Relatório N. 58296-GW GUINÉ-BISSAU Memorando Económico do País TERRA RANCA! UM NOVO COMEÇO 12 de Janeiro, 2015 Prática Global: Gestão Macroeconómica e Fiscal Documento do Banco Mundial EQUIVALENTE MONETÁRIO Unidade de Moeda = Franco CFA (CFAF) Unidade de câmbio data de 05/30/2014 USD$ 1 = 481 CFAF ANO FISCAL 1 de Janeiro - 31 de Dezembro ABREVIAÇÕES E ACRÓNIMOS ANP Assembleia Nacional Popular APD Ajuda Pública ao Desenvolvimento APE Acordo de Parceria Económica APL Crédito de Programa Adaptável APR Relatório Anual de Progresso (Anual Progress Report) AQIM Al Qaeda no Magrebe Islâmico ARA Autoridade Regulatória de Aquisições ASECNA Agência para a Segurança da Navegação Aérea em África e Madagáscar ASYCUDA Sistema Automatizado para Dados Aduaneiros AT Assistência Técnica BAD Banco Africano de Desenvolvimento BCEAO Banco Central de Estados do Oeste Africano BEN Benim BFA Burkina Faso BOAD Banco de Desenvolvimento da África Ocidental BPC Competição de Planos de Negócio (Business Plan Competitions) CAIA Célula de Avaliação de Impacte Ambiental CBOs Organizações Baseadas na Comunidade (Community Based Organizations) CCIA Câmara de Comércio, Indústria e Agricultura da Guiné-Bissau CDD Desenvolvimento liderado pela Comunidade CDM Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (Community Development Mechanism) CdM Conselho de Ministros CEDEAO Comunidade Económica de Países da África Ocidental CEM Memorando Económico do País (Country Economic Memorandum) CENFA Centro Nacional para Formação e Administração CET Tarifa Externa Comum CFAA Avaliação do País em Responsabilidade Financeira CFAF Franco da Comunidade Financeira Africana CIF Custo de Seguro e Transporte (Cost of Insurance and Freight) CIV Costa do Marfim CPAR Revisão das Aquisições Públicas do País CPLP Comunidade de Países de Língua Portuguesa CPV Cabo Verde CUT Conta Única do Tesouro DBT Dulombi, Boe, e Tchetche DENARP II Segundo Documento de Redução da Pobreza da Guiné-Bissau ii DGGM Direcção Geral de Geologia e Extracção Mineira DGO Direcção de Orçamento DRC Custo de Recursos Domésticos (Domestic Resource Cost) EAGB Companhia de Electricidade e Água da Guiné-Bissau ECOMIB Missão da CEDEAO na Guiné-Bissau ECOWAP Política de Agricultura da CEDEAO EEWRP Projecto de Reabilitação de Emergência da Electricidade e Água EITI Iniciativa para a Transparência das Indústrias Extractivas ENA Escola Nacional de Administração FAO Organização de Alimentação e Agricultura das Nações Unidas FBG Fundação BioGuinea FCPF Instrumento de Parceira para o Carbono de Florestas FCS Estados Frágeis e Afectados pelo Conflito FFEM Fonds Français pour l’Environnement Mondial FIAL Fundo para Iniciativas Locais de Ambiente FIAS Serviços de Assessoria para o Investimento Estrangeiro FMI Fundo Monetário Internacional FOB Custos totais até ao embarque no navio (Free on Board) FSU Fundo de Serviço Universal FUNPI Fundo para Promover a Industrialização de Produtos Agrícolas GEF Instrumento Global para o Ambiente (Global Environment Facility) GFP Gestão das Finanças Públicas GHA Gana GIN Guiné-Conacri GMB Gâmbia GNB Guiné-Bissau GPL Gás Petróleo Liquidificado HFO Fuelóleo Pesado (Heavy Fuel-Oil) HIPC País Pobre Altamente Endividado (Highly Indebted Poor Country) IBAP Instituto de Biodiversidade e Áreas Protegidas IDA Associação Internacional para o Desenvolvimento IDE Investimento Directo Estrangeiro IDHs Índices de Desenvolvimento Humano do PNUD IGAP Inspecção-geral da Administração Pública IGF Inspecção-geral das Finanças ILAP Inquérito Ligeiro para Avaliação da Pobreza IMF Instituição de Microfinanças INEC Instituto Nacional de Estatísticas e Censos INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa IPSA Avaliação Integrada Social e da Pobreza (Integrated Poverty and Social Analysis) ISP Fornecedor de serviços de internet (Internet Service Provider) IUCN União Internacional para a Conservação da Natureza LBR Libéria LDCF Fundo para os Países Menos Desenvolvidos LHS Eixo da esquerda (Left Hand Side) LIC Países de Rendimento Baixo (Low Income Countries) MAB Homem e Biosfera MdF Ministério das Finanças MDRI Iniciativa Multilateral para o Alívio da Dívida (Multilateral Debt Relief Iniative) iii MIRP Projecto Multissectorial de Reabilitação da Infra-estrutura MLI Mali MW Mega Watts NER Níger NPL Créditos Malparados (Non Performing Loans) NSIA Nouvelle Société Interafricaine d’Assurance NU Nações Unidas ODM Objectivos de Desenvolvimento do Milénio OECD Organização para a Cooperação Económica e Desenvolvimento OMVG Organização do Rio Gâmbia para o Desenvolvimento (Organisme de Mise en Valeur du fleuve Gambie) ONG Organização Não Governamental OSC Organização da Sociedade Civil OTM Organização de Transferência Monetária PAIGC Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde PEFA Responsabilidade Financeira da Despesa Pública PEMFAR Revisão da Gestão da Despesa Pública e Responsabilidade Financeira PIB Produto Interno Bruto PIM Gestão do Investimento Público (Public Investment Management) PITF Task Force para a Instabilidade Política PMD País Menos Desenvolvido PNB Produto Nacional Bruto PNIA Programa Nacional para o Investimento na Agricultura PNUD Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas PPP Paridade de Poder de Compra PPP Parceria Público-Privada PRS Partido de Renovação Social RCU Unidade de Coordenação de Reformas REDD Emissões Reduzidas de Desflorestação e Degradação da Floresta RHS Eixo da direita (Right Hand Side) ROC Comité de Supervisão da Reforma (Reform Oversight Comittee) ROIS Estrutura de Supervisão e Implementação da Reforma SDR Unidade Especial de Saque (Special Drawing Rights) SEAT Secretaria de Estado para o Ambiente e Turismo SEN Senegal SEN Sistema de Estatísticas Nacional SIDA Síndrome Imunodeficiência Adquirida SIGFIP Sistema Integrado de Gestão Financeira Pública SLE Serra Leoa SNAP Sistema Nacional das Áreas Protegidas SOE Empresas Públicas (State Owned Enteprises) SOP Série de Projectos (Series of Projects) SPF Fundo de Promoção do Estado e da Paz SSA África Subsaariana SSR Reforma do Sector da Segurança SYGADE Sistema de Análise da Gestão da Dívida TEUs Unidade de Equivalência de Vinte-Pés TGO Togo UE União Europeia UEMOA União Económica e Monetária da África Ocidental iv UNCTAD Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento UNDC Escritório das Nações Unidas para a Droga e Crimes UNWTO Organização Mundial do Turismo das Nações Unidas VIH Vírus da Imunodeficiência Humana WAGP Pipeline de Gás da África Ocidental WAPP Aglomeração de Electricidade da África Ocidental WARFP Programa Regional de Pescas da África Ocidental WDI Indicadores de Desenvolvimento Mundiais WDR Relatório de Desenvolvimento Mundial WFP Programa Alimentar Mundial WGI Indicadores de Governação Mundiais WWF Fundo Mundial da Vida Selvagem Vice-Presidente: Makhtar Diop Directora para o País: Vera Songwe Director Sénior da Prática: Marcelo Giugale Gestora da Prática: Miria Pigato Líder da Equipa Tarefa: Marek Hanusch v TABELA DE CONTEÚDOS CAPÍTULO 1: DESAFIOS DE DESENVOLVIMENTO NA GUINÉ-BISSAU E A ARGUMENTAÇÃO PARA UMA AGENDA DE RETOMA ................................................................................................................. 19 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 19 PARTE I: RESUMO ECONÓMICO, POLÍTICO E SOCIAL ..................................................................... 20 2. O CONTEXTO ECONÓMICO ..................................................................................................... 20 3. DESENVOLVIMENTO ECONÓMICOS RECENTES: ..................................................................... 24 4. POBREZA NA GUINÉ-BISSAU ................................................................................................... 26 5. POLÍTICAS E INSTITUIÇÕES ...................................................................................................... 30 6. FRAGILIDADE, INSTITUIÇÕES E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO ........................................ 33 PARTE II: A LÓGICA DO CEM ........................................................................................................... 39 7. CONSTRANGIMENTOS PARA O DESENVOLVIMENTO ............................................................. 39 8. UMA AGENDA PARA O CRESCIMENTO, REDUÇÃO DA POBREZA, E PROSPERIDADE PARTILHADA ................................................................................................................................... 44 CAPÍTULO 2: ENFRENTAR OS CONSTRANGIMENTOS DE INFRA-ESTRUTURAS.................................................. 52 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 52 PARTE I: O SECTOR DA ENERGIA .................................................................................................... 54 2. PROBLEMAS E SOLUÇÕES NO SECTOR DA ELECTRICIDADE .................................................... 54 3. PROBLEMAS E SOLUÇÕES NO SECTOR DO PETRÓLEO ............................................................ 61 PARTE II: O PORTO DE BISSAU ........................................................................................................ 63 4. CONTEXTO E QUESTÕES-CHAVE ............................................................................................. 63 5. INVESTIMENTO E REFORMA INSTITUCIONAL ......................................................................... 66 PARTE III: ESTRADAS ....................................................................................................................... 69 6. CONTEXTO E QUESTÕES CHAVE.............................................................................................. 69 7. PESQUISA E INVESTIMENTO ................................................................................................... 70 PARTE IV: TELECOMUNICAÇÕES ..................................................................................................... 70 8. CONTEXTO E QUESTÕES-CHAVE ............................................................................................. 70 9. INVESTIMENTO E REFORMA INSTITUCIONAL ......................................................................... 75 CAPÍTULO 3: DESENVOLVIMENTO DO SECTOR PRIVADO E FINANCEIRO ......................................................... 78 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 78 2. DESAFIOS E SOLUÇÕES ............................................................................................................ 79 3. RECOMENDAÇÕES .................................................................................................................. 87 PARTE II: O SECTOR FINANCEIRO ................................................................................................... 91 4. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ................................................................................................. 95 CAPÍTULO 4: UMA AGENDA PARA O SECTOR PÚBLICO - DISTRIBUIR OS DIVIDENDOS DA DEMOCRACIA EM SIMULTÂNEO COM A (RE)CONSTRUÇÃO DAS INSTITUIÇÕES ................................................ 97 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 97 2. RECONSTRUIR E MELHORAR A GESTÃO DAS FINANÇAS PÚBLICAS E A MOBILIZAÇÃO DE RECEITAS DOMÉSTICAS .................................................................................................................. 98 3. MELHORIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA............................................................................ 109 4. PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL: RESPONDER ÀS NECESSIDADES IMEDIATAS NUM CONTEXTO INSTITUCIONAL PRECÁRIO ......................................................................................... 113 5. ESTATÍSTICAS PARA POLÍTICAS COM BASE EM PROVAS ....................................................... 115 6. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ............................................................................................... 119 CAPÍTULO 5: PARCERIAS PARA UM MAIOR IMPACTO ................................................................................... 121 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 121 2. DOADORES E AJUDA PÚBLICA AO DESENVOLVIMENTO ....................................................... 122 vi 3. ORGANIZAÇÕES REGIONAIS E INTEGRAÇÃO REGIONAL ....................................................... 126 4. ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL .................................................................................. 132 CAPÍTULO 6: REMESSAS E PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ................................................................. 134 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 134 PARTE I: REMESSAS ...................................................................................................................... 135 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO ................................................................................................... 135 3. REMESSAS E O INVESTIMENTO DE CAPITAL DE RISCO .......................................................... 139 4. RECOMENDAÇÕES ................................................................................................................ 145 PARTE II: PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL .......................................................................... 147 5. VISÃO GERAL E CONTEXTO ................................................................................................... 147 6. O IMPACTO DOS PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ...................................................... 149 7. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS .......................................................................................... 155 CAPÍTULO 7: COLHER A RIQUEZA DOS RECURSOS NATURAIS ........................................................................ 156 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 156 2. RIQUEZA NATURAL E ACTIVIDADE ECONÓMICA .................................................................. 157 3. RIQUEZA NATURAL E RECEITA DO GOVERNO ....................................................................... 160 4. GESTÃO DOS RISCOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL....................................... 162 5. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ............................................................................................... 164 CAPÍTULO 8: CAJU - SUBIR NA CADEIA DE VALOR ......................................................................................... 167 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 167 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO ................................................................................................... 168 3. ESTABELECER O POTENCIAL DA GUINÉ-BISSAU PARA PROCESSAR CAJU ............................. 175 4. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS .......................................................................................... 180 CAPÍTULO 9: REVITALIZAR O SECTOR DO ARROZ........................................................................................... 184 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 184 2. O POTENCIAL DO SECTOR DO ARROZ NA GUINÉ-BISSAU ..................................................... 185 3. AUMENTAR A PRODUÇÃO DE ARROZ ................................................................................... 189 4. ARROZ, SEGURANÇA ALIMENTAR, E DIVERSIFICAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES .......................... 194 5. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS .......................................................................................... 198 CAPÍTULO 10: PESCAS, EMPREGO E RECEITA ................................................................................................. 200 1. VISÃO GERAL ......................................................................................................................... 200 2. ACÇÕES PARA TRAZER A ECONOMIA OFFSHORE PARA ONSHORE ....................................... 203 3. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ............................................................................................... 206 CAPÍTULO 11: OS SECTORES DE MINERAÇÃO E DO PETRÓLEO: TRANSFORMAR O CAPITAL NATURAL EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL .......................................................................................... 207 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 207 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO ................................................................................................... 208 3. ASPECTOS INSTITUCIONAIS E LEGAIS .................................................................................... 212 4. IMPULSIONAR O CRESCIMENTO PARTILHADO ..................................................................... 214 5. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ............................................................................................... 221 CAPÍTULO 12: BIODIVERSIDADE, ÁREAS PROTEGIDAS, E CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL E PARTILHADO LIDERADO PELO TURISMO........................................................................................................ 224 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 224 2. BIODIVERSIDADE E ÁREAS PROTEGIDAS ............................................................................... 225 3. TURISMO: O POTENCIAL POR EXPLORAR .............................................................................. 228 4. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS ............................................................................................... 235 vii Lista de Figuras: Figura 1: Trajectórias distintas de crescimento de Cabo Verde e Guiné-Bissau ...........................................19 Figura 2: A agricultura tem liderado o crescimento ......................................................................................20 Figura 3: O sector primário domina a produção económica .........................................................................21 Figura 4: A vasta maioria do Guineenses está empregue na agricultura .......................................................21 Figura 5: A Guiné-Bissau tem beneficiado de um dividendo demográfico, mas os ganhos de produtividade têm sido fracos...............................................................................................................................................21 Figura 6: Os preços do caju são um forte determinante da conta corrente e também afectam a inflação ....22 Figura 7: A pobreza e pobreza extrema são elevadas e estão em crescendo .................................................26 Figura 8: A população da Guiné-Bissau está concentrada em torno da cidade capital de Bissau .................28 Figura 9: A pobreza é distribuída de forma relativamente igual na Guiné-Bissau, embora esteja relativamente concentrada no Norte ..............................................................................................................29 Figura 10: O controlo da corrupção é fraco na Guiné-Bissau .......................................................................32 Figura 11: O acesso anterior a rendas é associado a uma incidência maior de golpes militares ...................34 Figura 12: A procura de rendas (clientelismo) está correlacionada com um pior desempenho económico ..34 Figura 13: A fragilidade e desincentivos para o exército entrar no comércio de drogas estão negativamente correlacionados ..............................................................................................................................................35 Figura 14: O investimento do sector privado é reduzido na Guiné-Bissau ...................................................39 Figura 15: O quadro de diagnóstico do crescimento .....................................................................................40 Figura 16: A rede rodoviária da Guiné-Bissau é comparável aos standards regionais .................................41 Figura 17: … mas o país situa-se bem atrás de outros em termos de TIC .....................................................41 Figura 18: O consumo de energia situa-se entre os mais baixos do mundo… ..............................................41 Figura 19: colocando um grande constrangimento às empresas ...................................................................41 Figura 20: Os resultados básicos de educação na Guiné-Bissau são comparáveis aos níveis regionais... .....42 Figura 21: … mas os défices em competências vocacionais são pronunciados ............................................42 Figura 22: A qualidade da gestão orçamental, financeira e económica como um todo é fraca na Guiné-Bissau... .........................................................................................................................................42 Figura 23: E o Governo tem um espaço extremamente limitado para conduzir a política orçamental ..........42 Figura 24: A penetração bancária é reduzida na Guiné-Bissau... ..................................................................43 Figura 25: … e poucas empresas têm acesso a serviços bancários ................................................................43 Figura 26: Lançar um círculo virtuoso para o crescimento e redução da pobreza .........................................44 Figura 27: As tecnologias de informação e comunicação são catalisadoras para o crescimento económico ................................................................................................................................53 Figura 28: A maioria dos agregados familiares na Guiné-Bissau não têm acesso a electricidade ................55 Figura 29: O porto recebe principalmente navios de pesca e de contentores ................................................63 Figura 30: O caju domina os produtos de exportação no porto .....................................................................63 Figura 31: O diesel, cimento e arroz dominam as importações recebidas no porto. ......................................63 Figura 32: A quantidade estradas pavimentadas é comparável com a média da África Subsaariana, no entanto têm-se deteriorado em anos recentes. ...............................................................................................69 Figura 33: As subscrições de telemóveis têm aumentado dramaticamente ao invés das linhas terrestres que são raras. ........................................................................................................................................................71 Figura 34: A revolução da Internet ainda não se manifestou na Guiné-Bissau .............................................71 Figura 35: A Guiné-Bissau é o único país costeiro da região que não está ligado a um cabo submarino. ....74 Figura 36: Os grandes episódios de turbulência política têm tido o maior impacto negativo no crescimento ...............................................................................................................................................79 Figura 37: A Guiné-Bissau não tem conseguido melhorar o seu ambiente regulatório entre 2010 e 2014 - ao invés do progresso notável em outros países da África Subsaariana. ............................................................80 viii Figura 38: Na Guiné-Bissau, o acesso a financiamento é um constrangimento severo para as empresas. ....81 Figura 39: O acesso a financiamento é um constrangimento em particular para pequenos negócios.81 Figura 40: Os procedimentos complexos de candidatura encontram-se entre as principais razões pelas quais as empresas não se candidatam a crédito na Guiné-Bissau... ........................................................................82 Figura 41:... e a escassez de garantias é a principal razão pela qual as aplicações são recusada ...................82 Figura 42: Os salários medianos são relativamente reduzidos na Guiné-Bissau ...........................................82 Figura 43:... mas devido à reduzida produtividade unitária, os custos laborais são elevados. .......................82 Figura 44: O mercado laboral da Guiné-Bissau é relativamente rígido... ......................................................83 Figura 45:...com os custos de despedimento a situarem-se entre os maiores desincentivos para as empresas contratarem empregos formais ......................................................................................................................83 Figura 46: A maioria dos trabalhadores da Guiné-Bissau têm uma educação de nível secundário - ou menor... ..........................................................................................................................................................84 Figura 47: … no entanto apenas algumas empresas fornecem formação aos seus trabalhadores .................84 Figura 48: Não existem ligações fortes entre as actividades económicas na Guiné-Bissau. .........................85 Figura 49: Quatro bancos comerciais detêm cerca de 94 por cento dos activos do sistema financeiro ........91 Figura 50: O Ecobank é responsável por quase metade do crédito fornecido à economia. ...........................92 Figura 51: Subsidiárias de bancos pan-africanos dominam o sistema financeiro na Guiné-Bissau ..............92 Figura 52: A Guiné-Bissau situa-se nos 10 por cento inferiores globalmente no que toca à qualidade da governação.....................................................................................................................................................97 Figura 53: Em 2014, a Guiné-Bissau situou-se entre os mais países com a probabilidade mais elevada de sofrer um golpe. .............................................................................................................................................97 Figura 54: As forças militares e paramilitares correspondem a uma larga parte do emprego público ........110 Figura 55: Tendo em conta os volumes de comércio modestos na Guiné-Bissau, o número de oficiais aduaneiros é vasto .......................................................................................................................................111 Figura 56: A capacidade estatística é débil na Guiné-Bissau ......................................................................116 Figura 57: As instituições mais fortes são associadas a um maior fluxo de APD .......................................124 Figura 58: A APD permanece o mais importante influxo financeiro na Guiné-Bissau; colapsou em 2012 em resposta ao golpe .........................................................................................................................................124 Figura 59: A infra-estrutura e a educação são as principais áreas apoiadas pela APD na Guiné-Bissau ..124 Figura 60: O comércio intra-regional é reduzido na CEDEAO. ..................................................................127 Figura 61: Na África Ocidental, a Guiné-Bissau e Cabo Verde sentiram a maior emigração para fora. .....136 Figura 62: Os principais destinos dos migrantes da Guiné-Bissau são Portugal, Senegal e Gâmbia. .........137 Figura 63: Os migrantes da Europa enviam o maior volume de remessas em termos relativos. .................137 Figura 64: As remessas melhoram o acesso ao capital de risco. .................................................................140 Figura 65: As remessas aumentam a disponibilidade de capital especialmente em economias informais ..141 Figura 66: As remessas apoiam o acesso a capital de risco especialmente quando as diásporas se encontram concentradas. ...............................................................................................................................................143 Figura 67: O número de instituições da Diáspora em todo o mundo tem aumentado. ................................144 Figura 68: Os programas de rede de segurança social, de diferentes tipos, são comuns em vários países africanos. .....................................................................................................................................................148 Figura 69: Uma transferência equivalente a 1,5 pontos percentuais do PIB reduziria a pobreza absoluta em dois pontos percentuais. ...............................................................................................................................149 Figura 70: Uma transferência equivalente a 1,5 pontos percentuais do PIB reduziria a pobreza extrema em dez pontos percentuais. ................................................................................................................................149 Figura 71: As transferências monetárias têm efeitos duplos de rendimento e substituição. ........................151 Figura 72: A Guiné-Bissau possuiu recursos renováveis e não renováveis consideráveis. .........................156 Figura 73 ...que correspondem à maior quota do total da riqueza do país. ..................................................156 Figura 74: Receitas das pescas e vendas de caju .........................................................................................160 Figura 75: As exportações de caju têm crescido a uma média de 6 por cento por ano. ...............................169 ix Figura 76: A Guiné-Bissau é o quinto maior exportador de castanha de caju em bruto no mundo… .........170 Figura 77:... embora o país quase não produza castanha de caju processada. .............................................170 Figura 78: A Guiné-Bissau tem um potencial considerável para produzir castanha de caju processadas. ..171 Figura 79: O desenvolvimento da indústria de processamento de caju teria um impacto considerável na economia. ....................................................................................................................................................172 Figura 80: A procura por castanha de caju proveniente dos Estados Unidos e Europa tem aumentado de forma constante. ..........................................................................................................................................174 Figura 81: A qualidade do caju da Guiné-Bissau é elevada de acordo com os standards globais. .............174 Figura 82: O custo total de processamento para uma fábrica com 1000 toneladas de capacidade é estimado em US$ 850 por tonelada métrica. ..............................................................................................................176 Figura 83: O valor da exportação do caju processado é estimado em US$ 220 por tonelada métrica processada. ..................................................................................................................................................176 Figura 84: Os lucros do processamento podem variar de acordo com os preços CIF e os preços agrícolas. ..........................................................................................................................................177 Figura 85: A distância das fábricas de processamento até à fonte das castanhas de caju em bruto é um dos determinantes-chave dos lucros líquidos. ....................................................................................................178 Figura 86: O caju de maior qualidade é colhido perto do mar. ....................................................................178 Figura 87: Se essas 1000 toneladas de caju em bruto fossem exportadas em 2009, o lucro teria sido de apenas US$ 13.000. .....................................................................................................................................179 Figura 88: Uma série de constrangimentos estão a afectar o desenvolvimento da indústria de processamento de caju .........................................................................................................................................................181 Figura 89: A produção de arroz recuperou da destruição da Guerra de Independência. .............................185 Figura 90: Existem duas cadeias de distribuição para o arroz local e importado ........................................192 Figura 91: Os termos de troca do caju e arroz em termos de comércio acompanham os preços internacionais do caju .........................................................................................................................................................193 Figura 92: O arroz contribui para os rendimentos familiares, especialmente em zonas costeiras. ..............196 Figura 93: O preço do arroz no curto prazo .................................................................................................196 Figura 94: O preço do arroz no longo prazo ................................................................................................197 Figura 95: A produção industrial de pescas é dominada por pequenos pelágicos. ......................................200 Figura 96: A maioria das áreas protegidas na Guiné-Bissau encontram-se ou vão situar-se no Sul do país, assim como nas ilhas ...................................................................................................................................226 Figura 97: A garantia dos direitos da comunidade nos parques nacionais é possível e importante. ............236 Lista de Tabelas: Tabela 1: Indicadores económicos seleccionados .........................................................................................27 Tabela 2: O porto de Bissau é o mais caro na região .....................................................................................65 Tabela 3: O arroz irrigado tem o maior rendimento de produtividade. .......................................................186 Tabela 4: Os custos de recursos domésticos são particularmente baixos para os pântanos de manguezais e arroz irrigado. ..............................................................................................................................................188 Tabela 5: Na região, a Guiné-Bissau tem uma vantagem comparativa na produção de arroz. ....................188 Tabela 6: Mais de 50 por cento do arroz para consumo doméstico é importado. ........................................193 Tabela 7: O arroz é a cultura de base mais importante da Guiné-Bissau. ....................................................195 Tabela 8: Biomassa e estimativas de potencial de pesca para peixes demersais, 2011 ...............................201 Tabela 9: Custo bruto indicativo do peixe capturado por pescas industriais em 2011 nas águas da Guiné- Bissau ..........................................................................................................................................................204 Tabela 10: Custo bruto indicativo estimado das pescas industriais em 2015. .............................................206 Tabela 11: A mineração pode ter um grande impacto no emprego e receita do Governo. ..........................215 Tabela 12: Actualmente, a Guiné-Bissau está bem atrás de potenciais competidores em termos de fluxos turísticos ......................................................................................................................................................230 x Lista de Caixas: Caixa 1: Crescimento apesar da fragilidade: o caso da indústria de vestuário do Bangladesh. .....................37 Caixa 2: Directrizes da OCDE para a Governação Empresarial em Empresas Estatais (SOEs) ...................60 Caixa 3: Ruanda: Líder da reforma do desenvolvimento do sector privado ..................................................86 Caixa 4: Promover o desenvolvimento local através de cooperativas ...........................................................89 Caixa 5: Fortalecer a governação num ambiente frágil .................................................................................99 Caixa 6: O Comité do Tesouro: Um instrumento para a transparência e controlo ......................................103 Caixa 7: O impacto do FUNPI nos preços agrícolas locais, e na pobreza ...................................................106 Caixa 8: Fornecer alívio imediato aos pobres: Transferência monetárias na Etiópia ..................................115 Caixa 9: Guiné-Bissau: Ganhos Potenciais da Política Agrícola (ECOWAP) no Suplemento às Importações de Arroz .......................................................................................................................................................131 Caixa 10: Travar a pilhagem das florestas da Guiné-Bissau .......................................................................159 Caixa 11: Como confirmar a viabilidade do cultivo de caju/arroz em famílias agrícolas ...........................190 Caixa 12: O licenciamento como uma ferramenta para gerir de forma sustentável o stock de pescas da Guiné-Bissau ...............................................................................................................................................202 Caixa 13: Promover as ligações com a economia local: experiências dos clusters mineiros do Chile e Gana. ...............................................................................................................................................217 Caixa 14: Investigar o estado do turismo na Guiné-Bissau .........................................................................229 Caixa 15: O Impacto dos Empregos do Turismo nos Rendimento das Aldeias ..........................................232 Este Memorando Económico do País foi preparado por uma equipa liderada por Marek Hanusch (Economista, GFMDR). O documento é baseado numa versão de 2011 liderada por Alain D’Hoore (Economista Sénior, GMFDR) e Fernando Blanco (Economista-Chefe, GFMDR). A equipa incluiu os seguintes quadros do Grupo do Banco Mundial: Leopold Sedogo (Especialista de Energia , GEEDR ), Pierre Graftieaux (Especialista-Chefe de Transportes, GTIDR), Arthur Foch (Especialista de Políticas de Tecnologias de Informação e Comunicação, GTIDR), John Virdin (Especialista Sénior na Gestão de Recursos Naturais , GENDR), Aniceto Bila (Especialista Sénior de Desenvolvimento Rural, GAGDR), Berengere Prince (Especialista Sénior de Gestão de Recursos Naturais, GENDR), Barak Hoffman (Especialista do Sector Público, GGODR), Kjetil Hansen (Especialista Sénior do Sector Público, GGODR), Eric Brintet (Especialista-Chefe de Gestão Financeira, GGODR), Francisco Moraes Leitão Campos (Economista, GTCDR), Eneida Fernandes (Especialista de Desenvolvimento do Sector Privado, GTCDR), Helen Edmundson (Economista, GFMDR), Gary McMahon (Especialista Sénior de Extracção Mineira, GEEDR), Emily Weedon (Especialista de Protecção Social, GSPDR), Aline Coudouel (Especialista-Chefe de Protecção Social, GSPDR), e Felicien Donat Edgar Towenan Accrombessy (Economista, GPVDR). A equipa também incluiu os seguintes consultores: João Montalvão (AFRGI), Steven Kyle (Universidade de Cornell), Paul Vaaler (Universidade de Minesota), Tanya Yudelman (GWADR), Niamh O’Sullivan (GFMDR), Antonio Pedro Mota (GFMDR), Asberr Mendy (GENDR), e Ehui Adovor (GEEDR). Carmen Pereira (Oficial de Ligação, AFMGW) e Rui Djarte (Consultor, GTCDR) forneceram apoio a partir de Bissau e Glaucia Ferreira (Assistente do Programa de Línguas, GMFDR), Judite Fernandes (Assistente do Programa de Línguas, GMFDR) e Sylvaine Cussac (Assistente do Programa de Línguas, GMFDR) de Washington, DC. Vera Songwe (Directora para o País, AFCF1), Miria Pigato (Gestora da Prática, GFMDR), Philip English (Líder de Programa, AFCF1) e Marie-Chantal Uwanyiligira (Coordenadora de Programa para a Guiné-Bissau, AFCSN) providenciaram orientação à equipa. A equipa agradece os comentários construtivos de McDonald Benjamin (Gestor de País, LCCDO), Anand Rajaram (Líder de Prática, GGODR), Raja Bentaouet Kattan (Líder de Programa, GEEDR), Kofi Nouve (Especialista-Sénior de Desenvolvimento Rural, GAGDR), Javier Baez (Economista-Sénior de Pobreza, GPVDR), Willy McCourt (Especialista Sénior do Sector Público, GGODR), Philip Keefer (Banco Interamericano para o Desenvolvimento), Yannis Arvanitis (Banco Africano de Desevolvimento), e Sunhee Park (Universidade de Yale), assim como as contribuições da equipa do FMI para a Guiné- Bissau. xi SUMÁRIO EXECUTIVO 1. Terra Ranca! Um novo começo 1. A Guiné-Bissau é um dos países mais pobres do mundo. É também um dos mais frágeis. Em 2013, o Produto Nacional Bruto per capita era de US$ 590. A pobreza em termos de paridade de poder de compra de US$ 2 situa-se acima de 70 por cento e a extrema pobreza é de cerca de 33 por cento. A economia é pouco diversificada e dominada pela produção de castanhas de caju não processadas. O crescimento médio anual tem acompanhado com dificuldade o crescimento populacional, o que se deve em parte a um ambiente de governação difícil, frequentemente interrompido por turbulência política, incluindo golpes militares. O último golpe ocorreu em 2012. A fragilidade política na Guiné-Bissau tem constrangido o crescimento liderado pelo sector privado e a redução da pobreza. 2. A democracia regressou à Guiné-Bissau em 2014 e o Governo recém-eleito tem agora a oportunidade de concretizar um novo começo e virar a página do crescimento anémico e pobreza. A Guiné-Bissau viveu uma recessão em 2012, particularmente como consequência da resposta coordenada e resolvida dos doadores que retiraram a maioria da ajuda em resposta ao golpe, mas também devido ao efeito da rotura política na colheita de caju em 2012. O crescimento tem recuperado apenas modestamente desde então e não é provável que resuma antes que a estabilidade política regresse. Em Abril e Maio de 2014, a Guiné-Bissau realizou eleições que muitos observadores consideraram as mais livres e justas da história do país. Os desafios ligados ao desenvolvimento que o Governo agora enfrenta são extensos mas não intransponíveis. Este Memorando Económico do País (CEM) providencia uma análise dos constrangimentos do país no plano do crescimento. As políticas que o documento recomenda podem apoiar o Governo a realizar um novo começo - terra ranca! em crioulo da Guiné-Bissau - para melhorar de forma sustentável a vidas dos Guineenses. 1 O objectivo é promover o crescimento partilhado e equitativo para reduzir a pobreza e alcançar a prosperidade. 3. A fragilidade continua a definir a trajectória de desenvolvimento da Guiné-Bissau. O Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2011 define a fragilidade como um período em que “os Estados e a instituições não têm a capacidade, responsabilidade, ou legitimidade para mediar as relações entre grupos de cidadãos e entre os cidadãos e o Estado, tornando-os vulneráveis à violência”. Um Estado frágil, com um nível pobre de serviços ao cidadão, e frequentes episódios de conflito, incluindo uma longa guerra de independência, uma Guerra Civil, e diversos golpes militares e assassinatos políticos, tem marcado a história da Guiné-Bissau. Embora o novo Governo goze de legitimidade popular, a interferência extrajudicial de opositores políticos, incluindo das Forças Armadas, pode ainda descarrilar o caminho para a prosperidade. A Task Force para a Instabilidade Política - sediada no Center for Global Policy na Universidade de George Mason - estimou que a probabilidade de um golpe ocorrer na Guiné-Bissau em 2014 era de cerca de 20 por cento. A fragilidade é uma característica enraizada na política da Guiné- Bissau. 4. No entanto o crescimento é possível apesar da fragilidade - e pode até reduzir a fragilidade. Este CEM foca-se em políticas que podem libertar o potencial do sector privado, fortalecer o sector público, e fornecer serviços aos cidadãos. O aumento nos rendimentos permite aos cidadãos responsabilizar os Governos e exigir melhor governação, e a melhoria nas políticas 1O sumário de todas as recomendações de políticas avançadas neste CEM pode ser encontrado no apêndice localizado no final do documento. xii públicas fortalecem a legitimidade do Estado. Um compacto social mais forte entre o Estado e os seus cidadãos irá consolidar de forma crescente o primado da Lei e proteger o Governo de uma remoção ilegítima; por outro lado, aumentar os dividendos do crescimento partilhado irá mitigar a concorrência das elites por uma quantidade mais limitada de rendas e assim reduzir os incentivos para remover a liderança. O crescimento partilhado poderá então reduzir a fragilidade. No entanto, verificando a quão enraizada a fragilidade está na Guiné-Bissau, a estabilidade não virá de um dia para o outro. O crescimento também não. Mas, conforme o CEM argumenta, aumentar o crescimento partilhado na Guiné-Bissau é possível, mesmo com um ambiente frágil. A chave passa por conceder mais poder aos Guineenses enquanto cidadãos e empreendedores: eles são os impulsionadores do crescimento económico. 5. Este CEM argumenta a favor de uma agenda de retoma, que enfrente os grandes constrangimentos ao crescimento em simultâneo. Na Guiné-Bissau, o ambiente para o crescimento partilhado e liderado pelo sector privado encontra-se num equilíbrio baixo, uma vez que a infra-estrutura, e os reduzidos níveis de capital humano e serviços públicos fracos reforçam-se mutuamente. Estes factores são agravados pela concorrência das elites por rendas, e uma administração pública fraca. Em conjunto, estes factores sufocam a actividade económica privada. Num ambiente onde mesmo as condições básicas para o crescimento são cumpridas de forma ténue, as intervenções isoladas de políticas vão provavelmente falhar uma vez que a maioria das actividades económicas são complementares: um agricultor de caju não irá vender o seu produto se os retalhistas conseguirem acesso ao crédito mas não existir uma estrada que ligue o agricultor aos mercados. A agenda de retoma proposta neste CEM tem o potencial de “virar” a economia para um futuro mais próspero, através de um esforço exaustivo para remover os constrangimentos vinculativos ao crescimento. Tendo em conta a capacidade fraca de fornecer até os serviços públicos mais básicos no momento, o Governo deverá focar-se em fortalecer a sua capacidade em áreas prioritárias e empossar os seus cidadãos em outras, e.g. através de programas de protecção social ou um ambiente de negócios mais estimulante. Adicionalmente, será crucial alavancar o apoio para evitar sobrecarregar o sector público, incluindo o apoio dos doadores, organizações regionais, ONGs, e da Diáspora. 2. Criar as Condições Para o Crescimento, Redução da Pobreza, e Prosperidade Partilhada Fortalecer a arquitectura física, legal e financeira. 6. As falhas de mercado abundam na Guiné-Bissau. O investimento na arquitectura física, legal e financeira irá ser vital para permitir a actividade do sector privado. Se libertar o potencial do sector privado da Guiné-Bissau é a chave do crescimento, redução da pobreza e prosperidade partilhada, particularmente num Estado frágil, então têm de ser resolvidas uma série de falhas dos mercados, conforme se explora nos capítulos 2 e 3. Nas economias modernas, a electricidade é um input crucial para a produção mas no entanto a sua disponibilidade na Guiné- Bissau é extremamente limitada e os custos são elevados. As infra-estruturas rodoviárias e portuárias inadequadas, um sector TIC subdesenvolvido, um ambiente regulatório restringido, uma força laboral largamente não qualificada, e um sector financeiro pouco profundo são factores que limitam a efectividade dos bens, trabalho e mercados de capitais. A remoção dos constrangimentos nestas áreas irá ajudar a ligar mercados e os seus participantes de uma forma mais efectiva, permitindo assim a actividade económica. 