferência de Con- tivo e baseado em TIC/ICT, ID-Cards (identificação de hecimento, Inovação Tecnologia e Serviços (CITE) tem produtos) e CITE (centros de apoio ao conhecimento, registado grande sucesso noutros países. Estes centros inovação, transferência de tecnologia e serviços que resolvem problemas de informação e conhecimento de outra forma se não podem obter). fornecendo serviços especializados a empresas ex- istentes ou sectores emergentes. Tomam por alvo 61. São necessários mais “articuladores” para ligar as produtos específicos, como a madeira e mobiliário, empresas e produtos moçambicanos aos mercados ou cabedal e sapatos, ou metalomecânica, morangos regionais e globais. Num país em que a produção é ou mangas, alcachofras ou frutos de casca, ou artes e muito fragmentada, essas iniciativas de articulação ofícios, etc. são essenciais para garantir benefícios de escala e transferências de conhecimento. Há já uma série de 65. A criação de uma Plataforma Mínima Integrada iniciativas de articulação a funcionar em Moçambique, para a Expansão do Comércio (MITEP) ajudaria as PME através de ONG, associações de produtores, empresas a superarem as barreiras técnicas ao comércio e a do sector privado e agências estatais. Mas é preciso desenvolverem negócios, tanto no mercado nacional fazer muito mais para obter os benefícios de econo- como no estrangeiro. A plataforma ideal deverá in- mia de escala. cluir; (i) infra-estruturas de Qualidade mínima, Normal- ização, Testes e Metrologia; (ii) um sistema com base 62. Para as pequenas e médias empresas, o primeiro TIC/ICT de informação comercial proactiva; (iii) desen- passo para entrarem nas cadeias regionais e globais de volvimento de serviços especializados não-financeiros aprovisionamento, redes de fornecedores e consórcios para as PME desenvolverem produtos e mercados; (iv) de exportação, é a adopção e certificação de normas racionalização de estruturas de apoio ao comércio e de qualidade. No entanto, o sistema de Qualidade e integração das suas actividades com as dos serviços Normalização, é um dos elos mais fracos no quadro do de promoção de investimento, incluindo as iniciativas apoio à exportação. O apoio dado actualmente pelo para articulação e transferência de conhecimento. INNOQ é mínimo, tem falta de dimensão, capacidade e recursos. Por exemplo, certas exportações agríco- 66. O paradigma essencial deverá ser “o desenvolvi- las estão em risco, devido à falta de capacidade para mento de capacidade para o desenvolvimento de cumprir o nível máximo de resíduos nos pesticidas produtos e mercados” para que sejam superadas as (MRL) para produtores e exportadores. barreiras técnicas ao comércio e as lacunas no con- hecimento. O conceito MITEP, com os seus quatro 63. Um sistema de informação comercial proactivo pilares, foi já introduzido regularmente nas práticas (PTIS) pode fazer uma grande diferença, ajudando as de operações de empréstimos do Banco Mundial no PME a desenvolverem produtos exportáveis e a pen- Gana, Benim e Guiné. 18 sumário do relatório económico de Moçambique A Imigração – no médio termo, uma política mais Serviços Profissionais liberal de concessão de vistos de trabalho a es- 67. Os serviços profissionais são importantes para trangeiros qualificados, ajudaria a desenvolver o o crescimento e transformação de uma economia mercado de serviços profissionais em Moçam- moderna. Desempenham um papel significativo na bique e permitiria às empresas moçambicanas redução dos custos de transacção e garantem às em- concorrerem em melhores condições com as es- presas um fluxo de conhecimento actualizado. Como trangeiras que fornecem esses serviços. parte do CEM foram analisados quatro desses serviços Regulação e Normalização – uma normalização profissionais: engenharia, auditoria, jurídico e médico. inapropriada aniquila muitas vezes a procura de São exemplos dos desafios que enfrenta a economia serviços em áreas como a engenharia e a conta- moçambicana à medida que se torna mais sofisticada. bilidade. O mercado