7. A infra-estrutura precária é um grande constrangimento na Guiné-Bissau. A melhoria no fornecimento de electricidade situa-se entre as preocupações mais urgentes. O capítulo 2 foca-se em quatro áreas para o investimento em infra-estruturas, iniciando com a xiii electricidade. O empreendedorismo e o crescimento liderado pelo sector privado são extremamente limitados devido a um acesso pouco fiável à energia. Cerca de 60 a 80 por cento dos Guineenses não têm acesso a energia. Os doadores já estão a apoiar o Governo na melhoria da capacidade de produção, que é crucial. Adicionalmente, será importante melhorar a sustentabilidade financeira do sector, fortalecer os sistemas de governação, e estabelecer um sistema eficiente em termos de custos para alimentar as centrais eléctricas no curto prazo até que o país consiga beneficiar de ligações às redes de energia regionais. 8. O acesso a mercados é extremamente limitado por uma infra-estrutura rodoviária inadequada e ineficiente. Mesmo tendo em conta que a economia da Guiné-Bissau é motivada por exportações - de castanha de caju em bruto - o único porto do país em Bissau encontra-se num estado muito precário. As intervenções chave a nível de políticas passam por dragar e remover os diversos naufrágios que obstruem o acesso aos cais - facilitando assim o acesso para navios maiores ao aumentar a profundidade do porto -, investimentos em infra-estruturas e instalações de armazenagem, melhoria na governação da autoridade portuária, e a resolução de disputas legais em curso com o anterior concessionário portuário, para que se consigam atrair novos investidores privados. As estradas por outro lado têm-se deteriorado dramaticamente em anos recentes, parcialmente como consequência da falta de apoios dos doadores no seguimento do golpe de 2012. O acesso a estradas principalmente para produtores de caju - mas também para outros produtos da Guiné-Bissau tais como arroz - exige trabalhos significativos de reabilitação para ligar os produtores aos mercados. 9. A cobertura de telecomunicações é subdesenvolvida na Guiné-Bissau. As linhas de telefone terrestres praticamente não existem na Guiné-Bissau. A cobertura de telemóveis no entanto tem aumentado rapidamente no país ao longo dos últimos anos. Cerca de 36% dos Guineenses dispunham de telemóveis em 2012 (as subscrições eram mais elevadas uma vez que os utilizadores tendem a ter múltiplos cartões SIM). Poucas empresas e famílias têm acesso à Internet: a Guiné-Bissau é o único país costeiro da África sem acesso a um cabo submarino. As telecomunicações são cruciais para o crescimento uma vez que podem ligar os participantes de mercado - mesmo quando conectividade física é limitada por infra-estruturas pobres, como na Guiné-Bissau. As tecnologias de informação e comunicação (TIC) melhoram a produtividade das empresas uma vez que podem canalizar recursos financeiros, incluindo remessas e transferências financeiras, para receptores mesmo nas áreas mais remotas. A melhoria do sistema de telecomunicações na Guiné-Bissau é vital. O desenvolvimento do sector privado e financeiro é um pilar do crescimento económico. Este enfrenta diversos constrangimentos na Guiné-Bissau. O capítulo 3 aponta que a Guiné- Bissau encontra-se entre os 10 países pior classificados nos indicadores de Doing Business. No entanto os constrangimentos não se limitam ao quadro regulatório fraco para empresas. Estes incluem também uma infra-estrutura física pobre (explicada no capítulo 2), uma força laboral largamente não qualificada, e um mercado financeiro pouco profundo. Estas são áreas-chave para intervenções de política, incluindo novas leis e regulamentações que melhorem o ambiente de negócios, investimentos em infra-estruturas, educação e formação, e o fortalecimento da intermediação financeira, por exemplo através de microfinança. Um dos principais desafios será redefinir o relacionamento entre o sector privado e o Governo de forma a minimizar a ingerência política no sector privado e os comportamentos de procura de rendas por parte dos oficiais governamentais. As intervenções de desenvolvimento do sector privado têm o potencial de impulsionar os sectores de crescimento já existentes mas também de motivar a entrada em novos sectores, permitindo que a economia se diversifique. Se as condições melhorarem, o investimento directo estrangeiro (IDE) pode desempenhar um papel transformativo. xiv Fortalecer a governação e alavancar as parcerias 10. O fortalecimento do sector público será crucial para coordenar e implementar a agenda de retoma. Os doadores encontram-se também preparados para apoiar o Governo. A resposta às falhas de mercado e fornecimento de serviços públicos requer que o Governo alavanque recursos, supervisione investimentos de larga escala, e reestruture a arquitectura legal, entre outras actividades. A fraca governação, uma das manifestações de fragilidade, limita o Governo na sua capacidade de desempenhar estas actividades. O investimento na capacidade da administração será crucial para garantir a elaboração eficaz de políticas e para promover a responsabilização efectiva do Governo no âmbito das intervenções propostas no CEM. O crescimento e o emprego assim como o melhor fornecimento de serviços como consequência da melhoria da governação vão fortalecer a legitimidade do Estado, que é importante num contexto de fragilidade. O reforço da capacidade do Estado leva tempo. Entretanto, diversos parceiros - internacionais, regionais, locais, privados e públicos - estão prontos para apoiar o Governo na construção de capacidades e em facilitar, e até implementar, as suas políticas. 11. Uma das chaves para alcançar um desenvolvimento mais dinâmico está ligada ao sector público. O Governo tem responsabilidades enquanto elaborador de políticas e tem sido o foco dos golpes militares. O fortalecimento da governação em países frágeis é vital, tanto para implementar as mudanças que são necessárias para impulsionar o crescimento partilhado como para isolar de interferências externas. É também necessário ter uma administração pública capaz de garantir a estabilidade macro orçamental como uma condição chave para o crescimento. O capítulo 4 argumenta que a agenda de reforma do sector público deverá focar-se na melhoria da Gestão das Finanças Públicas de forma a fortalecer a posição fiduciária do Governo, alinhar os incentivos com o interesse público, e para garantir que a receita é utilizada nos objectivos propostos, assim como também para preparar um orçamento sólido - a própria base da política. O fortalecimento dos recursos humanos e das estatísticas irá permitir ao Governo identificar e monitorizar as políticas chave e desempenhá-las efectivamente. Uma vez que a capacitação do Governo leva tempo, o capítulo 4 propõe que os programas de assistência social, tais como as transferências monetárias, sejam uma forma de apoiar os pobres, especialmente num ambiente onde as políticas públicas falham. Se forem implementados de forma cuidadosa e com integridade suficiente, tais programas podem aumentar a legitimidade do Estado e fortalecer o Governo contra intervenções externas. 12. A agenda do sector público é ambiciosa, mas o Governo pode alavancar diversas parcerias para o apoio à implementação. Entre estas encontra-se a comunidade de doadores que pode apoiar o Governo de forma financeira e com serviços consultivos. Para garantir que a ajuda é efectiva, o capítulo 5 argumenta que melhorar a coordenação dos doadores e em particular a liderança do Governo no processo é indispensável. Outros parceiros incluem organizações regionais como a UEMOA e a CEDEAO que providenciam um contexto importante para o comércio livre, e a CEDEAO em particular também fornece assistência política e militar. Outra das parcerias importantes destacadas no capítulo 5 é com as ONGs. As ONGs são altamente activas na Guiné-Bissau, preenchendo algumas das lacunas que as políticas públicas fracas criam. Estas organizações podem ser importantes parceiros para o Governo no desempenho de algumas políticas, tais como a construção de estradas rurais, em conjunto com iniciativas de desenvolvimento liderado pela comunidade. xv Alavancar o impacto das famílias e indivíduos 13. Os Guineenses não são apenas os beneficiários do crescimento partilhado - eles são os impulsionadores. Os Guineenses são empreendedores e trabalhadores, em outras palavras, os agentes do mercado; eles são também os cidadãos que podem responsabilizar o Governo. O apoio aos cidadãos além das políticas que libertem as forças do mercado irá fazê-los assumir responsabilidades e apropriar-se da agenda para o crescimento, redução da pobreza e melhor governação. O alavancamento do apoio da Diáspora através de redes familiares, mas também através do apoio aos pobres - que frequentemente não têm familiares no estrangeiro - através de transferências monetárias, poderia fortalecer a contribuição que os próprios Guineenses podem efectuar para impulsionar o crescimento partilhado. 14. As remessas e os programas de assistência social podem ser transformacionais na Guiné-Bissau. O capítulo 6 explora o efeito que estas formas de transferências públicas ou privadas podem ter no crescimento. As remessas são amplas na Guiné-Bissau e podem ajudar a impulsionar o consumo e harmonizar os choques no rendimento. As remessas são também uma fonte alternativa de financiamento de capital de risco, especialmente onde a informalidade é elevada, como na Guiné-Bissau. A informalidade é um dissuasor para os bancos mas a confiança familiar pode até certa medida substituir as formas formais de aplicação de contratos. A atracção de remessas ao estimular que mais organizações de transferências monetárias (OTMs) entrem no mercado, através da promoção de mais canais de transferência através de melhores sistemas de telecomunicações, mas também através do contacto com a Diáspora, pode maximizar o impacto das remessas no crescimento. Tal como as remessas, os programas de assistência social, incluindo transferências monetárias, podem também ter efeitos no crescimento local do rendimento, desde que apontem explicitamente aos membros mais pobres da sociedade. Tais programas podem impulsionar o crescimento ao encorajar a formação de capital físico e humano, ganhos de produtividade, e efeitos multiplicadores para a economia local. Os programas de assistência social requerem o desenho de um sistema efectivo de segmentação e, novamente, estabelecimento de contas bancárias para os pobres, assim como investimentos em telecomunicações e transferências móveis para os receptores. Alavancar a riqueza dos recursos naturais 15. A Guiné-Bissau é rica em recursos naturais renováveis e não renováveis que podem apoiar o crescimento partilhado. A sociedade Guineense é predominantemente rural, dominada pela produção de caju. O país tem também um potencial considerável de arroz, pescas, horticultura, madeira, e outras áreas. A mineração é um sector emergente na Guiné-Bissau mas o país tem também depósitos consideráveis de fosfatos e bauxite, assim como de petróleo. Quase todo o emprego na Guiné-Bissau depende dos activos naturais e das licenças tanto para recursos renováveis como não renováveis - pescas e mineração - que podem resultar num fluxo considerável de receitas para o Governo. Os recursos naturais são por isso uma das chaves para a prosperidade partilhada uma vez que facilitam o emprego e providenciam ao Governo receitas para financiar o seu orçamento - incluindo as políticas sugeridas neste CEM. 16. É fundamental suster e investir de forma prudente na riqueza dos recursos naturais. O capítulo 7 demonstra que os recursos naturais da Guiné-Bissau são amplos. No entanto a riqueza do país está a decrescer uma vez que os recursos naturais são utilizados através de práticas insustentáveis, tais como técnicas como o corte e queima na agricultura, extracção ilegal de madeira, e pesca excessiva. Os mecanismos subdesenvolvidos para partilhar a riqueza mineral vão colocar um grande problema quando estes recursos forem explorados. Este capítulo argumenta a favor de uma gestão e uso sustentáveis dos recursos naturais, investindo os lucros em xvi outras formas de capital (incluindo infra-estrutura e educação) para construir a riqueza do país como fonte de rendimento. Tendo em conta a centralidade dos recursos na Guiné-Bissau, o capítulo 7 contextualiza os seguintes capítulos que descrevem os diferentes sectores que podem arrancar os motores do crescimento. 3. Arrancar Os Motores Do Crescimento 17. A concentração em sectores de crescimento garante que as intervenções de políticas são exaustivas mas também focalizadas. A Parte I deste CEM identifica os constrangimentos chave para o crescimento, redução da pobreza, e prosperidade partilhada. Os temas amplos, especialmente as falhas de mercado e de governação, afectam todos os sectores económicos da Guiné-Bissau. A Parte II focaliza-se em sectores com maior potencial de crescimento - os motores actuais e futuros de crescimento - para elaborar em maior profundidade sobre os principais constrangimentos e realçar intervenções específicas para remover os obstáculos e apoiar o crescimento partilhado nestes sectores. É importante promover um certo grau de selectividade no caso de uma governação fraca e de capacidade limitada do Governo, isto para que se consigam dirigir e priorizar políticas públicas para as áreas com o maior impacto potencial. 18. O caju é actualmente o sector de crescimento mais importante da Guiné-Bissau. Cerca de 80 por cento da força laboral está empregue no sector, a maioria constituída por pobres, e o caju em bruto é a mais importante exportação do país. O sector é globalmente competitivo mas o valor acrescentado do caju em bruto é reduzido. O desafio será expandir para o processamento de caju que é mais lucrativo, e irá criar diversos empregos. O capítulo 8 argumenta que, aparte das intervenções de políticas identificadas no capítulo 3 - incluindo estradas e infra-estruturas portuárias, a formação da força laboral, e a melhoria do acesso ao financiamento - devem ser empreendidos esforços para atrair o IDE no sector e apoiar as comunidades na construção de instalações de pequena escala para o processamento do caju. 19. A Guiné-Bissau já foi um exportador líquido de arroz. A exportação está uma vez mais ao alcance. O capítulo 9 demonstra que o país tem uma vantagem comparativa na produção de arroz. O investimento no sector é importante para um crescimento mais amplo e diversificado. O desafio chave no sector do arroz é o investimento considerável que é necessário logo à partida para a reabilitação das plantações de arroz, que constitui uma prioridade central das políticas. No entanto, o sector é afectado por diversos outros constrangimentos, incluindo o acesso fraco ao financiamento, e estradas precárias, além de canais de comercialização débeis, escassez de serviços de extensão e de pesquisa e de disseminação das novas variedades de sementes. Estas constituem áreas importantes de políticas. Por fim, o capítulo realça que a troca directa de caju por arroz providencia um desincentivo para os agricultores trocarem para a produção de arroz. A monetização da economia através de transferências monetárias poderia permitir aos agricultores saírem da troca directa de caju por arroz e explorar outras áreas de actividades económica - incluindo produção de arroz. 20. As pescas providenciam receitas para o Governo através de licenças de pesca. No entanto, o sector tem também um potencial de emprego. As licenças de pesca correspondem actualmente a cerca de 10 a 15 por cento da receita do Governo. A melhoria dos acordos de pesca com blocos comerciais como a União Europeia poderia de factor aumentar este montante, providenciando recursos valiosos para o Governo implementar políticas públicas. A Guiné-Bissau não é uma nação tradicional de pescadores. As águas da Guiné-Bissau têm um potencial de pescas considerável que poderia ser aproveitado por partes mais amplas da força laboral. O capítulo 10 argumenta que para que as pescas atinjam o potencial pleno, tanto em termos de emprego como de receita, será vital alcançar a sustentabilidade dos stocks de peixes e xvii desenvolver um quadro forte de governação do sector para evitar a pesca excessiva e encorajar o emprego. 21. A mineração e o petróleo são fontes potenciais de receita para o Governo mas também podem gerar emprego para as comunidades locais. O capítulo 11 nota o potencial particular da extracção de fosfatos, bauxite, areias minerais, ouro e petróleo. O sistema legal e institucional encontra-se amplamente adequado e os novos investidores já demonstraram interesse. O desenvolvimento local poderia ser aumentado se as comunidades locais providenciassem serviços às minas; por outro lado, a protecção da subsistência das comunidades locais também implica que as companhias de mineração respeitem as leis que preservem o ambiente. O capítulo 11 argumenta que os recursos naturais devem ser utilizados para construir a riqueza total do país, incluindo capital humano e físico, capital intangível, tal como governação, mas também apoiar o orçamento para financiar programas de assistência social, tais como transferências monetárias ou programas de obras públicas. Tendo em conta um ambiente de governação que já e débil, será também importante salvaguardar e tomar medidas contra um potencial cenário de “Mal Holandês” (Dutch Curse), onde as receitas dos recursos naturais tendem a minar ainda mais as instituições. Adicionalmente, e para evitar uma apreciação da taxa de câmbio real, parte da riqueza de recursos pode ser poupada para evitar uma perda de competitividade externa em outros sectores económicos evitando assim o “Mal Holandês”. 22. A Guiné-Bissau tem um potencial considerável para o turismo devido à sua biodiversidade vasta e bem conservada. A estabilidade política deverá ser uma pré-condição chave para os fluxos de turismo aumentarem consideravelmente; no entanto, já é possível observar um sector de turismo emergente. Tendo em conta que o ambiente é de importância primordial para a Guiné-Bissau, a manutenção da biodiversidade é essencial, conforme o capítulo 7 argumenta. As diversas formas de ecoturismo são compatíveis com a estabilidade ambiental. O capítulo 12 destaca que o Governo da Guiné-Bissau já tem uma experiência forte de governação das suas áreas protegidas: é uma área que providencia razões para optimismo e que pode liderar o caminho para estender a boa governação e oportunidades económicas para outros sectores da Guiné-Bissau. xviii CAPÍTULO 1: DESAFIOS DE DESENVOLVIMENTO NA GUINÉ-BISSAU E A ARGUMENTAÇÃO PARA UMA AGENDA DE RETOMA 1. INTRODUÇÃO 1.1 A Guiné-Bissau é um pequeno país pobre de 1,6 milhões de pessoas mas com um potencial de desenvolvimento largamente inexplorado. Em 1974, as colónias portuguesas da Guiné-Bissau e Cabo Verde alcançaram a independência na sequência de uma luta de libertação que durou quase 20 anos. O conflito situou-se entre os mais longos e sangrentos das guerras de independência de África. Em 1981, a Guiné-Bissau e Cabo Verde dividiram-se, na sequência do primeiro golpe militar da história da Guiné-Bissau, e que removeu Luís Cabral da Presidência. Desde então, a trajectória de desenvolvimento dos dois países não poderia ter sido mais distinta. Partindo de um nível relativamente semelhante de Produto Nacional Bruto (PNB) per capita (em termos de paridade de poder de compra), Cabo Verde é hoje quatro vezes mais rico do que a Guiné-Bissau (Figura 1). Embora Cabo Verde tenha graduado na lista das Nações Unidas de Países Menos Desenvolvidos (PMD) em 2007, a Guiné-Bissau permanece um dos países mais pobres do mundo, com um Produto Nacional Bruto per capita de US$ 590 (método Atlas). Figura 1: Trajectórias distintas de crescimento de Cabo Verde e Guiné-Bissau Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial (WDI), 2014, e staff do Banco Mundial. 1.2 Em diversas ocasiões, as esperanças dos Guineenses para o início de um futuro mais próspero foram cortadas pela força. O último golpe militar ocorreu em 2012. Na sequência da independência e correspondente separação nacional, tanto Cabo Verde como a Guiné-Bissau iniciaram uma abertura democrática nos anos 90, que coincidiu com uma descolagem económica. Na Guiné-Bissau, no entanto, o crescimento abrandou subitamente em 1998 quando a Guerra Civil despoletou. Embora a paz tenha regressado à Guiné-Bissau em 1999, o dinamismo económico não voltou. A fragilidade continua a marcar o contexto da Guiné-Bissau. O Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2011 define a fragilidade como um período em que “os Estados e a instituições não têm a capacidade, responsabilidade, ou legitimidade para mediar as relações 19 entre grupos de cidadãos e entre os cidadãos e o Estado, tornando-os vulneráveis à violência”. De facto, os assassinatos políticos e as numerosas tentativas para derrubar o Governo são o testamento de um ambiente político frágil no qual a actividade económica luta para se assumir e o fornecimento de serviços públicos não cobre os mínimos necessários. Em 2009 iniciou-se um período de relativa calma iniciou com na sequência do assassinato de um dos líderes da Guiné- Bissau, Nino Vieira. Apesar de alguns incidentes ocasionais na sequência deste evento, o país passou por um período de rara estabilidade e ressurgência económica. No entanto uma outra intervenção por parte do Exército durante a segunda volta das eleições presidenciais em Abril 2012 acalmou o optimismo mais uma vez e descarrilou o período de progresso cauteloso. 1.3 Com as eleições realizadas com sucesso em 2014 e que terminaram o último período de transição, emerge uma outra oportunidade para realizar um novo começo e virar a página sobre o crescimento anémico e elevada pobreza. A magnitude dos desafios de política que o novo Governo enfrenta não pode ser subestimada. No entanto, ao construir na base dos feitos do período de relativa estabilidade entre 2009 e 2012, a retoma do progresso é possível para benefício de todos os Guineenses e em particular para os 1,3 milhões de cidadãos que subsistem com menos de US$ 2 por dia. Os parceiros da Guiné-Bissau encontram-se também preparados para apoiar este esforço. Em concordância com o objectivo duplo do Grupo do Banco Mundial, este Memorando Económico do País (CEM) providencia uma análise económica dos constrangimentos para a redução da pobreza e para impulsionar a prosperidade partilhada na Guiné-Bissau, e providencia recomendações de política que podem apoiar o Governo a criar as condições para um melhor futuro. “Terra ranca” é o mote que os Guineenses utilizam para mencionar num novo começo. 1.4 Este CEM argumenta que a agenda de retoma pode ser o catalisador para o crescimento partilhado na Guiné-Bissau. O CEM mantém que as instituições públicas fracas e um sector privado débil reforçam-se mutuamente, afectando assim as perspectivas para a actividade económica e redução da pobreza. As intervenções de política podem enfrentar de forma simultânea uma série de constrangimentos vinculativos para quebrar o ciclo vicioso da fragilidade e pobreza. O remanescente deste capítulo irá providenciar um resumo dos desafios de desenvolvimento na Parte I e introduzir a lógica do argumento para a agenda de retoma na Parte II. PARTE I: RESUMO ECONÓMICO, POLÍTICO E SOCIAL 2. O CONTEXTO ECONÓMICO 1.5 A Guiné-Bissau é uma economia rural, quase inteiramente dependente de uma única colheita: caju. As castanhas de caju são também a principal exportação, correspondendo a cerca de 85 a 99 por cento do total de exportações do país. A vasta maioria da colheita de caju é produzida por pequenos agricultores, e virtualmente todos os pequenos agricultores estão envolvidos no cultivo de pelo menos algum caju, sublinhando-se a forte ligação entre os rendimentos e os movimentos dos preços agrícolas ou níveis de produção, especialmente para os pobres. 1.6 O crescimento ao longo dos últimos 10 anos tem sido reduzido, com uma média de 3,1 por cento. Este desempenho situa-se ligeiramente acima da metade do desempenho de crescimento da África Subsaariana, que atingiu uma média de 5 por cento. A economia é dominada por agricultura, que inclui cultivo de caju mas também outras actividades, incluindo uma produção limitada de arroz e horticultura. De facto, o principal produto de alimentação é o arroz e, por algum tempo, este foi até um produto de exportação da Guiné-Bissau. Desde meados. 20 Figura 2: A agricultura tem sido uma grande Figura 3: O sector primário domina a produção impulsionadora do crescimento económica (crescimento real do PIB e respectivas contribuições (percentagem do PIB nominal em 2013) sectoriais) 10 Serviços Sector Primário Indústria e outras secundárias 8 Agricultura e outras primárias Agricultura, pesca e silvicultura Crescimento real do PIB Sector Secundário 6 Indústria (incl. água electricidade) 4 Construção 2 Sector Terciário (serviços) Comércio, restaurantes e hotéis 0 Administração pública -2 Transportes e comunicações Bancos, seguros e outros serviços -4 2004 2006 2008 2010 2012 2014e -10 10 30 50 Fonte: INEC, FMI e Banco Mundial. Fonte: INEC, FMI e Banco Mundial. Nota: Contribuições para o PIB (barras); crescimento real do PIB (linhas). Figura 4: A vasta maioria do Guineenses está Figura 5: A Guiné-Bissau tem beneficiado de um empregue na agricultura dividendo demográfico, mas os ganhos de (percentagem de emprego agrícola no emprego total) produtividade têm sido fracos (PIB per capita e componentes contributivos) 2001-2003 2004-2006 2007-2009 2010-2012 90 0.5 70 50 -0.5 Share of working age pop. in total pop. Employment rate 30 -1.5 Aggregate labor productivity GDP per capita 10 -2.5 Guiné-Bissau África Ocidental África Mundo -10 Subsaariana Fonte: Estimativas do Banco Mundial para a Guiné- Fonte: WEO, WDI e cálculos do staff do Banco Bissau, indicadores WDI para outros, utilizando os Mundial. últimos números disponíveis. Nota: O crescimento do PIB real per capita é decomposto em crescimento dos seguintes componentes: Produtividade agregada do trabalho (ou PIB real por pessoa empregue), a taxa de emprego (pessoas empregues como parte da população activa), e a parte da população activa na população total. 21 da década de 90, todavia, os preços favoráveis do caju levaram muitos agricultores a desconsiderar o arroz, e os requisitos de trabalho mais intensivos associados, a favor do caju. O arroz ainda corresponde a cerca de dois terços da produção de cereais no país e a três quartos do consumo. No entanto, todo o arroz é consumido domesticamente e as exportações de arroz estagnaram. Diversas famílias envolvem-se em agricultura de subsistência, incluindo a colheita de arroz. As pescas são relativamente subdesenvolvidas na Guiné-Bissau. A agricultura e outras actividades do sector primário correspondem a mais de 40 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) (Figura 2), que é valor elevado de acordo com standards regionais. Devido a uma porção significativa da agricultura no PIB, o sector tem sido também um driver do crescimento, e é a principal fonte de emprego na Guiné-Bissau, empregando cerca de 80 por cento dos trabalhadores (Figura 3 e Figura 4). 1.7 O crescimento reduzido da produtividade e o crescimento moderado da população têm contribuído para ganhos modestos no PIB per capita, embora o país tenha beneficiado de um dividendo demográfico. A Guiné-Bissau ainda terá de viver uma revolução verde como aquelas que motivaram o desenvolvimento em outras regiões - notavelmente no Leste Asiático - e consequentemente os ganhos de produtividade na agricultura, o motor económico do país, têm sido moderados (Figura 5). O comércio, outro grande sector da Guiné-Bissau, tende a ser de pequena escala e com pouco potencial para ganhos de produtividade. Embora o crescimento da produtividade tenha sido relativamente reduzido e frágil, a estrutura demográfica do país resultou num dividendo demográfico modesto uma vez que população activa cresceu, em relação aos dependentes. No entanto, com uma média de 2,2 por cento, o crescimento populacional geral ao longo dos últimos 10 anos tem sido apenas 0,9 pontos percentuais abaixo da média do crescimento do PIB, e assim o PIB per capita tem apenas crescido em cerca de 0,4 por cento, uma taxa que é sintomática de uma economia em estagnação. 1.8 A balança de pagamentos é Figura 6: Os preços do caju são um forte determinante da dominada por exportações de caju, conta corrente e também afectam a inflação e as importações especialmente por (mudança em percentagem anual) alimentos e combustíveis. Outros Preços do caju, crescimento em USD (LHS) influxos incluem volumes Saldo da balança de conta corrente antes de donativos, % do PIB (RHS) 50 Inflação (LHS) 15 consideráveis de remessas e apoio dos doadores. A economia é aberta, 40 10 com as exportações e importações por 30 via terreste e marítima a 5 corresponderem a mais de 70 por 20 cento do PIB; no entanto, a abertura 10 0 do lado das importações reflecte o 0 -5 nível de necessidades assim como as políticas empreendidas. A Guiné- -10 -10 Bissau tem uma grande exportação, -20 castanha de caju, e um grande destino, -15 Índia, onde as castanhas em bruto são -30 processadas para consumo local e -40 -20 reexportadas para outros mercados 2003 2005 2007 2009 2011 2013 Asiáticos e/ou de mercados Fontes: WDI, FMI e cálculos do staff do Banco Mundial. 22 desenvolvidos.2 As receitas de exportação, em conjunto com as remessas (estimadas entre 7 a 8 por cento do PIB em anos recentes) e fluxos de doadores, permitem à Guiné-Bissau importar combustíveis e alimentos - os dois equivalem a cerca de 60 por cento das importações totais, embora uma parte tenha variado consideravelmente com as recentes variações nos preços mundiais tanto do petróleo e trigos - assim como materiais de construção (e.g., cimentos) e bens manufacturados, especialmente carros. 3 O Investimento Directo Estrangeiro tem sido relativamente reduzido, situado em cerca de 2 por cento do PIB ao longo dos últimos 10 anos. 1.9 Os padrões de comércio relevam a vulnerabilidade dupla a desenvolvimentos externos: uma elevada dependência de uma única exportação, e uma susceptibilidade elevada a choques de preços internacionais. Do lado das exportações, os termos de troca da Guiné-Bissau são dominados pelos preços do caju. Os choques nos preços do caju (os choque em termos de quantidade são mais raros) têm um efeito considerável na balança corrente (Figura 6). Tendo em conta que a maioria da população está empregue no sector do caju, tais choques têm um efeito considerável na inflação, uma vez que receitas mais elevadas do caju colocam pressão nos preços locais. Adicionalmente, os choques de termos de troca traduzem-se rapidamente no aumento do nível de pobreza e de insegurança alimentar; no caso de um choque adverso, os agricultores pobres lutam para conseguirem juntar os recursos necessários - através de dinheiro ou troca directa - para adquirirem arroz. A falta de diversificação das exportações é um risco grande para a Guiné-Bissau e para os pobres em particular. 1.10 A inflação tem sido relativamente reduzida, particularmente devido à filiação da Guiné-Bissau na zona do Franco CFA. Ao entrar na União Monetária e Económica da África Ocidental (UEMOA) e na zona do CFAF, as autoridades da Guiné-Bissau adoptaram efectivamente um conjunto de instituições modernas para conduzir a política monetária e de taxa de câmbio. No centro encontra-se o Banco Central dos Estados da África Ocidental (BCEAO, Banque Centrale des Etats de l’Afrique de l’Ouest, acrónimo em Francês), que tem um historial extenso de implementar uma política monetária cautelosa a nível regional focada particularmente em manter a consistência do acordo de paridade (peg) com o Euro. Neste contexto, o financiamento monetário do défice orçamental não é uma opção para a Guiné-Bissau. Como resultado, na Zona CFAF e na Guiné-Bissau, tem-se registado uma inflação reduzida e estável, embora a Guiné-Bissau permaneça vulnerável à inflação importada. Ser membro da união monetária também significa que a competitividade externa não pode ser expandida através de políticas cambiais. O aumento da produtividade é por isso a chave para impulsionar a competitividade e os salários reais. 1.11 A gestão da política orçamental tem sido desigual no passado. Na sequência do final do conflito armado de 1998-1999, as tentativas de estabilização do início dos primeiros anos da década de 2000 falharam tendo em conta o contexto de instabilidade política e fraquezas estruturais severas na gestão orçamental. As receitas públicas foram reduzidas e variáveis - em parte devido ao forte peso e variabilidade dos pagamentos ao abrigo do acordo de pescas com a UE - onde as licenças de pesca correspondem a cerca de 16 por cento da receita doméstica. O controlo das despesas era fraco, e a política de despesas era, em alguns anos, inconsistente com a 2 São também exportados volumes significativos de peixe das águas da Guiné-Bissau, embora as exportações de peixe não apareçam nas estatísticas de exportação. Os navios da UE têm direitos de pesca com a Guiné-Bissau, pagos através de um acordo de pescas da UE, com as receitas a serem classificadas como transferências no balanço das estatísticas de pagamento, e da receita do governo. De facto, conforme discutido no capítulo 6, estas taxas constituem a principal fonte de receitas de recursos de pesca do país. 3 Conforme documentado na Revisão da Gestão da Despesa Pública e Responsabilidade Financeira (PEMFAR) de 2009, a volatilidade nos fluxos de doadores constitui uma terceira fonte de vulnerabilidade externa, não obstante o seu nível elevado. 23 manutenção da estabilidade - como por exemplo em 2000 e 2003 quando foram concedidos aumentos generalizados dos salários públicos apesar da falta de recursos para os pagar. 1.12 Foram realizados progressos significativo na estabilização orçamental durante 2009- 11, apoiados por uma iniciativa de redução da dívida. As políticas orçamentais prudentes permitiram à Guiné-Bissau suportar os efeitos da crise financeira global de 2007/2008 e dos anos subsequentes relativamente bem. Em 2009, o desempenho forte das receitas e o apoio orçamental elevado, em conjunto com o controlo rigoroso da despesa primária, levaram ao primeiro excedente orçamental de uma década, equivalente a uns impressionantes 3 por cento do PIB. Este rácio de despesa corrente em relação à receita interna caiu de 151 por cento em 2008 para 107 por cento em 2011, e o rácio de salários em relação à receita doméstica de 60 por cento para 45 por cento nos mesmos anos. Entretanto, o apoio dos doadores permitiu a subida do investimento público de 6,5 por cento do PIB em 2008 para 9 por cento em 2011. Num período de instabilidade sem precedentes e desempenho relativamente correcto de políticas, a Guiné-Bissau teve acesso ao alívio de dívida sob a política de Países Pobres Altamente Endividados (HIPC) em 2010 e sob a Iniciativa Multilateral para o Alívio da Dívida (MDRI) em Maio de 2011, embora o abate da dívida tenha iniciado mais cedo para apoiar o bom desempenho orçamental do Governo. Entre 2005 - o pico da dívida pública em relação ao PIB - e 2011, a dívida pública caiu de 228 por cento para 39 por cento do PIB, reduzindo o peso da dívida de forma significativa. 3. DESENVOLVIMENTO ECONÓMICOS RECENTES: 1.13 No seguimento do golpe militar de 2011, o PIB colapsou e poderá retomar o crescimento somente em 2014, no seguimento do regresso com sucesso à democracia. Tendo crescido cerca de 9,0 por cento em 2011, o PIB decresceu em 2,2 por cento em 2011 e não recuperou desde então. Em 2013, estima-se que o PIB tenha crescido cerca de 0,3 por cento. Podem ser identificados dois canais principais para o efeito do golpe no desempenho económico: um através da retirada do financiamento dos doadores e outro através de opções políticas domésticas. 1.14 A maioria dos doadores retirou de forma imediata o respectivo apoio financeiro na sequência do golpe. A comunidade internacional condenou de forma veemente a intervenção militar e reagiu através da suspensão das suas actividades. A Guiné-Bissau tem um dos rácios mais reduzidos de receita em termos de PIB no mundo e é altamente dependente de Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD). Os donativos oficiais caíram praticamente para metade entre 2011 e 2013, de 6,6 por cento do PIB para apenas 3,7 por cento. Neste contexto, as despesas registaram também um corte. A despesa de capital, que era financiada quase na íntegra por doadores, caiu 80,4 por cento em 2012, mas as despesas correntes tiveram também de ser cortadas, caindo em 20,1 por cento em 2013. O défice geral foi financiado ao utilizar os recursos do tesouro no Banco Central, através de apoio financeiro de doadores não tradicionais (geralmente em termos não concessionais), e com a acumulação de atrasos nos pagamentos. Assim que o período de transição terminou, o Banco Mundial entrou para providenciar apoio temporário através do financiamento de salários nos sectores da educação e saúde, aliviando alguma da pressão sob o orçamento. No entanto a situação orçamental continuou precária e as greves dos trabalhadores do sector público continuam a ocorrer frequentemente. 1.15 Os efeitos de replicação em outros sectores têm acrescentado às dificuldades económicas. A falta de apoio dos doadores e o reduzido investimento associado afectaram de forma negativa sectores como a construção e a energia. A situação de energia no país é desesperada e a deterioração na provisão de electricidade enfraqueceu ainda mais a actividade económica. De forma similar, a falta de energia afectou a provisão de água da rede - especialmente na cidade capital, Bissau - colocando sérios riscos à saúde pública, a somar ao 24 efeito nocivo nas empresas. No sector financeiro, surgiram fraquezas consideráveis uma vez que os bancos que haviam providenciado financiamento para os comerciantes de caju foram expostos a colheitas desapontantes. O crédito malparado aumentou, o crédito aos comerciantes abrandou, e o círculo vicioso iniciou, minando o sucesso da campanha de caju, mesmo quando os preços internacionais do caju atingiram outro pico em 2014. 1.16 Os erros de política têm agravado uma situação já por si só precária. Em 2011, quando os preços do caju eram particularmente elevados, o Governo decidiu apoiar o sector privado na tentativa de entrar no processamento de caju, que providenciava mais valor acrescentado do que a exportação em bruto, assim como outras actividades do agro-negócio, através de uma sobretaxa nas exportações de caju. No entanto, isto levou a uma série de consequências não desejadas, uma vez que o ambiente fraco de governação do fundo alimentado por esta sobretaxa - denominado FUNPI (Fundo para a Promoção da Industrialização dos Produtos Agrícolas) - resultou em mau uso dos recursos, além de acrescentar mais uma barreira na estrutura de preços. Os exportadores de caju recusaram-se a pagar a sobretaxa FUNPI e as disputas em torno da questão resultaram em disrupções sérias das campanhas de caju de 2012 e 2013, e - conforme sugerem as primeiras indicações - 2014. O fardo acrescido em temos de preço tem tido um efeito negativo nos agricultores pobres, que têm o poder negocial mais reduzido e por isso carregam a maioria da carga do custo. O FUNPI prejudicou também o orçamento, parcialmente através do efeito disruptivo na campanha de caju mas também através do estímulo ao contrabando de caju em bruto. O contrabando leva à perca de receita tributária e taxas portuárias e de transporte. Em 2013 as estimativas de contrabando situaram-se em aproximadamente 65.000 toneladas, o que significaria perder cerca de US$ 6 milhões em receitas tributárias e US$ 600.000 em taxas portuárias e de transporte. 1.17 Os efeitos nos agricultores têm sido devastadores. As campanhas fracas de caju atingiram de forma desproporcionada os pobres uma vez que os preços agrícolas têm vido a decrescer (em 59 por cento somente em 2013). Os termos de troca entre o caju e o arroz também deterioraram. Com a queda dos preços agrícolas, 1 kg de arroz foi trocado por 3 kg de castanha de caju em 2013, uma apreciação face à taxa de câmbio 1:1 registada em 2011. Consequentemente, a insegurança alimentar aumentou. Um inquérito sobre a segurança alimentar conduzido por parte do Programa Alimentar Mundial (WFP) descobriu que a percentagem de população rural que enfrenta insegurança alimentar severa aumentou de 20 por cento em 2011 para 40 por cento em 2013 (ou 260.000 pessoas). 1.18 Em 2014, a economia poderá começar a recuperar. Por um lado, isto poderá ser devido ao regresso dos doadores no seguimento das eleições gerais de sucesso. Todos os grandes doadores estão a reatar as relações com a Guiné-Bissau e a suspensão do país por parte da União Africana foi levantada. Espera-se que o défice orçamental estimado em 9% do PIB em meados de 2014 seja financiado com o apoio do Banco Mundial (através do pagamento dos salários dos professores e trabalhadores da saúde) e outras entidades multilaterais, nomeadamente a União Europeia, e parceiros bilaterais, incluindo um aumento do apoio financeiro de Timor- Leste. O FMI encontra-se em vias de aprovar um Instrumento de Crédito Rápido (Rapid Credit Facility) e os bancos comerciais regionais e locais, com fé renovada no Governo democrático da Guiné-Bissau, adquiriram obrigações governamentais na ordem dos 15 mil milhões de CFAF, para apoiar no pagamento dos salários e redução dos atrasados. A recuperação das finanças públicas irá apoiar o crescimento ao reestabelecer um Governo operacional e relançar uma agenda de investimentos públicos. 1.19 A campanha de caju de 2014 foi melhor do que a de 2013. Ajustando à sazonalidade, as estimativas recentes sugerem que o volume de exportações de caju permanece relativamente estagnado. Isto deve-se em parte à sobretaxa FUNPI, contrabando, mas também potencialmente devido a um aumento na exportação ilegal de madeira que bloqueou o acesso ao porto para as 25 exportações de caju. No entanto, o aumento dos preços internacionais sugere que o resultado de 2014 registou uma melhoria modesta face a anos anteriores. A estimativa para o crescimento económico real de 2014 situa-se então em cerca de 2,5 por cento, com uma aceleração modesta para cerca de 4 por cento prevista para 2015. O restauro de um quadro macro-orçamental estável, incluindo a recuperação da receita e a melhoria do crescimento, será vital, conforme reconhecido no Programa de Estabilização e Crescimento de 2014 do Governo. As condições são relativamente favoráveis, na ausência de turbulências políticas adicionais. As recomendações deste CEM podem contribuir para a retoma económica e orçamental, e consequentemente para a redução da pobreza. 4. POBREZA NA GUINÉ-BISSAU 1.18 Os níveis de pobreza na Guiné- Figura 7: A pobreza e pobreza extrema são elevadas Bissau são elevados. Em 2010, cerca de 70 e estão em crescendo por cento dos Guineenses situavam-se (percentagem da população a viver abaixo da linha da pobreza) abaixo da linha de US$ 2 por dia (Figura 7). Cerca de 33 por cento dos Guineenses 80 Poverty sobreviviam com US$ 1 por dia - um Extreme Poverty 70 aumento considerável dos 21 por cento estimados em 2002. Estas são estimativas 60 para as linhas de pobreza nacional e de 50 extrema pobreza. Utilizando a linha de pobreza de US$1,25 por dia em termos de 40 paridade de poder de compra, a incidência de pobreza em 2010 era de cerca de 50 por 30 cento. 4 As estimativas brutas para 2013 20 sugerem que a pobreza extrema (utilizando a definição nacional) aumentou ainda mais 10 para níveis superiores a 40 por cento.5 0 2002 2010 2013 1.19 A pobreza é relativamente mais reduzida na capital, Bissau, do que no Fontes: INEC e Banco Mundial. resto do país. A capital Bissau concentra Nota: 2013 é uma estimativa da WFP. cerca de 40 por cento da população e é a área com densidade populacional mais elevada (Figura 8), com base em dados de 2009. A incidência de pobreza na Guiné-Bissau é em certa medida mais reduzida do que a média nacional, com cerca de 50% dos residentes a viverem com menos do que US$ 2 dólares por dia (Figura 9). O restante da população está concentrada no Norte do país, e uma vez que a incidência de pobreza rural é mais elevada, é aqui que uma proporção considerável dos pobres da Guiné-Bissau vivem. Nas áreas rurais, o Guineenses geralmente vivem da terra, cultivando caju. Embora o arroz seja cultivado por muitas famílias, principalmente para o autoconsumo, e os agricultores de arroz e de caju tendem a ser igualmente pobres. 4 Utilizando a definição do Grupo do Banco Mundial de pobreza extrema de US$ 1,25 por dia em termos de paridade de poder de compra, na Guiné-Bissau, aumentar os rendimentos dos 40 por cento menos favorecidos e acabar com a pobreza extrema são quase equivalentes uma vez que mais de 50 por cento dos Guineenses são extremamente pobres. 5 Esta conclusão é baseada num inquérito rápido apoiado pelo WFP e em 2013 e os dados podem não ser completamente comparáveis com os dados de 2002 e 2010. Esta conclusão deverá ser considerada indicativa, tendo em conta a ressalva em termos de comparabilidade. 26 Tabela 1: Indicadores económicos seleccionados 2011 2012 2013 2014p 2015p 2016p (mudança em percentagem anual estimada, excepto quando indicado em contrário) Contas nacionais e preços PIB real a preços de mercado 9,0 -2,2 0,3 2,5 4,0 3,7 PIB real per capita 6,5 -4,4 -1,9 0,3 1,7 1,4 Deflator do PIB 13,8 -3,9 -3,4 3,7 2,8 2,2 Índice de preços do consumidor (média anual) 5,1 2,1 0,8 -0,8 3,3 2,3 Sector Externo Exportações f.o.b (baseado em valores US$) 118,0 -39,5 5,1 14,8 4,9 3,3 Importações f.o.b (baseado em valores US$) 22,1 -24,4 1,2 26,2 4,2 6,1 Volume de exportações 34,3 -16,5 33,0 -9,3 4,9 3,3 Volume de importações 6,0 -25,9 2,0 30,9 7,4 6,7 Termos de trocas (deterioração = -) 47,1 -29,6 -20,2 30,2 3,0 0,6 Taxa de câmbio efectiva real (depreciação = -) -4,7 4,9 -7,6 … … … Taxa de câmbio nominal (CFAF por US$; média) 471,4 510,2 493,9 … … … Finanças Governamentais Receita Doméstica (excluindo donativos) 16,3 -12,5 -10,6 39,5 -0,6 10,2 Despesa Total 9,4 -26,3 -2,1 58,2 -3,3 4,5 Despesa Corrente 14,6 8,6 -20,1 58,6 -6,8 4,6 Despesa de Capital 2,1 -80,4 152,9 57,1 6,5 4,2 Dinheiro e crédito Activos líquidos domésticos1 18,2 14,0 8,4 -1,1 7,3 7,9 Crédito ao Governo (líquido) -4,5 16,8 0,2 8,2 0,0 0,0 Crédito à economia 12,9 7,9 1,4 2,2 2,4 4,2 Velocidade (PIB/massa monetária ampla) 3,0 3,0 2,5 2,5 2,4 2,4 (percentagem do PIB, excepto quando indicado em contrário) Investimentos e poupança Investimento bruto 5,3 7,1 7,1 7,1 7,1 7,1 Dos quais: investimento do Governo 2,6 1,9 1,9 1,9 1,9 1,9 Poupança interna bruta 1,3 -2,7 -2,7 -2,7 -2,7 -2,7 Das quais: poupança do Governo -5,5 -2,9 -3,8 -8,0 -6,8 -6,1 Poupança nacional bruta 5,4 1,4 2,5 9,7 6,4 5,7 Finanças Governamentais Receita Orçamental 10,1 9,4 8,7 11,4 10,6 11,0 Despesa primária doméstica total 11,2 12,8 10,4 15,3 18,4 13,3 Saldo primário doméstico -1,1 -3,4 -1,7 -3,9 -7,8 -2,3 Saldo geral (base compromisso) Incluindo donativos -1,4 -2,3 -1,9 -1,8 -3,5 -2,8 Excluindo donativos -8,0 -4,8 -5,7 -10,0 -8,7 -8,0 Conta corrente externa (incluindo transferências -0,2 -4,7 -4,1 -0,4 -3,9 -4,5 correntes oficiais) Excluindo transferências oficiais -3,3 -6,6 -4,9 -6,7 -6,8 -7,4 Memorandum items PIB nominal a preços de mercado (mil milhões de 520,8 489,5 474,7 504,5 539,5 571,8 CFAF) Fontes: Autoridades da Guiné-Bissau; estimativas e projecções (p) do staff do FMI. 1 Contribuição para o crescimento da massa monetária em percentagem. 27 1.20 A maioria dos segmentos da economia são informais. Dos 20 por cento da força laboral que não estão empregues na agricultura, a maioria está empregue em serviços, e maioritariamente em pequenas actividades informais com microempresas ou de auto-emprego, no comércio e nos transportes. Apenas uma pequena fracção da força laboral - cerca de 10 por cento - representa trabalho assalariado, metade em pequenos serviços urbanos, e metade no sector público. 1.20 A malnutrição é uma preocupação e a insegurança alimentar subiu como consequência do golpe de 2012. Os elevados níveis de pobreza traduzem-se em malnutrição. O arroz é o principal alimento e muitas famílias da Guiné-Bissau lutam para complementar a sua dieta com outros alimentos mais nutritivos. No caso das campanhas pobres de caju, a segurança alimentar torna-se uma preocupação séria, conforme verificado em 2012 e 2013 quando os doadores intervieram com ajuda alimentar uma vez que várias famílias não conseguiam reunir os recursos para adquirir arroz. Isto é pouco usual para um país como a Guiné-Bissau, que dispõe de terrenos férteis e não tem vivenciado grandes choques naturais tais como secas. O aumento do rendimento das famílias, através de campanhas de caju melhor geridas, impostos mais reduzidos sobre o caju, e diversificação para outras actividades, incluindo o cultivo de arroz, será crucial para enfrentar a ameaça crónica de insegurança alimentar. Figura 8: A população da Guiné-Bissau está concentrada em torno da cidade capital de Bissau (densidade populacional: pessoas por quilómetro quadrado, dados de 2009) Bissau Fonte: Censo da Guiné-Bissau, 2009, e cálculos do staff do Banco Mundial. 28 Figura 9: A pobreza é distribuída de forma relativamente igual na Guiné-Bissau, embora esteja relativamente concentrada no Norte a) Rácios de contagem de pobreza a $1 dia (PPP) a) Rácios de contagem de pobreza a $2 dia (PPP) Fonte: J. Montalvão., M. Hanusch, e J. Baez. 2014. ‘Mapping Poverty in Guinea-Bissau’ (draft), baseado em cálculos do staff do Banco Mundial e em dados da pobreza do Censo (2009) e ILAP II (2010). 29 1.21 Os resultados mais amplos de desenvolvimento humano são geralmente fracos na Guiné-Bissau: dos 187 países, a Guiné-Bissau classifica-se em 177 no Relatório de Desenvolvimento Humano de 2014, mantendo a classificação do ano anterior. É pouco provável que a Guiné-Bissau atinja qualquer um dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio até 2015 devido aos resultados fracos, ou mesmo deteriorações, no que respeita à pobreza, nutrição, educação primária, equidade de género, saúde, e acesso a serviços básicos. Em 2014, as preocupações acerca da difusão da epidemia de Ébola aumentaram. A Guiné- Bissau tem fronteira com a Guiné-Conacri a Oeste e Sul e Senegal a Norte. Ambos os países relataram ter casos de Ébola, embora a incidência seja consideravelmente mais elevada na Guiné- Conacri. Para proteger os seus cidadãos do contágio da doença, o Governo encerrou a fronteira com a Guiné-Conacri em Agosto de 2014. Os profissionais de saúde já avisaram que o encerramento das fronteiras pode ser contra produtivo, desviando os viajantes para travessias não oficiais nas fronteiras porosas do país e reduzindo assim a capacidade das autoridades de monitorizar o tráfego entre fronteiras para potenciais vítimas do Ébola. O débil sector de saúde da Guiné-Bissau reduz a capacidade que as autoridades têm de identificar e tratar os casos de Ébola. Até Setembro de 2014, não se confirmaram casos de Ébola na Guiné-Bissau, mas o país permanece em alerta. 1.22 O duplo desafio de redução da pobreza e da promoção da prosperidade partilhada são tão urgentes quanto intimidantes. No entanto, o novo Governo tem a oportunidade de virar a página no que toca à pobreza na Guiné-Bissau. Devido à amplitude e profundidade da pobreza, o crescimento económico mais acelerado, especialmente na agricultura, assim como a maior diversificação económica, têm o potencial de realizar uma diferença significativa, mesmo no curto a médio prazo. Não há um domínio do desenvolvimento económico, social, físico ou humano na Guiné-Bissau que não tenha as cicatrizes do difícil legado ou não constitua um obstáculo enorme no caminho em diante. A redução da pobreza e a promoção da prosperidade vão exigir investimentos consideráveis e transversais em toda a linha, conforme sublinhado neste CEM. Tendo em conta a amplitude e profundidade das reformas necessárias, o progresso não surgirá do dia para a noite. O Governo recém-eleito enfrenta uma agenda ambiciosa, mas com o equilíbrio certo de políticas e apoio dos parceiros da Guiné-Bissau, o impacto nas vidas dos mais pobres encontra-se ao alcance. 5. POLÍTICAS E INSTITUIÇÕES 1.23 Durante os tempos coloniais, formalmente no século 19 e até meados de década de 1970, a Guiné-Bissau era largamente um território negligenciado. Ao invés de outras colónias portuguesas como Cabo Verde, Angola e Moçambique, a Guiné-Bissau não era considerada adequada para a povoação em larga escala. As autoridades coloniais introduziram um sistema semelhante ao apartheid, discriminando contra os Guineenses. Os Cabo-Verdianos, originalmente Guineenses com uma herança de mistura de raças, receberam tratamento especial, e em 1930 já constituíam uma elite local e ocupavam uma série de posições importantes no Governo colonial. Outros Guineenses não tinham virtualmente nenhum acesso a cuidados de saúde, educação, serviços sociais e não podiam aceder - muito menos participar - em nenhum aspecto da administração pública. No geral, as autoridades coloniais não realizaram nenhum investimento significativo na infra-estrutura física do país, capital humano, ou instituições do Estado. Por alturas da independência em 1974, a taxa de literacia da Guiné-Bissau era de 1 por cento, e dispunha apenas de 60 quilómetros de estradas pavimentadas. 1.24 A independência foi ganha depois uma luta longa e violenta de várias décadas que terminou em 1973, bem depois da onda de independência ter varrido outros países vizinhos. Uma rebelião armada havia emergido no final dos anos 50, mas as autoridades coloniais 30 permaneceram intransigentes e o conflito violento seguiu-se. Num esforço para alcançar a soberania, a Guiné-Bissau foi um dos poucos países da África Subsaariana a conquistar a independência - declarada em 1973 e reconhecida pela comunidade internacional a 10 de Setembro de 1974 - através do conflito violento. 1.25 A organização formal que herdou o domínio político da vitória na luta pela independência foi o Partido para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Quando os Portugueses finalmente concederam a independência em 1974, a administração colonial foi removida, deixando no seu lugar uma administração com poucos recursos humanos e em que, tendo sido desenhada para a gestão dos territórios ocupados durante o conflito, os quadros militares se encontravam excessivamente representados e agora automaticamente - e fortemente - integrados nas fileiras da administração. À semelhança de muitos outros países, a liderança do partido endossou uma versão da teoria de desenvolvimento inspirada pelo socialismo através da economia do comando e controlo e um enviesamento forte a favor de sector urbanos e “modernos”. Nos anos iniciais, o Governo focou cada vez mais a sua atenção no centro urbano, ao invés das zonas rurais que eram tratadas com uma mistura de negligência política e exploração económica. A população agrícola rural, que havia sido a base de apoio do PAIGC durante a guerra, não aprovou as novas taxas impostas para financiar o desenvolvimento urbano, e quando a estrutura administrativa e de serviços do PAIGC se dissolveu gradualmente, e o Governo eventualmente deixou de ser uma força significativa fora da capital. 1.26 A complexidade e emaranhamento de assuntos políticos, étnicos e militares foi já aparente durante os anos iniciais da luta pela independência. A liderança do PAIGC era composta principalmente por Cabo-Verdianos étnicos, a primeira intelligentsia, e os lutadores de guerrilha de mato eram largamente da etnia Balanta. Subsistia um ressentimento contra a minoria dos Cabo-Verdianos devido ao seu papel na administração colonial, especialmente pelos Balanta, que representavam cerca de 30 por cento da população da Guiné-Bissau, e que verteram muito sangue na luta pela independência do país. As tensões subiram, especialmente à medida que Luís Cabral, um Cabo-Verdiano e meio irmão de Amílcar Cabral, consolidou de forma crescente o seu poder político. Em 1980, o Presidente Cabral estava em Cabo Verde a negociar uma potencial secessão da Guiné-Bissau. João Bernardo Vieira, um membro da tribo Papel aliada com a Balanta, advogou pela união do país, e provocado pela ingerência de Cabral em assuntos militares, lançou um golpe militar, removendo Cabral in absentia. 1.27 Com a corrupção a ascender e a consumir as receitas tributárias e a ajuda estrangeira, o Governo foi deixado num estado de crise financeira permanente. Esta crise financeira internacional encorajou vários ministros e ministérios a procurarem recursos de várias fontes domésticas ou de doadores, com contabilidade e responsabilidade central limitadas - uma situação que deixou uma herança que dura até este dia, apesar de algum progresso recente na frente orçamental. Sem uma estrutura administrativa efectiva, os negócios do Governo eram conduzidos através de redes pessoais, em que o clientelismo e a reciprocidade se tornaram endémicos. 1.28 A situação económica não melhorou nos anos 80 e 90, e somou-se a isto uma expansão do clientelismo, rivalidades étnicas e uma corrupção sistémica cada vez mais profunda. Numa fase inicial, o historial militar e identidade étnica de Vieira, assim como o seu encerramento do plano binacional, acalmaram os medos de elitismo e pareciam prometer uma divisão de poder mais equitativa. Vieira também cortejou os militares de forma efectiva, através de promoções que eram largamente baseadas em fidelidades pessoais: Vieira tinha tendência de se focar em oficiais Balanta, cuja promoção era mais popular do que de Cabo-Verdianos ou membros de outros grupos étnicos elevados por Cabral. Apesar do reconhecimento claro que o seu poder era contingente ao apoio dos militares, a administração de Vieira falhou repetidamente no pagamento dos salários aos soldados, e chegou mesmo a verificar-se falta de rações. 31 Sobreviveu a numerosas tentativas de golpes, alguns provavelmente fabricados, e permaneceu no poder por quase 20 anos, através de uma vitória numa eleição multipartidária que foi considerada geralmente livre e justa em 1994, e também através do apaziguamento de interesses militares importantes e eliminação célere de inimigos. Figura 10: O controlo da corrupção é fraco na Guiné-Bissau 1.29 A Guerra Civil da Guiné- (percentagem de empresas) Bissau de 1998-99 foi um conflito de 0 10 20 30 40 50 duração limitada mas de alta Incidência de subornos (percentagem intensidade, motivado por uma de empresas que viveram por pelo tentativa de golpe contra o Presidente menos um pedido de suborno) Vieira em Junho de 1998. Estima-se Profundidade de subornos (% de que tenham morrido milhares de civis transacções públicas onde foi pedida durante os episódios de luta ao longo de uma oferta ou pagamento informal) Junho-Julho entre forças do Governo, Percentagem de empresas que se apoiadas por um contingente de forças da espera virem a fazer ofertas em encontros com oficiais dos impostos Guiné e Senegalesas, e os rebeldes que saíram principalmente das fileiras do Percentagem de empresas que se exército. Na sequência da mediação da espera virem a fazer ofertas para garantir um contrato governamental Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), o conflito foi Valor estimado da oferta para Mundo rapidamente seguido por uma trégua, e garantir um contrato governamental África Subsaariana (% do valor do contrato) depois por um acordo de cessar-fogo em Guiné-Bissau Novembro de 1998. Formou-se um Fonte: Inquérito às Empresas do Banco Mundial e cálculos do Governo de União Nacional e foram staff do Banco Mundial. Nota: Dados de 2009 para a Guiné-Bissau, últimos dados convocadas novas eleições em 1999. A disponíveis para os outros. situação permaneceu indecisa e tensa, com mais um episódio de violência que terminou com a partida para exílio de Vieira em Maio de 1999. 1.30 Entre 1999 e 2009, embora a Guerra Civil já tivesse terminado, a política permaneceu em tumulto. Durante as primeiras eleições após a guerra civil, o PAIGC perdeu - pela primeira vez na sua história - para o Partido de Renovação Social (PRS). O chefe do PRS, Kumba Yalá, outro membro da etnia Balanta, venceu a eleição presidencial. Sob a sua administração, o processo de balantização étnica da política e do Estado, já fortemente entrincheirada nesta altura, acentuou-se, desta vez focada na clivagem Balanta/Mandinga. Embora Vieira tenha concentrado os seus esforços nos militares em geral, a nova administração concentrou-se na etnia Balanta enquanto base de suporte. Apesar da oposição, incluindo através de golpes, contra a tentativa da administração de avançar a agenda étnica dos Balanta ao designar diversos oficiais juniores Balantas para altas posições, o processo acabou por cimentar o domínio Balanta sob os militares. Sob a presidência de Kumba Yalá e sucessivos chefes de Estado, o caos político atingiu o seu cume, a corrupção permaneceu profundamente entrincheirada (Figura 10), e os Guineenses perderam de forma crescente a sua confiança nas instituições.6 Entre 1999 e 2009, o país viu 11 primeiros-ministros entrar e sair, assim como quatro presidentes. O último dos quais, Vieira, tendo regressado do exílio e reconquistado a presidência, foi assassinado em 2009 num acto de vingança devido ao seu alegado assassinato do chefe do Exército Tagme na Wai. 6 Em 2005, nos inquéritos de Avaliação Integrada Social e da Pobreza (IPSA), quando questionados sobre em quem é que confiavam mais, apenas 1 por cento dos Guineenses indicou o Governo ou partidos políticos e 0,3 por cento os militares. 32 1.31 O período de relativa calma que iniciou em 2009 foi interrompido por outro golpe militar em Abril de 2012. Malam Bacai Sanha ganhou a presidência em 2009 e, em conjunto com o Primeiro-ministro, Carlos Gomes Jr., supervisionou um período relativamente ordeiro em que Gomes Jr. se tornou o Primeiro-ministro mais tempo em funções desde a Guerra Civil. No entanto, a rivalidade entre as elites políticas e militares continuou, e Gomes Jr. tornou-se mais assertivo sobre o limite à influência dos militares. Quando Sanha morreu em 2012 e Gomes Jr. estava prestes a vencer a segunda volta da eleições militares, o Exército interveio e Gomes Jr. foi forçado ao exílio. 1.32 Em 2014, a Guiné-Bissau viveu as eleições discutivelmente mais livres e justas da sua história. Na sequência do golpe, as consultas havidas com todas as partes interessadas da Guiné-Bissau levaram a um acordo unânime sobre a necessidade de paz e retorno à ordem constitucional. O mapa de acção resultante procurou apontar o caminho para um retorno à ordem constitucional, culminando em eleições gerais. Com o apoio da comunidade internacional, que assistiu com os preparativos até às eleições e supervisionou-os com mais de 400 observadores, a Guiné-Bissau passou por eleições ordeiras, livres e justas em Abril, com uma segunda volta presidencial em Maio de 2014. Ambas as rondas eleitorais ocorreram sem incidentes de maior e o candidato vencido da segunda volta presidencial concedeu com dignidade e o novo Governo entrou em funções em Julho de 2014. As condições para o resumo de um período político mais calmo onde o Governo possa avançar com reformas críticas parecem relativamente boas. 6. FRAGILIDADE, INSTITUIÇÕES E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO 1.33 A fragilidade constitui o principal desafio para a redução da pobreza e estímulo à prosperidade partilhada. Os indicadores sociais demonstram que as pessoas em Estados frágeis e afectados pelo conflito (FCS) tendem a ser pobres, a não beneficiar de escolarização, e a terem falta de acesso a serviços de saúde básicos. De acordo com Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2011, a redução da pobreza nos países afectados por grande instabilidade é, na média, cerca de um ponto percentual mais lenta do que em países não afectados por violência, com as estimativas a mostrarem que, na média, os países que atravessaram grandes períodos de instabilidade têm uma taxa de pobreza 21 pontos percentuais mais elevada do que países que não têm violência. Adicionalmente, as crianças nascidas em países instáveis e frágeis têm duas vezes mais probabilidade de serem malnutridas e de terem acesso precário a fontes de água; aquelas na idade de escola primária têm três vezes mais probabilidades de não serem inscritas nas escolas; e são duas vezes mais prováveis de falecerem antes do seu quinto aniversário. As estimativas do Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2011 também demonstram que os Estados afectados pelo conflito, incluindo aqueles em recuperação do conflito e fragilidade, respondem por 70 por cento das mortes de primeira infância, 65 por cento de pessoas sem acesso a água segura, e 77 por cento de crianças não inscritas nas escolas primárias. Os Estados frágeis e de rendimento reduzido têm menos probabilidade de alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODMs), e a Guiné-Bissau não é excepção. 1.34 A fragilidade e os desafios de desenvolvimento resultantes são associados às instituições fracas. Existem fortes provas empíricas que sugerem que as instituições são chaves para o desenvolvimento. De acordo com a pesquisa inovadora de Acemoglu, Johnson, e Robinson, as instituições do mundo em desenvolvimento derivam da história colonial dos países.7 7 D. Acemoglu, S. Johnson, e J. Robinson, “The Colonial Origins of Comparative Development : An Empirical Investigation,” The American Economic Review 91(5):1369-1401 (2001); e D. Acemoglu, e J. Robinson, Why Nations Fail: The Origins of Power, Prosperity, and Poverty (Crown Publishers 2012). Provas adicionais corroboram que as instituições desempenham um papel primário no desenvolvimento, 33 Em países ondes os Europeus se estabeleceram, estes emularam as instituições europeias, fortemente baseadas nos direitos de propriedade e responsabilização e controlo do poder político, provisões que na Europa foram resultado da extracção excessiva de rendas por parte dos monarcas absolutistas. Em países onde as potências coloniais não se estabeleceram mas apenas exploraram a riqueza natural dos países - ou mesmo efectuavam comércio de escravos -, as instituições foram desenhadas somente para extrair rendas (principalmente na forma de recursos). Os Governos recém-independentes tendem a herdar a administração colonial e o sistema de extracção de rendas permanece implantado - excepto que agora beneficia as elites locais ao invés das coloniais. O facto de que Cabo Verde herdou instituições relativamente desenvolvidas dos Portugueses, que se estabeleceram e miscigenaram no arquipélago, ao invés da Guiné-Bissau, é uma das possíveis explicações para as trajectórias de desenvolvimento substancialmente diferentes dos dois países que já foram unidos. 8 Num contexto de instituições fracas, a competição por rendas pode resultar em fragilidade. Figura 11: O acesso anterior a rendas é associado a uma Figura 12: A procura de rendas (clientelismo) está incidência maior de golpes militares correlacionada com um pior desempenho económico (número de golpes e índice de controlo da corrupção) (índice de controlo da corrupção e crescimento percentual) 18 10 16 9 Número de golpes militares e GNB 14 8 Controlo da corrupção tentativas de golpes 12 7 6 10 5 8 4 6 3 4 2 2 GNB 1 0 0 0 2 4 6 8 -5 0 5 10 Controlo da corrupção Crescimento anual Fontes: Transparência Internacional, Centro para Paz Sistemática, e Fontes: Transparência Internacional, WDI e cálculos do staff cálculos do staff do Banco Mundial. do Banco Mundial utilizando os últimos dados disponíveis. Nota: O controlo da corrupção é utilizado como proxy para a dificuldade em extrair rendas. Demonstra o número de tentativas de golpes e o número de golpes com sucesso; apenas inclui países que viveram pelo menos uma tentativa de golpe. 1.35 Os golpes militares são frequentemente sintomáticos de instituições fracas, elites fragmentadas, e um nível elevado de clientelismo. Em conjunto com a Somália, a Guiné-Bissau viveu o maior número de incidências de golpes planeados e realizados no registo, apontando assim a constrangimentos institucionais graves. A função tem sido sempre associada a determinadas rendas, desde o rendimento legal associado à função, até “rendas de ego”9 (tais como o poder), até actividades menos legais (i.e. corrupção), em que as elites abusam da sua autoridade para efeitos de auto enriquecimento. Quando as elites são fragmentadas e as instituições que limitam a corrupção são fracas, a competição pode resultar em elites a combaterem-se entre si, incluindo através do uso de meios violentos, tais como golpes militares e.g., D. Rodrik, A. Subramanian, and F. Trebbi, “Institutions Rule: The Primary of Institutions of Geography and Integration in Economic Development,” Journal of Economic Growth, 9:131-165 (2004). 8 Outra razão pode ser associada à Guerra da Independência que foi travada sobretudo na Guiné-Bissau. Além da destruição física que causou, também entrincheirou o exército na política, enquanto Heróis da Revolução. Os golpes promovidos pelo Exército são uma fonte substancial de instabilidade na Guiné- Bissau. A emergência de instituições civis sólidas foi limitada pelo poder militar do Exército. 9 O termo “rendas de ego” (ego-rents) foi introduzido por Rogoff em “Equilibrium Political Budget Cycles,” American Economic Review 80:21-36 (1990). 34 (Figura 11). No entanto, a extracção de rendas e clientelismo, e especialmente a concorrência disruptiva sobre as rendas, afecta a actividade económica, explicando assim a correlação positiva entre o crescimento económico e o controlo da corrupção (Figura 12). 1.36 Na Guiné-Bissau, a competição entre elites acontece entre as elites políticas e militares, embora haja também uma dimensão étnica na tensão. As elites da Guiné-Bissau podem ser agrupadas de forma geral em grupos militares e políticos, onde os militares ainda utilizam a Guerra da Independência como fonte de legitimidade. A dimensão étnica atravessa as elites políticas de forma mais visível, ao invés que os militares são controlados de forma próxima por membros do grupo Balanta, pelo menos desde a Presidência de Kumba Yalá. Mesmo nos militares, têm ocorrido revoltas por parte de oficiais juniores, embora menos em anos recentes. As elites políticas têm sido associadas a desfalques (incluindo o mau uso dos recursos do FUNPI). Existem também relatos de que os militares têm utilizado de forma indevida a receita pública, especialmente em épocas em que o Governo não tinha fundos suficientes para pagar os salários aos soldados. Por vezes, as elites políticas e militares colaboram contra outras elites políticas. No geral as elites políticas tendem a ser mais fragmentadas do que as militares. 1.37 A competição por rendas tem-se tornado mais intensa com o intensificar do tráfico de droga internacional, que utiliza a Guiné-Bissau com ponto de transbordo. Em anos recentes, o tráfico de droga internacional entre a América Latina e a Europa Figura 13: A fragilidade e desincentivos para o exército consolidou-se na Guiné-Bissau, com esta entrar no comércio de drogas estão negativamente nação da África Ocidental a servir como correlacionados ponto de entrada a partir do qual as drogas (índice de fragilidade entre a despesa militar e o valor de cocaína traficado por soldado) são subsequentemente traficadas por terra e 20 ar. As estimativas de volume de narcóticos 18 GNB traficados são difíceis de obter. Com base em apreensões internacionais relatadas 16 pelo Escritório das Nações Unidas para a 14 Droga e Crimes (UNDC), a cocaína Fraqgilidade 12 traficada na Guiné-Bissau poderá ser 10 avaliada acima de US$ 16,9 milhões (3,4 8 por cento do PIB) em 2005 e é provável 6 A despesa que tenha aumentado consideravelmente 4 O valor da cocaína excede militar em volume desde então. Em Dezembro de a despesa militar excede o 2 valor da 2013, o Secretário-Geral Ban Ki-moon 0 cocaína informou o Conselho de Segurança das -6000 -4000 -2000 0 2000 Nações Unidades que os fluxos de cocaína Gap: (despesas militares/rastreamento de cocaína) por soldado dispararam no seguimento do golpe militar Fontes: Índice de Fragilidade Polity IV e UNODC (2011). de 2012, com centenas de quilogramas de Nota: Apenas inclui países da África Ocidental. cocaína traficados numa base semanal. As rendas consideráveis do tráfico de narcóticos aumentam os pay-offs para a competição entre as elites. 35 1.38 Existem provas consideráveis do envolvimento dos militares no tráfico de drogas.10 Em Abril de 2010, o Almirante Bubo na Tchuto e o Chefe de Estado-maior da Força Aérea, General Ibraima Papa Camará, foram considerados traficantes de droga pelo Governo dos Estados Unidos da América. Em Abril de 2013, Na Tchuto foi preso por autoridades americanas em águas internacionais, na sequência de uma operação policial que durou sete meses. Tendo em conta o valor elevado do comércio de droga, pode concluir-se que as rendas atribuídas às Forças Armadas são substanciais. As rendas elevadas podem tornar a competição mais intensa e podem tornar a contenção do poder do Exército uma tarefa mais complicada. A Figura 13 ilustra que, em casos onde as rendas das drogas excedem as rendas do orçamento militar, a fragilidade tende a aumentar. O Programa de Estabilização e Desenvolvimento do Governo de 2014 reconhece que lidar com o comércio de narcóticos é uma medida importante para reduzir a fragilidade. 1.39 Existem poucas fórmulas para capacitar as instituições. O crescimento partilhado pode ser uma delas, uma vez que fortalece os cidadãos. O crescimento partilhado altera o poder relativo entre os governantes e os governados: de acordo com um estudo influente por Bueno de Mesquito et al. no que diz respeito à mudança endógena das instituições, para segurarem a sua sobrevivência no poder, as elites têm uma escolha entre: a) dedicar recursos a oprimir a maioria ou b) construir um grande eleitorado político ao providenciar bens e serviços públicos à maioria. 11 Em outras palavras, as elites optimizam a quantidade de rendas que partilham com a população em geral com base nos pay-offs da opressão versus a provisão de bens públicos. A capacitação dos pobres através de meios financeiros - redução da pobreza ou crescimento partilhado - pode alterar o equilíbrio a favor do fornecimento de bens públicos, reduzindo o espectro para o clientelismo e competição de elites. Por sua vez, a competição reduzida entre as elites reduz os incentivos para as elites não governantes removerem os incumbentes de forma inconstitucional, reduzindo assim a fragilidade. 1.40 A melhor governação fortalece o compacto social e a legitimidade do Estado - reduzindo assim a fragilidade. Uma vez que os cidadãos beneficiam de melhores políticas públicas, o apoio ao Estado e às regras que o governam irá crescer. Os cidadãos vão aceitar a autoridade do Governo e em retorno vão exigir uma maior responsabilização: compacto social. À medida que o primado da Lei cresce, os cidadãos vão criar expectativas de que todos se vão reger pelas “regras do jogo”. A mudança destas regras de forma bilateral, por exemplo através de golpes, será cada vez menos aceite, especialmente porque afecta a provisão de serviços que os cidadãos têm vindo a esperar do Estado.12 Um Estado mais legítimo promove o primado da lei e reduz a fragilidade. 1.41 O crescimento partilhado é possível apesar da fragilidade. A estabilidade não chegará à Guiné-Bissau de um dia para o outro, e mesmo o crescimento partilhado não é garantia do fim da fragilidade. No entanto, as experiências em outros países frágeis demonstram que, se providenciada a oportunidade, os empreendedores podem procurar oportunidades de negócios e criar empregos mesmo em ambientes frágeis (Caixa 1). O cerne deste CEM passa por providenciar aos Guineenses estas oportunidades ao remover grandes constrangimentos à actividade económica proporcionando-lhes assim uma maior participação. 10 D. O’Regan, e P. Thompson, “Advancing Stability and Reconciliation in Guinea -Bissau: Lessons from Africa’s First Narco-State,” Special Report (Africa Center for Strategic Studies 2013). 11 B. Bueno de Mesquita, A. Smith, R. Siverson e J. Morrow, The Logic of Political Survival, (MIT Press 2003); e B. Bueno de Mesquita e A. Smith, “Leader Survival, Revolutions and the Nature of Government Finance,” American Journal of Political Science 54(4): 936–950 (2010). 12 Como exemplo, os observadores notam que o Governo de Gomes Jr. presidiu sobre um período de relativa estabilidade porque o Governo pagava os salários a tempo, o que lhe providenciava um certo grau de legitimidade. 36 Caixa 1: Crescimento apesar da fragilidade: o caso da indústria de vestuário do Bangladesh Tal como a Guiné-Bissau, o Bangladesh tem uma história de conflito e fragilidade. Após a sua independência do Reino Unido em 1947 e separação do Paquistão em 1971, o Bangladesh enfrentou problemas similares aos da Guiné-Bissau. O país era pobre: o PIB real per capita situava-se em cerca de US$ 240 em 1980, comparado com o equivalente de US$ 380 na Guiné-Bissau. A política de ambos os países foi marcada por competição de elites com Governos de vários graus de autoritarismo. As elites competiram pelas rendas e onde as elites poderosas não conseguiram acomodar-se, os golpes eram uma forma para os descontentes conseguirem ganhar poder. O Bangladesh passou por seis golpes e tentativas de golpes nas décadas de 1970 e 1980 (Caixa Figura 1). Caixa Figura 1: As exportações de vestuário do Bangladesh dispararam apesar da fragilidade política (valor das exportações de vestuário, US$ correntes (LHS); percentagem anual de crescimento das exportações de vestuário (RHS); ano da tentativa ou do golpe com sucesso) $25 300% Billions 198 Tentativas ou golpes com 250% $20 1981 1996 2007 1975 sucesso 200% 198 Crescimento 1976 anual da $15 150% Final do exportação 197 autoritarismo de vestuário 100% (RHS) $10 Desh 50% 0% $5 Valor das exportações de -50% vestuário (LHS) $0 -100% 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 Nota: Os anos indicam as tentativas ou golpes com sucesso conforme a base de dados Coup d´Etat do Centro para a Paz Sistemática. Fontes: UN COMTRADE e OMC (exportações de vestuário do Bangladesh), e Centro para a Paz Sistemática (golpes). Num ambiente de instabilidade política, a capacidade de realizar compromissos credíveis é crítica para atrair investimentos. O Bangladesh tornou-se beneficiário em 1973 do Acordo de Multi-tecidos (Multi-fibre Agreement) que concedeu ao país quotas preferenciais para a exportação de vestuário para os EUA. O país tinha uma indústria de vestuário emergente, mas os grandes investidores hesitavam em investir no sector devido à incerteza política e a dúvidas associadas à capacidade de aplicar contratos e proteger os investimentos. Em 1979, um empreendedor local do Bangladesh e antigo funcionário público estabeleceu uma joint venture denominada Desh Garments com a Daewoo, uma multinacional da Coreia do Sul. De acordo com a análise de Mushtaq Khan, um académico, o facto de que o lado Bangladesh da empresa era representado por um antigo funcionário público - que tinha ligações próximas com o Presidente do Bangladesh - sinalizou um grau suficiente de compromisso da elite no projecto para justificar os riscos e investir. No Bangladesh, a Associação de Produtores e Exportadores de Vestuário (BGMEA), uma organização do sector privado, garante a aplicação de compromissos credíveis. A Desh Garments registou um grande sucesso e as exportações de vestuário do Bangladesh expandiram e novos produtores de vestuário entraram no mercado. O ambiente político permaneceu frágil e as elites continuaram a competir. Uma vez que o Governo continuou a ser uma fonte precária de aplicação de compromissos e protecção dos investidores, a indústria do vestuário estabeleceu a BGMEA. Esta serviu como árbitro de disputas e aplicou as suas decisões através de soft power, incluindo a emissão de certificados e a calendarização dos serviços 37 que esta providenciava aos membros, tornando assim os compromissos credíveis. A BGMEA conseguiu acomodar a competição entre as elites. Conforme é apontado por Khan, o facto de que o Governo não tentou interferir nos negócios da BGMEA foi importante, focalizando-se antes em rendas políticas ao invés de económicas. Quando assim foi, os membros da BGMEA conseguiram mobilizar a simpatia de outras elites para verter o equilíbrio da competição de elites a seu favor, tendo ajudado o facto de que os produtores de vestuário beneficiaram de uma organização forte tal como a BGMEA que facilitou a acção colectiva no interesse do sector do vestuário. Este isolamento por parte da BGMEA da fragilidade permitiu ao sector do vestuário crescer a um ritmo estonteante, e à medida que o sector cresceu, os produtores tornaram-se ainda acérrimos na defesa dos interesses do sector. Hoje, o Bangladesh ainda é uma dos maiores exportadores de vestuário do mundo. A história de sucesso do Bangladesh contém importantes lições para a Guiné-Bissau. O caju processado poderia ser potencialmente o primeiro equivalente do sector de vestuário do Bangladesh.* Primeiro (como o capítulo 8 deste CEM descreve) o processamento da castanha de caju tem potencial considerável na Guiné-Bissau - à semelhança do vestuário no Bangladesh. O desafio passa por atrair investidores estrangeiros, e o compromisso específico do Governo para atrair IDE neste sector pode ser uma opção. A associação de caju da Guiné-Bissau, ANCA, poderia desempenhar o papel da BGMEA se conseguisse isolar-se suficientemente da competição de elites. Talvez a mais importante lição que a experiência do Bangladesh contém para a Guiné-Bissau é a de que um sector de crescimento vibrante - como é neste caso o processamento de castanha de caju - é possível apesar da fragilidade política. *No entanto, uma importante diferença é que o sector de vestuário não dependia dos agricultores para fornecer inputs, e o desenvolvimento de caju processado poderia acontecer com custos para os agricultores, a não ser que os seus interesses sejam bem defendidos. Fonte: Esta caixa de texto busca informações de M. Khan (2013) ‘Bangladesh: Economic Growth in a Vulnerable Limited Access Order’, em D. North, J. Wallis, S. Webb, e B. Weingast (eds.), In the Shadow of Violence: Politics, Economics, and the Problems of Development . Cambridge: Cambridge University Press, pp. 24-69. 38 PARTE II: A LÓGICA DO CEM 7. CONSTRANGIMENTOS PARA O DESENVOLVIMENTO 1.42 A redução da pobreza e a prosperidade partilhada exigem maiores receitas mas também um maior grau de redistribuição. O crescimento partilhado significa que o valor acrescentado é partilhado por todos os participantes activos do mercado de uma forma relativamente equilibrada. O principal canal é através de receitas, especialmente dos rendimentos do trabalho. Se as receitas aumentarem suficientemente, isto irá permitir que os pobres consigam subir para além da linha de pobreza. No entanto, especialmente num país onde a pobreza é vasta e enraizada como é o caso, isto irá ser um processo longo. A redistribuição, incluindo através de programas de assistência social, pode preencher o gap da pobreza ao transferir recursos directamente para os pobres, ao invés de que os serviços públicos só redistribuem os recursos de facto se os pobres tiverem mais probabilidade de beneficiar destes. Num país com os níveis de pobreza tão elevados como a Guiné-Bissau, a redistribuição irá ocorrer maioritariamente entre nações ricas e pobres na forma de APD ao invés de através de tributação fiscal progressiva. 1.43 O crescimento partilhado necessita de oportunidades económicas para os pobres. Quanto melhores forem as condições para os pobres participarem nos mercados, mais estes ficam em posição de conseguirem sair da pobreza. Além da governação fraca, a Guiné-Bissau demonstra também um amplo nível de falhas de mercado. Uma forma de pensar sobre as razões que inibem o crescimento é através da análise dos constrangimentos vinculativos. Hausman, Rodrik, e Velasco desenvolveram o que é actualmente um modelo analítico testado e experimentado de diagnóstico do quadro de crescimento para identificar os constrangimentos vinculativos ou estruturais. 13 Fundamentando na teoria de crescimento neoclássica, a principal razão para o crescimento débil segundo o modelo é o sub-investimento por parte do sector privado. De facto, o investimento do sector Figura 14: O investimento do sector privado é reduzido privado na Guiné-Bissau é excepcionalmente na Guiné-Bissau reduzido, mesmo de acordo com standards (formação bruta de capital fixo por parte do sector privado regionais e globais (Figura 14). Embora os em percentagem do PIB, médias de 5 anos) constrangimentos vinculativos só possam ter 35 uma abordagem superficial neste CEM devido à escassez de dados, uma visão ampla 30 sobre os factores individuais que na Guiné- 25 Bissau afectam o investimento privado providenciam uma compreensão de que os 20 constrangimentos existem na maioria das áreas - o que é de esperar, tendo em conta o 15 reduzido desempenho da economia desde a 10 independência do país. 5 1.44 A Guiné-Bissau enfrenta uma série de constrangimentos ao 0 BFA GIN SSA GMB CIV GHA BEN CPV NER Mundo SLE TGO LBR SEN MLI GNB desenvolvimento económico, que podem ser organizados num quadro de diagnóstico de crescimento. O quadro, Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. adaptado de Hausman et al. e ilustrado na Figura 15, é contextualizado pela governação e um sistema financeiro inclusivo. A boa 13 R. Hausman, D. Rodrik, e A. Velasco, Growth Diagnostics (Harvard University 2005). 39 governação suporta o investimento privado de duas formas: facilita o ambiente para realizar negócios, incluindo uma infra-estrutura física que ligue os mercados, capital humano como input para a produção, e um quadro regulatório que permita a fluxo eficiente de factores de produção e promova a inovação e produtividade. Através de uma política monetária focalizada, a boa governação apoia a estabilidade de preços e de taxas cambiais para garantir que os retornos dos investimentos podem ser capturados na íntegra. A política orçamental é o principal veículo para a provisão de bens públicos. Através de uma política orçamental contra cíclica, os Governos podem aumentar a estabilidade dos outputs. O acesso ao financiamento é importante para o investimento do sector privado, uma vez que canaliza eficientemente as poupanças domésticas através de intermediários financeiros (principalmente bancos) para as oportunidades de investimento mais produtivas. Figura 15: O quadro de diagnóstico do crescimento Boa governação Infra-estruturas Investimento em Estabilidade Ambiente capital humano macro-orçamental regulatório estimulante Investimento privado  Crescimento liderado pelo sector privado Intermediação Poupança privada Acesso a financiamento Fonte: Adaptation de Hausman et al. (2005) por staff do Banco Mundial. 40 Figura 16 – Figura 19: Infra-estruturas Figura 16: A rede rodoviária da Guiné-Bissau é Figura 17: … mas o país situa-se bem atrás de outros comparável aos standards regionais... em termos de TIC (km de estradas por 100 km quadrados de área terrestre e (por 1000 pessoas) população por quilómetro quadrado de área terrestre, médias para 2001 – 2011) 40 80 Km estradas por por 100 km2 de área terrestre 35 70 GHA GMB 30 60 África Subsaariana Guiné-Bissau África Ocidental 25 CIV 50 20 TGO 40 GIN SLE 15 BEN 30 10 GNB 20 SEN 5 BFA 10 MLI NER 0 0 0 50 100 150 Subscrições de telemóveis (por Utilizadores de Internet (por 100 Pessoas por km2 de área terrestre 100 pessoas) pessoas) Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. Figura 18: O consumo de energia situa-se entre os Figura 19: ...colocando um grande constrangimento às mais baixos do mundo… empresas (kWh per capita) (percentagem de empresas que identificaram a electricidade como um constrangimento) 500 80 450 70 400 60 350 50 300 40 África Subsaariana 250 30 Guiné-Bissau 200 Mundo 20 150 10 100 0 50 Percentagem de empresas que Proporção de electricidade identificaram a electricidade como proveniente de um gerador (%) 0 um grande constrangimento Guiné-Bissau África Ocidental África Subsaariana Fonte: Energy Information Administration dos EUA, Fonte: Relatórios Doing Business. WDI, e cálculos do staff do Banco Mundial Mundial 41 Figura 20 & Figura 21: Capital humano Figura 20: Os resultados básicos de educação na Figura 21: … mas os défices em competências Guiné-Bissau são comparáveis aos níveis regionais... vocacionais são pronunciados (percentagem de empresas que identificaram as (taxas de literacia em percentagem de jovens e adultos) competências como um constrangimento) GPV 60 GHA TGO 50 74 GNB GMB Taxa de literacia jovem SEN CIV 40 SLE Média da MLI África LBR Subsaariana 30 BEN BFA NER GIN 20 10 0 0 0 63 Guiné-Bissau África Subsaariana Mundo Taxa de literacia adulta Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. Fonte: Relatórios Doing Business. Figura 22 & Figura 23: Estabilidade Macro Orçamental Figura 22: A qualidade da gestão orçamental, Figura 23: E o Governo tem um espaço extremamente financeira e económica como um todo é fraca na limitado para conduzir a política orçamental Guiné-Bissau... (receita geral do Governo em percentagem do PIB) (score, 1 pior, 6 melhor) 6 35 Qualidade da gestão orçamental e financeira 30 5 25 4 20 15 3 10 GNB 2 5 1 0 1 2 3 4 5 6 Guiné-Bissau África Ocidental África Mundo Gestão Económica Subsaariana Fonte: A Avaliação Institucional e de Políticas do País Fonte: FMI, World Economic Outlook 2014 e cálculos do (CPIA) do Banco Mundial, 2012 staff do Banco Mundial. Nota: Os dados demonstram apenas países IDA. 42 Figura 24 & Figura 25: Poupança e intermediação Figura 24: A penetração bancária é reduzida na Figura 25: … e poucas empresas têm acesso a serviços Guiné-Bissau... bancários (% de empresas com uma conta à ordem ou de poupança) (agências de bancos comerciais por 100.000 adultos) 25 100 90 20 80 70 60 15 50 40 10 30 20 10 5 0 Guiné-Bissau (2006) África Subsaariana Mundo 0 % de empresas com uma conta à ordem ou poupança 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 % de empresas com um crédito bancário ou linha de crédito Guiné-Bissau África Subsaariana Mundo Fonte: FMI, Inquérito de Acesso Financeiro. Fonte: Inquérito às Empresas do Banco Mundial. 1.45 A falta de investimento crónica em infra-estrutura e capital humano têm sido constantes em várias áreas. Tendo em conta os constrangimentos consideráveis de governação que a Guiné-Bissau tem enfrentado, não é surpresa que o país não tenha investido de forma adequada. A infra-estrutura encontra-se num estado muito precário. Embora a infra-estrutura rodoviária da Guiné-Bissau se compare com os standards regionais (Figura 16), encontra-se no entanto numa condição precária. As tecnologias de informação e comunicação (TIC, Figura 17), energia (Figura 18 e Figura 19), e também o único porto internacional do país têm sofrido com a escassez severa de investimentos. Em termos de educação básica, a Guiné-Bissau tem realizado algum progresso e as taxas de literacia são comparáveis à média da África Subsaariana (Figura 20). No entanto, nas competências vocacionais, o país fica em défice (Figura 21), limitando o potencial para se mover para actividades maior valor acrescentado além do sector agrícola de pequena escala. Os resultados da saúde na Guiné-Bissau são insatisfatórios mas comparáveis com aqueles de outros países pobres; a esperança de vida, nos 54 anos, situa-se apenas três anos abaixo da média da África Subsaariana. 1.46 A política monetária beneficia da filiação na UEMOA, mas a política orçamental é limitada por uma receita reduzida e fraca capacidade administrativa, limitando a capacidade do Governo de suportar a estabilidade macro orçamental. A filiação na zona CFAF e o outsourcing da autoridade da política monetária para o Banco Central de Estados do Oeste Africano (BCEAO) tem isolado a política monetária da ingerência política e concedido à Guiné-Bissau acesso a uma instituição com excelentes capacidades. Embora a UEMOA não seja uma união monetária perfeita, a reduzida inflação e a taxa de câmbio relativamente estável são provas de uma política monetária globalmente correcta. Do lado orçamental, persistem mais desafios. Mesmo de acordo com standards de países com acesso a financiamento em termos concessionais da Associação Internacional para o Desenvolvimento (IDA), a administração fiscal da Guiné-Bissau é débil (Figura 22). Adicionalmente, a política orçamental é severamente limitada por um pequeno envelope de recursos: o nível da receita em relação ao PIB na Guiné- 43 Bissau situa-se entre os mais reduzidos do mundo (Figura 23). No plano orçamental isto reduz consideravelmente a capacidade 1.47 do Governo de manter a estabilidade macroeconómica enquanto condição chave para a actividade económica. 1.48 O clima para investimentos na Guiné-Bissau não é actualmente conducente para a facilidade em realizar negócios e as famílias lutam para conseguirem acesso a financiamento. A Guiné-Bissau tem empreendido algumas reformas notáveis para melhorar o ambiente de negócios ao longo dos últimos dez anos. No entanto, situa-se ainda em 180º no ranking de Doing Business do Banco Mundial. Apenas nove outros países têm uma classificação pior. No que respeita ao acesso ao financiamento, as poupanças privadas são residuais como consequência da presença escassa de bancos comerciais no país (Figura 24). A obtenção de crédito é difícil (Figura 25) particularmente devido à escassez de poupanças e parcialmente devido a outros factores, nomeadamente o número e dimensão de projectos bancáveis, identificação dos credores, e escassez de garantias. 8. UMA AGENDA PARA O CRESCIMENTO, REDUÇÃO DA POBREZA, E PROSPERIDADE PARTILHADA 1.49 Este CEM advoga uma agenda de retoma, que enfrente simultaneamente uma série Figura 26: Lançar um círculo virtuoso para o crescimento e redução da pobreza de constrangimentos-chave para o crescimento partilhado. Tendo em conta um ambiente onde os constrangimentos à actividade económica são omnipresentes, as acções de políticas isoladas não vão necessariamente libertar o crescimento: por exemplo, um agricultor de caju não irá vender o seu produto se os retalhistas tiverem acesso ao crédito mas não exista nenhuma estrada que ligue o agricultor aos mercados. A Tabela A1 em apêndice ilustra como é que estes tópicos abrangem vários sectores. As iniciativas de políticas vão focar uma série de intervenções em áreas críticas que constrangem o sector privado. Estas vão apoiar o Governo no desenvolvimento da capacidade para desempenhar as políticas necessárias, mas, realisticamente, os doadores, parceiros regionais assim como as organizações da sociedade civil, incluindo ONGs, a Diáspora, e os próprios Guineenses, terão que ser mobilizados para fazer com que estas políticas aconteçam de facto. 1.50 As intervenções identificadas podem colocar em movimento um círculo virtuoso entre o crescimento liderado pelo sector privado e a Fonte: Staff do Banco Mundial. melhor governação (Figura 26). Conforme este capítulo tem argumentado, o arranque da economia pode resultar em melhor governação ao responsabilizar os cidadãos e reduzir a competição entre as elites. A melhor governação por seu turno, suportada por uma colecta robusta de receitas, irá permitir ao Governo implementar as políticas necessárias para apoiar o sector privado. Neste sentido, as condições para a actividade económica privada e boa governação reforçam-se mutuamente. A melhor governação poderá 44 subsequentemente distribuir as receitas do crescimento através de melhores serviços públicos ou até de transferências directas tais como transferências monetárias. De facto, este CEM argumenta que poderá existir uma ligação adicional, onde os programas de assistência social apoiam o contrato social e assim, também, contribuem para melhorar a governação e fortalecer o círculo virtuoso entre o crescimento e a governação. Existem numerosos exemplos da história da Guiné- Bissau que podem temperar o optimismo - no entanto, com um novo começo, os Guineenses podem tornar o actual círculo vicioso num círculo virtuoso. 