está claramente dividido: as Os serviços profissionais são caros e escassos; entretan- poucas empresas de grande dimensão exigem to, muitos moçambicanos com elevadas qualificações serviços de alta qualidade podem pagar por eles estão a emigrar, pois podem ganhar muito mais no um preço elevado. No entanto, há um grande estrangeiro. Este paradoxo de não ter um manancial número de PME que não requerem grande suficiente de competências (encarecendo grande- sofisticação e as qualificações médias são-lhes mente os serviços profissionais) e ao mesmo tempo suficientes. não ter suficiente procura para essas competências (tendo como resultado a emigração) precisa de ser 69. As associações profissionais podem desempenhar cuidadosamente analisado para que seja preparado um papel importante nas áreas de intervenção de um pacote apropriado de reformas políticas. políticas acima referidas. Com o apoio do governo podem criar uma estrutura de regulação e normas ad- 68. O CEM propõe três áreas chave de acção de políti- equadas. Podem também monitorizar a qualidade e ca económica: o desenvolvimento de competências. As associações profissionais de Moçambique deveriam formar parce- A Educação deve ser reforçada em todos os rias para estabelecerem o reconhecimento mútuo de níveis e tornar-se mais relevante para os merca- qualificações profissionais. dos do trabalho; a cooperação regional promete vir a ser uma forma de atingir a especialização na educação superior com eficácia de custos. 19 Conclusão 70. O objectivo deste relatório é proporcionar um en- 71. As reformas nestas áreas terão muito maior êxito quadramento organizado para o desenvolvimento de se o Governo trabalhar activamente para desfazer uma estratégia a longo prazo para Moçambique, no a percepção de “controlo e castigo” e definir para si sentido de alcançar um crescimento mais inclusivo e próprio um papel mais claro, “facilitando e regulando”. partilhado. O seu enfoque incide sobre os obstáculos Ao mesmo tempo, necessita de se focalizar sobre o mais óbvios ao crescimento dos negócios e ao desen- melhoramento da capacidade de implementação da volvimento sustentável de Moçambique, realçando o administração pública, a nível central e local. No en- papel do comércio e da integração regional na cri- tanto, é importante ter presente que o sector privado ação de empregos. Fornece análises de uma selecção é geralmente melhor a nível da descoberta de produ- de sectores de crescimento nos quais Moçambique tos que os governos ou a instituições públicas. Anos detém vantagem comparativa no desenvolvimento antes de o sul do Sudão ser identificado como poten- de produção de mão-de-obra intensiva, como o cial mercado para produtos do Uganda ou do Quénia, agronegócio, a confecção de vestuário e o turismo, pelos seus respectivos governos, já negociantes priva- entre outros. As reformas acima recomendadas têm dos dos dois países vizinhos se tinham instalado em por objectivo solucionar dificuldades que são trans- Juba e estabelecido rotas de comércio e cadeias de versais a todos os sectores e que podem ser assim abastecimento para exportar materiais de construção resumidas: e bens de consumo e fornecer serviços chave, como telecomunicações, engenharia e construção e até Reformar o sistema de impostos e tarifas e con- educação e saúde. tinuar a reduzir os custos de transacção adminis- trativos. 72. As mudanças de mentalidade do funcionalismo público, políticos e até do público, não podem ser Melhorar a implementação da lei de terras. facilmente medidas e foram consequentemente ex- Melhorar a logística do comércio. cluídas das políticas abordadas neste relatório. No en- tanto, essas atitudes têm uma enorme importância. É Garantir um papel mais proactivo por parte do necessário haver liderança e competências em gestão Estado na promoção das exportações. de mudança para convencer as pessoas e alterarem as suas mentalidades e atitudes. 20 The world bank Mozambique The original had problem with text extraction. pdftotext Unable to extract text.