1.51 Os seguintes capítulos vão focar-se em áreas de intervenção de elevado retorno para agenda de retoma. Utilizando a Figura 15 como uma referência ampla, os capítulos vão, em várias secções, focar na infra-estrutura (em particular energia, o porto de Bissau, estradas, e TIC), capital humano (principalmente formação de competências), estabilidade macro-orçamental (e.g., através do fortalecimento do sector público e da filiação na UEMOA), ambiente regulatório, e acesso ao financiamento. De facto, várias destas áreas, incluindo infra-estrutura, governação e emprego de uma forma mais ampla estão também reflectidas no DENARP II - II Documento de Redução da Pobreza da Guiné Bissau cobrindo o período de 2011 a 2015 - demonstrando assim que o plano permanece relevante apesar do golpe de 2012. O Programa de Estabilização e Desenvolvimento de 2014 e que cobre os anos de 2014-2016 elabora sob o DENARP II e realça quatro áreas prioritárias: (i) governação e modernização do Estado; (ii) finanças públicas e restauração de um quadro de políticas macro-orçamentais estáveis; (iii) desenvolvimento sustentável, e (iv) desenvolvimento social. Embora o CEM esteja amplamente alinhado com as prioridades governamentais estabelecidas nestes dois documentos, o foco no estímulo ao crescimento partilhado significa que, neste CEM, algumas áreas têm maior realce do que outras. 1.52 O CEM encontra-se dividido em duas partes. A Parte I aborda as prioridades mais amplas da agenda de retoma. Irá focar-se no fortalecimento dos quadros físicos, legais e financeiros que devem ser colocados em prática para permitir o estímulo à actividade privada económica, e também no investimento na capacidade do Governo de implementar boas políticas públicas. A Parte I irá também olhar a diferentes formas de alavancar as relações com os cidadãos e com a Diáspora, envolvendo os empreendedores e os pobres para desempenharem um papel mais activo no impulso ao crescimento partilhado. O capítulo final do Parte I aborda os recursos naturais que contextualizam praticamente toda a actividade económica na Guiné-Bissau, enquanto sociedade predominantemente rural. A Parte II foca-se em sectores individuais que têm um potencial particular para o alcance destes objectivos - os motores do crescimento - concentrando-se nos principais assuntos e políticas transformadoras nestes sectores. Parte I: Criar as Condições Para o Crescimento, Redução da Pobreza, e Prosperidade Partilhada Fortalecer a arquitectura física, legal e financeira.  O Capítulo 2 irá focar na infra-estrutura enquanto um dos principais constrangimentos para a Guiné-Bissau, que actualmente não providencia o nível adequado de inputs-chave de produção, tais como energia, mas que também inibe o fluxo eficiente de factores de produção e de ligação dos Guineenses com os mercados e serviços públicos.  Além da infra-estrutura física, o país necessita também de uma forte infra-estrutura legal para permitir o crescimento. O Capítulo 3 focaliza-se na melhoria do ambiente de negócios, estimulando os empreendedores e aumentando a produtividade dos trabalhadores através de desenvolvimento de competências e melhores regulamentações. De forma adicional, irá também abordar o sector financeiro, que constitui um sector crucial para lubrificar a economia, encorajar o investimento e apoiar o crescimento. 45 Fortalecer a governação e alavancar as parcerias  O Capítulo 4 centra-se no sector público. O fortalecimento da capacidade do Governo é uma condição necessária na busca de melhores condições de políticas públicas e de serviços públicos para o benefício dos Guineenses, mas também para permitir que Governo tome liderança plena da agenda política recomendada neste CEM.  O novo Governo poderá contar com um número amplo de parceiros para enfrentar os desafios de desenvolvimento da Guiné-Bissau. O Capítulo 5 irá analisar o papel dos parceiros de desenvolvimento, organizações regionais, e organizações da sociedade civil no apoio à agenda de retoma. Alavancar o impacto das famílias e indivíduos  O Capítulo 6 foca-se no impacto transformacional das transferências monetárias privadas e públicas. A Diáspora é frequentemente esquecida enquanto fonte de crescimento para o país, embora se possa considerar que as famílias migrantes também são parceiros na luta contra a pobreza. Conforme o capítulo 5 irá demonstrar, as remessas podem ser um catalisador para o desenvolvimento. O capítulo irá também rever as recentes provas que suportam a noção de que os programas de assistência social, incluindo transferências monetárias públicas, podem promover o crescimento partilhado. Alavancar a riqueza dos recursos naturais  O capítulo final da Parte I irá discutir o papel da riqueza natural da Guiné-Bissau no desenvolvimento. O Capítulo 7 irá enquadrar os capítulos da Parte II uma vez que praticamente toda a actividade económica na Guiné-Bissau está ligada aos recursos naturais. O capítulo irá então argumentar que a gestão dos recursos naturais de forma sustentável e a realização de trade-offs intuitivos entre os respectivos usos é chave para impulsionar a prosperidade na Guiné-Bissau. Parte II: Arrancar os motores do crescimento  Os capítulos da Parte II vão abordar os motores do crescimento com o maior impacto no emprego e consequentemente na redução da pobreza, mas também aqueles que podem apoiar uma maior prosperidade ao partilhar a riqueza dos recursos naturais. O Capítulo 8 centra-se no sector económico mais importante da Guiné-Bissau: caju.  O Capítulo 9 irá abordar um sector com um potencial económico considerável mas que colapsou na sequência da Guerra de Independência e permaneceu estagnado deste então: o arroz. Este sector contém um potencial considerável para o emprego e diversificação de exportações. Se for cultivado para o autoconsumo, o arroz aporta também um potencial considerável para reduzir a insegurança alimentar.  Actualmente, a Guiné-Bissau não é uma nação de pescadores. O Capítulo 10 irá argumentar no entanto que o sector das pescas aporta um potencial de crescimento substancial. A pesca constitui ainda uma importante fonte de receitas para o Governo através da emissão de licenças pesqueiras.  O Capítulo 11 irá focar-se no sector da mineração. Contrariamente às expectativas de muitos observadores, a mineração tem o potencial para gerar emprego na Guiné-Bissau, 46 isto se as comunidades locais forem ligadas em termos de fornecimento de serviços às minas. Um dos grandes potenciais das minas da Guiné-Bissau situa-se nos recursos que estas vão render e que podem ser investidos em capital humano e físico, capital intangível (tal como a governação), e também no financiamento de programas de assistência social com recursos domésticos.  Por fim, o Capítulo 12 irá focar-se no sector do turismo e biodiversidade. Embora o sector do turismo seja ainda emergente na Guiné-Bissau, a beleza natural do país - associada aos esforços governamentais para a preservar através de áreas protegidas - tem muito para oferecer aos turistas. Se a agenda de retoma alcançar sucesso e o crescimento e estabilidade se concretizarem na Guiné-Bissau, o volume de turistas irá provavelmente crescer. 1.53 O sumário de todas as recomendações de política e um plano de acção proposto pode ser encontrado no apêndice. As últimas páginas do CEM consideram as implicações práticas da análise dos capítulos precedentes. Uma das mensagens que se destaca é de que o sector público dispõe de capacidade relativamente reduzida e uma agenda de reformas ambiciosas pode sobrecarregar a administração. No entanto, uma agenda de reformas compreensiva e exaustiva é importante dado que reformas isoladas serão apenas gotas no oceano num ambiente de equilíbrio precário de constrangimentos interlaçados. A discussão sugere assim uma agenda de reformas baseada em três princípios: (i) seleccionar; (ii) fortalecer; e (iii) partilhar. A primeira centra-se na selectividade, onde o Governo deverá focar-se em providenciar serviços de base e devolver alguma responsabilidade em outras áreas de volta aos cidadãos. Isto irá libertar recursos para construir a capacidade de base. O fortalecimento da capacidade do Governo no desempenho das suas tarefas envolve o fortalecimento dos sistemas financeiros públicos, reforma do serviço público - incluindo uma alocação eficiente de recursos humanos e formação - e arrecadação de receita adicional. Por fim, a partilha refere-se a parcerias que podem ser alavancadas para partilhar a implementação da agenda. Os parceiros incluem, entre outros, doadores, organizações regionais, ONGs e a Diáspora. O apêndice também providencia uma priorização sugerida das reformas assim como as agências governamentais que poderiam liderar a implementação de cada das reformas propostas. 47 Apêndice Tabela A 1: A agenda de retoma é multidimensional. Tendo isso em consideração, existem diversas sinergias ao longo dos próximos capítulos Capítulo Energia Portuário Estradas TIC Desenvolvim Finanças Governação Parcerias Remessas Programas Recursos ento do de Naturais Sector Assistência Privado Social 2 Energia Portuário Providenciar energia ao sector portuário Estradas TIC Providenciar energia à informatizaçã o e telefones móveis 3 Desenvolvim Providenciar Importar e.g. Ligar as Ligar as ento do energia às bens de empresas e os empresas e os Sector empresas capital, consumidores consumidores Privado produtos de ; ganhos de exportação produtividade Finanças Providenciar Ligar as Projectos energia aos empresas e os bancáveis bancos e consumidores respectivas ; ganhos de agências produtividade 4 Governação Providenciar Investimento Investimento Investimento Estabilidade Os bancos energia às no porto e nas estradas e nas TIC e Política e exigem instalações respectiva respectiva respectiva IDE; estabilidade governament gestão gestão gestão melhorar o política; ais; ambiente regular os investimento regulatório bancos na energia e respectiva gestão 5 Parcerias Projectos de Ligar os Ligar os Alavancar as doadores em mercados mercados parcerias, energia, regionais regionais; apoio dos importações ONGs que parceiros à regionais de apoiam governação energia projectos das comunidades para reabilitar estradas 48 Capítulo Energia Portuário Estradas TIC Desenvolvim Finanças Governação Parcerias Remessas Programas Recursos ento do de Naturais Sector Assistência Privado Social 6 Remessas Providenciar Transferir Investimento Ligar os Promover as energia para remessas para de capital de remetentes ligações com as os receptores risco aos a Diáspora; organizações receptores; encorajar os de encorajar a fluxos de transferência concorrência remessas monetária entre organizações de transferências monetárias Programas E.g. E.g. Empreendedo E.g. Administrar o Donativos Complementa de providenciar Transferência rismo de transferências programa; dos doadores ridade assistência energia para s monetárias pequena monetárias «dividendo para social os telefones para os escala para os da transferências móveis e receptores receptores democracia» monetárias transferências contrato social 7 Recursos Produção Maximizar o Administrar Parcerias Rendas de Naturais sustentável impacto no de forma global na área recursos de Energia crescimento sustentável os do ambiente naturais para dos recursos (e.g. GEF) financiar os investimentos naturais programas de financiados assistência com recursos social naturais 8 Caju Providenciar Exportações Transportar o Melhorar as Providenciar Encorajar a Potenciais Recursos Facilitar o energia para caju para o condições crédito aos produção e investimentos financeiros cultivo de os mercado para a retalhistas de processament de capital de para os caju processadores comercializaç caju e o do caju, risco agricultores de caju ão e produtores minimizando pobres de processament para o a carga caju; o investimento tributária monetizar a na produção e troca directa processament caju-arroz o 9 Arroz Providenciar Exportações Transportar o Melhorar as Providenciar Supervisionar Mercado Potenciais Recursos Facilitar o energia à arroz para o condições crédito para investimentos regional de investimentos financeiros cultivo de irrigação mercado para a os produtores de larga arroz de capital de para os arroz comercializaç e retalhistas escala para risco agricultores ão e reabilitar a pobres de exportação produção de arroz arroz Pescas Facilitar a Transportar o Providenciar Garantir a Acordos Potenciais Recursos Facilitar a 10 atracagem peixe para o crédito para sustentabilida regionais de investimentos financeiros pesca, mercado os pescadores de dos stocks pescas de capital de para os necessidade pesqueiros; risco pescadores de stocks receitas das mais pobres pesqueiros licenças de sustentáveis pescas 49 Capítulo Energia Portuário Estradas TIC Desenvolvim Finanças Governação Parcerias Remessas Programas Recursos ento do de Naturais Sector Assistência Privado Social Mineração Providenciar Exportações Transportar Aumentar a Providenciar Negociar Potenciais Financiar Construir a 11 energia às os minerais produtividade crédito para contratos de investimentos transferência riqueza minas para o dos serviços as mineração; de capital de monetárias nacional mercado locais para as comunidades transferências risco (em no longo enquanto os minas que servem directas de serviços de prazo recursos as minas dividendos mineração) naturais são exauridos Turismo & Providenciar Transportar Ligar os Encorajar o Providenciar Estabilidade Potenciais Redução Conservar a 12 biodiversida energia aos os turistas hotéis e investimento crédito para política atrai investimentos potencial de biodiversidad de hotéis para os hotéis turistas em serviços os os turistas; de capital de actividades e relacionados fornecedores preservar a risco ilegais que com o de serviços biodiversidad ameaçam a turismo de turismo e biodiversidad e Capítulo Energia Portuário Estradas TIC Desenvolvim Finanças Governação Parcerias Remessas Programas Recursos ento do de Naturais Sector Assistência Privado Social 50 PARTE I: CRIAR AS CONDIÇÕES PARA O CRESCIMENTO, REDUÇÃO DA POBREZA, E PROSPERIDADE PARTILHADA 51 CAPÍTULO 2: ENFRENTAR OS CONSTRANGIMENTOS DE INFRA-ESTRUTURAS 1. INTRODUÇÃO 2.1 As lacunas de infra-estruturas na Guiné-Bissau são um obstáculo significativo para o desenvolvimento. Um dos constrangimentos-chave é o défice no fornecimento de energia. A energia é um ingrediente crítico para o crescimento económico. Uma série de estudos empíricos documentam que existe uma forte relação entre o consumo de energia e o crescimento económico. 14 Na Guiné-Bissau existe um forte défice no fornecimento de electricidade, reduzindo assim as actividades empresariais e das famílias. A prolongada crise de electricidade e uma década de medidas ineficazes para a tentar resolver levaram a um círculo vicioso de cortes regulares; elevados custos operativos, incluindo furto de combustível; facturação e colecta reduzidas de receitas, incluindo furto de electricidade através de ligações ilegais; tarifas elevadas para cobrir, sem sucesso, estas ineficiências; um peso orçamental significativo através de subsídios directos e indirectos; e despesas muito elevadas suportadas por parte dos consumidores ao gerarem electricidade por meios alternativos. Estas despesas representam um custo económico muito elevado através do aumento dos custos de produção devido à ausência de um serviço fiável, e, consequentemente, dissuadem o investimento e reduzem a competitividade. Existe uma necessidade crítica de investir em nova capacidade de produção e distribuição. 2.2 Melhorar o fornecimento de electricidade requer o restabelecimento da viabilidade do sector. A reparação do balanço de receitas será necessária para melhorar de forma sustentável o acesso ao serviço e a sua qualidade. Um sistema ineficaz de facturação resulta actualmente em taxas reduzidas de pagamento e existe também um grau considerável de furto de electricidade e combustível, minando assim a rentabilidade da Empresa de Electricidade e Água da Guiné-Bissau (EAGB). Embora as taxas cobradas sejam excepcionalmente elevadas mesmo de acordo com standards regionais, a companhia não consegue atingir o equilíbrio financeiro. A melhoria na colecta de receita e a redução de perdas de devido a furto poderiam trazer dois benefícios: (i) os preços da electricidade provavelmente reduziriam uma vez que o reforço da disciplina de pagamento distribuiria o custo da electricidade de forma mais uniforme, e os preços mais reduzidos levariam por sua vez a um reforço adicional da disciplina de pagamento. O acesso sustentável à electricidade e a taxas mais reduzidas são cruciais para o desenvolvimento e crescimento empresarial; (ii) sem subsídios governamentais consideráveis, a EAGB estaria falida. Restaurar a viabilidade financeira irá reduzir a necessidade de subsídios e irá libertar mais recursos públicos para usos mais produtivos. 2.3 Adicionalmente, será importante reduzir a dependência excessiva do combustível gasóleo importado e maximizar os benefícios do comércio regional. Um primeiro passo para reduzir a dependência excessiva de combustível de preço elevado é completar a mudança de gasóleo para fuelóleo pesado (HFO) na produção de electricidade. O segundo passo é garantir a aceleração do desenvolvimento das interligações regionais/bilaterais de electricidade que poderiam fornecer mais potência de base e de reserva através da Organização de Desenvolvimento do Rio Gâmbia (OMVG) e interconexões no âmbito da Aglomeração de Electricidade da África Ocidental 14 Burkina Faso: I. M. Ouédraogo, “Electricity Consumption and Economic Growth in Burkina Faso: A Cointegration Analysis,” Energy Economics 32(3)524–531 (2010). Costa do Marfim: A.K. Kouakou, “Economic Growth and Electricity Consumption in Côte d'Ivoire: Evidence from Time Series Analysis,” Energy Policy 39(6)3638–3644 (2011). Mundo: R. Ferguson, W. Wilkinson, e R. Hill, “Electricity Consumption and Economic Development,” Energy Policy 28:923–934 (2000). 52 (WAPP). A este respeito, a Guiné-Bissau poderia assumir um papel mais pró-activo na promoção das interconexões regionais, especialmente com o sistema de electricidade da OMVG, e assim poderia beneficiar de uma fonte segura e menos dispendiosa de electricidade para dar resposta às suas necessidades no curto prazo. Um terceiro conjunto de medidas, de longo prazo, passariam pelo desenvolvimento racional dos recursos energéticos endógenos para uso doméstico e para exportação. Isto diz respeito notavelmente ao desenvolvimento da energia hidroeléctrica (e.g. projecto hidroeléctrico de Saltinho) e recursos de energia solar nas zonas rurais. O país deveria garantir que o desenvolvimento dos recursos hidroeléctricos endógenos, tais como o projecto hidroeléctrico de Saltinho, têm um custo inferior ao da electricidade importada. 2.4 O segundo grande constrangimento-chave centra-se no porto de Bissau, que tem um potencial considerável para alavancar o desenvolvimento do país. Em princípio, a posição da Guiné-Bissau como um país costeiro no Oceano Atlântico é um activo. Assim, o país pode colher benefícios do comércio internacional devido ao acesso directo ao Atlântico e à proximidade com as grandes rotas marítimas que ligam os continentes Americano e Europeu. O sistema portuário desempenha então um papel chave na competitividade geral da economia. Hoje, o porto de Bissau é o principal porto do país uma vez que lida com mais de 85% do comércio internacional registado nesta cidade, e é a principal porta para o mundo da principal exportação da Guiné-Bissau: caju. Este porto constitui por isso uma componente fundamental do capital físico do país, assim como a chave para a Guiné-Bissau explorar o activo geográfico que a sua posição representa. 2.5 O porto de Bissau encontra-se Figura 27: As tecnologias de informação e comunicação todavia num estado precário, e necessita são catalisadoras para o crescimento económico de investimentos e reformas (impacto estimado no crescimento de um aumento de 10 p.p. consideráveis. O porto sofre com uma série na penetração de linhas fixas, telefones móveis, e Internet) de problemas, de natureza administrativa e 1.2 da própria infra-estrutura, que incluem Alto Rendimento Baixo e Médio Rendimento 1.12 desempenho operacional débil, tarifas 1.0 elevadas, infra-estrutura em mau estado e má governação empresarial. Os atrasos na 0.8 0.81 carga e descarga de contentores e de cargas 0.77 0.73 a granel são longos, e reflectem a 0.6 capacidade inadequada do porto; o porto 0.60 lida actualmente com quase 25.000 0.4 0.43 Unidades de Equivalência de Vinte-Pés (TEUs) em termos de capacidade de carga 0.2 por ano, comparado com a capacidade desenhada de 5.000 TEUs. As tarifas 0.0 portuárias são demasiado elevadas. A infra- Linhas Fixas Telefones Móveis Internet estrutura e o equipamento para lidar com a Fonte: Banco Mundial 2009. carga encontram-se num estado de manutenção reduzida, e o número de naufrágios constrange significativamente as operações portuárias. 2.6 As estradas são as artérias da economia do dia-a-dia. As estradas secundárias e terciárias encontram-se numa condição precária. Não foi possível efectuar uma avaliação criteriosa do sector das estradas. Todavia, o sector é assinalado no DENARP II como um constrangimento significativo e uma área para investimento público. Embora a rede de estradas pareça adequada para a Guiné-Bissau (Figura 16 no Capítulo 1), a qualidade das estradas não é. Por exemplo, os Capítulos 8 e 9 identificam as estradas como um grande constrangimento para os agricultores de caju e arroz na entrega dos seus produtos no mercado. A Parte III deste capítulo irá 53 abordar brevemente o sector das estradas e providenciar recomendações a respeito dos trabalhos futuros para identificar as necessidades de investimentos neste sector. 2.7 Os sistemas de telecomunicações inadequados constituem um terceiro grande constrangimento de infra-estruturas. A economia da Guiné-Bissau encontra-se numa etapa inicial de desenvolvimento e para alguns observadores pode não parecer óbvio que os investimentos no sector TIC sejam uma prioridade. Todavia, existem fortes provas empíricas que sugerem que as telecomunicações, incluindo linhas terrestres, telemóveis, e a Internet, são factores motivadores do desenvolvimento, incluindo em países de baixo e médio rendimento (Figura 27). 15 Uma das razões é que a comunicação via telefone — e em África especialmente via telemóveis — liga com sucesso os participantes do mercado não obstante a distância e as condições difíceis do terreno. Os telemóveis são também cada vez mais utilizados para transferir dinheiro a indivíduos, através de programas oficiais de transferência ou remessas, o que contribui para reduzir a pobreza e pode estimular a economia local através de um aumento da procura dos agregados familiares e mesmo através de um estímulo ao investimento; estas transferências públicas e privadas serão analisadas em maior detalhe no Capítulo 6. No que respeita à banda larga, as evidências empíricas demonstram que a infra-estrutura de banda larga contribui directamente para produtividade, competitividade, e capacidade de um país atrair Investimento Directo Estrangeiro (IDE), isto através da redução dos custos de transacção e diversificação da economia para sectores mais sofisticados. As comunicações de voz e banda larga permitem um fornecimento mais célere de serviços e reduzem tempo desnecessário de viagem, o que é especialmente importante num país como a Guiné-Bissau com um sistema de transportes subdesenvolvido. 2.8 Embora este CEM se foque na energia, porto de Bissau, estradas e telecomunicações, outros constrangimentos de infra-estruturas devem ser realçados. Por exemplo, subsistem constrangimentos sérios no que respeita à água e saneamento; de facto, a escassez de água tem resultado num aumento do número de emergências de saúde pública em Bissau em anos recentes. Todavia, isto é parcialmente devido à escassez de energia necessária para garantir o abastecimento de água na cidade. O foco do CEM neste Capítulo é justificado da forma seguinte: a energia é um input indispensável para a produção; o porto de Bissau é o nexo de ligação entre a Guiné-Bissau e o resto do mundo e com uma importância crucial para uma economia dependente da exportação de caju; as estradas são cruciais para ligar os produtores aos mercados; as telecomunicações contribuem também para ligar os participantes no mercado e são um ingrediente importante no aumento da competitividade e produtividade e podem também canalizar recursos financeiros às famílias, o que reduz a pobreza e estimula o crescimento do rendimento do agregado, como é argumentado nos capítulos que se seguem. As secções deste capítulo irão então focar nas quatro áreas mencionadas. PARTE I: O SECTOR DA ENERGIA 2. PROBLEMAS E SOLUÇÕES NO SECTOR DA ELECTRICIDADE 2.9 A Guiné-Bissau enfrenta um défice agudo de electricidade. Uma percentagem estimada entre 60 a 80 por cento de todos os agregados na capital Bissau não têm acesso a electricidade por razões técnicas, mas também devido a questões económicas. A situação deteriora-se no resto do país (Figura 28). A taxa global de acesso à electricidade é actualmente inferior a 10 por cento no plano nacional, uma das mais reduzidas em África. O consumo médio anual per capita de 15 S.H. Lee, J. Levendis, e L. Gutierrez, “Telecommunications and Economic Growth: An Empirical Analysis of Sub-Saharan Africa,” Applied Economics 44:461–469 (2012); Banco Mundial, “Information and Communications for Development,” (Washington, DC: Banco Mundial, 2009). 54 electricidade é extremamente reduzido, mesmo tendo em conta médias regionais. A capacidade de produção é insuficiente para dar resposta à procura existente por electricidade, e a rede de distribuição e transmissão é inadequada. A escassez de capacidade de produção e a falta de fiabilidade do fornecimento de energia têm raízes de natureza técnica, comercial, financeira, institucional e, por último, de políticas. 2.10 Na perspectiva técnica, a capacidade de produção dos geradores mais recentes da EAGB é de 11 megawatts (MW), dos quais apenas 5 estão disponíveis, devido a avarias e a incidentes frequentes de sobrecarga causados pela condição precária dos equipamentos de protecção. De facto, um sistema pequeno como o da Guiné-Bissau, que tem optado pela autonomia total na produção de energia, só pode operar com unidades de pequena dimensão, com um sobrecusto de eficiência e encargos face a unidades mais amplas. Um dos principais problemas para o país é de que capacidade de produção é principalmente através de combustível diesel de alto custo. As unidades que utilizam combustível tipo diesel têm um custo de produção mais de duas vezes superior ao de unidades que utilizam fuelóleo pesado (HFO). O sistema de produção actual tem por isso um custo estruturalmente elevado. 2.11 Devido à falha no fornecimento público de electricidade, existe uma capacidade estimada de 20 MW de capacidade privada instalada por grandes consumidores, tais como embaixadas, organizações internacionais, hotéis, e outras instituições. Existem também cerca de 800 a 1000 pequenos geradores utilizados no segmento residencial, equivalentes a cerca de 10 MW. Os pequenos geradores diesel são mais onerosos e menos eficientes do que as unidades mais amplas, do tipo industrial. Esta capacidade privada é alimentada por combustível diesel de alto custo, com um custo de produção tipicamente entre US$ 0,60 até US$ 1.00/kWh, que é elevado à luz da maioria dos standards. Figura 28: A maioria dos agregados familiares na Guiné-Bissau não têm acesso a electricidade (percentagem dos agregados com acesso a electricidade, dados de 2009) Fonte: Censo de 2009 e cálculos de staff do Banco Mundial. 2.12 O sistema de transmissão e distribuição só cobre essencialmente Bissau. A sua condição é muito pobre, devido a manutenção inadequada e proliferação tolerada de ligações 55 ilegais. As redes encontram-se com um grande défice de reparação, embora algum trabalho importante de reabilitação tenha sido empreendido com financiamento do Banco de Desenvolvimento da África Ocidental (BOAD). Uma proposta de segunda fase financiaria a reabilitação da rede, mas os recursos não foram ainda identificados. Isto seria importante para reduzir as perdas técnicas. Muitos consumidores de baixa voltagem não são medidos. Embora o nível exacto de perdas técnicas não seja actualmente conhecido, uma vez que não existe um sistema para medir a pequena e média voltagem, estima-se que seja elevado. 2.13 O nível de perdas comerciais e técnicas é extremamente alto. Estimou-se recentemente que este nível se situe em cerca de 52 por cento da média da energia produzida. No sector residencial, as perdas podem atingir os 60 por cento. Algumas das causas são as ligações ilegais, contadores com defeito, consumo não medido, e a revenda de electricidade por um consumidor primário que está conectado de forma ilegal, tem um contador com defeito, ou não tem um contador de todo. O nível de ligações ilegais é elevado - estimando-se em cerca de metade de todas as ligações à rede - e durante anos não foram tomada medidas sérias para enfrentar este problema. Os contadores de consumo não são fiáveis e encorajam a fraude; dos 27.250 clientes da EAGB, cerca de metade ou mais têm contadores avariados ou não têm contadores de todo, e a capacidade da EAGB para os reparar é muito limitada. Assim, o desenho e implementação de um programa rigoroso para reduzir as perdas técnicas e efectuar a manutenção dos contadores é importante para a recuperação do sector. 2.14 Existem vários produtores e distribuidores de electricidade. No entanto este sistema paralelo é ilegal. A maioria dos produtores privados, que tendem a ser pequenos, apoiam a produção de electricidade através de co-geração ou produtores e distribuidores individuais. Os standards técnicos são pobres, com vários riscos tais como o de incêndio. Adicionalmente, os fornecedores privados utilizam de forma frequente os postes da EAGB e outras instalações para estender os seus fios. Os distribuidores privados de electricidade têm no entanto um propósito social e económico claro e útil, tendo em conta o fracasso do sistema de fornecimento público. A oferta privada indica também que as pessoas estão dispostas a pagar preços elevados para obter electricidade, e isto é um prenúncio positivo para o futuro do sector. O sistema de distribuidores privados é ilegal, tendo em conta o enquadramento legal que concede exclusividade à EAGB para distribuir electricidade, e não é regulado. Em simultâneo, fica claro que, se o fornecimento público for restaurado e as economias de escala se materializarem, a tarifa pública seria significativamente mais reduzida e os clientes poderiam assim mudar para um abastecimento centralizado. A melhor solução para o fornecimento ilegal de electricidade passa então pelo restauro de um abastecimento público viável. 2.15 Do lado comercial, a base conhecida de clientes é muito reduzida, reflectindo a ausência de dados comerciais; numa cidade de 400.000 pessoas, existem apenas 27.250 clientes oficiais consumidores de energia. Na realidade, o número de consumidores poderá ser muito mais elevado, possivelmente até 35.000, incluindo as ligações ilegais.16 O principal desafio comercial na Guiné-Bissau é o sistema de facturação pouco fiável e também de uma forma mais acessória, a cobrança das facturas. A EAGB não tem dados ou documentos dos clientes, e não tem conhecimento de quem são e onde é que se situam. Uma vez que a maioria dos clientes de baixa voltagem não dispõem de contadores, o seu consumo é estimado. Os resultados são uma facturação errática e arbitrária, concedendo um poder discricionário aos empregados da EAGB que frequentemente encorajam a fraude para benefício próprio. Adicionalmente, devido à escassez de recursos financeiros, a EAGB não consegue responder aos pedidos de ligações por parte de novos 16 Não existe uma estimativa de ligações ilegais na Guiné-Bissau. Em países com uma situação comparável tais como a Guiné-Conacri, as ligações ilegais equivalem à quase totalidade dos consumidores registados. 56 consumidores, que consequentemente acabam por recorrer a ligações ilegais. A questão da facturação tem uma dimensão administrativa, e o estabelecimento de um sistema adequado de facturação é uma prioridade de topo, mas trata-se sobretudo de uma questão de governação uma vez que, mais do que uma questão de acções dos consumidores, a facturação reduzida é resultado de fraude interna na EAGB. A instalação de contadores para substituir o consumo estimado pode melhorar a situação, mas as questões ligadas às ligações ilegais toleradas e à destruição sistemática e bypass de contadores devem ser enfrentadas como um pré-requisito antes de se avançar com tal medida. 2.16 Estima-se que o não pagamento, especialmente devido a um sistema de facturação ineficaz, seja elevado, tanto entre consumidores públicos como privados, e isto tendo em conta que o consumo de electricidade do sector público corresponde a cerca de 50% do total. A taxa estimada de cobrança de facturas, comparando a electricidade facturada com as receitas cobradas, é de cerca de 83%, sugerindo que o principal desafio da EAGB é facturação ao invés de cobrança, apesar de uma tarifa muito elevada de cerca de US$ 0,45/kWh. Os ganhos da cobrança de facturas podem ser alcançados através do desenvolvimento de contadores pré-pagos, particularmente para os consumidores médios e grandes.17 No âmbito das reformas futuras do sector da electricidade, e para enfrentar o problema de governação que gera uma colecta de receita reduzida, o Governo da Guiné-Bissau pode considerar contratar as actividades de cobrança ao sector privado local, como aliás tem sido feito com resultados interessantes em países que sentiam problemas semelhantes no sector, nomeadamente a Nigéria. 2.17 No plano financeiro, a EAGB tem um capital próprio negativo e ainda demonstra grandes défices operacionais e de cash-flow, apesar das altas tarifas cobradas. Isto deve-se em larga parte à baixa facturação, e ao furto de combustível.18 Como consequência, a EAGB é incapaz de pagar os seus custos recorrentes, incluindo: (i) empregados que têm cerca de 40 meses de salários em atraso, o que é problemático do ponto de vista da governação da empresa; (ii) fornecedores (particularmente fornecedores de combustível); e (iii) manutenção; muito menos sobram recursos para renovar e expandir a capacidade de produção e redes. Sem o apoio do Estado, a companhia teria que ser declarada falida. Enfrentar as questões relacionadas com a facturação e furto de combustível será crucial para restaurar a viabilidade financeira da EAGB. 2.18 No plano institucional, a distribuição de responsabilidades críticas pelas instituições do sector no que toca às decisões de investimento, financiamento e gestão da dívida, não está bem definida. O papel das diversas entidades tais como a EAGB, o Ministério de Energia, e outros departamentos governamentais (Economia e Planeamento, Finanças, Ambiente) pode ser claro na Lei, mas não é aplicado de forma clara na prática. Um exemplo importante é o das tarifas e a forma como estas são estabelecidas e alteradas, que é muito importante para manter o cash- flow do sector. Actualmente não existe uma agência regulatória para estabelecer tarifas e balancear os interesses de diferentes agentes intervenientes, tais como o sector privado ou Governo, ou para proteger os interesses dos consumidores. As tarifas foram estabelecidas em níveis muito elevados (CFAF 492/kWh) mas não têm sido ajustadas ao longo de um período de 14 anos. 2.19 Estrategicamente, o sector de energia tem défice de uma estratégia clara e selectiva baseada num conjunto limitado de objectivos prioritários e alocação eficiente de recursos. 17 A manutenção de sistemas de contadores pré-pagos na Guiné-Bissau terá de ser organizada à medida que os contadores forem entregues e instalados, e a formação adequada terá de ser providenciada ao staff da EAGB. 18 Estima-se que o furto de combustível atinja US$ 800.000 por ano, para uma receita total da EAGB de cerca de US$ 5 milhões (colecta de cerca de US$ 4 milhões) e uma factura de combustível de cerca de US$ 3 milhões. 57 Adicionalmente, os investimentos no sector têm acontecido de forma irregular e descoordenada e quase sempre numa base de emergência, e sem o benefício de um enquadramento para planear o investimento de forma a garantir um equilíbrio entre a oferta e a procura e a minimização dos custos de produção e oferta. Isto tem levado a uma política de investimentos não optimizada e elevados custos de produção uma vez que a prioridade assenta na construção de capacidade de emergência, ao invés de soluções de longo prazo; e a reparação a curto prazo de equipamentos ineficientes tem tido também prioridade face a soluções de menor custo e de longo prazo. Como enquadramento para futuras reformas do sector, o Governo da Guiné-Bissau poderá optar por desenvolver e adoptar uma visão estratégica realista para o sector, e desenvolver um plano de longo prazo, incluindo investimento e desenvolvimento institucional no curto e longo prazo. Um dos primeiros passos é decidir quem é que ficará encarregado de desenvolver a visão do sector energético e respectivo plano de desenvolvimento. Isto poderá ser concretizado pelo Ministro de Energia ou pelo próprio Gabinete do Primeiro-Ministro, pelo menos no curto prazo enquanto as reformas de emergência são implementadas, e dependendo do grau de prioridade concedido pelo Governo às questões do sector da electricidade. 2.20 Na actual situação de emergência, as prioridades recomendadas para o Governo da Guiné-Bissau podem ser sumarizadas da seguinte forma: Garantir a oferta de energia fiável e de baixo custo 2.21 Tendo em conta actual situação de escassez, pelo menos 40MW de capacidade de produção adicional serão necessários até 2016. O sistema de electricidade da OMVG em particular tem um potencial interessante. O BOAD encontra-se actualmente a financiar uma central térmica de 15MW, e também a apoiar a actualização de algumas das linhas de distribuição. A este respeito, a Guiné-Bissau poderia assumir um papel mais pró-activo na promoção das interconexões regionais, especialmente através do sistema de electricidade da OMVG, e assim poderia beneficiar de uma fonte segura e menos dispendiosa de electricidade para dar resposta às suas necessidades no curto prazo. A OMVG está a planear desenvolver o projecto hidroeléctrico de Kaleta, que é fisicamente localizado na vizinha Guiné-Conacri e tem uma capacidade de 240 MW, dos quais a Guiné-Bissau obteria cerca de 40 MW, cobrindo assim as suas necessidades de médio prazo. 2.22 Outra abordagem é a utilização crescente de recursos de energia endógenos para uso doméstico. Isto diz respeito notavelmente ao desenvolvimento da energia hidroeléctrica e outros recursos renováveis nas zonas rurais - uma das prioridades do Programa de Estabilização e Desenvolvimento do Governo para 2014. As autoridades devem promover o desenvolvimento de recursos hidroeléctricos, tais como o projecto hidroeléctrico de Saltinho. Ambas as abordagens, importação de electricidade através do sistema de electricidade da OMVG e o desenvolvimento da energia renovável local podem mitigar consideravelmente os impactos ambientais da produção de energia na Guiné-Bissau e aumentar o fornecimento fiável de energia no país. 2.23 A alavancagem de fontes de energia existentes através da parceria com produtores autónomos pode também resultar em ganhos rápidos. Do lado da oferta, a EAGB pode envidar a formalização de contratos com produtores seleccionados para complementar a sua capacidade existente - no entanto, para isso, estas entidades teriam de ser legalizadas. Na Guiné-Bissau poderá ser difícil melhorar em simultâneo a qualidade da oferta em todo o sistema de energia. O Governo e a EAGB podem considerar a melhoria na fiabilidade da oferta numa base geográfica, um distrito de cada vez, em coordenação com acções para aumentar a facturação e colecta: é mais provável que os consumidores cumpram com as suas obrigações de pagamento quando a qualidade do serviço melhora. 2.24 A gestão da procura melhoraria a eficiência do consumo da electricidade disponível. A acção do Governo deverá considerar a implementação de programas de eficiência energética, 58 incluindo a generalização de sistemas de iluminação eficientes para os edifícios públicos, iluminação pública, e consumidores privados; o uso de sistemas para desencorajar o uso de electricidade durante períodos de pico (gestão de carga) pode também ser considerado. 2.25 A troca do tipo de combustível utilizado resultaria em poupanças adicionais através da redução do custo da electricidade que é actualmente produzida domesticamente. A troca de combustíveis será discutida numa das secções posteriores. O sistema de electricidade da OMGV contém todavia o maior potencial para poupança de custos. A importação de electricidade é uma abordagem adoptada por pequeno número de países em África.19 Com contratos adequados, esta estratégia pode reduzir os custos de produção em 50 por cento ou mais.20 Restaurar o cash-flow do sector 2.26 A recuperação da viabilidade financeira pode ser chave para o fornecimento sustentável de electricidade a preços acessíveis. As medidas necessárias para reestabelecer a viabilidade financeira do sector são: (i) o estabelecimento de um programa rigoroso de redução de perdas coordenado com a melhoria na qualidade serviço, incluindo a utilização de contadores, e eliminação de ligações ilegais através de acções junto dos clientes e na empresa pública EAGB; (ii) investimentos em produção, transmissão e distribuição para melhorar a qualidade de serviço em áreas onde o programa de redução de perdas é implementado e satisfaz a procura futura; (iii) investimento em tanques de armazenagem de fuelóleo pesado; (iv) redução nas despesas de combustível, incluindo o fim do furto de gasóleo para uso em carros e carrinhas privadas; (v) um plano de recuperação financeira que enfrente os passivos de curto prazo e a dívida de longo prazo, incluindo um plano para reduzir os atrasados aos privados e mecanismos para impedir que se acumulem novamente; (vi) um enquadramento de governação empresarial eficiente, que introduza princípios de transparência e de governação empresarial e estabeleça um enquadramento para uma supervisão eficiente do Estado. Um sétimo ingrediente, a revisão das tarifas de forma a providenciar incentivos para o consumo eficiente, já está em curso. 2.27 No médio prazo, a EAGB terá também estabelecer um sistema de contabilidade fiável como pré-condição para implementar o programa de recuperação financeira e monitorizar a implementação das acções de redução de custos e aumento das receitas. A reestruturação do balanço da EAGB é um desafio, tendo em conta a ausência de contabilidade organizada. Apenas agora é que um conjunto de auditores está a tentar reconstituir as contas dos últimos cinco anos. Neste contexto, a liquidação da EAGB tem algumas vantagens, incluindo uma folha branca para um novo começo em todas as vertentes do negócio. O problema real no entanto é como tratar a dívida actual da EAGB. Embora os estatutos da EAGB limitem o passivo imputável da empresa apenas ao que detém como activo, o Governo pode ser chamado a responder por parte da dívida, particularmente os salários em atraso e as contribuições para segurança social, que a EAGB não tem efectuado ao longo de vários anos. Nesta perspectiva, a liquidação parece ser uma opção desejável e de baixo custo. 21 O plano de recuperação financeira contém dois tipos de 19 Por exemplo, o Benim tem uma dependência na ordem dos 90 por cento de electricidade regional; o Botsuana de 66 por cento; a Namíbia 53 por cento; o Níger de 60 por cento; a Suazilândia de 66 por cento e o Togo de 82%. 20 Tendo em conta que o custo de produção das unidades movidas a diesel com um factor de carga de cerca de 50 por cento não é inferior a US$ 0,25/kWh em condições óptimas, e mais provavelmente em excesso de US$ 0,60-1,00/kWh no contexto actual (devido ao elevado custo do combustível diesel e dos custos de aquisição e manutenção em Bissau), o custo de electricidade baseado no Custo Marginal de Longo Prazo dos países vizinhos da zona WAPP é de cerca de US$ 0,12/kWh. 21 H. Farine, « Reforme Institutionnelle des Secteurs de l’Eau et de l’Electricité, Rapport Provisoire de Diagnostic et Recommandations sur les Options de Reforme et la Mise en Place de Partenariats Public- Privé » (Mimeo 2010). 59 medidas: primeiro, aquelas que apontam a pagar uma porção dos passivos de curto prazo (atrasos aos fornecedores e descoberto bancário em particular), uma vez que estes representam o maior perigo para a empresa e têm um peso maior na demonstração de resultados. O segundo conjunto de medidas aponta à restruturação dos passivos das EAGB que não podem ser liquidados (e que dizem respeito essencialmente às maturidades de curto a longo prazo), para melhorar o balanço e restaurar o equilíbrio financeiro. As medidas para pagar os passivos no curto prazo incluem acções destinadas à redução dos créditos a receber no lado do activo do balanço para induzir uma injecção de fundos; um passo importante neste processo é a introdução de um sistema de orçamentação e pagamento das facturas pelo Governo para reduzir as facturas a receber do sector público. Melhorar a governação do sector da energia 2.28 A governação no sector da energia tem diversos aspectos, incluindo a participação da EAGB em furtos de energia, furtos de combustível, excesso de quadros, e decisões de investimentos preparadas de forma precária. A melhoria na governação é um pré-requisito para qualquer reforma do sector e melhoria no desempenho da EAGB. A governação empresarial providencia um enquadramento testado e coerente para enfrentar as principais fraquezas das Empresas Estatais (SoEs) que é consistente com a propriedade indefinida do Estado e a privatização contínua. O manual OECD Guidelines on the Corporate Governance of State-Owned Enterprises detalha os princípios de tal enquadramento e o que é que os governos das SoEs necessitam de fazer para garantir boa governação empresarial (Caixa 2). 2.29 O progresso está em marcha em algumas destas áreas, com o apoio dos parceiros da Guiné-Bissau. O Banco Mundial montou um esforço substancial para auxiliar o Governo a implementar a sua estratégia para o sector da energia através do Projecto Multissectorial de Reabilitação da Infra-estrutura (MIRP), que foi aprovado em Maio de 2006 e foi recentemente reestruturado, e o Projecto de Reabilitação de Emergência da Electricidade e Água (EEWRP), que foi aprovado em Julho de 2010. Adicionalmente, duas organizações regionais, a Comunidade Económica de Países da África Ocidental (CEDEAO), e a UEMOA, estão a providenciar US$ 10 milhões à EAGB para aquisição de combustível para produção de electricidade. O EEWRP irá financiar três grandes contratos no sector da electricidade para: (i) adquirir 5 MW de capacidade de produção utilizando fuelóleo pesado e reservatório para armazenar o combustível; (ii) aquisição e instalação de cerca de 15.000 contadores pré-pagos; e (iii) financiamento da assistência técnica para melhorar a gestão do sector e iniciar a reforma da EAGB. Estas acções, combinadas com os US$ 10 milhões para combustível, devem restaurar um nível mínimo de capacidade de produção de cerca de 10 MW para a cidade de Bissau, melhorar o cash-flow em paralelo com o uso de contadores pré-pagos, e a melhoria da gestão através de assistência técnica. Isto deverá levar ao retorno à EAGB de alguns consumidores institucionais que estavam a confiar em auto-geração, e também à melhoria da qualidade e quantidade no serviço a todos os consumidores. Todavia, existe ainda um gap entre a procura de pico, estimada em 30MW, e o fornecimento disponível por parte da EAGB. Caixa 2: Directrizes da OCDE para a Governação Empresarial em Empresas Estatais (SOEs) De acordo com a OCDE, os princípios-chave para a governação das SOEs incluem os seguintes pilares: I. Garantir um Enquadramento Legal e Regulatório Efectivo para as SOEs O enquadramento legal e regulatório das SOEs deverá garantir um plano competitivo equitativo em mercados onde as SOEs e empresas privadas competem de forma a evitar distorções. O enquadramento deverá elaborar a partir de, ou ser totalmente compatível com, os Princípio de Governação Empresarial da OCDE. II. O Estado a agir enquanto Proprietário 60 O Estado deverá agir como um proprietário informado e activo e estabelecer uma política de controlo clara e consistente, garantindo que a governação das SOEs é levada a cabo de forma transparente e responsável, com o grau necessário de profissionalismo e eficácia. III. Tratamento Equitativo dos Accionistas O Estado e as SOEs devem reconhecer os direitos de todos os accionistas e, de acordo com os princípios de governação empresarial da OCDE, garantir o seu tratamento equitativo e igual no acesso à informação empresarial. IV. Relações com os Stakeholders A política de controlo do Estado deverá reconhecer as responsabilidades das SOEs para com os stakeholders e pedir que estas reportem acerca das relações com os diversos stakeholders. V. Transparência e Divulgação As SOEs devem observar princípios elevados de transparência, em concordância com os Princípios de Governação Corporativa da OCDE. VI. As responsabilidades dos Conselhos de Administração das SOEs Os Conselhos de Administração das SOEs devem ter a autoridade necessária, competência e objectividade para realizar a sua função de liderança estratégica e acompanhamento da gestão. Devem agir com integridade e serem responsabilizados pelas suas acções. Fonte: Directrizes da OCDE para a Governação Corporativa em Empresas Estatais (SOEs) 3. PROBLEMAS E SOLUÇÕES NO SECTOR DO PETRÓLEO 2.30 O petróleo é um input essencial para a produção de electricidade. A dependência forte das importações do petróleo representa um desafio. O sector do petróleo foi privatizado em 2003. A instalação de armazenamento mais ampla que existe actualmente é agora propriedade e operada por um privado, mas encontra-se num estado de falta de manutenção, e o consórcio privado falhou até agora na implementação do trabalho de reabilitação com que se tinha comprometido como parte do processo de privatização. Os principais problemas relacionados com o sector de produtos de petróleo são os seguintes: (i) a cadeia de abastecimento é ineficiente e uma auditoria para melhorar o trânsito dos produtos de petróleo poderia determinar medidas úteis para a redução de custos; (ii) o armazenamento actual de produtos de petróleo encontra-se em estado precário e é insuficiente. De facto, para fornecer a futura capacidade de produção com fuelóleo pesado, será necessário construir mais capacidade de armazenagem; (iii) subsídio para a produção com gasóleo óleo/diesel para a produção de energia: parte do gasóleo/diesel é furtado e usado para caros e carrinhas privadas; (iv) o sector tem um impacto negativo no ambiente e uma avaliação ambiental das instalações de descarregamento, armazenagem, transporte, e distribuição deve ser realizada para determinar que tipo de medidas de mitigação podem ser empreendidas para reduzir ou eliminar o impacto ambiental negativo; (v) a estrutura dos preços deve ser racionalizada. Em particular, as contribuições para o fundo rodoviário devem ser proporcionais ao estrago feito à rede de estradas; e por fim (vi) a ausência de um enquadramento para o sector do petróleo é problemática, uma vez que não existem regras claras sobre a aquisição, importação, descarregamento, armazenamento, transporte e distribuição de produtos de petróleo em Bissau ou no resto do país. 2.31 O Governo define os preços máximos de venda, que são elevados de acordo com os standards regionais. Os preços são definidos na base de uma recomendação de uma comissão de vários stakeholders, que inclui companhias petrolíferas a operar no país. Em Abril de 2010, os preços eram CFAF 565 (US $0,93) por litro de óleo diesel para uso geral e CFAF 430 (US$ 0,86) por litro para produção de energia, CFAF 677 (US$ 1,35) por litro de gasolina, CFAF 474 (US$ 0,95) por litro de querosene, e CFAF 549 (US$ 1,10) por litro de gasolina misturada. Estes preços são cerca de 20 a 40 por cento mais elevados do que o custo de produtos de petróleo em 61 mercados comparáveis de países da África Ocidental. A formação de preços de produtos petrolíferos na Guiné-Bissau é inflacionada, em parte, devido a problemas no canal de navegação (navios naufragados e outros destroços), que afectam a passagem dos navios-tanques e aumentam significativamente os custos de expedição, mas também devido a infra-estruturas precárias para descarregar os produtos, instalações de armazenagem danificadas, e distorções estruturais e não estruturais do mercado local. A melhoria do sistema de fornecimento, incluindo o porto de Bissau (discutido em capítulos posteriores), incluindo a melhoria da governação e transparência, constituem condições vitais para a melhoria do sector de energia. 2.32 O sector de produtos petrolíferos da Guiné-Bissau tem impactos sociais e ambientais negativos, especialmente em Bissau, onde as operações actuais continuam a causar danos devido ao descarregamento e distribuição. O sector tem também um impacto social negativo, afectando as condições de vida das comunidades em torno das áreas de operação. As autoridades não têm as normas, leis e fundos necessários para cumprir a sua missão. Adicionalmente, a aplicação das normas é díspar e algumas companhias não estão a respeitar os compromissos que firmaram durante o processo de privatização. O desenvolvimento de um enquadramento legal claro sobre protecção ambiental que permita o desenvolvimento sustentável do sector de petróleo na Guiné- Bissau, em consulta com todos os stakeholders - incluindo o público em geral e especialmente aqueles afectados, Governo local, e as companhias - é essencial. Tal enquadramento deve ser baseado em experiências de sucesso em outros países com características ambientais e culturais semelhantes. 2.33 As principais recomendações para o sector do petróleo podem ser resumidas em torno dos seguintes pontos: (i) conceber um enquadramento regulatório que promova a transparência e a eficiência do fornecimento e distribuição das importações e promova práticas ambientais e sociais seguras; (ii) eliminar o subsídio ao gasóleo/diesel para a EAGB; (iii) rever e aplicar os contratos actuais com as companhias de distribuição de petróleo; (iv) rever a cadeia de abastecimento para todos os produtos com vista a reduzir a redução de custos; (v) rever e racionalizar a estrutura de preços actual dos produtos de petróleo; (vi) desenvolver uma estratégia para a promoção do uso do Gás Petróleo Liquidificado (GPL) para áreas urbanas e rurais; e (vii) avaliar os danos ambientais da cadeia de distribuição dos produtos de petróleo e identificar medidas de remediação, em particular o desenvolvimento de um plano para gerir os impactos ambientais e sociais do uso do GPL. 2.34 Embora desafiante, a reforma do sector de energia é crítica. O fornecimento fiável e economicamente acessível de energia para as famílias e empresas, sem a necessidade de subsídios, e sem externalidades para o ambiente e comunidades, é o objectivo que a Guiné-Bissau deve almejar. É difícil subestimar a importância da energia para o desenvolvimento e redução da pobreza. É possível observar progresso no sector, suportado pelos parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau, e este permanecerá um sector chave que irá concentrar o foco dos investimentos e reformas. 62 PARTE II: O PORTO DE BISSAU 4. CONTEXTO E QUESTÕES-CHAVE 2.35 O porto de Bissau é um porto muito pequeno, com um output de apenas cerca de 30.000 TEU.22 O porto é localizado no estuário norte do Rio Geba e é o único grande porto da Guiné-Bissau, frequentado principalmente por embarcações pesqueiras e de contentores (Figura 29) embora tenha sido originalmente Figura 29: O porto recebe principalmente navios de desenhado para navios de passageiros e de pesca e de contentores carga convencional. Em um dos lados, o porto (número de navios) está bem protegido das marés do Oceano Navio de contentores Atlântico pelo Arquipélago dos Bijagós. Do 180 Petroleiro lado oposto, está rodeado pelo densamente 160 Barco de Pesca povoado bairro da cidade de Bissau, o que 140 dificulta a implementação de qualquer medida de extensão do porto para uma das áreas 120 adjacentes. Sem prejuízo da sua pequena 100 dimensão o porto é e permanecerá uma das 80 infra-estruturas-chave do país, uma vez que a 60 maioria da carga importada e exportada é tratada aí. Em 2013, o arroz contabilizou 40 cerca de um quarto das importações (Figura 20 31) e o caju mais de 80 por cento das 0 exportações (Figura 31) tratadas no porto. A 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 outra carga, incluindo bens de consumo, tem vindo a aumentar de forma constante, no entanto esta tendência registou uma pausa Fonte: APGB. abrupta e reverteu com o golpe de 2012 e a queda económica associada. Figura 30: O caju domina os produtos de exportação Figura 31: O diesel, cimento e arroz dominam as no porto importações recebidas no porto (toneladas métricas) (toneladas métricas) 180 250 Combustível diesel Thousands Thousands 160 Cimento Arroz 140 200 Outra carga 120 150 100 80 100 60 Castanha de caju Outra carga 40 50 20 0 0 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2008 2009 2010 2011 2012 2013 Fonte: APGB. Fonte: APGB. 22 É classificado como um “porto pequeno” sob a classificação internacional da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). 63 2.36 As condições actuais da infra-estrutura do porto e equipamento são descritas como muito precárias. Foram identificadas numerosas deficiências nas infra-estruturas. Estas incluem questões críticas tais como o acesso marítimo, superfícies, armazéns, edifícios do porto, e outros sistemas de infra-estruturas - em suma, praticamente todas as partes constituintes do porto.  Acesso: o acesso ao porto é muito difícil devido à profundidade limitada do canal de aproximação e da baía do porto. Os auxílios à navegação (i.e. faróis e bóias) no canal de aproximação entre a ilha do Caio e o porto ou são completamente ausentes ou encontram-se numa situação muito precária. O tráfego marítimo só pode ocorrer durante o dia e com a maré enchente; o canal de aproximação permite apenas tráfego de um sentido e passagem demora cerca de quatro horas. As manobras de atracagem no porto são dificultadas por diversos naufrágios. Adicionalmente, a profundidade das águas na proximidade do cais, seja novo ou velho, é insuficiente.  Superfícies: uma superfície de 1,5 hectares está actualmente a ser usada para armazenagem de contentores, a maioria da qual não foi ainda pavimentada. A parte da superfície que está pavimentada demonstra já algum desgaste e danos. Três superfícies adicionais para armazenagem de contentores (5.500 m2 e 6.600 m2) não foram ainda pavimentadas.  Edifícios portuários de armazenagem e outros: oito armazéns (i.e., armazéns A até H), com uma superfície de aproximadamente 780 metros quadrados, estão a ser usados para armazenar arroz e outros bens empacotados. Todos os armazéns demonstram sinais de deterioração acentuada. A maioria dos armazéns e estruturas apresentam estragos, alguns dos quais bastante severos.  Outros sistemas de infra-estruturas: a ausência de um sistema de esgoto e drenagem, combinado com a ausência de superfícies pavimentadas, coloca constrangimentos graves ao fluxo de águas tendo em conta também que os canais de drenagem limitados actualmente existentes estão bloqueados. Adicionalmente, existe um problema sério com a rede eléctrica, e a ausência de um sistema de iluminação funcional impede qualquer trabalho nocturno e, consequentemente, os trabalhos de manutenção não são muito eficientes.  Equipamento de handling: as operações de manuseamento e de transporte de carga são afectadas de forma negativa devido ao estado precário do equipamento de carga ou de transporte, isto para carga em contentores como para outros tipos de carga de forma semelhante; pela ausência de um sistema de controlo e de um sistema operacional do terminal (TOS); por instalações, equipamentos e ferramentas inadequadas; por escassez de peças e consumíveis; e pela falta de um sistema de manutenção em geral. 2.37 Adicionalmente, existe uma panóplia de assuntos institucionais e organizacionais que impactam no desempenho operacional do porto e na respectiva viabilidade financeira. A entidade portuária, APGB, tem de lidar com quadros redundantes e não qualificados, e não existe um planeamento geral do porto ou uma estratégia de investimentos para orientar as actividades. Ainda mais importante, a entidade está actualmente a funcionar sem ter um enquadramento legal e regulatório claro e sob uma arquitectura institucional desadequada. Todavia, o enquadramento existente não é simples e envolve um número vasto de entidades e de relações de tutela, criando assim uma rede complexa de interesses de stakeholders na reforma do porto. 2.38 Reflectindo a escala pequena do porto e o respectivo estado precário, assim como também o contexto regulatório onde a APGB opera, os custos portuários são elevados. A estrutura das tarifas de handling do terminal mostram que as tarifas atingem valores dez vezes superiores do que alguns portos da região, incluindo aqueles que começam a perfilar-se como competidores credíveis de Bissau para o comércio com destino à Guiné-Bissau (Tabela 2). Como 64 resultado adicional, as operações portuárias geram receitas equivalentes a cerca de 2 por cento do PIB, tornando a APGB uma das maiores companhias do país. Todavia, com tarifas de handling tão elevadas, o porto não conseguirá ser competitivo regionalmente, mesmo que seja expandido para lidar com mais tráfego regional. 2.39 A participação do sector privado no porto falhou na década de 90. Além da instabilidade política, económica e financeira na Guiné-Bissau desde o final de década de 90, o enquadramento institucional inacabado da APGB e a falta de progresso no plano das reformas resultaram em parte da tentativa falhada em 1991 de concessionar as operações portuárias a um operador privado, TERTIR, como parte de uma joint-venture com um grupo de interesses locais denominado GUIPORT. No seguimento do cancelamento do contrato de concessão em 1999, a APGB foi forçada a assumir a gestão e operações do Porto de Bissau, uma responsabilidade para a qual não estava estruturada para assumir e para a qual não tinha mandato. 2.40 Como resultado, a APGB encontra-se actualmente encarregue de gerir todos os portos do país sob a supervisão do Ministério do Transporte e Telecomunicações, mas de facto verifica-se que a companhia se auto-regula. Isto deve-se principalmente ao facto de que os seus quadros são os únicos com capacidade técnica suficiente para gerir o sistema portuário do país. Adicionalmente, a concessão falhada deixou o Governo com um passivo de US$ 9,5 milhões, uma vez que o concessionário original recebeu este montante sob a decisão de um tribunal de arbitragem internacional. Embora esta decisão não seja tecnicamente aplicável no país uma vez que a Guiné-Bissau não ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre o Reconhecimento e Aplicação de Decisões de Arbitragem Internacionais, a sua mera existência é um poderoso dissuasor para qualquer operador internacional privado interessado em investir no sistema portuário. Em alguma altura o Governo necessitará de resolver esta disputa se quiser maximizar as suas hipóteses de garantir uma privatização de sucesso da sua rede de portos no futuro, a não ser que limite a participação privada a um contrato de gestão. Tabela 2: O porto de Bissau é o mais caro na região Fontes: Websites da APGB, autoridades portuárias de Banjul e Dakar, e (a) Autoridade Portuária da Arábia Saudita. 65 5. INVESTIMENTO E REFORMA INSTITUCIONAL 2.41 Os custos económicos associados à situação actual são significantes. Apesar da infra- estrutura precária e uma situação institucional disfuncional, o porto consegue operar com uma capacidade quatro vezes superior à capacidade de origem, e é a fonte da uma porção significativa das receitas do Governo através da alfândega, e um cash-flow significativo para a APGB. No entanto, para todos actores e observadores económicos na Guiné-Bissau, o estado precário do porto é um dos principais constrangimentos à promoção do comércio e crescimento económico no país e na cidade de Bissau enquanto principal centro económico urbano do país. 2.42 Adicionalmente, o porto de Bissau irá provavelmente permanecer o único grande porto do país durante o futuro próximo. Embora haja um grande interesse dos sucessivos governos em desenvolver um porto de águas profundas em Buba, uma cidade secundária situada na parte Sul do país, as autoridades não conseguiram até agora mobilizar os recursos necessárias para o financiamento de um projecto grande e oneroso como um porto novo de raiz, e não é provável que o consigam no futuro próximo. Assim, o porto existente de Bissau continua a desempenhar um papel quase exclusivo na cadeia logística de comércio do país, mesmo que essa posição possa ser contestada por fugas de tráfego internacional de e para a Guiné-Bissau a partir de países vizinhos (Senegal e Gâmbia) por via terrestre e marítima. De facto, as receitas de impostos, aduaneiras e de manuseamento de carga geradas directa e indirectamente pelas actividades do porto ficam abaixo das que um porto eficiente de um economia pequena mas em crescimento poderia gerar, mesmo que a sua existência explique em parte porque é que os esforços de reforma do porto tenham sido até à data inconsequentes. 2.43 Até à data o progresso alcançado na concepção de uma estratégia de reforma tem sido limitado. Afortunadamente, durante um workshop organizado no início de 2010 para disseminar as conclusões de um estudo sobre a reforma dos portos, emergiu um consenso entre a APGB, Ministério dos Transportes e Comunicações, assim como outros stakeholders, sobre a necessidade de lançar as reformas portuárias necessárias sob uma abordagem colaborativa e participativa para garantir um progresso célere. Embora isto represente um passo na direcção certa, todos os agentes envolvidos reconhecem que, devido à situação complicada do porto de Bissau, uma série de medidas de emergência devem ser consideradas e consensualizadas, como um primeiro passo, para mitigar o o impacto negativo da situação actual na economia da Guiné- Bissau. 2.44 Uma estratégia viável para o porto deve enfrentar tanto as necessidades de investimento físico, como as necessidades institucionais. Isto irá requerer nada menos do que o desenvolvimento, adopção pelo Governo, e implementação de uma abordagem transformacional compreensiva. Será necessário investimento significativo, a custo elevado, para tornar o porto funcional e eficiente, e mitigar - senão mesmo remover completamente -, os constrangimentos vinculativos ao crescimento que o desempenho precário do porto representa actualmente e continuaria a representar no futuro. Todavia, para este investimento produzir retorno económico e financeiro, as operações portuárias e a gestão financeira necessitam também de uma reestruturação profunda, o que por sua vez exige uma reforma institucional profunda. Todavia, uma abordagem compreensiva, para ser exequível, deve reconhecer os desafios específicos associados à implementação de uma reforma do sector portuário, assim como, de forma mais geral, a capacidade fraca para a suportar. O núcleo da estratégia proposta é uma abordagem sequencial, articulada em torno de um plano de investimento de múltiplas fases e uma estratégia de reforma institucional. 2.45 Será crucial a remoção dos navios naufragados e a criação de superfície suficiente para a armazenagem e manuseamento dos volumes de carga previstos - especialmente contentores, mas também carga convencional. O objectivo secundário passa pela adaptação e 66 melhoria das instalações para o manuseamento mais eficiente da carga e levantamento das restrições operacionais.23 O plano de investimento pode ser estruturado em diversas fases, com a primeira a focar-se em colmatar as infra-estruturas críticas das instalações existentes conforme mencionado em cima, e as futuras fases a concentrarem-se na expansão gradual do porto necessária para responder ao crescimento projectado nas actividades de importações e exportações. Mais especificamente, a Fase 1 envolveria:  Dragagem de navios naufragados;  A reabilitação dos cais e o aprofundamento da profundidade do mar diante do cais e no canal de aproximação;  A reabilitação da superfície de terminal actualmente usada para importação e exportação de contentores;  A reabilitação das instalações de infra-estruturas, tais como sistema de esgotos, sistema de pressão para águas potáveis, e estação de energia eléctrica;  O desenvolvimento de superfícies de armazenamento para contentores refrigerados, contentores esvaziados, e bens perigosos; e  O desenvolvimento de muros de segurança e um sistema de entrada segura de acordo com os standards do ISPS. 2.46 As estimativas preliminares colocam os custos de investimento desta fase em cerca de US$ 35 milhões, com cerca de US$ 15 milhões para os cais e canais de acesso, e o restante para a infra-estrutura terrestre. As fases subsequentes, ao longo de um período de 20 anos, poderiam então incluir a construção de um novo terminal de contentores para responder às actividades de importação projectadas; a construção de superfície de armazenagem adicional para carga convencional, incluindo armazéns; e a construção de um novo terminal de contentores para acomodar o crescimento projectado das actividades de exportação. 2.47 O envolvimento do sector privado seria benéfico para a reabilitação e operação do porto. Uma vez que a Fase 1 do plano de investimento representa um volume considerável que não pode ser financiado somente por recursos portuários ou pelo Governo, as autoridades têm que certificar-se que as reformas institucionais, regulatórias e de governação são colocadas em marcha para que a APGB consiga apresentar a potenciais financiadores um projecto viável, e que inclua um conjunto credível de balanços financeiros. Assim, em conjunto com a implementação destas fases de investimento, é necessário conceber soluções para desenvolver parcerias público-privadas viáveis. Em simultâneo, tendo em conta o tempo necessário para estruturar e licitar uma PPP, e tendo em conta a urgência em enfrentar os problemas de infra-estruturas que pedem o lançamento célere da Fase 1, deve ser implementado um acordo interino. 2.48 Os riscos para a reforma proposta são consideráveis. No nível mais amplo, a instabilidade política da Guiné-Bissau continuará a ser um factor significativo, e que irá afectar a implementação de qualquer configuração de reforma. A identificação, no interior do Governo, de um promotor da reforma com suficiente capacidade e continuidade na estrutura é também fundamental. No geral, o risco político e institucional para a reforma deverá continuar muito elevado no futuro próximo. 2.49 Os riscos para o operador privado nas operações portuárias e financeiras são também elevados. O potencial concessionário não só teria que lidar com interesses laborais e de 23 O aumento do número de ancoradouros não foi projectado, devido ao número actual de navios. 67 gestão instalados, como também teria que lidar com o risco relacionado com a capacidade do Governo de manter o rumo da reforma durante vários anos no sentido de providenciar o tempo suficiente e necessário para conseguir dar a volta às operações portuárias.24 Por fim, como quase sempre é caso para um monopólio quase público, existe um risco considerável que, na ausência de um regulador eficaz e de um acordo de concessão bem desenhado, o monopólio público se transforme num monopólio privado. É por isso importante que todos os agentes relacionados com o porto consigam um acordo que detalhe o âmbito, responsabilidades, e objectivos da reforma. 2.50 Neste sentido, uma das medidas chave necessária e que poderia produzir melhorias rápidas e visíveis nas operações do porto poderia ser a introdução de um contrato de gestão de assistência técnica na APGB. Os objectivos principais de tal contrato seriam o de fortalecer as funções do núcleo de responsabilidades da APGB, providenciar capacitação para o pessoal em áreas que ultrapassariam a Fase 1, e melhorar a disponibilidade e credibilidade de dados operacionais críticos. As áreas para assistência deveriam incluir o planeamento de negócios do porto, gestão financeira, eficiência operativa e técnica, e gestão de recursos humanos, suportados pela introdução de ferramentas modernas de gestão e outras actividades necessárias de fortalecimento institucional. Adicionalmente, o fornecedor de assistência técnica seria incumbido de desenvolver na íntegra uma estratégia de investimento e reabilitação para o porto e um plano detalhado de reforma da gestão. 2.51 As fases posteriores de investimentos devem ser subsequentes à assinatura de um contrato de concessão sob o qual o potencial operador privado assumiria riscos comerciais e financeiros significativos como operador portuário, incluindo o financiamento da nova infra- estrutura proposta. Sob esta abordagem, a APGB eventualmente abandonaria o papel de operador a favor de um papel de regulador sob um “modelo de senhorio”. A concessionária obteria o direito a usar as instalações e activos definidos, mas seria responsável pela estrutura inteira, incluindo todos os investimentos, operações e trabalhos de manutenção. Adicionalmente, a concessionária pagaria encargos de arrendamento à APGB pelo terreno arrendado, os edifícios e restante equipamento, assim como um montante de concessão baseado nas receitas obtidas e negociado a priori. A APGB, pela sua parte, agora liberta da sua função como operadora, poderia então concentrar-se em actividades tais como seguimento de preços, monitorização da qualidade de serviço, etc. 2.52 Devem ser empreendidos pelo menos três passos fundamentais ao realizar a transição para esta nova estrutura regulatória e institucional:  Primeiro, os documentos legislativos de base que vão permitir ao Governo implementar esta reforma vão cobrir o estabelecimento de um enquadramento legal de PPP, e a adopção de regulamentações portuárias económicas e técnicas revistas.  Segundo, uma revisão bottom-up da estrutura de tarifas portuárias será necessária de forma a adoptar um mecanismo adequado de transferência financeira entre o concessionário e o senhorio, Autoridade Portuária, de forma a garantir a solvência financeira de ambos.  Terceiro, a concessão do porto pode requerer um exercício de redimensionamento dos quadros que deve ser estudado cuidadosamente, financiado adequadamente, e implementado a priori antes do concurso para a concessão, de forma a reduzir o nível de risco associado à operação. 24 Adicionalmente, salvo que a questão com a TERTIR seja resolvida de forma célere, o novo concessionário enfrentaria também riscos adicionais em termos de potenciais litigações legais associadas com as tentativas anteriores de concessão do porto. 68 2.53 Embora os desafios sejam formidáveis, a reabilitação do Porto de Bissau é possível e promete ganhos económicos consideráveis. Um estudo realizado em 2010 confirmou que ambos os investimentos detalhados em cima poderiam gerar retornos económicos e financeiros suficientes para justificar o apoio financeiro do Governo e doadores para o processo de reabilitação do porto (incluindo a retrocessão para APGB), e também podem gerar interesse significativo do sector privado. Para um nação de exportações como a Guiné-Bissau, ter acesso a um porto funcional e eficiente em termos de custos é fundamental. PARTE III: ESTRADAS 6. CONTEXTO E QUESTÕES CHAVE 2.54 A Guiné-Bissau tem uma rede rodoviária que se estende por 2.755 km. A maioria da rede rodoviária situa-se na parte continental, enquanto as ilhas têm apenas 79 km, menos de 3 por cento do total. Uma vez que não existe um sistema ferroviário no país, as estradas são as principais infra-estruturas que permitem o transporte. O caju é produzido em todo o país e a capacidade de entregar a castanha de caju para exportação no porto de Bissau é crítica para que os agricultores possam vender o seus produtos e conseguir subsistir. O mesmo se aplica a produtores de outros bens comerciáveis, incluindo arroz, madeira e outros. A capacidade de enviar bens ao longo do país e especialmente para o porto de Bissau é crucial para permitir o funcionamento do mercado. Uma rede rodoviária fraca impede o fluxo eficiente de bens, e também de trabalho, distorcendo assim o mercado. Uma rede precária inibe também a capacidade das pessoas acederem a serviços básicos, incluindo escolas e hospitais. Por fim, se o acesso a outras partes do país, especialmente o porto de Bissau, é limitado, os produtores têm um incentivo crescente para comercializarem os seus bens além-fronteiras com o Senegal ou Guiné. No caso do caju, isto pode resultar numa propensão acrescida para contrabandear, resultando isso num perca substancial de receita para o Governo. 2.55 Apenas 28 por cento das estradas são pavimentadas. A rede rodoviária da Guiné- Figura 32: A quantidade estradas pavimentadas é comparável com a média da África Subsaariana, no Bissau é comparável aos standards regionais. entanto têm-se deteriorado em anos recentes Em termos de cobertura de estradas (estradas pavimentadas em percentagem do total da rede pavimentadas, o país está na média da África rodoviária) Subsaariana (Figura 32). Todavia, esta informação baseia-se no DENARP II e tem por 40 isso cerca de 5 anos. O DENARP II aponta uma 35 série de projectos de reabilitação de estradas no 30 período entre 2004-2009, incluindo ligações 25 estratégicas com países vizinhos (Ziguinchor no Senegal e Banjul na Gâmbia), e inclusive 20 construções de pontes. No entanto, a qualidade 15 das estradas provavelmente deteriorou-se nos 10 últimos anos e os agricultores relataram constrangimentos consideráveis na 5 comercialização dos seus produtos, 0 especialmente durante a época das chuvas GHA BFA NER MLI SSA GNB SEN quando as estradas são inundadas e inutilizadas. Fonte: DENARP II, IDH e cálculos do staff do Banco Isto verifica-se em estradas secundárias e Mundial. terciárias, que estão numa condição particularmente má. Estas são no entanto as estradas que ligam as áreas rurais, em particular as populações rurais, aos mercados. 69 2.56 A falta de investimento na rede rodoviária é um problema considerável. Tradicionalmente, o Governo da Guiné-Bissau dispõe de recursos limitados para investir em estradas. A maioria do investimento nesta área é suportado por doadores. Uma vez que a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) entrou em colapso na sequência do golpe de 2012, não houve disponibilidade de recursos para investir em estradas, fossem estes para novos investimentos ou para efeitos de manutenção. Embora a dimensão exacta do sub-investimento recente seja actualmente desconhecida, a experiência sugere que tem tido um impacto considerável nas estradas e no seu papel vital enquanto artérias económicas. Uma vez que a assistência dos doadores resumiu na sequência das eleições bem-sucedidas de 2014, as estradas devem ser agora uma área chave de intervenção, cobrindo tanto os corredores estratégicos como as estradas rurais. Através de um projecto de Desenvolvimento Liderado pela Comunidade (CDD), o Banco Mundial já está a apoiar algumas comunidades na reabilitação de estradas. Até Novembro de 2013, cerca de 11.250 pessoas nas comunidades envolvidas ganharam acesso a uma estrada resiliente ao clima como parte do projecto. Embora o investimento na rede primária seja melhor entregue a companhias profissionais, os projectos de CDD têm um potencial considerável para reabilitar estradas secundárias e terciárias. 7. PESQUISA E INVESTIMENTO 2.57 O estabelecimento da necessidade de investimentos no sector rodoviário é uma prioridade urgente para o novo Governo. Será importante determinar a dimensão do sub- investimento actual na rede rodoviária desde o último golpe, e subsequentemente priorizar os investimentos. O apoio dos doadores será vital para a construção e reabilitação das estradas, embora se espere que o caso seja particularmente forte para acções de reabilitação. Entretanto, os projectos de CDD podem fazer uma diferença considerável nas comunidades ao identificar e remover constrangimentos chave no sector das estradas em cooperação com os doadores e ONGs. 2.58 A garantia de financiamento doméstico para a manutenção de estradas será crucial para o futuro. O orçamento da Guiné-Bissau é reduzido e as despesas de capital têm sido financiadas quase na totalidade por doadores. No entanto, para tornar o sector sustentável, será importante elaborar um sistema que permita ao Governo tornar-se totalmente responsável pela manutenção da rede rodoviária do país. Já existe um fundo rodoviário que agrega cerca de mil milhões de CFAF (aproximadamente US$ 2 milhões) por ano. O fundo rodoviário é alimentado por uma quota dos impostos sob produtos de combustível, assim como taxas para veículos que utilizam estradas e pontes no país. Todavia, no passado surgiram provas de financiamento de despesas correntes não relacionadas com estradas. Provavelmente será então necessário reforçar a gestão do fundo das estradas. Finalmente, as instituições encarregues da manutenção das estradas podem necessitar de fortalecimento para garantir um melhor seguimento dos trabalhos de construção e reabilitação. PARTE IV: TELECOMUNICAÇÕES 8. CONTEXTO E QUESTÕES-CHAVE 2.59 Com uma taxa de penetração reduzida, o potencial das telecomunicações como um motor para o crescimento económico permanece largamente por utilizar. Em 2012, a contribuição da receita do sector das telecomunicações para o PIB foi apenas de 1,7 por cento, comparada com a média de África de cerca de 7 por cento.25 A contribuição reduzida do sector das 25 Estimativas do staff do Banco Mundial tendo como base dados do 2014 do GSMA e MTN Bissau. 70 telecomunicações para o crescimento económico advém do facto de que os telefones (fixo e móveis), assim como o mercado de banda larga, permanecem subdesenvolvidos (Figura 33). A taxa de penetração das linhas terrestres é reduzida à luz de qualquer standard, e a cobertura móvel encontra-se ligeiramente abaixo da média regional.26 O caso da Internet de banda larga inspira preocupação particular, situando-se em cerca de 0,1%, estimando-se que menos de 3% da população tenha utilizado a Internet em 2013 (Figura 34). Os principais factores que explicam o subdesenvolvimento do sector das telecomunicações incluem: (i) os problemas de energia que resultam em custos elevados de produção para os operadores; (ii) a ausência de conectividade fibra a nível nacional e internacional; e (iii) a falência técnica e financeira da empresa incumbente, Guine-Telecom, e da sua subsidiária móvel, Guinetel, que cessou toda a actividade no início de 2014, reduzindo assim o nível de concorrência no sector (apenas duas operadoras móveis privadas no mercado). 2.60 O desenvolvimento do sector de telecomunicações tem sido lento. Em anos recentes, o Governo provisional da Guiné-Bissau tem iniciado medidas para desenvolver o sector de telecomunicações e este tem permanecido uma prioridade sob o Programa de Estabilização e Desenvolvimento de 2014 do Governo. Todavia estas medidas não foram ainda implementadas. Primeiro, em 2008, o Governo iniciou um processo de reestruturação do operador incumbente com assistência técnica e financeira do BOAD e Ecobank, com um empréstimo de US$ 14 milhões. Este financiamento foi utilizado principalmente para pagar salários atrasados, despedimentos de alguns funcionários (alguns dos quais entretanto regressaram), e dívidas fiscais, mas não financiou investimentos para reavivar as actividades da empresa. A assistência técnica levou à publicação de um convite para concurso na preparação para a privatização da Guinetel e Guine-Telecom, mas foi entretanto suspenso após o golpe de 2010. Segundo, embora a Guiné-Bissau seja o único país da costa africana não ligado a um cabo submarino, o Governo contactou o consórcio ACE em 2011 para iniciar um projecto de ligação e construção de uma estação de recepção. Todavia, a falta de financiamento e a incerteza que pesam há muito na Guiné-Bissau são factores que têm afectado a realização de tal projecto, que se encontra actualmente suspenso. Figura 33: As subscrições de telemóveis têm Figura 34: A revolução da Internet ainda não se aumentado dramaticamente ao invés das linhas manifestou na Guiné-Bissau terrestres que são raras (utilizadores de internet por 100 pessoas) (subscrições de telefones móveis e linhas terrestres por 100 pessoas) 70 1 16 Telefones Móveis Linhas Terrestres (RHS) 60 14 Guiné-Bissau África Subsaariana em Desenvolvimento 50 12 40 10 30 0.5 8 20 6 10 4 0 2 1999 2005 2011 -10 0 0 1999 2004 2009 Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial (WDI). Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial Nota: Devido a múltiplos cartões SIM por utilizador (WDI). (1,97), a taxa actual de penetração para telefones móveis encontra-se mais próxima dos 36 por cento. 26 Ver Figura 17 do capítulo 1. 71 2.61 As linhas terrestres são quase inexistentes. O mercado de telefone fixo - muito limitado devido à degradação gradual da infra-estrutura de cobre - estagnou no seguimento da falência técnica e financeira da incumbente Guine-Telecom e da sua subsidiária móvel Guinetel em Janeiro de 2014, reportada há cerca de quatro meses. O último inventário providenciado pela administração da Guine-Telecom e Guinetel em Maio de 2014 indica:  Uma infra-estrutura de cobre de 4.000 linhas, incluindo 2.000 linhas activas (comparado com 11.000 linhas em 2000);  Uma rede móvel de 27.000 subscritores (que foram agora absorvidos pela MTN e Orange- Bissau) servidos por 47 instalações;  Um quadro de 170 empregados (dois empregados por instalação, com os restantes afectos à administração);  Um prejuízo líquido durante seis anos;  Atrasos de pagamentos ao Estado estimados em US$ 45 milhões, acumulados desde 1997. 2.62 O processo de reestruturação da empresa incumbente, iniciado em 2008 e apoiado por um empréstimo de US$ 14 milhões do BOAD, não gerou nenhuma melhoria estrutural e aumentou o endividamento associado do Governo (para os US$ 20 milhões actuais). O esquema de privatização sob consideração incluiu a venda de 80 por cento de quota accionista da empresa incumbente ao sector privado, critérios rigorosos de selecção (e.g. know-how reconhecido na gestão de uma rede com mais de 500.000 subscritores), e requereu a adopção de um decreto a autorizar a privatização do grupo. O decreto foi adoptado no início de Maio de 2014, mas o resultado do processo de reestruturação é imprevisível no contexto político actual. 2.63 O mercado de telefones móveis concentra a maior parte da actividade do sector de telecomunicações, com 1,04 milhões de subscritores no final de 2013. Isto corresponde a uma taxa de penetração de 66 por cento, onde 99 por cento das subscrições são pré-pagas. Na sequência da falência da Guinetel, causada em parte pelos elevados custos operacionais dos geradores eléctricos em 49 das suas instalações (27.000 subscritores móveis), o mercado de telefones móveis é constituído por apenas dois operadores: A MTN e Orange-Bissau entraram no mercado em 2004 e 2007, respectivamente. As quotas de mercado de ambas as empresas são bastante semelhantes actualmente. Existe um certo grau de concorrência (preços mais reduzidos, procura acrescida, e programas de investimentos) entre os dois operadores, que lutam pela liderança, recentemente obtida pela Orange na sequência da conquista de parte dos subscritores da MTN. 2.64 Actualmente, o crescimento do mercado de telefones móveis é afectado por problemas na qualidade de serviço causados pela situação crítica no plano da energia. Isto traduz-se em custos operacionais e de investimento elevados, que por sua vez oneram o custo do serviço. Esta situação traduz-se numa situação paradoxal em que, apesar de uma boa cobertura geográfica do país (90%), algumas regiões registam muitos poucos subscritores.  Elevados custos operacionais e de manutenção das instalações. Apesar de um enquadramento legislativo e regulatório actualizado (uma Lei de 2010), a partilha de infra- estruturas não é comum. A Orange-Bissau (com 95 instalações) e a MTN (com 110 instalações) não partilham nenhuma instalação em comum e suportam custos operacionais significativos relacionados com o fornecimento de energia e de segurança (um segurança por instalação) das respectivas instalações. A electricidade corresponde a cerca de 60 a 70 por cento dos custos operacionais para os operadores; é produzida por geradores que requerem combustíveis (aquisição e transporte de combustível) e manutenção regular (incluindo importação de peças de reserva). Por estas razões, as instalações localizadas nas regiões mais remotas, onde a densidade de clientes é mais reduzida, enfrentam problemas de manutenção que afectam o funcionamento e qualidade da rede. 72  Custo do Serviço. Fora de Bissau, o poder de compra dos agregados familiares é reduzido, e os problemas de electricidade são exacerbados (a empresa estatal EAGB opera somente em Bissau, e os custos de transporte de combustível são mais reduzidos fora desta cidade). Sob estas condições, o telemóvel é menos disseminado nas regiões rurais do país do que na capital. De facto, a Guiné-Bissau é caracterizada por um número relativamente elevado de cartões SIM por utilizador, significando isto que existem apenas 527.000 subscritores únicos, a maioria dos quais baseados em Bissau. 2.65 O preço das subscrições móveis é demasiado elevado para a maioria do Guineenses. Como ilustração, em 2012, o Produto Nacional Bruto (PNB) per capita era de US$ 510. Tendo em conta a receita média mensal por subscritor do sector de telecomunicações (incluindo todos os operadores) era de US $8,1 em 2013, isto significa que os subscritores utilizaram 19 por cento do seu rendimento mensal em serviços de telecomunicações. Esta proporção é muito elevada quando comparada com aquela de outros países na região: o mesmo rácio é de 14 por cento da Costa do Marfim, 12 por cento no Senegal, 9 por cento no Gana, e 4 por cento na África do Sul.27 Na Guiné- Bissau, o preço elevado dos serviços de telecomunicações deve-se em parte aos custos operacionais significativos suportados pelos operadores e causados por problemas críticos de electricidade. Os operadores de telecomunicações não dependem da electricidade produzida pela EAGB e desenvolvem a sua própria rede de energia na base de geradores muito dispendiosos (devido a combustível, manutenção e custos de segurança). Qualquer melhoria no sector da energia na Guiné-Bissau reduziria significativamente os custos operacionais dos operadores de telecomunicações, o que permitiria a redução de preços e maiores níveis de investimento, aumentando eventualmente a penetração dos serviços. 2.66 O mercado de banda larga, concentrado na capital, é ainda incipiente, com uma taxa de penetração de cerca de 0,1 por cento e taxa de utilização inferior a 3 por cento em 2013. A Orange Bissau tem um monopólio virtual desde 2011, apesar da presença da MTN e Eguitel (um fornecedor local de internet [ISP] licenciado em 2011 que depende da conectividade via satélite). Embora a Orange Bissau utilize tecnologia WiMAX para fornecer os seus serviços, a MTN utiliza essencialmente o GPRS (i.e. 2.5G), mas iniciou o desenvolvimento de acesso Wi-Fi que oferece uma qualidade superior de serviço. 2.67 A Orange-Bissau deve a sua liderança no mercado de banda larga à sua conectividade às redes terrestres de fibra óptica detidas por outras subsidiárias da Orange na Guiné (via Conacri) e Senegal (via Ziguinchor). Apesar da presença da MTN em ambos os países, as ligações terrestres não são tão desenvolvidas como aquelas da Orange e dependem de ligações menos fiáveis e mais dispendiosas de microondas (mais de 20 pontos de ligação [BTS] por corredor regional) comparado com as redes de fibra óptica da Orange. A MTN depende também parcialmente da conectividade dispendiosa via satélite. Actualmente a operadora planeia fortalecer a sua presença no mercado de banda larga e está a considerar um plano de investimentos para 2015. 2.68 A Guiné-Bissau é o único país da costa africana que não está ligado a um cabo submarino (Figura 35). O Governo está em contacto com o consórcio ACE, que estima o custo de investimentos em cerca de US$ 35 milhões, dependendo da localização geográfica da estação terrestre. Todavia, a falta de financiamento e a incerteza política na Guiné-Bissau estão a prejudicar a materialização do projecto. 2.69 A construção de uma estação de cabo submarino na Guiné-Bissau pode ser considerada uma opção dispendiosa para a conectividade internacional quando comparada 27 Fonte: GSMA, “Sub-Saharan Africa Mobile Economy 2013,” publicação online acedida em 2013. 73 com conexões terrestres com países vizinhos que já têm essa infra-estrutura implantada. As conexões podem ser estabelecidas através da combinação de investimento do sector privado e acesso a capacidade excedente de fibra óptica implantada ao longo da rede de electricidade. Figura 35: A Guiné-Bissau é o único país costeiro da região que não está ligado a um cabo submarino Cabo ACE Fonte: TeleGeography, Mapa de Cabos Submarinos 2.70 Sem um melhor acesso à conectividade internacional, a Guiné-Bissau não pode esperar uma melhoria substancial na qualidade e preço dos serviços de banda larga. A melhoria no acesso a serviços de banda larga é essencial para ampliar o nível de serviços ao público e promover sectores-chave produtivos da economia, tais como electricidade, o porto, e o sector do caju. Actualmente, nem a EAGB nem a APGB utilizam serviços TIC ou de banda larga no seu processo de produção, o que cria um défice significativo em termos de ganhos de produtividade. A informatização e o uso da Internet são também chaves para melhorar a governação e facilitar a transição para uma sociedade digital. Os serviços de governação electrónica, iniciativas de livre acesso à informação, e ferramentas de redes sociais têm o potencial para aumentar o envolvimento dos cidadãos, promover inclusão social, e criar oportunidades para o emprego, actividades empreendedoras, e desenvolvimento social. 2.71 A regulação do sector de telecomunicações é desempenhado pela ARN (antigamente ICGB), que tem iniciado uma série de acções de políticas para promover o desenvolvimento do sector das telecomunicações.  Foi implementada uma Lei em 2010 que encoraja a partilha de infra-estruturas (instalações) entre operadores. Apesar deste desenvolvimento positivo, a MTN e a Orange Bissau não partilham nenhuma instalação e não têm planos nesse sentido. Actualmente, os operadores não estão dispostos a partilhar as instalações, com receio de comportamento anti concorrencial por parte dos competidores, e com o pretexto de dificuldades de natureza técnica e de gestão. O uso de companhias de antenas, uma prática comum em mais e mais países, é uma opção na qual os operadores da Guiné-Bissau têm um interesse real. 74  Na sequência de pedidos dos operadores, o regulador autorizou a MTN e a Orange-Bissau a lançar, em Janeiro de 2014, projectos-piloto de 3G através da atribuição licenças experimentais. Esta iniciativa procura acelerar a introdução do 3G, que irá exigir que o Governo defina e implemente uma estratégia de concessão de licenças de 3G.  O regulador pediu aos operadores para registar a identidade dos seus subscritores no espaço de um ano (até à data, os cartões SIM poderiam ser adquiridos sem apresentar identificação pessoal).  O Fundo de Serviço Universal (FSU) foi criado há cerca de três anos e tem recebido contribuições financeiras dos operadores que pagam 1 por cento da sua facturação anual para a operação do Fundo e 1 por cento para o financiamento dos projectos. Até à data, o FSU financiou: (i) o estudo de viabilidade (US$100,000) da conexão via cabo do ACE; e (ii) o desenvolvimento de nove cyber-cafe (operados pela Orange-Bissau) em escolas públicas (em Bissau e outros locais) através do financiamento da conexão, equipamento, manutenção e electricidade. 9. INVESTIMENTO E REFORMA INSTITUCIONAL 2.72 Existe uma margem substancial para melhorias. Paradoxalmente, apesar de problemas de energia, e carência de infra-estruturas para a reestruturação da empresa incumbente, o sector TIC está a mover-se a um ritmo relativamente elevado, e os cidadãos parecem geralmente satisfeitos com os serviços. A introdução de concorrência tem contribuído para a melhoria do fornecimento do serviço, mas a ausência de uma estratégia para o sector limita o desenvolvimento da conectividade, diversificação dos serviços, e redução dos custos. Estas constituem áreas importantes de reforma. 2.73 O Governo adoptou um plano para a estabilização e desenvolvimento em 2014 que providencia a seguintes medidas para o sector TIC: i) Fortalecer a capacidade institucional do Ministério dos Transportes, Comunicações, e TIC; ii) desenvolvimento de um master plan para o sector TIC; iii) reabilitação, reestruturação e privatização da Guine-Telecom e Guinetel; iv) reabilitação, reestruturação e privatização da companhia de correios da Guiné-Bissau; v) instalação de um cabo submarino de fibra óptica; vi) instalação de uma rede esqueleto nacional de fibra óptica; vii) transição do analógico para o digital; viii) transição do 3G para o 4G. 2.74 A maioria destas medidas converge com as principais recomendações do Banco Mundial. Para permitir que a Guiné-Bissau alcance os seus vizinhos, uma série de medidas poderiam - de forma célere e com um custo reduzido - impelir o desenvolvimento do sector TIC e assim promover o crescimento económico, emprego, e redução da pobreza em simultâneo com a diversificação da estrutura da economia. Actualmente, a ausência de uma estratégia que defina as principais reformas de políticas no futuro próximo limita a capacidade para alavancar o crescimento do sector. Tais reformas incluem: Financiamento de infra-estruturas:  Promover sinergias entre os sectores da electricidade, água, e transporte para casos onde os projectos que apontem a reconstruir o stock de infra-estrutura estejam a ser preparados ou implementados. Isto implica o desenvolvimento de redes de base regionais fiáveis através do uso da capacidade excedente de fibra adjacente ao uso da rede de electricidade sob o projecto de electricidade WAPP/OMVG. 75  Revisitar a viabilidade técnica e financeira de uma conexão ao cabo submarino através de um consórcio de operadores suportados por doadores internacionais, e em comparação com a opção WAPP/OMVG28;  Estabelecer as condições certas para aumentar os investimentos em redes de infra-estrutura terrestre, inclusive, quando apropriado, através de PPPs entre operadores privados e o sector público; Diálogo, diagnóstico e estratégia:  Estabelecer um diálogo com os operadores para: i) identificar os principais desafios ao desenvolvimento do sector TIC; ii) elaborar um mapeamento das redes existentes; e iii) discutir soluções possíveis para melhorar o acesso a infra-estruturas existentes e implementar novas infra-estruturas em áreas com serviço reduzido (incluindo através de PPPs). Este diálogo, que tem duas dimensões, deve ser coordenado pelo Ministério do Transportes e Telecomunicações e facilitado pela ARN: multissectorial (estradas, água, electricidade) e regional (através da integração de redes e projectos regionais), incluindo o projecto OMVG de electricidade.  Conduzir um inquérito para identificar os principais obstáculos ao fornecimento de banda larga às famílias e negócios.  Conduzir uma revisão do sistema tributário existente no sector TIC (incluindo telecomunicações e banda larga).  Desenvolver um plano nacional para o desenvolvimento das telecomunicações e banda larga, especificando os objectivos e propondo um plano de acção para os próximos 5 a 10 anos. Regulação e concorrência:  Aumento da concorrência através da reestruturação da empresa incumbente (GuineTelecom / Guinetel) iniciada em 2008.  Considerar um programa de capacitação para a ARN, incluindo o estabelecimento de um observatório do sector;  Implementar um ambiente legal e regulatório actualizado: o enquadramento legal-regulatório- institucional necessita de ser fortalecido.  Aplicar a regulamentação para a partilha de infra-estruturas entre operadores (Bitstream, separação do tipo local loop);  Conceder novas licenças: licenças de operador de infra-estruturas (e.g., companhias de antenas); licenças fixas, ISP, 3G. 2.75 O desenvolvimento do sector TIC na Guiné-Bissau tem um potencial considerável. A reforma do sector da energia será crítica para facilitar o crescimento das TIC. No mundo actual, os telefones móveis e a Internet tornaram-se indispensáveis para as famílias e empresas. Em muitos países africanos, os telefones móveis aumentam o bem-estar das famílias facilitando a transmissão de divisas, sejam estas provenientes da Diáspora ou do Governo. Os telefones móveis ligam os empresários mesmo nos ambientes físicos mais adversos. A Internet liga as empresas aos fornecedores e consumidores e aumenta a eficiência das suas operações. Esta tecnologia tem ajudado pessoas em todo mundo uma vez que os serviços de media sociais são a principal 28 Acrónimo francês para Organisme de Mise en Valeur du fleuve Gambie. 76 ferramenta de coordenação para os movimentos democráticos, conforme visto na Primavera Árabe e em outros locais. A Guiné-Bissau tem muito a ganhar do alavancamento das TIC. Serão necessários investimentos e reformas consideráveis no sector TIC. No entanto, um dos principais constrangimentos prende-se com o fornecimento insuficiente de electricidade. 2.76 As necessidades de reestruturação e de investimento no sector das telecomunicações também existem nos sectores portuário e de electricidade. Embora estas três áreas sejam interdependentes e sejam igualmente vitais para o desenvolvimento económico, a coordenação entre os respectivos programas de reestruturação e investimento deve ser maximizada. A EAGB pode alocar uma proporção crescente da sua produção de electricidade à APGB e Guinetel (e Guine-Telecom), para que se consigam reduzir os custos de electricidade destas duas companhias, melhorando assim o valor acrescentado e gerando as margens necessárias para o investimento e reabilitação das infra-estruturas existentes. A Guinetel pode providenciar serviços TIC à APGB e EAGB para melhorar a respectiva gestão administrativa e simplificar a cadeia de produção, distribuição, e facturação destas duas companhias de forma a permitir que estas possam aumentar e expandir as suas actividades empresariais. Podem ser estabelecidos acordos de parceria entre estas três companhias públicas, que forneceriam serviços entre si. Este capítulo providenciou recomendações sobre como enfrentar os constrangimentos, e outros, para suprir os gaps de infra- estrutura e levar o país para um caminho de desenvolvimento mais dinâmico. 2.77 Os doadores que se estão a preparar para reentrar na Guiné-Bissau devem maximizar as sinergias e fortalecer a coordenação multissectorial. Neste âmbito, parece urgente providenciar uma Unidade de Coordenação, que opere sob a tutela do Ministério da Infra- estrutura, com os meios necessários para apoiar projectos de infra-estruturas (principalmente água e energia), permitindo que esta ligue com os sectores de transporte e telecomunicações. Adicionalmente, o estabelecimento de um registo centralizado de projectos públicos associados com infra-estruturas parece essencial para promover sinergias no sector. 77 CAPÍTULO 3: DESENVOLVIMENTO DO SECTOR PRIVADO E FINANCEIRO 1. INTRODUÇÃO 3.1 A emergência de um sector privado dinâmico na Guiné-Bissau é uma condição necessária para reiniciar o crescimento económico, reduzir a pobreza, melhorar a segurança alimentar, e reduzir o risco de instabilidade política. A promoção do desenvolvimento robusto do sector privado nas áreas produtivas é crítico para redução da pobreza extrema. Garantir o crescimento liderado pelo sector privado é um desafio fundamental para reduzir o risco de ressurgimento do conflito. O desenvolvimento de um sector privado que consiga alcançar os mercados externos pode permitir a criação de empregos, especialmente nas camadas mais jovens. Num país pequeno com espaço limitado para expandir o consumo local, é crítico diversificar para subsectores associados com o potencial de chegar aos mercados externos. 3.2 O sector privado do país está ainda por desenvolver. A economia é largamente informal com um grau considerável de agricultura de subsistência. O desafio será permitir investimentos que possibilitem valor acrescentado à economia, mais empregos, e salários mais elevados. Conforme foi argumentado no capítulo 1, e especialmente num Estado frágil, um sector privado mais dinâmico é importante para que os mais pobres possam sair da pobreza tendo em conta o apoio reduzido que pode ser providenciado pelo Governo. Adicionalmente, um sector privado mais forte ficará em melhor posição para responsabilizar o Governo, resultado numa parceria entre os sectores público e privado. Isto pode por sua vez promover a estabilidade. 3.3 A economia da Guiné-Bissau é muito dependente da agricultura e do sector público. O país é dependente de recursos naturais, principalmente agricultura e pescas, e dentro da agricultura, as exportações de castanha de caju são o sector dominante. A pobreza crónica é mais prevalecente nas áreas rurais. A agricultura representa a principal fonte de rendimentos para 85 por cento da população, e providencia a subsistência da maioria esmagadora dos pobres. Cerca de trinta por cento da pobreza extrema considera-se no estado de desemprego. Mesmo para os que são economicamente activos, os rendimentos são reduzidos e voláteis. Dos 30 por cento da força laboral que não estão empregues na agricultura, a maioria está em serviços, e maioritariamente em auto-emprego associado a actividades de comércio e transporte. Apenas uma fracção pequena da força laboral - cerca de 10 por cento - tem um rendimento de salário, metade em pequenos serviços urbanos, e metade no sector público. Com um mercado doméstico pequeno e iniciativas limitadas orientadas para a exportação, o sector privado local é altamente dependente do consumo e investimentos do sector público. Este factor tem tido efeitos significativos na estrutura e dinamismo do sector privado. 3.4 O país necessita de tomar uma série de medidas para desenvolver os sectores financeiro e privado. A primeira parte deste capítulo irá providenciar uma visão sobre os principais constrangimentos que impactam no investimento privado na Guiné-Bissau e irá identificar as recomendações de políticas para libertar o potencial destes investimentos. 29 A segunda parte deste capítulo irá focar-se no sector financeiro, uma componente crítica para promover o desenvolvimento económico e o crescimento integrado. O capítulo irá providenciar recomendações de políticas para aprofundar o sector financeiro com foco particular no acesso ao crédito, e realçando o papel potencial das instituições de microfinanças. 29 Deverá ser notado que a disponibilidade de dados para este capítulo é relativamente escassa, uma vez que os dados mais recentes disponíveis são de 2006. Existem todavia provas limitadas de que as conclusões tiradas da análise destes dados tenham mudado dramaticamente em anos recentes. 78 PARTE I: DESENVOLVIMENTO DO SECTOR PRIVADO 2. DESAFIOS E SOLUÇÕES 3.5 Os desafios ao desenvolvimento do sector privado na Guiné-Bissau são consideráveis Estes podem ser agrupados em seis áreas: (i) instabilidade política; (ii) infra-estrutura precária; (iii) ambiente regulatório pobre; (iv) acesso limitado a financiamento; (v) baixa produtividade e custos laborais relativamente elevados; e (vi) a falta de diversificação económica. A remoção destes desafios será essencial para que os empreendedores possam perseguir as oportunidades económicas, criando postos de trabalho e pagando melhores salários. A remoção destes constrangimentos é crucial para o crescimento partilhado. 3.6 A instabilidade política tem sido Figura 36: Os grandes episódios de turbulência política responsável por quedas amplas no têm tido o maior impacto negativo no crescimento rendimento. Os golpes militares com e sem (crescimento per capita do PIB e grandes choques políticos) sucesso, os assassinatos políticos e a 20 instabilidade civil têm marcado a história da Guiné-Bissau. A Figura 36 demonstra que os golpes com sucesso e a Guerra Civil de 10 1998-1999 são responsáveis pela maioria dos períodos de recessão na Guiné-Bissau. 0 A perda associada de rendimento, e por vezes da capacidade de produção, tem Golpe Golpe -10 consequências amplas de longo prazo. Um simples experiência sugere que se o país não Golpe tivesse passado por estes períodos de -20 instabilidade política, o PIB per capita seria hoje cerca de duas vezes mais elevado em -30 Guerra Civil 30 termos reais. A incerteza - ou até mesmo a 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 destruição física - que a instabilidade Fonte: IDH e staff do Banco Mundial. política cria, aumenta a aversão ao risco dos empreendedores locais e investidores estrangeiros de forma semelhante. Os doadores, por sua vez, retiraram o seu apoio, conforme sucedeu em 2012. Uma vez que o apoio dos doadores tem sido vital para financiar os investimentos públicos e uma parte dos salários do sector público, o efeito da retirada dos doadores da economia é considerável. Conforme o Capítulo 1 argumenta, levará algum tempo até que a estabilidade regresse à Guiné-Bissau. O fortalecimento do sector privado, como sugerido neste capítulo, é uma forma de apoiar o Guineenses a melhorar o seu dia-a-dia apesar da fragilidade. 3.7 A infra-estrutura precária é o segundo grande desafio para o sector privado da Guiné-Bissau. Conforme os Capítulos 1 e 2 demonstraram, o fornecimento de energia é um dos principais constrangimentos para as empresas. De acordo com o inquérito do Banco Mundial às empresas, cerca de 69 por cento das empresas da Guiné-Bissau dependem de geradores para energia31, e a electricidade é dispendiosa. No entanto, as estradas degradadas, o porto internacional ineficiente, e a infra-estrutura precária de TIC são também constrangimentos. O Capítulo 2 30Isto é baseado no crescimento médio per capita de cerca de 1 por cento a partir de 1982 (excluindo os anos de turbulência política demonstrados na Figura 36 dos cálculos da média do crescimento per capita). 31 Os últimos dados disponíveis são de 2006. 79 providencia recomendações que resolveriam de forma considerável os constrangimentos de mercado associados à infra-estrutura precária. 3.8 A Guiné-Bissau tem também um dos piores ambientes regulatórios para conduzir negócios a nível mundial. O último relatório Doing Business de 2014 classifica a Guiné-Bissau entre os locais mais difíceis para realizar negócios do mundo (Figura 37). Em todas as áreas, incluindo abrir uma empresa, lidar com licenças de construção, aceder a electricidade, registar propriedade, acesso a crédito, protecção de investidores, comércio além-fronteiras, aplicação de contratos, e resolução de insolvências, a Guiné-Bissau encontra-se entre os 50 piores países para realizar negócios. O ranking mais elevado que país alcança diz respeito a licenças de construção (ranking 119) e comércio além-fronteiras (125) - apesar da inadequação do porto. Adicionalmente, o progresso no geral tem sido quase inexistente: o país classificou-se em 181 em 2010 e 180 em 2014. Em contraste, durante o mesmo período o Ruanda subiu de 67 para 32, e Cabo Verde de 146 para 121. 32 Embora o Governo da Guiné-Bissau tenha feito alguns esforços para melhorar o ambiente de negócios antes do golpe em 2012, o progresso permanece modesto e tendo em conta o ritmo mais célere de reformas em outros países, é necessária uma mudança de paradigma rumo a uma agenda mais decisiva de reformas. Figura 37: A Guiné-Bissau não tem conseguido melhorar o seu ambiente regulatório entre 2010 e 2014 - ao invés do progresso notável em outros países da África Subsaariana. África do Sul Ruanda Gana Quénia Cabo Verde Gâmbia Mauritânia Guiné- Senegal Congo, Bissau República Democrática Fonte: Banco Mundial, Doing Business, 2010 e 2014 3.9 Acesso a financiamento é um constrangimento significativo. O capital inicial e o financiamento através de dívida são recursos fundamentais para o desenvolvimento de uma ideia de negócio promissora. Na sua ausência os empreendedores não podem investir, e a ideia de negócio não pode desenvolver-se rumo a uma empresa viável. Conforme explicado na Parte II 32 Ver Caixa 5 no capítulo 4 sobre a visão sólida do Governo do Ruanda acerca do desenvolvimento, e que se manifesta parcialmente no progresso considerável na melhoria do ambiente regulatório para conduzir negócios. 80 desde capítulo, o sector financeiro na Guiné-Bissau permanece largamente subdesenvolvido, 33 tornando o acesso ao financiamento - especialmente o capital inicial - um obstáculo chave que os empreendedores enfrentam. De facto, os últimos dados do inquérito às empresas do Banco Mundial (de 2006 para a Guiné-Bissau) mostram que 38 por cento das empresas que responderam na Guiné-Bissau relataram o acesso ao financiamento como um grande constrangimento ao investimento. Este número é 44 pontos percentuais mais elevado do que aquele observado na média da economia Subsaariana, e mais de 60 pontos percentuais mais elevados do que nos países vizinhos do Senegal e Guiné-Conacri. Quando questionadas sobre se o acesso a financiamento é um obstáculo importante (mas não necessariamente um dos principais), o número salta de 38 para quase 72 por cento, entre os mais altos do mundo. Figura 38: Na Guiné-Bissau, o acesso a financiamento é Figura 39: O acesso a financiamento é um um constrangimento severo para as empresas constrangimento em particular para pequenos (percentagem de empresas que identificaram o acesso a negócios financiamento como um obstáculo significativo para (percentagem de empresas que pediram um empréstimo, conduzir negócios) por dimensão da empresa) Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial. Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). 3.10 O financiamento é um constrangimento especialmente para pequenas empresas. A falta de acesso a capital na Guiné-Bissau afecta principalmente as pequenas empresas: de acordo com dados do inquérito às empresas, apenas 8% pediram um empréstimo (Figura 39). Esta percentagem é significativamente mais baixa do que aquela observada em grandes empresas (50 por cento), e parece ser explicada pela falta de capacidade que as pequenas empresas têm de processar os procedimentos complexos de candidatura e também os requisitos ligados às garantias. De facto, a escassez de garantias foi a principal razão dada pelas instituições financeiras para negar o crédito em dois terços das situações (Figura 41). 3.11 O mercado laboral da Guiné-Bissau é caracterizado por baixa produtividade e custos laborais unitários relativamente elevados. Apesar dos níveis salariais baixos (Figura 42), os custos laborais unitários relativos são elevados quando comparados com outros países (Figura 43). O custo laboral corresponde a 54 por cento do valor acrescentado para a firma mediana no país, um nível mais elevado do que aquele observado na África do Sul (41 por cento), e muito mais elevado do que níveis registados no Quénia (24 por cento) e na República Democrática do Congo (32 por cento). 33 Ver também as Figura 24 e Figura 25 no Capítulo 1. 81 Figura 40: Os procedimentos complexos de candidatura Figura 41:... e a escassez de garantias é a principal encontram-se entre as principais razões devido às quais razão que leva as candidaturas a serem recusadas as empresas não se candidatam a crédito na Guiné- (razões para os empréstimos serem rejeitados, Bissau... percentagem) (razões devidos às quais as empresas não se candidatam a empréstimos, percentagem) Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). Figura 42: Os salários medianos são relativamente Figura 43:... mas devido à reduzida produtividade reduzidos na Guiné-Bissau… unitária, os custos laborais são elevados (salário mediano por trabalhador, em termos de paridade de (custos laborais unitários, rácio de salários por valor poder de compra) acrescentado) Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). 3.12 Uma razão que pode ajudar a explicar a baixa produtividade na Guiné-Bissau é a de que os mercados laborais do país tendem a estar entre os mais rígidos de África (Figura 44). A reduzida produtividade implica um custo laboral unitário relativamente elevado; mesmo quando os salários na Guiné-Bissau são baixos de acordo com vários standards, são relativamente elevados tendo em conta a volume de valor acrescentado por trabalhador. O Governo definiu os níveis de salário mínimo para todas as categorias de trabalho e introduziu uma semana laboral de com um máximo de 45 horas. Os contratos de termo fixo não são permitidos para tarefas permanentes, e a duração máxima deste tipo de contratos (incluindo renovações) é de apenas 12 meses. As indeminizações por rescisão e o despedimento por motivos económicos, situado em 26 semanas de salário, situa-se entre os mais elevados da região (Figura 45). 82 Figura 44: O mercado laboral da Guiné-Bissau é Figura 45:...com os custos de despedimento a situarem- relativamente rígido... se entre os maiores desincentivos para as empresas (rigidez do índice de emprego; mais elevado contratarem empregos formais corresponde mais rígido) (as indeminizações para o despedimento por redundância, semanas de salário) Fonte: Doing Business Banco Mundial Fonte: Doing Business Banco Mundial 3.13 A rigidez do mercado laboral afecta as decisões de contratação das empresas mas também a opção sobre se devem ou não reestruturar, reduzindo assim os incentivos para contratarem trabalhadores de forma formal e afectando também o aumento da produtividade através da reestruturação. É importante ressalvar que diversas empresas não declaram uma vasta parte dos seus trabalhadores ao Governo e que existe uma fraca capacidade para aplicar regulamentações. De facto, de acordo com dados do Inquérito às Empresas, as empresas no sector de manufactura declaram apenas cerca de 72 por cento da sua força laboral; no sector do retalho o número é de 70 por cento e em outros sectores é de 68 por cento. Isto sucede devido à fuga ao fardo pesado imposto pelas regulamentações, apresentado um caso tipo de leis que devem aplicar- se à realidade. 3.14 Uma das grandes causas para a rigidez do mercado laboral são as leis obsoletas. Estas leis representam uma herança do passado: a Lei laboral actual tem cerca de 22 anos e precede inclusive a Constituição. As leis laborais são excessivamente restritivas, com destaque para os seguintes tópicos problemáticos: (i) registo obrigatório dos trabalhadores junto da Inspecção Geral do Trabalho; (ii) submissão anual obrigatória da lista de trabalhadores ao Governo; e (iii) revisão obrigatória de todos os contratos de emprego pelo Governo. Outros aspectos incluem: (iv) as condições que regulam os contratos de termo fixo; (v) a necessidade de autorização prévia antes de implementar planos de despedimento; e (vi) condições que regulam os pagamentos ligados ao desempenho (ligados ao rendimento individual dos trabalhadores). Será vital a reforma das leis laborais para que um código laboral moderno possa governar o mercado laboral. 3.15 Uma segunda razão que ajuda a explicar a baixa produtividade e os custos laborais unitários relativamente elevados na Guiné-Bissau é o reduzido nível de qualificações dos trabalhadores. Os níveis de educação na Guiné-Bissau são baixos, e as companhias fornecem apenas acções de formação limitadas. Por exemplo, a proporção de trabalhadores com um nível médio de educação ou qualquer tipo de formação técnica ou vocacional é reduzido. Os dados apresentados na Figura 47 são baseados apenas em empresas formais do sector de manufactura - 83 na agricultura, onde a maioria do Guineenses trabalha, os níveis de educação são ainda mais reduzidos. A somar aos reduzidos níveis de educação, o país enfrenta também uma escassez de investimento das empresas na formação técnica, mesmo quando os inquéritos às empresas do Banco Mundial sugerem que cerca de 50 por cento das empresas acreditam existe um défice considerável de competências. De facto, apenas 12 por cento das empresas respondentes na Guiné- Bissau oferecem formação formal aos seus trabalhadores, comparado com 43 por cento em Cabo Verde, e cerca de 31 por cento na média da África Subsaariana. A existência de diversas falhas de mercado, tais como externalidades e problemas de trabalhadores que não produzem, reduzem a capacidade de garantir que, quando os trabalhadores são formados pela empresa, não são “roubados” por concorrentes. Adicionalmente, as empresas micro, pequena e médias (MPMEs) têm um conhecimento limitado acerca dos benefícios de investir em programas de formação, e não estão por isso dispostas a pagar o valor de mercado de tais programas. Figura 46: A maioria dos trabalhadores da Guiné- Figura 47: … no entanto apenas algumas empresas Bissau têm uma educação de nível secundário - ou fornecem formação aos seus trabalhadores menor... (percentagem de empresas que providenciam formação) (percentagem de empregados da Guiné-Bissau por nível de educação) Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). Fonte: Inquérito às Empresas, Banco Mundial (2006). Nota: Apenas empresas de manufactura. 3.16 Por fim, o desenvolvimento do sector privado é constrangido por um nível relativamente reduzido de diversificação económica. O principal impulsionador do crescimento económico na Guiné-Bissau é o sector do caju, que é internacionalmente competitivo e tem colocado o país entre os cinco maiores exportadores do mundo. A dependência de somente um produto de exportação torna o país vulnerável em termos de choques de termos de troca, ou choques naturais de grande escala tais como pestes. Em 2012, as condições climatéricas menos favoráveis afectaram de forma negativa a colheita de caju. Todavia, adicionalmente, os produtos da Guiné-Bissau são essencialmente matérias-primas, ou em outras palavras a primeira etapa da cadeia de valor. Isto é ilustrado na Figura 48: quase todas as exportações locais estão à margem do espaço do produto, e servem como inputs brutos para cadeias de valor mais sofisticadas. Isto torna a diversificação para outros produtos complicada, assim como a ligação a jusante e a montante com outros sectores. O caju é um exemplo importante na Guiné-Bissau de uma matéria-prima com um potencial considerável que pode ter muito maior valor acrescentado através do processamento. De facto, os desenvolvimentos recentes sugerem que, além do processamento da noz do caju, também a maçã do caju para produção de bebidas pode ser uma opção lucrativa para a exportação. O vinho de caju já é consumido domesticamente na Guiné-Bissau; e as empresas internacionais, 84 incluindo a Pepsi e a Tropicana, estão a sondar a produção de bebidas refrigerantes com base no caju. 34 Figura 48: Não existem ligações fortes entre as actividades económicas na Guiné-Bissau (espaço do produto: os pontos representam as linhas e produtos de exportação que indicam uma potencial ligação entre produtos; export RCA refere-se à vantagem comparativa revelada da exportação) Fonte: O Observatório da Complexidade Económica, 2014. Nota: Baseado em dados de exportações de 2011; 3.17 Este CEM explora algumas áreas potenciais para diversificação. Embora o sector privado esteja melhor equipado para identificar novas oportunidades. A Parte II deste CEM aborda de forma mais próxima produtos e áreas como o arroz, pesca, indústria extractiva, e turismo como potenciais pólos de crescimento a somar ao sector de processamento do caju. Podem no entanto existir outras oportunidades. Incentivar os empreendedores a entrarem em novos sectores ao melhorar as condições para a actividade económica - incluindo uma melhor infra- estrutura e um ambiente regulatório mais amigável, leis laborais menos rígidas, programas de formação que alinhem com as necessidades dos empregadores, melhoria no acesso ao financiamento, e investimento em competências - pode encorajar a emergência de novos sectores de negócios e melhorar a diversificação económica. A atracção de investidores estrangeiros, incluindo na região (ver o Capítulo 5), tem o potencial de trazer financiamento assim como novas tecnologias e know-how. 3.18 Efectuou-se algum progresso na agenda de desenvolvimento do sector privado anterior ao golpe de 2012. Em Janeiro de 2010, o Conselho de Ministros aprovou uma declaração que enfatizava a importância de simplificar o ambiente de negócios para promover o desenvolvimento do sector privado. Seguiu-se um processo de consultas e discussões, de forma a gerar o consenso sobre o plano de acção para simplificar as formalidades de abertura e registo de um negócio. Aprovaram-se em Março de 2010 dois decretos que estabelecem a base institucional 34 Strom, S. (2014) Cashew Juice, the Apple of Pepsi’s Eye, The New York Times, 8 de Agosto. 85 para criar um balcão único, com o objectivo de simplificar o processo de criação de um negócio. Com a implementação do balcão único em 2011, o tempo para registar um negócio foi reduzido para nove dias em 2013 a partir dos 213 dias estimados em 2010 e, no mesmo período, o custo decresceu de 183,3% para 45,5% do PNB per capita. Em 2011, o Governo elaborou um plano de acção que identificou e removeu mais impedimentos ao desenvolvimento do sector privado. No entanto o ímpeto de reforma foi interrompido pelo golpe de 2012. O novo Governo tem agora uma oportunidade para resumir a agenda de desenvolvimento do sector privado. O Ruanda pode servir como exemplo de um país, também afectado pela fragilidade, que se tornou um dos principais reformadores conforme reflectido nos rankings do Doing Business (Caixa 3). Caixa 3: Ruanda: Líder da reforma do desenvolvimento do sector privado O genocídio de 1994 no Ruanda causou a morte de cerca de 1 milhão de pessoas - cerca de 15 por cento da sua população - e a deslocação de cerca de 2 milhões de pessoas para países vizinhos. Durante esse ano, o crescimento económico decresceu em 50 por cento. Em 1997, 70 por cento de todos os agregados familiares haviam caído abaixo da linha da pobreza, comparado com 53 por cento em 1993. O Governo que chegou ao poder na sequência destes eventos enfrentou a tarefa difícil de reconstruir o país quase a partir do zero. No entanto, apesar destes desafios tremendos, o Ruanda tem registado um progresso notável ao longo dos últimos 20 anos. A esperança de vida duplicou para mais de 60 anos. A taxa de mortalidade para crianças com menos de 5 anos decresceu de 230 para 55 por cada 1000 crianças. O crescimento económico tem atingido em média aproximadamente 8 por cento por ano. Este progresso foi alcançado através da implementação de políticas macroeconómicas sãs e reformas ambiciosas do sector público. Registou-se também um progresso significativo no estabelecimento de fundações para uma economia liderada pelo sector privado, e para posicionar o Ruanda como um hub emergente de serviços e logística na região. De facto, de acordo com o relatório Doing Business de 2013, o “Ruanda encontra-se entre as mais de 35 economias onde o poder executivo tem colocado o desenvolvimento do sector privado como uma prioridade ao estabelecer instituições cujos principais propósitos são de desenhar e implementar reformas de regulamentação do ambiente de negócios”. Alguns exemplos ilustram as medidas tomadas pelo Governo para desenvolver o sector privado:  Envolvimento dos líderes empresariais na definição de políticas e estratégias para alcançar a visão do país. Por exemplo, o Retiro da Liderança Nacional é institucionalizado para que durante uma semana de cada ano, os líderes governamentais e empresariais agreguem as suas competências num esforço para reflectir como é que as estratégias de desenvolvimento podem ser realinhadas para alcançar resultados tangíveis na redução da pobreza.  Melhoria no acesso ao crédito. De acordo com vários relatórios Doing Business: o Em 2005, o registo de crédito público expandiu a sua base de dados de instituições financeiras e melhorou o conteúdo do seu sistema de reporting de crédito. o Em 2010, a legislatura aprovou uma Lei que regulamentou a distribuição de informação das agências de crédito. Isto levou à criação da primeira agência de informação de crédito privada, o que providenciou uma maior cobertura do que o registo público uma vez que inclui informação das empresas públicas de serviços. Adicionalmente, o registo público expandiu a cobertura a empréstimos de todos os montantes. o Em Dezembro de 2010, o registo público parou de emitir relatórios de crédito e actualmente somente a agência privada é que partilha informação de crédito. O 86 registo público ainda colecta informação das instituições financeiras reguladas mas apenas para efeitos de supervisão.  Redução no tempo necessário para iniciar um novo negócio. Em 2006, centenas de novos notários foram introduzidos para reduzir o tempo necessário para abrir uma empresa. Em 2009, os empreendedores deixaram de ter de usar os serviços do notário; uma reestruturação da lei empresarial permitiu o uso de formulários estandardizados, e um sistema para publicar online o aviso de registo substituiu os requisitos para a publicação física.  Facilitação do comércio entre fronteiras As declarações electrónicas aduaneiras foram introduzidas em 2005 e a autoridade aduaneira reduziu o tempo de espera para entrega ao introduzir mais pontos de entrega das declarações em 2007. Adicionalmente, o governo do Ruanda ampliou o horário de abertura dos postos fronteiriços em 2008 e implementou um sistema de troca de informação e inspecções com base no nível de risco. 3.19 O desenvolvimento do sector privado na Guiné-Bissau pode beneficiar de um foco em três pilares (i) implementar reformas para melhorar o ambiente de incentivo ao negócio, incluindo o acesso ao crédito e a mitigação do impacto da instabilidade política; e (ii) introduzir intervenções que ajudem a desenvolver a capacidade de exportação de uma economia em diversificação. 3.20 Primeiro, o país beneficiaria através do foco na implementação de políticas que permitissem um ambiente favorável para as empresas. Um dos pontos cruciais para o desenvolvimento do sector privado em muitos estados frágeis como a Guiné-Bissau são as medidas de facilitação de ambiente de negócios que promovam as reformas regulatórias, capacitação do sector público, acesso ao financiamento, melhoria do ambiente legal, e facilitação do comércio. A melhoria do ambiente de negócios significa a reforma da interface entre a administração pública e o sector privado. Estas reformas têm o papel duplo de motivar o investimento privado em simultâneo com o reforço do «capital político» das instituições públicas vis-à-vis com a população em geral, actualmente num nível baixo. O investimento do sector privado deveria ser apontado a sectores onde o país já é um exportador forte (por exemplo, caju), mas deveria também encorajar o investimento em outros sectores da economia. 3.21 Segundo, o crescimento económico deve ser promovido através da melhoria da produtividade com um foco nas exportações, e através do aumento do número de sectores que fazem uma contribuição significativa para a economia. Num contexto de competências limitadas e capacidade empreendedora fraca, as reformas e simplificação do ambiente de negócios sugeridas no ponto acima são condições necessárias mas não suficientes para a promoção do desenvolvimento do sector privado. De facto, a existência de grandes distorções e necessidades importantes em termos de reformas regulatórias no nível macro não deve ofuscar a necessidade de intervenções micro para melhorar as competências técnicas, de gestão, e empreendedoras do país, assim como enfrentar problemas no acesso ao financiamento e outros constrangimentos ao desenvolvimento das empresas. Este tipo de intervenções têm o benefício adicional de serem relativamente isoladas da instabilidade política. Além do foco na melhoria da produtividade, o país poderia também beneficiar ao procurar um aumento na diversificação económica, uma vez que isto criaria mais espaço para o crescimento, e poderia mitigar os riscos associados à dependência de um único produto agrícola. 3. RECOMENDAÇÕES 3.22 Será importante melhorar a infra-estrutura e investir na capacidade do Governo. As intervenções nestas áreas são descritas em maior detalhe nos capítulos 2 e 4 respectivamente. Embora a infra-estrutura possa ser melhorada, especialmente através da alavancagem dos recursos 87 dos doadores (capítulo 5), os ganhos para a estabilidade política da melhoria da governação vão demorar mais tempo. Conforme o capítulo argumentou, de facto, o reforço da actividade do sector privado a melhoria da governação pública podem reforçar-se mutuamente. 3.23 Um programa para as reformas do ambiente de negócios pode facilitar os investimentos. Para melhorar o clima de investimentos, há necessidade de melhorar a sustentabilidade do balcão único, e as regulamentações devem ser mais simplificadas e mais transparentes, especialmente no que toca aos procedimentos de importação/exportação. Para alcançar este último ponto, o país deverá rever e racionalizar a documentação exigida, os procedimentos de importação/exportação/trânsito, sistemas internacionais de monitorização do comércio internacional, regulamentações sobre investimento industrial, e barreiras internas de comércio (checkpoints de segurança). Deverá também certificar-se que novas regulamentações tais como aquelas que supervisionam o pré-licenciamento do comércio internacional são totalmente implementadas e que a disseminação da informação seja mais visível. Adicionalmente, deve ser reestabelecida uma administração fiscal operacional e adequada, e os sistemas tributários podem ser simplificados e tornados menos onerosos, especialmente para Micro e PMEs. 3.24 O envolvimento do sector privado na definição das reformas é crucial, e por isso o reforço do fórum institucional para o diálogo público-privado e feedback contínuo devem fazer parte da agenda de reformas. De forma mais concreta, o papel das associações do sector privado como stakeholders importantes quando as reformas estão a ser discutidas deve ser sublinhado por duas razões. Primeiro, a agenda de reforma deve envolver trade-offs, e certamente haverá oposição por parte alguns grupos. Por esta razão, a construção de uma grande coligação que apoie estas reformas é crucial para maximizar as hipóteses de sucesso. Segundo, o sector privado será um beneficiário chave desta agenda de reformas, e mesmo que haja empreendedores que não beneficiem de cada reforma, é certo que tomar em conta as suas opiniões constituirá uma importante fonte de verificação para medir o impacto potencial destas iniciativas. 3.25 O ambiente legal deverá ser mais pró-empresas. O fortalecimento da implementação das leis, em geral, e mais especificamente a melhoria dos mecanismos para resolver disputas comerciais, é uma prioridade devido aos efeitos de propagação (spillover). De facto, os problemas relacionados com a aplicação das disputas comerciais têm consequências múltiplas ao longo de diferentes áreas. Primeiro, reduzem o incentivo para investir ou entrar em contratos que envolvam algum tipo de disputa. Segundo, têm uma influência muito negativa no desenvolvimento do sistema financeiro, uma vez que reduzem drasticamente a predisposição dos bancos para conceder crédito. Terceiro, aumentam o custo de cada transacção ao tornar o ambiente de negócios menos competitivo na Guiné-Bissau, reduzindo por isso os incentivos para investir. A criação de um tribunal comercial e de um centro de arbitragem tem sido discutida e planeada. Em 2009, o novo tribunal comercial foi aberto para lidar especificamente com este problema. Quatro juízes foram formados e o novo tribunal foi bem equipado em termos de espaço e equipamento. Infelizmente, devido à falta de serviços administrativos e apoio limitado em termos de pessoal, o tribunal não está ainda totalmente operacional. Alguns investimentos reduzidos nesta área podem ter um importante retorno se conseguirem tornar o tribunal totalmente operacional. 3.26 O acesso ao financiamento deverá ser melhorado. Este aspecto é discutido na segunda parte deste capítulo. 3.27 Existe uma necessidade considerável de melhorar a formação e reforçar as competências. Isto implica investimentos no sector da educação e formação. A somar ao trabalho na educação formal, existe uma necessidade de identificar a dimensão da procura por competências técnicas nos anos vindouros nos sectores críticos de crescimento. Existem certamente boas oportunidades para desenvolver a formação vocacional em colaboração com grandes empresas. O sector de recursos da indústria extractiva (capítulo 11), se desenvolvido, pode 88 ser uma área para essa cooperação. O mercado laboral deve ser reformado para reduzir a rigidez, aumentar a produtividade das empresas, e encorajar a formação de empregos. Um mercado laboral muito rígido é um constrangimento-chave para as empresas. Na Guiné-Bissau, muitas empresas não declaram os seus trabalhadores, evitando assim o regime oficial de leis laborais. Será importante que a Lei se aplique à prática e adopte um código laboral mais moderno. 3.28 A formação de competências dos empreendedores irá ajudar a suprir um importante constrangimento no desenvolvimento das empresas. As capacidades empreendedoras das companhias existentes são particularmente baixas. Um recente Censo de Empresas na Guiné- Bissau relatou que apenas 199 das 8.665 empresas entrevistadas declararam terem contabilidade organizada. A combinação de formação e competições de planos de negócios pode fomentar o empreendedorismo. Tais competições podem atrair ideias de negócios em sectores de actividade que podem potencialmente gerar valor acrescentado substancial para a economia, e gerar um número significativo de novos empregos. Este tipo de competição foi desenvolvida com sucesso em países como a Nigéria e Costa do Marfim. As competições de planos de negócios seriam abertas para empreendedores actuais interessados em desenvolver novas ideias. Todavia, devem dar prioridade a empreendedores jovens por duas grandes razões. Primeiro, os jovens da Guiné- Bissau têm falta de oportunidades económicas em geral, e de empregos em particular. Segundo, na estrutura de mercado actual, os jovens são mais afectados por constrangimentos no acesso a financiamento, uma vez que a ausência de um historial de crédito e de garantias torna difícil demonstrar a sua confiabilidade junto das instituições financeiras. Os planos de negócio seleccionados podem receber donativos iniciais e formação personalizada. 3.29 A diversificação da economia será vital. Este CEM cobre na segunda parte uma série de sectores que podem tornar-se potenciais motores de crescimento na Guiné-Bissau, além do sector dominante do caju: produção de arroz, pescas, recursos extractivos, e turismo. Algumas destas áreas têm potencial para ligações consideráveis a jusante e a montante (tais como o sector de recursos extractivos, ver o capítulo 11). Em algum ponto, a Guiné-Bissau deverá iniciar actividades de produção com alto valor acrescentado para conseguir subir na escala dos rendimentos. As melhorias no ambiente de negócios, acesso a financiamento e desenvolvimento de competências, conforme explicadas neste capítulo, vão permitir aos empreendedores lançar-se em novas áreas. Os investidores estrangeiros devem ser atraídos, tendo em conta o seu know-how e financiamento. A CEDEAO é uma região potencial da qual se pode atrair IDE (ver capítulo 5). 3.30 As cooperativas, incluindo cooperativas de consumidores, podem ser mais exploradas enquanto catalisadoras do desenvolvimento económico (Caixa 4). As cooperativas agregam os seus recursos, alavancando assim o seu impacto. Podem também ultrapassar os constrangimentos de mercado, incluindo a escassez de acesso a financiamento. As cooperativas já existem na Guiné- Bissau, mas o seu potencial pode não estar devidamente realizado. Os doadores e as ONGs podem apoiar mais o desenvolvimento de cooperativas na Guiné-Bissau. Caixa 4: Promover o desenvolvimento local através de cooperativas As cooperativas têm um historial de mobilizar recursos da comunidade com o objectivo de aproveitar as oportunidades económicas. Desde que as primeiras cooperativas foram formadas em comunidades locais durante a Revolução Industrial no norte da Inglaterra, elas têm-se espalhado por todo o globo, conquistando diferentes sectores, e tornando-se substanciais em dimensão. Nos Estados Unidos, por exemplo, as cooperativas podem ser encontradas em sectores que abrangem a agricultura, serviços financeiros, cuidados de saúde, habitação, retalho de alimentos, e serviços de electricidade e água, empregando mais de 850 mil pessoas, controlando mais de US$ 3 biliões em activos, e gerando mais de US$ 500 mil milhões em receita anual. A Guiné-Bissau é também sede de uma série de cooperativas - algumas das quais, no sector do caju, 89 que são apoiadas através de um projecto financiado pelo Banco Mundial. A chave para o sucesso do modelo das cooperativas assenta na capacidade que têm de agregar e alavancar os recursos da comunidade, desde activos, a trabalho, conhecimento, e formação. As cooperativas têm um potencial particular para o desenvolvimento económico de países como a Guiné-Bissau. Em geral, as cooperativas têm os seguintes princípios: (i) são empresas detidas pelos seus membros; (ii) todos os membros têm direitos de voto iguais; (iii) a participação é voluntária; (iv) são capitalizadas pelos seus membros e através dos lucros retidos do negócio; (v) parte dos lucros são distribuídos aos membros, baseado na sua contribuição para os lucros da cooperativa. O ponto (v) é auto evidente no caso das cooperativas de produção, que são comuns em África. No entanto, existem também cooperativas de consumidores, que são menos comuns, e que também incluem negócios como lojas de retalho alimentar das comunidades. Neste exemplo, os lucros seriam distribuídos proporcionalmente à quantia que cada membro gastou em produtos na loja. As cooperativas têm também um potencial considerável na Guiné-Bissau por dois motivos: podem ajudar a ultrapassar falhas do mercado a nível da comunidade, e apoiar o empreendedorismo através do estabelecimento de comunidades empresariais auto reguladas. A resolução das falhas de mercado e a promoção do empreendedorismo têm um potencial considerável para a Guiné-Bissau, conforme os capítulos 2 e 3 deste CEM argumentam. Isto é especialmente verdade num ambiente de fraca governação, onde as comunidades podem compensar parcialmente as fracas instituições nacionais. As falhas de mercado abundam na Guiné-Bissau. Algumas das quais podem ser resolvidas através do modelo de cooperativas. Uma das tais falhas é disponibilidade muito limitada de crédito. As cooperativas são negócios formados por membros que agregam os seus recursos - mesmo que estes sejam limitados. As cooperativas tendem a expandir quando os membros investem os lucros do seu negócio de volta na cooperativa. Desta forma, os negócios podem crescer de forma orgânica, mesmo sem acesso a crédito bancário. Além do financiamento, é também concebível que as cooperativas enfrentem outras falhas de mercado. Por exemplo, se as estradas de ligação se encontram num estado que afecta o negócio da cooperativa, os membros podem investir na reabilitação da estrada mesmo sem assistência do Governo - os projectos de desenvolvimento liderado pela comunidade já trabalham para melhorar o estado das estradas rurais. As cooperativas podem entrar em actividades similares, mas neste caso sem utilizar recursos dos doadores mas antes de forma independente utilizando os recursos próprios da comunidade. As cooperativas podem estimular o empreendedorismo e melhorar a cultura empresarial. Uma vez que os cidadãos comuns, incluindo trabalhadores, produtores e/ou consumidores, possam tornar-se membros da cooperativa, e assim seus proprietários, eles têm um interesse em perceber a forma como a cooperativa conduz a sua actividade - com um objectivo de maximizar os lucros. Posteriormente todos os lucros são distribuídos parcialmente de volta aos membros. Neste sentido, especialmente numa economia rural, agrícola e frequentemente de subsistência como a da Guiné- Bissau, as cooperativas providenciam um fórum de economia moderna aos seus membros e estimulam os instintos empresariais: maximização do lucro. Segundo, as cooperativas criam redes empresariais através das quais as transacções são efectuadas, reguladas pelas regras da cooperativa. Neste sentido, os membros responsabilizam-se entre si, o que pode compensar parcialmente o fraco sistema judicial na presença do Estado frágil. A aplicação dos contratos entre as partes da transacção é uma fundação crucial de uma cultura empresarial dinâmica. As cooperativas de consumo têm um potencial particular quando combinadas com transferências monetárias (cash transfers). Existem já uma série de cooperativas de produtores na Guiné-Bissau. Todavia, este não é o único tipo de cooperativas. As cooperativas de 90 consumidores são abertas a todos os consumidores - que em princípio incluem todos os membros (adultos) da comunidade. O Capítulo 6 argumenta acerca da necessidade de implementar programas de assistência social na Guiné-Bissau. Qualquer forma de transferência de dinheiro, seja ela condicional ou incondicional ou através de um programa de dinheiro por trabalho, iria injectar recursos financeiros adicionais mesmo em áreas remotas e especialmente pobres da Guiné- Bissau. Isto providenciaria ao Guineenses poder de compra, o que permitira por sua vez a aquisição de bens em lojas locais - incluindo cooperativas. O estabelecimento de cooperativas de consumidores iria garantir que estas despesas criam riqueza e oportunidades económicas na comunidade, uma vez que os lucros são imputados aos membros da comunidade e são investidos para ampliar o negócio e criar mais rendimentos e empregos para os membros da mesma. Fontes: Majee, W. e A. Hoyt. 2011. ‘Cooperatives and Community Development: A Perspective on the Use of Cooperatives in Development’ Journal of Community Practice 19(1):48-61; Woolcock, M. e Narayan, D. 2000. ‘Social Capital: Implications for Development Theory, Research and Policy’ World Bank Research Observer 15(2):225–251; Birchall, J. 2004. Cooperativas e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio Genebra: Organização Internacional do Trabalho. PARTE II: O SECTOR FINANCEIRO 3.31 O sector financeiro é pouco profundo, e maioritariamente limitado ao sector bancário. Os quatro bancos comerciais a operar na Guiné-Bissau (três dos quais iniciaram operações nos últimos oito anos) detêm cerca de 94 por cento dos activos do sistema financeiro (Figura 49). O Ecobank, no final de 2009, era o maior banco dos quatro, em termos de volume de empréstimos bancários (Figura 50). O sistema financeiro é dominado por subsidiárias de bancos pan-africanos e quotas de não residentes nos bancos maioritariamente detidos por privados (Figura 51). Figura 49: Quatro bancos comerciais detêm cerca de 94 por cento dos activos do sistema financeiro (activos em mil milhões de CFAF e percentagem do PIB) Fonte: BCEAO, Bancos Comerciais, INPS, CIAS Seguros, e estimativas do FMI . 91 Figura 50: O Ecobank é responsável por quase Figura 51: As subsidiárias de bancos pan-africanos dominam metade do crédito fornecido à economia o sistema financeiro na Guiné-Bissau (percentagem de empréstimos totais em 2009) (quotas de percentagem, 2012) Fonte: Banco Mundial. Fonte: BCEAO, Bancos Comerciais, e estimativas do FMI. Bancos 3.32 O principal negócio dos bancos consiste em colectar depósitos, conceder crédito a empresas de média dimensão, e lidar com títulos financeiros do Governo. Um dos bancos (BRS) tem concedido crédito a actividades de microfinanças, mas com níveis muito limitados. Nenhum novo banco entrou no mercado da Guiné-Bissau desde 2007, quando o Ecobank, um grupo bancário Africano, iniciou operações em Bissau. Apenas cinco instituições de microfinanças (IMFs) fornecem serviços financeiros no país, e numa base limitada e circunscrita a Bissau. 3.33 A taxa de penetração bancária é muito reduzida, situando-se em menos de 1 por cento da população. Os empréstimos bancários são caros e têm poucos clientes. Como exemplo, as taxas de juros para pequenas empresas situam-se em cerca de 12 por cento em 2010, comparado com a média de 8 por cento nos países da UEMOA. O número total de contas bancárias que servem a população situa-se abaixo dos totais de países comparáveis.35 As autoridades tentaram, há alguns anos, fomentar um aumento do número de contas bancárias ao obrigar os trabalhadores públicos a abrir uma conta bancária na qual os seus salários seriam directamente depositados. Todavia, o baixo nível de rendimentos entre os trabalhadores públicos não permitiu que estes mantivessem saldos nestas contas. 3.34 No final de 2012, os bancos encontravam-se bem capitalizados, relativamente líquidos e com uma rentabilidade modesta. De acordo com o FMI, o rácio de adequação de capital em 2012 era de 22 por cento.36 Embora este seja o maior buffer de adequação de capital na região UEMOA, o sector bancário da Guiné-Bissau corresponde a uma parte muito pequena do sector bancário deste espaço; em conjunto, os quatro bancos comerciais correspondem a apenas 0,7 por cento do balanço agregado da UEMOA. A liquidez em 2012 era de 44,6 por cento, expressa em termos de bens líquidos por total de activos, o que representa um nível sólido. O retorno sobre os activos (ROA) era cerca de 2,6 por cento e o retorno sobre o capital próprio 35 Ver Figura 24 no capítulo 1. 36 Esta discussão é baseada no relatório de Artigo IV do FMI de 2013. 92 (ROE) era de cerca de 18 por cento em 2012. Os bancos são por isso relativamente rentáveis e o sistema bancário pode ser considerado globalmente saudável. 3.35 No entanto, a concentração de activos é elevada e o crédito malparado (NPLs) tem aumentado. A elevada exposição ao caju - os empréstimos ao sector representaram cerca de 25 por cento do total dos empréstimos - significa um nível relativamente elevado de riscos. Este sector é também responsável por uma alta percentagem de crédito malparado, cerca de 9,7 por cento em 2012, tendo registado um aumento entretanto. O crédito malparado elevado é uma das principais razões pelas quais os bancos têm sido relutantes em emprestar em anos recentes, especialmente para comerciantes de caju. Isto agravou o desempenho fraco das recentes campanhas de caju. 3.36 O aprofundamento financeiro melhorou recentemente, mas ainda não se encontra no nível dos países da UEMOA. O rácio M2 para PIB, um medida proxy de intermediação financeira, aumentou de cerca de 24 por cento em 2009 para 38 por cento em 2012, mas ainda se mantém abaixo dos níveis de outros países da UEMOA. Os empréstimos ao sector privado aumentaram de cerca de 2 por cento do PIB em 2005 para cerca de 10 por cento em 2008 e 15 por cento 2012, mas este nível mantém-se bem abaixo dos números que países como o Senegal, Cabo Verde, e Mauritânia vêm apresentando. Os depósitos bancários em percentagem do PIB, que se situam em 18 por cento, estão consideravelmente abaixo das taxas no Senegal (33 por cento) e na Gâmbia (41 por cento). Apesar de um aumento constante no acesso ao crédito, este é ainda equivalente a 15 por cento do PIB no final de 2012, comparando por exemplo com os 31 por cento no Senegal. No entanto, isto representa um aumento de seis pontos percentuais do PIB em apenas três anos. 3.37 A crise financeira internacional e o abrandamento nos mercados emergentes afectaram os bancos da Guiné-Bissau através de atrasos nas receitas de exportação e remessas mais reduzidas. No entanto, este impacto foi deveras limitado uma vez que os bancos não têm acesso a linhas de crédito da Europa: a maioria dos bancos são financiados localmente. Isto também aumentou a oportunidade para os grupos bancários africanos se expandirem na região, contrabalançando alguns dos efeitos negativos na crise global. 3.38 Existem um amplo número de constrangimentos ao aprofundamento maior do sistema financeiro. Um sector informal substancial e baseado em numerário, as margens relativamente elevadas de taxas de juro, o acesso escasso ao financiamento, as garantias insuficientes, e a práticas precárias de contabilidade financeira colocam obstáculos significativos ao desenvolvimento do sistema financeiro. Adicionalmente, a infra-estrutura precária, o sistema de pagamentos rudimentar, os sistemas legais e judiciais fracos, a falta de um sistema de referência de crédito, e a instabilidade política afectam a capacidade do sector de providenciar apoio adequado ao sector privado. O acesso ao financiamento é frequentemente citado com uma barreira chave ao crescimento do sector privado. O Doing Business de 2014 classifica a Guiné-Bissau em 130 entre os 186 países no indicador de “acesso ao crédito”, com notações reduzidas nos índices “profundidade da informação de crédito” e “força dos direitos legais”. 3.39 Do lado da oferta, a intermediação financeira na Guiné-Bissau é severamente afectada por um ambiente de negócios arriscado, uma incapacidade de avaliar o risco de forma fiável devido a défices importantes de informação, e a opções insuficientes de mecanismos legais quando o risco se materializa. Em simultâneo, a procura por financiamento é constrangida pela escassez de candidaturas viáveis a empréstimos e oportunidades viáveis de investimento. Esta procura é também minada devido à ausência de uma cultura de poupança e falta de conhecimento acerca de produtos e serviços financeiros no público em geral. A infra-estrutura física precária impede a expansão do sistema bancário (apesar de um aumento do número de 93 agências bancárias de 5 para 13 entre 2007 e 2009) e limita o espectro de serviços financeiros, especialmente em áreas rurais. 3.40 Do lado da procura, o acesso ao crédito é constrangido pela fraca capacidade das empresas, entre outros impedimentos. Estes incluem o clima de investimento nocivo para as empresas, combinado com a insegurança política e económica, predominância do sector informal, infra-estruturas de mercado e institucionais fracas, incluindo direitos contratuais e respectiva aplicação, agência de informação de crédito, e standards de contabilidade e de relato. Conforme demonstrado na Parte I deste capítulo, de acordo com os bancos, as principais razões para rejeitar as candidaturas a crédito são falta de garantias, estudos de viabilidade pobres, e a falta de sistemas de contabilidade nas empresas. 3.41 O segmento de instituições financeiras não bancárias é subdesenvolvido e dominado na íntegra por companhias de seguros, especialmente de automóvel e de responsabilidade civil. Todos os restantes produtos, incluindo seguros de vida, saúde e de colheitas, são largamente ausentes. Existem três companhias de seguros registadas com o Ministério das Finanças, incluindo a Guineebis, a companhia nacional de seguros privatizada em 1997; Alliance Bissau, uma subsidiária da Alliance Senegal registada em Bissau em 2004 (a sua licença foi revogada em 2010 no seguimento da falência da empresa mãe no Senegal); e Nouvelle Société Interafricaine d’Assurance (NSIA), registada em Bissau em 2007 e com sede em Abidjan, com operações em nove países na África Central e Ocidental. No entanto, nenhuma destas companhias tem agências fora da cidade capital. O mercado de seguros como um todo na Guiné-Bissau é de cerca de mil milhões de CFAF (ou cerca de 1 por cento da dimensão do mercado no Senegal). A NSIA regista uma quota de mercado de 45 por cento contra os 35 por cento da Guineebis e 20 por cento da Alliance. 3.42 Diversos factores constrangem o crescimento do sector de seguros: fraca actividade comercial; falta de capacidade institucional e humana nas companhias de seguros; falta de conhecimento do público sobre produtos de seguros; e pouca aplicação da legislação. 3.43 As actividades das instituições de microfinanças (IMFs) são negligenciáveis no âmbito do sistema financeiro da Guiné-Bissau. Estas focam-se em serviços básicos do sector, tais como contas poupança e microcrédito. As actividades das IMFs não são bem compreendidas e um número reduzido de pessoas têm contas com estas instituições. Os empréstimos das IMFs correspondem a menos de 1 por cento do crédito bancário (CFAF 340 milhões). Algumas IMFs são operadas por organizações não-governamentais (ONGs) e têm um mandato social (por exemplo, concedem crédito a mulheres e agricultores em regiões remotas) mas não relatam as suas operações. Adicionalmente, uma vez que as IMFs iniciais foram estabelecidas por ONGs baseadas no financiamento por donativos, tem prevalecido o conceito de que as IMFs devem providenciar empréstimos sem a necessidade de reembolsar. Isto tem contribuído para um elevado nível de créditos malparados, e, eventualmente, ao desaparecimento de um amplo número de IMFs. 3.44 Apesar do seu estado residual, o sector registou um início promissor, e tem atravessado recentemente uma fase de consolidação. O sector registou um progresso promissor de 2005 a 2010, com o apoio activo do PNUD, e com o estabelecimento de um comité de supervisão no Ministério das Finanças, a criação de uma associação de microfinança (RECOP), e uma elevada procura por serviços de microfinanças. No entanto, a cultura de microfinanças é fraca na Guiné-Bissau, e as taxas de recuperação desequilibradas (especialmente em Bissau) têm levantado dúvidas sobre a sustentabilidade das IMFs sem o apoio dos doadores. Em 2010, o sector atravessou um processo de consolidação, e a supervisão tem melhorado. Como resultado, o número de agências tem decrescido de 135 em 2007, 41 em 2009, 18 em 2010 e apenas 5 em 2012. A taxa de reembolso reduzida, a fraca aplicação de contratos, os custos administrativos elevados, e os balanços monetários exauridos, causaram o encerramento de diversas IMFs. 94 3.45 Apesar de uma melhoria em 2011, a qualidade dos portfolios de crédito das IMFs tem deteriorado recentemente. O crédito malparado corresponde a cerca de 25 por cento do total de empréstimos durante 2011, e atingiu 51 por cento do portfolio das IMFs no final de 2012. Adicionalmente, os relatórios de dados e financeiros das IMFs são pouco fiáveis e não são produzidos dentro dos prazos mandatados nas regulamentações da UEMOA. Este sector tem necessidade de melhorias de capacidade. Adicionalmente, as actividades de supervisão providenciadas pelo Ministério das Finanças têm de ser fortalecidas. O financiamento tanto de fontes locais como internacionais para as IMFs tem também caído substancialmente. Assim, o sector de microfinança da Guiné-Bissau continua ser o menos desenvolvido região UEMOA. Como exemplo, no Senegal, as IMFs providenciam serviços a cerca de 20 por cento da população e fornecem cerca de 10 por cento do crédito bancário. 3.46 Tendo em conta estrutura e escala das empresas privadas na Guiné-Bissau, a microfinança pode desempenhar um papel importante no sector financeiro. No entanto, uma série de factores impedem o desenvolvimento adicional deste sector. Primeiro, as regulamentações do BCEAO impõem um tecto de 27 por cento nas taxas de juro de microfinanças, o que não toma em conta as circunstâncias específicas de cada país no respeita aos riscos e retorno. A CADESPC está mal preparada para efectuar a supervisão do sector e a sua eficiência é enfraquecida pela ausência de alocações de orçamento por parte do Governo e pela implementação insuficiente das recomendações de supervisão por parte do Ministério das Finanças. O Governo não aprovou ainda o plano de acção de desenvolvimento do sector de microfinanças finalizado em 2008. Segundo, existe uma capacidade limitada no que respeita às próprias IMFs. A maioria das IMFs depende de contribuições de doadores e não consegue atingir o limiar de sustentabilidade devido a fraca governação, baixa diversificação de serviços e produtos para responder às necessidades das micro, pequenas e médias empresas; fraca capacidade institucional para avaliar e monitorizar os riscos; e sistemas fracos de controlo interno. Finalmente, a organização do sector é demasiado fraca para conduzir de forma eficiente o diálogo de políticas, promover o desenvolvimento do sector, e partilhar informação e melhores práticas. A sustentabilidade da RECOP é uma fonte de preocupação. O seu alcance é limitado uma vez que a maioria das IMFs estão concentradas na cidade capital. 4. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS 3.47 Um sector financeiro que responda às necessidades de financiamento de um sector privado em desenvolvimento é simultaneamente um resultado e um input para a estabilidade económica. Esta secção advoga uma estratégia de dois níveis para alcançar este resultado: (i) uma táctica de ganhos rápidos que toma em conta o status quo e identifica pontos focais específicos que têm uma probabilidade elevada de render no curto prazo, nomeadamente no campo da microfinança e apoio ao sector do caju; e (ii) uma agenda mais ampla de desenvolvimento do sector financeiro que atente à criação de um ambiente estimulante para o fornecimento de uma gama vasta de produtos e serviços financeiros.  Existe o potencial para conseguir ganhos rápidos com o apoio do desenvolvimento do sector de microfinanças. Algumas das principais recomendações para melhorar o papel das IMFs podem incluir: fortalecer a promoção, autorização, inspecção, e supervisão das IMFs por parte do Ministério da Economia e Finanças em conjunto com o BCEAO; promover acções de capacitação e formação das IMFs; mobilização de recursos financeiros de fontes domésticas e internacionais, e a distribuição de tais recursos às IMFs numa base competitiva; supervisão das IMFs de acordo com as melhores práticas internacionais; e criação de uma agência de crédito e risco similar à da BCEAO para os bancos. 95  Adicionalmente, existe também o potencial para implementar ganhos rápidos com o desenvolvimento do sector de processamento do caju. As potenciais empresas de processamento competiriam com os exportadores para adquirirem caju em bruto, e os últimos têm uma vantagem financeira substancial. Para os bancos, os empréstimos aos exportadores apresentam uma proposição de risco substancialmente mais atractiva, em parte porque se trata de um crédito de curto prazo e de alto retorno. Garantir que as empresas de processamento têm acesso a crédito atempadamente no início da campanha do caju, quando existe uma oferta abundante, será desafiante. As conversações com os bancos comerciais indicaram que a sua relutância em conceder crédito a empresas de processamento deve-se primordialmente à percepção de alto risco associado. Além do risco inerente associado a um Estado frágil, os bancos são também dissuadidos pela incapacidade de muitos empresas processadoras de elaborarem uma candidatura a crédito viável ou um plano de negócios exequível. Os parceiros de desenvolvimento e/ou Governo podem desempenhar um papel crítico neste contexto. Um acordo de partilha de risco com bancos comerciais, seja através de um donativo matching grant ou fundo de garantia ou qualquer outro mecanismo, é uma das formas de canalizar crédito da banca comercial a preços razoáveis para os processadores de caju. No entanto, o sucesso de tal mecanismo também depende da oferta de desenvolvimento de competências aos processadores de caju para que estes estejam aptos a satisfazerem os critérios básicos para empréstimos bancários.  A somar aos ganhos rápidos descritos acima, devem ser empreendidos esforços para lançar uma agenda mais ampla e estrutural de desenvolvimento do sector financeiro, nomeadamente através da melhoria no acesso à poupança e financiamento através do provimento de recursos a termo para as PMEs e microfinanças, assim como acções de capacitação para as instituições financeiras. Será importante estabelecer programas que encorajem os Guineenses a abrir uma conta bancária para que possam entrar no sistema financeiro e aceder a serviços bancários - incluindo a transmissão de remessas e transferências de dinheiro ou outras formas de apoio financeiro público (ver o capítulo 6). A banca móvel (mobile banking) em particular deve ser encorajada e a MTN e o Ecobank já estão a planear estender os serviços de banca móvel através do MTN Mobile Money em vários países da África Ocidental, incluindo a Guiné-Bissau. 96 CAPÍTULO 4: UMA AGENDA PARA O SECTOR PÚBLICO - DISTRIBUIR OS DIVIDENDOS DA DEMOCRACIA EM SIMULTÂNEO COM A (RE)CONSTRUÇÃO DAS INSTITUIÇÕES 1. INTRODUÇÃO 4.1 As décadas de instabilidade e governação pobre têm minado o sector público na Guiné-Bissau. No Indicador de Governação Mundial do Banco Mundial (WGI), a Guiné-Bissau situa-se no 10º percentil inferior em todos os indicadores que medem a capacidade do sector público (Figura 52): controlo da corrupção, eficiência do Governo, qualidade regulatória, e aplicação das leis. Nos últimos dois indicadores, o país situa-se no 3º percentil. O que isto significa é que, de acordo com os WGI, mais de 90 por cento dos países têm uma capacidade de governação mais elevada do que a Guiné-Bissau. Esta avaliação é corroborada por outros rankings. Por exemplo, a Transparência Internacional coloca a Guiné-Bissau em 163º de 175 no controlo da corrupção e o Índice Mo Ibrahim de Governação de África classifica a Guiné-Bissau em 47º de 52 em termos de segurança e aplicação das leis. Figura 52: A Guiné-Bissau situa-se nos 10 por cento Figura 53: Em 2014, a Guiné-Bissau situou-se entre os inferiores globalmente no que toca à qualidade da países com a probabilidade mais elevada de sofrer um governação golpe (ranking de percentil, 0 pior, 100 melhor) (probabilidade de um golpe ocorrer em 2014, percentagem) Madagascar Rule of Law Equatorial Guinea Guinea-Bissau Regulatory Quality CAR Somalia Conrtrol of Corruption Pakistan Egypt Cote d'Ivoire Government Effectiveness Angola 0 2 4 6 8 10 Yemen 0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% Fonte: Indicadores de Governação Mundial do Banco Fonte: PITF 2014 Mundial 4.2 O Governo recém-eleito da Guiné-Bissau tem a oportunidade de ter um começo novo e melhorar o ambiente de governação. Os desafios são no entanto consideráveis. Tendo em conta história de fragilidade da Guiné-Bissau, o novo Governo permanece vulnerável. A Figura 53, por exemplo, mostra a probabilidade de golpes em países seleccionados baseados no modelo de previsão de golpes da Task Force de Instabilidade Política (PITF).37 De acordo com o modelo, em 2014 a Guiné-Bissau era um de seis países com a probabilidade mais elevada de sofrer um golpe. A probabilidade de um golpe na Guiné-Bissau aproxima-se dos 20 por cento. Estas 37 Este modelo previu de forma correcta o golpe no Mali e o golpe prévio na Guiné-Bissau. O PTIF é constituído por um grupo de académicos de diversas universidades dos EUA e tem sede no Centro de Políticas Globais da Universidade de George Mason. 97 probabilidades persistem e a possibilidade de que a agenda de reforma da governação seja desviada por uma nova queda do Governo permanece real. 4.3 As condições externas favoráveis podem reduzir a possibilidade um golpe durante os próximos anos. Isto providencia uma oportunidade para acelerar e consolidar as reformas de governação. A CEDEAO está a envolver-se de forma crescente na segurança devido à ameaça crescente colocada por actores não estatais na região, particularmente a Al Qaeda no Magrebe Islâmico (AQIM) e Boko Haram. Estas organizações constituem uma ameaça substancial a diversos países na região, principalmente Mali, Níger e Nigéria. Como resultado, os governos regionais não vão tolerar esforços militares que possam acrescentar instabilidade à região, tais como golpes. Adicionalmente, após anos de actividade com relativa impunidade, a comunidade internacional em geral, e as Forças Armadas dos Estados Unidos em particular, estão a neutralizar o envolvimento dos militares no narcotráfico e o ex-comandante as forças navais da Guiné-Bissau está actualmente numa prisão norte americana. Os esforços dos EUA no combate aos narcotraficantes que estiveram também associados ao golpe de 2012 pode mitigar os incentivos a assumir riscos ligados ao derrube potencial do Governo. 4.4 O espaço de oportunidade providenciado coloca ao Governo uma oportunidade para focalizar na reforma do sector público e na melhoria de políticas públicas para o benefício dos Guineenses. Mesmo num Estado frágil, é possível melhorar os resultados da governação, como a Caixa 5 descreve. Será necessário um compromisso político considerável para garantir que o retorno à democracia irá render dividendos aos Guineenses. Este CEM argumenta que as prioridades para a reforma do Governo são de três tipos: i) fortalecer os sistemas de gestão das finanças públicas (GFP) para garantir que todos os fundos públicos são gastos nos propósitos pretendidos para maximizar a eficiência das políticas públicas. A melhoria do ambiente fiduciário e a redução das fugas vão ser condições importantes para os doadores providenciarem apoio financeiro - especialmente apoio orçamental - através dos sistemas nacionais (o Capítulo 5 elabora sobre este ponto em maior detalhe). Uma vez que os recursos públicos são utilizados de forma mais responsável, será também importante aumentar o rácio receita/PIB para que o Governo tenha meios para realizar as suas políticas; ii) desenvolver a capacidade dos serviços civis de implementar o mandato do Governo e melhorar a qualidade das políticas públicas; iii) estabelecer um mecanismo de assistência social para fornecer um alívio imediato ao Guineenses mais pobres e para permitir a sua subsistência em áreas onde as políticas públicas ainda não providenciaram soluções; iv) desenvolver sistemas estatísticos que permitam ao Governo identificar áreas de intervenção e também para efectuar o seguimento dos efeitos das suas medidas e elaborar políticas com base em evidências concretas. Estes tópicos são explorados em maior detalhe ao longo deste capítulo. 2. RECONSTRUIR E MELHORAR A GESTÃO DAS FINANÇAS PÚBLICAS E A MOBILIZAÇÃO DE RECEITAS DOMÉSTICAS 4.5 Processos mais fortes para a execução orçamental, incluindo salvaguardas fiduciárias, são necessárias para administrar a APD e a receita doméstica. A primeira prioridade para o Governo é implementar sistemas que permitam a administração de recursos públicos minimizando em simultâneo as preocupações fiduciárias. Isto será crucial para ganhar a confiança dos doadores para que estes canalizem os seus recursos utilizando os sistemas nacionais. Uma vez que os sistemas estejam implementados, o Governo irá necessitar de fortalecer a sua base de receita. A receita em relação ao PIB encontra-se actualmente entre as mais baixas do mundo e o Governo necessitará de recursos, incluindo domésticos, para implementar as suas políticas, incluindo aquelas que constam da agenda de estabilização e retoma. É importante no entanto manter em mente que na Guiné-Bissau, onde a pobreza é vasta, diversos tipos de impostos irão provavelmente agravar a situação da pobreza. O benefício das políticas públicas terá de exceder o 98 custo de aumentar o peso sobre os pobres. Assim, o aumento da receita deverá ser condicional ao progresso na área de Gestão das Finanças Públicas (GFP). 4.6 As prioridades na área GFP incluem o estabelecimento de um processo orçamental credível com controlos de compromisso suficientes, a redução das despesas fora do orçamento, a reforma das aquisições públicas, e um conjunto credível de controlos internos e externos. No médio prazo, será importante auxiliar o Governo no aumento das receitas tributárias a partir das taxas actuais muito reduzidas em comparação com outros países em África. Esta secção agrega dados do relatório de 2009 da Revisão da Gestão da Despesa Pública e Responsabilidade Financeira (PEMFAR) e do recentemente finalizado documento de Responsabilidade Financeira da Despesa Pública (PEFA) de 2013, assim como das prioridades de médio prazo conforme expressas no Programa de Estabilização e Desenvolvimento de 2014. O objectivo de médio prazo é construir um sistema de GFP que esteja apto a gerir os recursos próprios do Governo assim como o financiamento dos doadores com uma integridade fiduciária razoável. 4.7 A última avaliação PEFA demonstra que muitos dos ganhos modestos que haviam sido realizados em 2009-11 foram subsequentemente perdidos. A retoma destes ganhos é a primeira prioridade. Embora tenham sido realizadas melhorias na credibilidade e relato do orçamento, e se tenha instalado um novo software de gestão electrónica das finanças públicas, estes avanços têm estagnado e alguns foram de facto revertidos uma vez que as instituições de GFP foram regularmente evitadas desde o golpe de 2012. O restabelecimento de alguma medida de controlo será um passo inicial essencial, que pode subsequentemente ser desenvolvido para colocar em funcionamento um sistema básico de GFP que pode depois ser gradualmente fortalecido para responder aos standards necessários para os doadores utilizarem os sistemas nacionais no fornecimento da sua assistência financeira. O remanescente desta secção irá primeiramente providenciar um plano para as reformas necessárias na frente GFP, e depois passar para as reformas potenciais do lado da receita. Caixa 5: Fortalecer a governação num ambiente frágil O Ruanda e a Etiópia são dois países africanos que emergiram de períodos de conflito e tomaram acções decisivas para melhorar a governação. A Guerra Civil em ambos os países variou em duração e intensidade, mas os danos humanos e físicos causados foram substanciais. A guerra civil do Ruanda terminou apenas 6 anos antes do conflito da Guiné-Bissau. A Guerra Civil da Etiópia (e a guerra com a Eritreia) durou cerca de 30 anos e entre a década de 70 e início dos anos 90, o país passou por numerosos golpes com e sem sucesso - à semelhança da Guiné-Bissau. No entanto, o Ruanda e Etiópia conseguiram realizar investimentos consideráveis nos seus sistemas de governação (Caixa Figura 2). Tendo iniciado com uma qualidade de governação semelhante à da Guiné-Bissau, estes países têm-se situado entre os reformadores mais céleres da África Subsaariana. Os resultados têm sido notáveis: o crescimento real do PIB em ambos os países excedeu uma média de 8 por cento ao longo dos últimos 15 anos, comparado com cerca de 2 por cento na Guiné-Bissau. O compromisso decisivo do Governo em torno da reforma é a base das melhorias para a governação. Os líderes Meles Zenawi da Etiópia e Paul Kagame do Ruanda governaram os seus países com um pulso de ferro e o seu registo de manutenção das liberdades civis é frequentemente criticado. No entanto, ambos os líderes tiveram uma visão para os seus países, e mantiveram a sua atenção na agenda de reformas que os tornou engenheiros de um sector público mais eficiente. Os políticos da Guiné-Bissau têm agora a oportunidade de se tornarem reformadores que podem virar a página da Guiné-Bissau e melhorar eficiência do Governo. 99 Caixa Figura 2: A melhoria na governação é possível conforme exemplificado nas experiências do Ruanda e Etiópia (índice de Governação do Banco Mundial, -3 (pior) até +3 (melhor)) 0.2 0 -0.2 -0.4 -0.6 -0.8 -1 -1.2 -1.4 -1.6 1996 2000 2003 2005 2007 2009 2011 Guniea Bissau Rwanda Ethiopia Fonte: WGI. Fortalecer os sistemas de GFP da Guiné-Bissau 4.8 Embora tenham sido alcançados progressos importantes na gestão das finanças públicas entre 2009 e 2012, muitas destas melhorias têm sido revertidas, e como resultado a agenda remanescente é vasta e realisticamente irá necessitar de alguns anos para ser implementada de forma exaustiva.38 A secção seguinte sumariza alguns dos avanços e recuos desde 2009:  O quadro legal e institucional para a gestão das finanças públicas estava prestes a ser fortalecido com a adopção por parte do Conselho de Ministros de uma série de leis que apontavam a trazer a legislação na área das finanças públicas à conformidade com as directivas da UEMOA.39 Estas leis têm ainda de ser promulgadas e aplicadas.  A preparação e execução do orçamento têm sido apoiadas desde o final de 2008 pela implementação do sistema de software SIGFIP, e adopção de uma nomenclatura orçamental em linha com os standards UEMOA. O sistema ainda se encontra potencialmente operacional, mas a maioria das despesas não era processada pelo sistema desde o golpe. 38 Esta agenda foi identificada e descrita em detalhe no relatório PEMFAR de 2009 e actualizada no exercício PEFA de 2013. Estes relatórios descrevem ao detalhe as fraquezas na gestão das finanças públicas no que concerne a várias áreas, nomeadamente (i) o quadro legal e institucional; (ii) preparação do orçamento, (ii) execução orçamental, incluindo controlos do processo de despesas e de relato orçamental; (ii) contabilidade do tesouro e procedimentos de pagamento; (v) aquisições; (vi) controlos internos e externos por parte da Inspecção das Finanças e Tribunal das Contas; e (vii) supervisão da execução orçamental por parte da Assembleia Nacional. 39 Em Junho de 2010, a Assembleia Nacional aprovou (i) a nova lei orgânica das finanças públicas, em conformidade com as directivas da UEMOA; (ii) o regulamento geral da contabilidade pública, também consistente com as directivas da UEMOA; (iii) Lei-quadro dos concursos públicos que estabelece uma agência regulatória independente para os concursos públicos e uma unidade central de aquisições; e (iv) uma série de leis sobre a reorganização das forças militares e de segurança, incluindo estabelecimento de um fundo de pensões dedicado. 100  O seguimento da execução orçamental tem melhorado através da preparação de relatórios de execução trimestrais, que têm sido regularmente compilados desde meados de 2009 e comunicados à Assembleia Nacional e ao público. Esta prática foi abandonada em Junho de 2012.  Os procedimentos de controlo orçamental foram renovados: no início de 2010, o escritório do controlador financeiro foi separado da direcção do orçamento e colocado sob a supervisão directa do Ministro. Esta reforma não foi seguida após o golpe.  Os procedimentos excepcionais que alguns haviam tentado revogar no início de 2010 têm sido utilizados numa base regular, e impedem então qualquer relato fiável da execução orçamental.  Foi tomado um passo significativo para enfrentar os desafios a respeito da contabilidade, com a entrada em funcionamento em Setembro de 2010 de um novo sistema de contabilidade no Tesouro. Este sistema não tem sido utilizado para produzir relatórios fiáveis desde a desorganização que se seguiu ao golpe.  O Tribunal de Contas não recebe relatórios de execução orçamental, e não teria, em qualquer caso, capacidade para os auditar.  As fraquezas nos procedimentos de pagamentos dos salários públicos têm sido enfrentadas com a publicação em Julho de 2010 dos resultados do Censo de funcionários públicos; todos os dados dos quadros foram introduzidos no novo sistema até ao final de 2011, estabelecendo a base uma gestão de mais racional do quadro de funcionários públicos. Como parte do apoio do Banco Mundial para cobrir os salários dos professores e do sector da saúde no início de 2014, a denominada Folha Única tem sido actualizada nestes sectores.  O sistema computorizado de administração aduaneira SYDONIA ++ foi instalado nos três principais escritórios aduaneiros com assistência técnica externa. Um novo sistema de gestão da dívida, SYGADE, foi também instalado com assistência técnica externa. Ambos estes sistemas são razoavelmente fiáveis. 4.9 O progresso nestas áreas deve ser alcançado de uma forma gradual e coordenada. Os progressos nas diferentes funções reforçam-se mutuamente. Por exemplo, uma preparação orçamental mais focada requer uma base de dados sobre a alocação de funcionários públicos e custos unitários. A alocação eficiente de recursos orçamentais deve depender de controlos cuidadosos da eficácia dos serviços prestados, e de uma política de aquisições rigorosa, reforçada por controlos ex-post incisivos por parte de unidades de auditoria externas. A maior alocação de recursos para sectores prioritários deverá levar a uma discussão sobre as implicações fiscais de continuar a utilizar 16 por cento do orçamento nacional na Defesa Nacional. O desempenho financeiro e operacional das empresas estatais na Guiné-Bissau terá também de ser seguido de forma próxima e devem ser tomadas medidas para reduzir as perdas contínuas. Nos parágrafos que se seguem, as acções recomendadas nesta área são apresentadas em sequência, baseadas nas avaliações PEMFAR e PEFA, recomendações-chave, e acções empreendidas desde então. 4.10 A coordenação das acções de reforma no Ministério das Finanças (MF) poderia beneficiar do estabelecimento de um comité de reforma estruturado com assistentes técnicos financiados externamente. De facto, ao longo dos últimos dois anos um grupo de consultores no Ministério das Finanças financiado pelo Banco Mundial sob o Fundo de Promoção do Estado e da Paz (SPF) tem tido um papel líder no processo de reforma. Eles foram responsáveis pelo master plan de informatização do ministério, cobrindo as operações de orçamento e tesouro, alfândegas, gestão da dívida, base de dados dos funcionários públicos, e também lideraram a preparação da legislação para apoiar o processo de reforma. Seria importante reiniciar este grupo, possivelmente sob uma organização mais estruturada, e de forma ideal com liderança efectiva política e técnica do lado do Governo. 101 4.11 O Governo poderá também querer estabelecer uma unidade de Parcerias Público- Privadas (PPPs). Esta unidade deverá ser baseada no Ministério das Finanças e seria responsável por todas as actividades relacionadas com PPPs, incluindo o desenvolvimento de novas parcerias e o seguimento de parcerias existentes. Os capítulos 2, 5 e 9 providenciam exemplos de áreas que as PPPs podem ser benéficas, desde infra-estruturas, tais como portos, estradas energia, até serviços agrícolas. As PPPs podem ser promissoras na medida em que Governo poderia associar-se a companhias privadas que têm o know-how e recursos que o Governo - especialmente num ambiente de capacidade reduzida - não dispõe. No entanto, o lado contrário deste argumento é o de que unidade de PPP teria de ser constituída por funcionários públicos altamente qualificados para garantir que os dividendos das PPPs são distribuídos de forma justa entre os parceiros públicos e privados. 4.12 Um plano de acção exaustivo para os próximos três anos pode ser baseado nos seguintes elementos: a) Tornar o orçamento um instrumento de políticas credível através de melhorias na elaboração do Orçamento, no Controlo de Despesas, nas Aquisições Públicas, e na Contabilidade e no Relato. b) Quadro legal e regulatório, ciclo de despesas e pagamento de salários 4.13 O orçamento do Governo é o instrumento através do qual o Estado implementa os seus programas e políticas. Para que este seja útil como uma ferramenta de políticas, deve ser realista, exaustivo, e claramente ligado às prioridades governamentais, além de que a sua implementação deve ser monitorizada e seguida de forma próxima. Adicionalmente, todos os actores relevantes devem ser consultados e fazer parte do processo de negociação de alocações orçamentais, devem compreender e aceitar o processo e as decisões finais que são tomadas, e devem estar aptos a implementar os seus programas em linha com estas decisões. O PEFA de 2013 para Guiné-Bissau demonstra o que o exercício orçamental se tornou vazio e um exercício académico, que repete essencialmente as alocações do ano anterior sem consideração pelas políticas e programas governamentais. As unidades de despesa e ministérios ignoram o orçamento e encontram formas de implementar as suas prioridades através de uma variedade de formas, incluindo fontes de financiamento fora do orçamento e despesas não contabilizada. Este é um processo que mina a utilidade do orçamento. 4.14 É por isso de alguma urgência que se garanta que o exercício do orçamento seja pleno de substância e relevância, e uma forma da alcançar isto seria o de tornar o fórum anual do orçamento um exercício com significado. Isto necessitaria de uma liderança prévia de planeamento e técnica sólida para agregar as contribuições dos diferentes ministérios, liderar as negociações de topo e funcionar com árbitro final de disputas. Outro elemento passa por garantir que as unidades orçamentais ou ministérios aplicam as prioridades orçamentais, e isto significa garantir que as despesas planificadas estão em linha com o orçamento. Para esse efeito será necessário implementar controlos e os gestores seniores devem estar aptos a rejeitar despesas que não cabem nas prioridades conforme definidas no orçamento. Quando as unidades orçamentais compreenderem que o orçamento é um instrumento de políticas fiável que orienta as prioridades e controla as despesas, o incentivo para o monitorizar será mais forte, e os relatórios de seguimento devem ser produzidos e utilizados de forma mais frequente como ferramentas para seguir o progresso na implementação do programa, como foi o caso no passado. 102 4.15 A Guiné-Bissau adoptou oficialmente as directivas 2009 de GFP da UEMOA.40 Estas directivas não foram ainda transpostas para a legislação nacional e isto deverá ser feito assim que o contexto político o permita. Sem esperar por este importante passo legal, estas directivas da UEMOA podem providenciar o quadro para as reformas de GFP e especificamente para renovação da cadeia de despesas, desde a preparação do orçamento até ao relato financeiro da execução orçamental. No entanto, as provisões mais avançadas das directivas da UEMOA não serão implementadas até que um sistema GFP suficientemente funcional esteja a funcionar. 4.16 Isto irá exigir acções nos seguintes tópicos: (i) melhorar a fiabilidade e antecedência das projecções macroeconómicas para efeitos de uma melhor orçamentação anual e plurianual; (ii) controlo orçamental e financeiro para melhorar a preparação do orçamento, gestão dos compromissos, controlo e contabilidade, assim como relatório atempados e fiáveis de execução orçamental; (iii) melhorar a gestão e controlo da gestão de pagamentos, relatórios mais atempados e fiáveis intra-anuais de execução orçamental e a respectiva reconciliação com os relatórios de execução orçamental publicados pela Direcção de Orçamento (DGO). Caixa 6: O Comité do Tesouro: Um instrumento para a transparência e controlo Na sequência da deposição do Presidente Kumba Yalá em Setembro de 2003, um programa de recuperação de emergência e um fundo associado foram criados e financiados por diversos doadores para garantir uma continuação dos serviços sociais básicos. O fundo de emergência financiou os salários do pessoal base dos sectores de saúde e educação, alguns medicamentos, e equipamentos básicos. Diversos milhares de professores, enfermeiras e médicos foram financiados através deste programa no período de 2004-08. O novo Governo procurou retomar o controlo sobre as finanças públicas que haviam sido geridas até à data com um alto grau de opacidade e informalidade durante o regime anterior, e que resultou numa estagnação do sector público, greves relacionadas com os salários por pagar e na incapacidade do Governo de garantir os serviços sociais básicos devido a uma derrapagem significativa de custos, um peso insustentável de dívidas e uma mobilização fraca de recursos. Tomou-se a decisão de impor um programa estrito de racionamento de recursos através do fortalecimento do Comité do Tesouro. O Comité era presidido de forma conjunta pelo Ministério das Finanças e Banco Central (agência central do BCEAO) e reunia duas vezes por semana (uma das quais era uma reunião preparatória) para examinar e tomar decisões sobre os compromissos de despesas de todas as entidades governamentais, incluindo o escritório do Presidente e até as Forças Armadas. Todos os compromissos de despesas eram examinados de forma criteriosa pelo Comité para garantir que estas eram consistentes com a estratégia do Governo e respectivo orçamento anual, e que os fundos estavam disponíveis para as financiar. Como uma medida para ganhar confiança e construir a relação com os doadores, o Governo convidou a UE e o PNUD, enquanto principal financiador e administrador do fundo respectivamente, para participar no Comité enquanto observadores. O desempenho e impacto do Comité variou ao longo do tempo, mas muitos doadores sentiram que o Comité desempenhou um papel importante na imposição de maior controlo em períodos quando o Comité tinha um forte apoio político e o apoio técnico necessário. Adicionalmente, o Comité ajudou a estabelecer um ambiente de transparência vis-à-vis com os doadores. Existem algumas provas de que este programa de gestão rigorosa dos recursos ajudou a promover a disciplina na gestão das despesas e a reconstruir a confiança dos doadores no programa de reforma do Governo, e eventualmente levou à retoma do apoio orçamental por parte da UE. Ao longo do tempo, algumas instituições importantes, tais como as Forças Armadas, cessaram a sua participação no Comité e consequentemente o seu processo de tomada de decisões foi minado. Durante 40 Em 2009, a União Monetária e Económica da África Ocidental (UEMOA) adoptou seis novas directivas de Gestão das Finanças Públicas que cobrem a transparência nas finanças públicas, as leis de preparação e execução do orçamento, contabilidade do Governo, classificações orçamentais, plano de contabilidade do Governo central, e a Tabela de Operações Financeiras do Estado (TOFE). 103 o período de transição os doadores não foram convidados a participar enquanto observadores. O Comité do Tesouro esteve funcional até Agosto de 2008 e deixou de operar completamente em 2012. O restabelecimento do Comité do Tesouro implica uma série de consequências desejáveis, incluindo não só uma melhor supervisão das finanças públicas, mas também a retoma da confiança dos doadores - um requisito chave para o apoio financeiro e apoio orçamental em particular. A função chave do Comité do Tesouro deverá ser a monitorização das despesas, embora se possam considerar poderes executivos adicionais conforme já foi caso em edições anteriores do Comité. Os representantes dos doadores, que reportam à comunidade de doadores numa base mensal, ajudariam a aumentar a transparência e construir a confiança junto dos doadores. O Comité de Tesouro reestabelecido teria as seguintes responsabilidades: (i) aprovar as projecções anuais do Tesouro e relatório de execução orçamental; (ii) aprovar a priorização das despesas ao encontrar constrangimentos financeiros; (iii) autorizar despesas que não sigam o processo convencional, e.g. emergências (denominadas despesas não titulares); (iv) aprovação mensal das reconciliações das ordens de pagamento que o Tesouro envia para os bancos, e cruzar estas com o registo que os Bancos têm dos pagamentos efectuados. 4.17 Os controlos internos, incluindo as auditorias financeiras e organizacionais, são um elemento importante do controlo fiduciário. Os controlos internos, ao invés de auditorias financeiras ex-post, podem providenciar importantes medidas correctivas durante a execução orçamental. Na Guiné-Bissau, existe um serviço de inspecção no Ministério das Finanças (Inspecção Geral das Finanças [IGF/MF]), mas o mandato e espectro de actuação é muito limitado, e aguarda a promulgação da nova legislação, as suas actividades são limitadas e sujeitas aprovações do Ministério e do Conselho de Ministros. No entanto existem algumas capacidades na IGF. Em 2011 e 2012, este serviço conduziu uma auditoria interna para identificar as fraquezas no controlo da folha de salários e trabalhadores “fantasma”, que resultou em ganhos significativos (122 milhões de CFAF por mês). A aprovação do estatuto da Inspecção-geral da Administração Pública (IGAP) seria um importante passo para garantir uma maior interdependência institucional e controlos internos mais sistemáticos e efectivos. A reinstituição do Comité de Tesouro extinto (que foi encerrado em 2012) seria uma forma eficiente de garantir tais controlos. O Comité anterior, que durou de 2003 até 2012 e que oi co-liderado pelo Ministério das Finanças e Banco Central, foi por vezes muito eficiente na imposição de controlos de gestão de fluxos de caixa e fiduciários, assim como um instrumento de controlo de políticas (Caixa 6). 4.18 Deverá ser prestada uma atenção especial ao sistema de recursos humanos e de pagamento de salários. Este sistema representa actualmente uma quota ampla das despesas correntes e o último PEFA demonstrou que as melhorias realizadas no passado podem ter sido revertidas desde o golpe. O sistema deverá ser expandido, se o contexto político o permitir, às forças de defesa e segurança que não se encontram actualmente cobertas no âmbito do aplicativo de pagamento de salários (a folha de pagamentos salariais é discutida em maior detalhe na próxima secção). Aquisições Públicas 4.19 O sistema de aquisições públicas na Guiné-Bissau beneficiou de assistência técnica efectiva no período anterior ao golpe. As instituições criadas nesta altura (Agência Reguladora de Aquisições Públicas, Direcção de Aquisições Públicas, e Unidade de Aquisições Centralizada) ainda se encontram em funcionamento, mas estão com recursos humanos insuficientes, e com uma capacidade e meios operativos muito fracos, o que as torna ineficientes. Será necessário equipar as instituições de aquisições públicas e desenvolver novos manuais de procedimentos e documentos nacionais estandardizados de licitação para as organizações de aquisições, criar ferramentas electrónicas para monitorizar as estatísticas e transacções associadas às aquisições, e conceber mecanismos de revisão e avaliação de desempenho. Quando esta capacidade de base for realmente 104 reforçada, podem ser consideradas acções de formação no âmbito de um sistema de Gestão do Investimento Público (PIM). Operacionalização do sistema integrado FMIS 4.20 O sistema informatizado de gestão financeira da Guiné-Bissau (FMIS) é o SIGFIP. Este software é comum na África francófona. O software é operacional desde a preparação do Orçamento até ao pagamento de vouchers. No entanto, existem provas amplas de que uma larga porção das despesas correntes não estão a passar pelo sistema. Ao invés, os vouchers de pagamento directo autorizados pelas autoridades políticas prevalecem, o que impacta na disciplina fiscal e mina a fiabilidade da contabilidade. 4.21 Existe uma necessidade urgente de restaurar o uso do SIGFIP para todas as despesas orçamentais. Isto auxiliaria o Governo a conceber procedimentos melhorados para o interface do SIGFIP com todos os restantes sistemas do Ministério das Finanças (Contabilidade, Pagamento de Salários, Impostos e Alfândegas) e com o Banco Central. Assim que o nível central esteja reestabelecido, a implementação do SIGFIP para os ministérios da tutela deverá ser implementada, de forma a facilitar a devolução progressiva da autoridade orçamental aos ministérios da tutela. Esta implementação deverá no entanto ser baseada numa avaliação da qualidade dos controlos internos em cada agência e ministério de tutela. Auditoria Externa e Controlo do Parlamento 4.22 A instituição suprema de auditoria ou Tribunal das Contas não audita as contas do Governo desde 1989. A instituição tem poucos recursos, e necessita de um reforço da capacidade e formação para que consiga efectivamente auditar as contas do Governo e desempenhar um papel de assessoria na Assembleia Nacional. Os relatórios financeiros do Governo devem ser produzidos atempadamente para que o Tribunal consiga auditar e emitir um relatório baseado na auditoria. A Assembleia Nacional e as suas comissões parlamentares não estão em posição de exercer a sua supervisão sobre a execução orçamental. No entanto, o reforço da capacidade do Tribunal de Contas e da Assembleia Nacional deve ser realizada apenas quando forem produzidas contas anuais aceitáveis por parte do Governo. 4.23 Conjuntamente com um plano de acção de reformas, deverá ser estabelecida uma Estrutura de Supervisão e Implementação da Reforma (ROIS) para ancorar a reforma e os esforços de capacitação. Esta estrutura deverá coordenar o uso de assistência técnica externa, e garantir que os relatórios são disseminados junto das autoridades nacionais relevantes. Um Comité de Supervisão da Reforma (ROC) deverá reunir regularmente a nível ministerial e endossar politicamente as principais decisões das reformas. Dependendo da situação política, deverá reportar ao Primeiro-ministro ou ao Presidente da República. Um Comité de Direcção Técnica (TSC) deverá reunir todos os meses e juntar os Directores Gerais responsáveis pela implementação actual da reforma. Uma Unidade de Coordenação de Reformas (RCU) deverá ser responsável pela gestão dia-a-dia das reformas. Aumentar a base de receitas e melhorar a administração tributária: 4.24 A Guiné-Bissau deverá considerar, a médio prazo, o abandono de taxas de exportação sobre o caju. Tendo em contas as debilidades do sistema de colecta tributária, a Guiné-Bissau depende de taxas sobre as exportações, um procedimento relativamente simples, concentrando os esforços de colecta de impostos nas transacções que ocorrem no porto. Adicionalmente, tendo em conta que o caju é o sector económico com mais sucesso da Guiné- Bissau, parece à primeira vista prático que Governo colecte receita a partir deste. Existem no entanto poucos países no mundo que taxam as suas exportações tendo em conta que esta é uma 105 política que torna o sector menos competitivo. Os agricultores de caju são também predominantemente pobres, tornando o imposto sobre o caju altamente regressivo e contra os pobres. A Guiné-Bissau tem um dos rácios mais reduzidos de receita em termos de PIB no mundo e necessita urgentemente de aumentar as receitas públicas. No entanto, para promover o crescimento partilhado, será importante olhar a novas fontes de tributação. 4.25 O FUNPI deverá ser abolido. O FUNPI, um fundo situado fora do orçamento, foi criado para financiar assistência técnica e estabelecer linhas de créditos e fundos de garantia para expandir o acesso a financiamento para os processadores de caju e outros produtos de agro- negócio. Desde a introdução do FUNPI, os seus objectivos, actividades e governação têm sido alvo de controvérsia - devido a preocupações fiduciárias e tendo em conta que nenhum dos recursos do FUNPI parece ter sido utilizado para o seu objectivo contratado.41 Ao invés, existem algumas evidências de que o FUNPI tem aumentado o contrabando, devido ao peso orçamental que impõe ao mercado de caju, minando assim as receitas do Governo. Entre 2012 e 2013, o FUNPI criou incerteza política, uma vez que o Governo alterou a sua taxa em múltiplas ocasiões. Isto afectou de forma negativa a predisposição dos exportadores (e timing) para adquirir caju dos retalhistas e afectou de forma negativa os preços. O FUNPI deverá assim ser abolido uma vez que os seus recursos não foram utilizados para os seus objectivos declarados, mina a receita orçamental, e pode distorcer significativamente os preços do caju devido à incerteza política que pode criar. No entanto, o argumento mais forte contra o FUNPI é o do que aumenta a pobreza. 4.26 Um estudo de 2014 do Banco Mundial sugere que o FUNPI cria um gap entre os preços internacionais o os preços agrícolas locais, reduzindo os preços agrícolas locais em cerca de 20 por cento (Caixa 7).42 Isto implica que 80 por cento do custo do FUNPI é assumido por agricultores de caju - a maioria dos quais são pobres. A redução nos preços agrícolas locais traduz-se num aumento da pobreza absoluta em 2 pontos percentuais e na pobreza extrema em 3 pontos percentuais, e numa redução do consumo de 8 por cento para famílias pobres. O FUNPI é assim altamente regressivo. Em 2014, o FUNPI foi estabelecido em 40 CFAF por quilograma para mitigar de alguma forma os seus efeitos negativos. No entanto, uma melhor opção seria abolir o FUNPI na sua totalidade. A atracção de IDE para promover o processamento de caju e outros sectores é uma alternativa promissora ao FUNPI. Caixa 7: O impacto do FUNPI nos preços agrícolas locais, e na pobreza Em 2014, o Banco Mundial estudou o impacto do FUNPI nos preços agrícolas locais e na pobreza A análise modela o poder relativo dos agentes ao longo da cadeia de abastecimento do caju - desde agricultores de caju até exportadores - estimando até que ponto é que estes podem absorver o impacto das mudanças nos preços do caju, e até que ponto é que estes passam estas mudanças a outros agentes na cadeia de abastecimento. Quanto mais amplas forem as quotas de mercado dos agentes individuais, mais concentrados e mais poderosos estes são. Calibrado para a economia da Guiné-Bissau, a análise demonstra que a concentração ao longo da cadeia de abastecimento é relativamente reduzida. Os cerca de 39 intermediários activos no sector de caju da Guiné-Bissau são os mais concentrados, seguidos por 49 a 51 exportadores. Tendo em conta que 85 por cento dos agricultores de caju são unidades de produção muito reduzidas, as quotas de mercado individuais são muito reduzidas. Isto significa que os 41 Os fundos têm sido utilizados até à data para adquirir meios de transporte para juízes, comprar 3500 toneladas da castanhas de caju de um único vendedor a um preço muito elevado de US$ 1200 por tonelada com o objectivo de colocar em funcionamento algumas fábricas existentes, financiar os salários em atraso de professores, etc. 42 Este efeito é baseado na taxa original do FUNPI de 50 CFAF por quilograma. 106 produtores de caju são os menos concentrados e por isso têm menor poder negocial. Os produtores de caju assumem o principal custo do FUNPI. Os resultados são simulados para 2013. O imposto pago pelos exportadores por via do FUNPI é de 50/CFAF por quilograma (US$ 106,38 por tonelada). No entanto o preço que os revendedores recebem do caju que vendem cai para US$ 92,88 por tonelada, o que implica que os exportadores assumem US$ 13,50 por tonelada (13 por cento) do custo do FUNPI e passam o restante aos retalhistas. Os agricultores recebem menos US$ 84,95 por tonelada, o que significa que os retalhistas assumam US$ 7,93 por tonelada (7 por cento) e passam o restante aos agricultores. Os retalhistas assumem a quota mais reduzida de imposto porque são os mais concentrados em termos indústria. Os agricultores, que são os menos concentrados, assumem 80 por cento do custo do FUNPI uma vez que os preços agrícolas locais caem quase 20 por cento (Caixa Figura 3). O FUNPI resulta numa queda de consumo de 8 por cento para as famílias pobres. Os resultados são calibrados baseados em dados do ILAP II. Os resultados correspondem a um aumento de 2 p.p. na taxa de pobreza absoluta (e um aumento de 3 p.p. na pobreza extrema). O forte efeito no consumo deve-se ao facto de que o FUNPI afecta especialmente os agricultores de caju e a maioria dos agricultores de caju são pobres. De facto, para os agricultores pobres de caju, o FUNPI resulta numa queda no consumo dos agregados em 12 por cento. Isto significa que para cada dólar gasto em consumo, os agregados familiares dos agricultores do caju só podem gastar 88 cêntimos desde a introdução do FUNPI. Isto constitui um efeito muito amplo, especialmente numa situação onde os alimentos são os itens mais importantes na cesta de consumo. O FUNPI contribui provavelmente para agravar a insegurança alimentar na Guiné-Bissau. Existe um espaço limitado de políticas para contrabalançar o efeito negativo do FUNPI na pobreza. A política mais eficiente seria focar em reduzir o custo para exportadores e retalhistas. A redução dos custos dos retalhistas e exportadores inclui medidas que apontam à redução dos custos de transporte e transacção. Alguns exemplos, cobertos noutros capítulos deste CEM, são melhorias nas estradas, comunicações, medidas para reduzir o custo de crédito para os retalhistas, ou medidas para reduzir os custos fronteiriços para os exportadores. A redução dos custos de transacção no sector do caju aumentam a concorrência entre exportadores e retalhistas, enfraquecendo o seu poder negocial. Assumindo uma redução de 10 por cento nos custos para exportadores e retalhistas, significaria que os preços agrícolas locais cairiam em cerca de 16 por cento, cerca de 4 p.p. a menos do que com a intervenção. No entanto, o consumo dos agricultores pobres de caju ainda cairia em cerca de 11 por cento. O estudo estima que os custos para os exportadores e retalhistas teria que ser cortado em metade para suprir o efeito do FUNPI. O desenvolvimento de uma indústria doméstica de processamento de caju não irá mitigar o efeito do FUNPI na pobreza. O objectivo do FUNPI é apoiar o desenvolvimento de uma indústria doméstica de processamento de caju. O Banco Mundial está a apoiar a Guiné-Bissau no estabelecimento de 4 unidades de processamento com uma capacidade 200 toneladas cada. O estudo demonstra que esse pequeno aumento na procura por caju não irá afectar o impacto do FUNPI na pobreza. Utilizando os recursos do FUNPI para um acréscimo mais ambicioso da capacidade de produção, atingindo um total de 20.000 toneladas (conforme previsto pelo Conselho Nacional para o Caju no longo prazo) já faria uma pequena diferença. A nova procura por caju para efeitos de processamento iria induzir produção adicional mas principalmente substituiria as oportunidades de exportação. A redução da oferta antes disponível para exportações iria reduzir a quota de mercado dos exportadores e reduzir o correspondente poder negocial. No entanto a diferença seria pequena e os preços agrícolas ainda reduziriam em 17 por cento e o consumo dos pequenos agricultores de caju também cairia em 11 por cento. 107 Caixa Figura 3: O efeito da introdução do imposto FUNPI e políticas complementares nos preços agrícolas e consumo das famílias (mudança percentual no consumo das famílias) FUNPI + 10%-cost reduction for exporters FUNPI + cashew FUNPI + subsidy to FUNPI and traders processing (20K tons) farmer inputs 0.0 -5.0 -10.0 -15.0 -20.0 Drop in farm-gate price -25.0 Fall in consumption: Poor households Fall in consumption: Non-poor households Fall in consumption: Poor cashew producers Fonte: G. Porto e W. Cont, “Measuring the Impact of a Change in the Price of Cashew Received by Exporters on Farm- Gate Prices and on Poverty in Guinea-Bissau,” World Bank Policy Research Working Paper (2014). Os subsídios também não irão mitigar o efeito do FUNPI. Por fim, o estudo simulou uma interacção entre o FUNPI e medidas de apoio aos agricultores, tais como subsídios para sementes ou fertilizantes. Os subsídios induziriam uma resposta positiva da oferta. As quantidades mais elevadas resultariam em preços mais reduzidos, por isso o efeito do FUNPI nos preços agrícolas locais seria magnificado. No entanto, esta magnitude é reduzida, cerca de 0,6 p.p. a somar à queda nos preços agrícolas locais directamente atribuível ao FUNPI. No entanto, as quantidades adicionais vendidas beneficiariam os agricultores. Isto assume no entanto que os agricultores poderiam facilmente vender o caju adicional que colheriam, o que não é necessariamente o caso na Guiné-Bissau. Adicionalmente, mesmo que os subsídios reduzissem o custos de input dos agricultores em 10 por cento, os agricultores de caju pobres ainda assistiriam à queda do seu consumo em 13 por cento em resposta ao FUNPI. A extinção do FUNPI é a melhor política disponível a favor dos pobres. Tendo em conta que o FUNPI não tem sido utilizado para o seu objectivo mandatado de desenvolver o sector do agro-negócio, pode ser considerado um fracasso, com um custo elevado para os Guineenses mais pobres. A abolição do FUNPI irá devolver recursos aos agricultores de caju, que podem ser utilizados na alimentação das suas famílias ou no investimento nas suas quintas, que constituem formas mais eficientes de gastar recursos actualmente utilizados para alimentar um FUNPI disfuncional. 4.27 Em simultâneo com a procura de novas fontes de receita, a melhoria da eficiência da colecta no porto será crucial. A harmonização dos procedimentos de importação e exportação deverá ser acompanhada por um quadro renovado de administração aduaneira. Isto irá auxiliar o Governo a fortalecer as leis e administração aduaneira para uma tributação mais previsível e um aumento de receita. A prioridade deve ser dada ao estabelecimento de um sistema pequeno mas transparente que pode preencher as necessidades de um pequeno país e encorajar o investimento privado estrangeiro. Isto pode incluir a harmonização do sistema de informação actual SYDONIA++ e a sua interface com o Tesouro. 4.28 As licenças de pesca são uma fonte potencial de receita adicional. A receita de licenças de pesca é comparativamente baixa na Guiné-Bissau, o que contrasta significativamente com outros países costeiros da África Ocidental tais como Cabo Verde, Senegal e especialmente Mauritânia. Uma das razões que explica o valor reduzido das licenças individuais de pesca 108 emitidas pelas autoridades é a de que a Guiné-Bissau não tem qualquer mecanismo de controlo para dissuadir a pesca ilegal. Caso as autoridades optassem por aumentar o preço das licenças individuais, estão plenamente conscientes que isto criaria um forte incentivo a pescar sem licença, com pouco ou nenhum risco de ser apanhado. Mesmo os pescadores artesanais nacionais têm uma actividade estritamente informal que não gera nenhuma receita para o Governo. Outra razão é o forte poder negocial das principais frotas pesqueiras internacionais. Será importante fortalecer a capacidade para implementar um regime legal de pescas e apoiar o Governo na negociação das receitas das frotas pesqueiras. No que toca ao último ponto, as reformas que fortaleçam os sistema de GFP serão complementares uma vez que os grandes blocos pesqueiros, tais como a UE, estarão mais aptos a pagar taxas mais elevadas por licenças se tiverem a garantia que a receita não irá ser desviada, mas antes utilizada para benefício dos cidadão da Guiné-Bissau. 4.29 Existe uma necessidade urgente de fortalecer as leis tributárias e melhorar a administração para conseguir aumentar a receita. Além da receita das licenças, o Governo necessitará de diversificar a sua base tributária e colectar os impostos de forma mais eficiente. Os processos administrativos mais eficientes podem aumentar a receita tributária sem aumentar a taxa de imposto ao realizar a colecta de forma mais eficiente. A prioridade deve ser dada ao estabelecimento de um sistema pequeno mas transparente que possa preencher as necessidades de um pequeno país onde o sector privado está ainda numa fase gestante. A redução da carga burocrática associada aos pagamentos tributários das empresas irá não apenas ajudar o sector privado a crescer, como também providenciar desincentivos ao não pagamento de impostos. Isto por sua vez iria também fortalecer o esforço de colecta. 4.30 O governo deve reforçar a Conta Única do Tesouro (CUT), para garantir que as receitas (incluindo receitas pequenas e geradas internamente de sectores como Educação, Saúde e outras instituições sectoriais) são colectadas por agentes do Tesouro e transferidas sem atrasos para a CUT. Isto facilitaria o planeamento de fluxos de caixa e gestão das disponibilidades, evitando assim custos adicionais de endividamento do Governo, e reforçando o controlo sob os recursos públicos para um melhor nível de serviço. 3. MELHORIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 4.31 Aumentar a capacidade da Guiné-Bissau de melhorar a sua situação económica, social e política depende, em parte, da sua capacidade de gerir e desenvolver uma administração pública eficiente. A experiência do Banco Mundial em Estados frágeis sugere que, independentemente do investimento que é realizado em infra-estruturas, o impacto no crescimento de um aumento do hardware do sector será apenas de curto prazo, como a experiência da Guiné-Bissau demonstra na última década, se este não for acompanhado por um upgrade do software das instituições públicas. 4.32 A melhoria da administração pública e a garantia de um impacto positivo na governação na Guiné-Bissau exigem um esforço de dupla ordem na Guiné-Bissau. Por um lado implica o desenvolvimento de uma infra-estrutura de gestão da administração pública que seja capaz de rastrear a evolução da força laboral ao longo do tempo. Adicionalmente, requer uma mudança fundamental de cultura que se afaste da abordagem de gestão de quadros clientelista e pessoal em direcção a uma gestão mais profissional e orientada por resultados e nível de serviço. 4.33 Em 2009/2010, o Governo completou, pela primeira vez na história recente, uma auditoria completa da sua administração pública, que relevou informações importantes acerca da sua composição. O exercício de limpeza identificou 3.378 trabalhadores “fantasma” e duplicidades, ou 15,2 por cento do total de empregados no Governo da Guiné-Bissau. Estes dados são consistentes com exercício similares realizados em outros locais do mundo. Após o exercício de limpeza, a dimensão total da administração pública é agora estimada em 18.137, excluindo as 109 Forças Armadas, e 22.317 incluindo as Forças Armadas. Destes, 12.450 são considerados funcionários públicos. 4.34 De acordo com standards sub-regionais, a administração pública da Guiné-Bissau é volumosa. Com cerca de 1,45 por cento da população, o emprego público na Guiné-Bissau situa- se acima do Senegal (1,1 por cento) e é comparável a alguns dos níveis mais elevados na região, tais como do Gana e da Maurícias. Todos estes países são países de rendimento médio baixo com uma base de receitas muito mais ampla. Existem mais trabalhadores no sector público actualmente do que aqueles que existem no sector privado formal. 4.35 Embora a administração seja ampla, algumas áreas cruciais têm poucos recursos humanos em simultâneo com outras que têm quadros a mais. A eficiência da administração pública na Guiné-Bissau é afectada pela composição dos serviços públicos. A desagregação sectorial dos dados demonstra o volume relativamente grande dos sectores militar e paramilitar quando comparado com o sector público como um todo, e destaca também a relativa inadequação da dimensão dos sectores de educação e saúde na Guiné-Bissau - apenas 35 por cento total de emprego público contra uma média global 45 a 55 por cento e uma média regional de 40 a 50 por cento. Embora haja uma insuficiência de trabalhadores em saúde e educação, existem demasiados nas Forças Armadas, mas também em outros sectores, tais como as alfândegas. A Figura 55 sugere que o número de oficiais aduaneiros na Guiné-Bissau é desproporcional ao volume de comércio do país, levantando questões mais amplas sobre a alocação de recursos humanos no serviço público da Guiné-Bissau. 4.36 De acordo com os dados disponíveis publicamente, o sector militar e paramilitar emprega cerca de 7.000 ou 35 por cento do total do emprego do sector público. Cerca de 4.000 destes são membros activos das Forças Armadas, enquanto outros 3.551 são paramilitares. Embora esta dimensão seja similar à média na UEMOA, o número de quadros das forças de segurança em proporção da população permanece muito elevado: existem quase 5 soldados por 1000 habitantes na Guiné-Bissau, comparado com uma média regional de 1,23. Isto compara com um médico e 2 enfermeiras por cada 10.000 habitantes, 146 magistrados para uma população de cerca de 1,6 milhões de pessoas e 9 juízes por 100.000 pessoas. No longo prazo, a redução do rácio de militares no total do emprego público será necessário - assim como a reorganização dos militares para reajustar o número altamente desproporcional de oficiais seniores em relação a patentes mais baixas. No entanto, num ambiente de fragilidade, a redução das rendas das Forças Armadas sem o seu consentimento é altamente arriscado. Embora talvez seja possível providenciar um incentivo aos soldados para que saiam das Forças Armadas e sigam uma profissão civil ou se reformem, a reestruturação das Forças Armadas contra a sua vontade poderá levar a outro golpe. 4.37 Alguns empregados públicos não estão oficialmente registados como funcionários públicos. A dimensão do emprego não oficial - i.e. não validado pelo Tribunal de Contas e pelo Ministério da Administração Pública - não é ainda conhecida. No entanto, a informação disponível sugere que o número é vasto e que cerca de 50 por cento destes empregados sem um código remuneratório encontram-se nos sectores de saúde e educação. Estes empregados recebem apenas um bónus, e são pagos ocasionalmente, por vezes graças a contribuições por parte dos parceiros de desenvolvimento. A formalização dos trabalhadores em sectores actualmente com défice de recursos humanos deverá ser uma prioridade. 110 Figura 54: As forças militares e paramilitares Figura 55: Tendo em conta os volumes de comércio correspondem a uma larga quota do emprego público modestos na Guiné-Bissau, o número de oficiais (percentagem de emprego total, dados de 2010) aduaneiros é vasto (oficiais aduaneiros por US$ milhões importados ou exportados) 1.5 1.0 0.5 0.0 Nigéria Gâmbia Senegal Gana Libéria Guiné-Bissau Costa do Marfim Togo Guiné-Conacri Benim Serra Leoa Fonte: Recenseamento Biométrico da Administração Fonte: Organização Mundial Aduaneira (2013) cálculos Pública da Guiné-Bissau, 2010, Ministério da Função do staff do Banco Mundial. Pública, Trabalho e Modernização do Estado. Para os dados militares, The Military Balance, 2010 (International Institute for Strategic Studies). 4.38 Tendo em conta a tendência dos últimos 15 anos, a dimensão do serviço público cresceu de forma dramática. Podem ser necessários ajustamentos. O emprego na administração pública ao longo dos últimos 15 anos na Guiné-Bissau tem aumentado num aumento médio na ordem dos 4 por cento por ano - o que ultrapassa de longe o crescimento da população ou receita. A informação disponível indica que tem havido um aumento grande nos quadros administração geral e da educação em especial, e um aumento moderado no sector da saúde. Estes aumentos podem em parte ser explicados pelas tentativas do Governo de lidar com um aumento dramático nas inscrições no ensino primário, por exemplo. Apesar destas explicações, e tendo em conta o nível de serviço geralmente inadequado por parte da administração pública, a dimensão destes aumentos no emprego público são difíceis de explicar, uma vez que o provimento de serviços registou uma melhoria apenas marginal. Um serviço público ineficiente não justifica a receita tributária que o financia. Os recursos canalizados para o financiamento do sector público podem neste caso ser usados pelo sector privado de forma mais produtiva. Será vital ajustar a estrutura do serviço público para que este responda às necessidades das políticas públicas, ao preencher posições nos lugares certos, apostar na formação de competências dos funcionários públicos, mas também cortar quadros em áreas onde as ineficiências persistem. 4.39 A folha salarial do sector público deverá ser contida. Os salários representam cerca de 50 por cento das despesas correntes e cerca de 35 por cento do total das despesas em 2013. Isto corresponde a cerca de 60 por cento da receita doméstica e 41 por cento da receita incluindo donativos. Em percentagem do PIB, os salários públicos situam-se acima de 5%. Este valor situa- se ligeiramente abaixo da média da UEMOA de cerca de 6 por cento. No entanto, a média da UEMOA é bastante elevada de acordo com os standards internacionais. Será crucial conter a folha salarial, especialmente tendo em conta o baixo desempenho das receitas, e melhorar a eficiência do sector público. 4.40 Tendo em conta o perfil actual de idades no sector público, a reforma do sector pode ser gerida parcialmente através de esquemas voluntários de reforma e através de uma 111 política cuidadosa e criteriosa de contratações. Os funcionários públicos da Guiné-Bissau são invulgarmente mais idosos à luz de standards de países em desenvolvimento, com cerca de 65 por cento dos funcionários públicos a terem 40 anos ou mais. No entanto, isto pressupõe a capacidade do Governo de aplicar regras de reforma obrigatório por um lado, e por outro reforçar a capacidade do sector público de contratar de forma criteriosa. O foco deverá ser colocado em empregados contratuais e não confirmados. No que respeita a empregados que não são titulares e não aportam um valor acrescentado significado ao nível de serviços do sector público, esta classe de empregados deverá ser mais analisada para possíveis cortes adicionais. No futuro o Governo deverá evitar a contratação de funcionários públicos de forma não oficial. 4.41 Serão necessárias melhores ferramentas de planeamento para a gestão de recursos humanos e para garantir que os funcionários públicos certos ficam no emprego certo. Isto inclui: (i) o desenvolvimento de sistemas e processos capazes de acompanhar de forma fiável os funcionários públicos desde a altura em que entram na função pública até à sua saída; (ii) desenvolvimento de ferramentas de previsão que possam informar a discussão acerca do planeamento dos recursos humanos no âmbito de um envelope orçamental realístico e bem definido. No que toca ao primeiro objectivo, a chave para assegurar o cumprimento estrito da folha salarial passa pelo desenvolvimento de um sistema fiável baseado em transacções para rastrear as acções relativas aos recursos humanos. No que toca ao segundo objectivo, cada Ministério deverá desenvolver uma política de recrutamento em linha com as suas prioridades de políticas e reconhecendo os constrangimentos do Governo na área das finanças públicas. 4.42 A melhoria dos procedimentos contratuais irá aumentar a adequação dos funcionários públicos às suas funções. Devem ser implementados testes à contratação de novos funcionários públicos que devem ser obrigatórios para todas as novas contratações. O desenvolvimento de tais procedimentos de teste e a respectiva aplicação é uma tarefa sofisticada que, inicialmente, pode ser atribuída a uma empresa externa, independente e internacional. A terciarização do processo de contratação para uma empresa independente também reduziria os envolvimentos clientelísticos no processo que por vezes surgem como empecilhos à contratação de quadros estritamente com base na sua competência para a função. 4.43 Existe também uma necessidade considerável de fortalecer a capacidade dos funcionários públicos. O último censo do serviço público confirmou a opinião generalizada de que os funcionários públicos da Guiné-Bissau não têm a educação formal necessária para executarem as funções que se exigem de um serviço público moderno. Apenas 14,2 por cento dos empregados públicos possuem um bacharelato ou acima, enquanto 24 por cento têm seis anos de educação formal ou menos. A percentagem dos que possuem um doutoramento é semelhante à dos que não sabem ler ou escrever. A melhoria dos procedimentos de contratação poderá funcionar mas somente até certo ponto. É importante manter em mente que a educação é relativamente baixa em toda a Guiné-Bissau e que a contratação das pessoas certas de um universo composto por candidatos com competências relativamente baixas não irá necessariamente aumentar a qualidade. Terá de ser providenciada formação on-the-job. 4.44 A formação de funcionários públicos exige uma abordagem multidimensional. O Instituto Nacional da Administração Pública (ENA) foi estabelecido com uma forma de providenciar a administração com gestores de alto nível com determinadas competências, tais como orçamentação pública, auditoria, e gestão. É importante que a ENA mantenha um mandato e missão bem definidos, que passa por desenvolver as competências de uma série de funcionários públicos seleccionados que vão ter a oportunidade de preencher a administração a nível de dirigentes de serviço, ou níveis mais elevados. De forma a manter a eficácia do sistema, a formação de quadros de níveis inferiores irá exigir o desenvolvimento de diferentes instrumentos e instituições, talvez utilizando a universidade pública como um veículo para algumas formações. Deverá ser desenvolvida e orçamentada uma estratégia exaustiva de desenvolvimento - documento 112 síntese - capaz de definir os requisitos gerais e técnicos para os funcionários públicos especializados. 4.45 No âmbito da reforma da função pública, é essencial ter uma base de dados actualizada de todos os funcionários públicos. Recentemente, o Governo efectuou algum progresso no registo centralizado de todos os funcionários públicos. A Folha Única representa um ganho significativo, parcialmente como consequência do apoio do Banco Mundial para pagar aos trabalhadores dos sectores de educação e saúde, que foi condicional à conclusão da Folha Única. No entanto, em Agosto de 2014, o computador que continha este registo dos funcionários públicos, incluindo dados biométricos, foi roubado e não existem backups disponíveis. Um dos passos importantes que deverá então preceder a reforma da função pública é a reconstrução desta base de dados - e o seu backup exaustivo. 4. PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL: RESPONDER ÀS NECESSIDADES IMEDIATAS NUM CONTEXTO INSTITUCIONAL PRECÁRIO 4.46 A construção de instituições do sector público irá levar tempo, e colocar demasiada pressão em instituições fracas pode colapsar a capacidade administrativa. As reformas levam tempo mesmo nos países mais céleres e dinâmicos de África (ver a Caixa 1), e as melhorias na eficácia dos Governos podem levar décadas. Colocar demasiadas exigências ao Governo numa fase inicial pode resultar em recuos. A ambição em excesso na agenda de reformas pode resultar numa “armadilha de capacidade” onde os pedidos se tornam irrealistas, resultando em resistência à mudança que irá descarrilar o esforço de reforma.43 No pior dos cenários, as reformas demasiado ambiciosas têm consequências sérias e não desejadas. Assim, as reformas devem ser faseadas. 4.47 Os programas de assistência social, tais como a transferência monetárias (cash transfers), podem encorajar soluções do sector privado para os fracassos das políticas públicas. Embora a administração pública esteja a ser reformada, o Governo pode transferir divisas para os mais pobres com necessidades mais imediatas, mas também para colocar meios nas mãos daqueles que não têm recursos para encontrar soluções para os seus problemas. Por exemplo, não haverá necessidade de subsídios de energia (geralmente ineficientes) se os pobres puderem pagar o preço de mercado de transporte devido às transferências monetárias. O Capítulo 6 irá providenciar formas adicionais através das quais a assistência social pode assistir aos mais pobres. O estabelecimento de tal programa pode ser uma forma do Governo responder de forma imediata aos objectivos de protecção social sem sobrecarregar o sector público. As vantagens dos programas de assistência social in Guiné-Bissau são várias:  Responder às necessidades imediatas e garantir a estabilidade: Embora no longo prazo o Governo deverá apontar a optimizar o fornecimento de serviços de redução da pobreza em várias áreas, no curto prazo terá de ser selectivo. A pesquisa tem demonstrado que os programas de assistência social, tais como transferências monetárias ou programas de obras públicas, constituem um mecanismo efectivo para a redução da pobreza de forma célere (a Caixa 8 providencia uma exemplo). Em particular, demonstra que as famílias tendem a utilizar estes programas para satisfazer as necessidades imediatas, ao invés de utilizá-los para luxos desnecessários. De forma crucial, estes programas providenciam uma assistência a que as crianças vulneráveis e os mais velhos não teriam de outra forma acesso, e podem também facilitar o desarmamento, desmobilização e reintegração. As transferências de dinheiro também têm dado provas na promoção da coesão social, estimulam a cidadania e reduzem o 43 Lant Pritchett, Michael Woolcock, e Matt Andrews, “Capability Traps,” Working Paper 234. (Washington, DC: Center for Global Development, 2010). 113 conflito.44 Neste sentido, tais programas podem providenciar um «Dividendo da Democracia» que demonstre de forma clara e imediata os benefícios de um regresso à autoridade democrática que ajude a evitar mais disrupções. De facto, o Programa de Estabilização e Desenvolvimento do Governo de 2014 reconhece a necessidade de uma assistência célere para os mais pobres (especialmente no que respeita a alimentação). As transferências monetárias podem ser uma forma eficiente de alcançar isto, ao possibilitar que as famílias tenham os recursos financeiros para adquirir as necessidades básicas através das redes de distribuição existentes.  Os programas de assistência social são relativamente mais fáceis de administrar, mais eficientes, e menos sujeitos a desperdícios (melhor focados e assim mais efectivos) e têm melhor cobertura do que algumas outras opções de política tais como subsídios. No entanto, deve ser exercida cautela para gerir com o foco certo e com a administração correcta para evitar a captura pelas elites, especialmente num quadro de instituições fracas. Com o apoio técnico correcto, os Governos com reduzida capacidade podem implementar com eficácia os programas de transferência monetária. Os desafios prendem-se com a identificação e inscrição das populações-alvo, estabelecimento de condições (se existentes) e dimensão das transferências, estabelecimento de regras de entrada e saída, e a decisão sobre serviços complementares. Em países onde os serviços complementares tais como a educação e saúde são escassos ou de reduzida qualidade, as transferências de dinheiro incondicionais - ou transferências de dinheiro com condições “soft” que encorajam as famílias sem as penalizarem - podem ser a melhor opção inicial.  Os programas de assistência social podem ser uma pedra base para o desenvolvimento de uma maior capacidade no longo prazo. O desenho e implementação de um programa de transferência monetária irá exigir o envolvimento do sector público na concepção e implementação. Qualquer programa de reforma requer dados para determinar o problema, estabelecer valores base, e estabelecer marcos de progresso. O registo para um programa de transferência monetária é talvez uma das formas mais simples através da qual o Governo pode colher informações demográficas detalhadas sobre a população pobre e vulnerável, informação esta que pode ser utilizada para planear e monitorizar o impacto dos seus programas, e para focar outros programas. Também, uma vez que os cidadãos ganham acesso a fundos, estes vão provavelmente aumentar a sua procura por serviços complementares tais como educação e saúde, que o Governo terá que providenciar, e este círculo virtuoso pode ajudar a criar os incentivos certos para o fornecimento de um melhor serviço público. 4.48 Os programas de assistência social podem providenciar assistência imediata aos pobres ao mesmo tempo que providenciam ao Governo o espaço para construir as competências de base. O fornecimento de recursos aos mais pobres irá reduzir a necessidade do Governo de responder às suas necessidades. Isto irá abrir espaço para construir a capacidade em áreas onde as transferências monetárias não são a solução, incluindo grandes investimentos de infra-estruturas (tais como o porto ou no sector de energia), regulação, policiamento, e saúde e educação – e também, caso existam recursos suficientes, podem ser encontradas soluções lideradas pelo sector privado nesta área. Com o foco crescente do Governo no fornecimento adequado de serviços específicos, a sua legitimidade irá aumentar, o que, conforme argumentado no capítulo 1, irá fortalecer a aplicação da lei e reduzir a fragilidade. 44 Fonte: OECD (http://www.oecd.org/development/povertyreduction/43280571.pdf). 114 Caixa 8: Fornecer alívio imediato aos pobres: Transferência monetárias na Etiópia O Programa de Rede de Segurança Produtiva (Productive Safety Net Program) na Etiópia é um bom exemplo de um programa de transferência monetária com sucesso num país pobre e instável. O catalisador para o programa foram as crises alimentares recorrentes dos anos 80 e 90, que levaram subsequentemente a um clima social de instabilidade. Nessa altura, os doadores tinham a tendência de responder à situação numa base anual ad-hoc, fornecendo frequentemente ajuda na forma de alimentos. O Governo da Etiópia pediu à comunidade internacional de doadores para financiar um programa plurianual de transferências monetárias que permitisse às comunidades locais ganharem flexibilidade na resposta às crises alimentares ao providenciar uma rede social de segurança. O projecto recebeu assistência substancial do Banco Mundial, Programa Alimentar Mundial, e também de agência da ajuda bilaterais do Canadá, Reino Unido e Estados Unidos. O PNSP tem sido um programa bem focado. Iniciou em 2005 com um custo de cerca de US$ 400 milhões por ano, dos quais os doadores financiam cerca de 75 por cento e o Governo da Etiópia financia o restante. O programa tem dois componentes, transferência monetária para os agregados familiares com insegurança alimentar - principalmente através de actividade de dinheiro por trabalho, e um componente mais pequeno de capacitação. Uma vez que o objectivo do programa é focar nos agregados familiares mais inseguros e uma vez que o Governo da Etiópia acredita que as comunidades são as que se encontram na melhor posição para identificar os agregados mais pobres, o programa foi altamente descentralizado. O Governo da Etiópia concebeu um sistema que garantiu que o foco em regiões e comunidades fosse constantemente revisto, dependendo dos padrões de vulnerabilidade e choques. O programa tem tido sucesso na redução da vulnerabilidade dos agregados à escassez alimentar, e na melhoria da infra-estrutura local, tais como escolas, clínicas de saúde, estradas e irrigação. O programa evoluiu também a partir do fornecimento de assistência de emergência a favor de uma abordagem mais preventiva, incluindo o desenvolvimento de fundos de contingência que são accionados quando o sistema de aviso indica uma escassez alimentar iminente, fornecendo assim às famílias um apoio antes da escassez. De acordo com a Comissão de Avaliação Independente do Banco Mundial, o “PNSP formou o esqueleto das actividades de rede de segurança social na Etiópia... [o programa] demonstra o que pode ser alcançado num país de baixo rendimento com capacidade limitada e níveis elevados de pobreza.” 5. ESTATÍSTICAS PARA POLÍTICAS COM BASE EM PROVAS 4.49 O investimento público no desenvolvimento das estatísticas é uma chave para melhorar a governação. A concepção e planeamento de políticas na Guiné-Bissau têm tido lugar sem dados fiáveis, e frequentemente sem dados de todo. A experiência internacional tem demonstrado que a disponibilidade de dados fiáveis melhora a capacidade da administração de desenvolver melhores políticas. Os dados permitem: (i) análise da situação e uma compreensão melhor dos mecanismos subjacentes de desenvolvimento; (ii) melhoria na concepção de programas e políticas e o desenvolvimento de metas quantitativas tangíveis e ligadas a objectivos específicos de política; (iii) melhor análise do impacto das políticas; (iv) capacidade reforçada de seguimento e avaliação para políticas e programas, e na gestão dos ministérios sectoriais; e (iv) melhoria no acesso à informação para os implementadores de políticas e público em geral. 4.50 O score do Índice da Capacidade Estatística do Banco Mundial para a Guiné-Bissau é de 50 (Figura 56), o que se situa consideravelmente abaixo da média de 60 para os países da África Subsaariana, e coloca a Guiné-Bissau entre os países com o score mais reduzido na região e no mundo. Foram empreendidos vários esforços em anos recentes e os scores têm melhorado 115 ligeiramente, indicando que tem havido Figura 56: A capacidade estatística é débil na Guiné- progresso na capacidade da administração de Bissau agregar dados, especialmente nas áreas (score da capacidade estatística, mais elevado é melhor) apoiadas pelos doadores. 90 80 4.51 O sistema estatístico da Guiné- Bissau está ancorado num quadro 70 institucional sólido, mas que necessita 60 ainda de ser totalmente implementado. A Lei de Estatísticas 45 de Setembro de 2007 50 África Subsaariana define os objectivos e as instituições do 40 Guiné-Bissau Sistema Nacional de Estatísticas (SEN) e a 30 sua composição, domínios de intervenção, e atribuições. O SEN como um todo está sob a 20 autoridade do Primeiro-ministro, com 10 delegação ao Ministério do Planeamento. O 0 SEN inclui três grandes instituições: o Total Metodologia Fontes dos dados Periodicidade e Conselho Superior de Estatísticas, o Instituto regularidade Nacional de Estatísticas e Censos (INEC), e Fonte: Banco Mundial, Indicadores da Capacidade Estatística as instituições delegadas pelo INEC (para uma descrição detalhada do INEC, ver “Bilan de l’existant”, INEC, Março de 2010). O INEC é a principal instituição encarregue de produção de estatísticas na Guiné-Bissau. Este enquadramento é consistente com a prática internacional em geral e, como tal, deverá ser considerada eficiente. No entanto, até à data, o Governo não submeteu o decreto de aplicação, e como tal, a Lei não é efectiva. 4.52 Os Ministérios individuais também produzem dados, mas a qualidade é dúbia. Existem de facto 23 unidades estatísticas nas agências ministeriais, cada uma a operar sob o controlo directo do respectivo Ministério. A missão e os objectivos destas unidades não são bem definidos e, previsivelmente, a cooperação com os Ministérios é pobre. Por esta razão, a melhoria da colaboração entre todos os produtores de estatísticas na Guiné-Bissau é uma prioridade para garantir a aplicação harmoniosa das metodologias e standards. 4.53 Em termos de produção de dados, a revisão da actividade de inquéritos nos últimos 10 anos revela uma dependência excessiva do apoio dos parceiros de desenvolvimento, o que levou a uma falta de desenvolvimento de capacidades e a uma colecta casual de dados chave. Ao longo da última década, têm sido conduzidos um número significativo de inquéritos estatísticos na Guiné-Bissau46 com o apoio dos doadores, tanto em termos de financiamento como através do fornecimento de assistência técnica. Previsivelmente, a selecção dos tópicos abordados, o calendário de implementação, e as metodologias e questionários dos inquéritos e censos foram determinados pelos interesses dos parceiros de desenvolvimento e disponibilidade de financiamento. Embora tenham sido produzidos dados úteis de forma pontual, esta realidade não levou nem a um aumento da capacidade estatística nacional, nem permite a realização de revisões periódicas da situação do país ao longo do tempo. 4.54 A colecta regular de dados permite a elaboração de séries temporais, o que por sua vez pode providenciar informação significativa para a formulação de políticas. Todavia, na Guiné-Bissau este não é o caso. Os censos populacionais, por exemplo, são habitualmente 45 Lei N 6/2007 de 10 de Setembro de 2007. 46 Principalmente focada na população, pobreza, e condições de vida, saúde e demografia, empresas, etc. 116 conduzidos após 12 anos, e depois após 19 anos. Os dados da pobreza, habitualmente recolhidos em cada três anos, foram colectados pela primeira vez em 2002 e novamente em 2010, tornando a elaboração de séries temporais um exercício difícil. Para o inquérito MICS, a situação é melhor, uma vez que os anos de colecta de dados foram 2002, 2006 e 2010. A produção estatística do sistema estatístico nacional da Guiné-Bissau por áreas gerais pode ser encontrada no website do INEC.47 4.55 A produção de dados administrativos rotineiros permanece incompleta, pouco fiável, e casual. Estes dados são produzidos pelas 23 unidades estatísticas sectoriais (UES) em cada ministério e cobrem um número vasto de domínios socioeconómicos. Em alguns domínios críticos, tais como registo civil, governação, e ambiente, a informação não tem sido colectada de forma rotineira, enquanto em determinados tópicos onde a informação é colectada, os relatórios estatísticos não foram produzidos. 48 O hiato temporal entre o ano de colecta de dados e a publicação do relatório varia de sector para sector e é frequentemente excessivo, mas tem havido algum progresso em alguns sectores. 4.56 O armazenamento, gestão e disseminação da informação estatística é negligenciado e precário. Os relatórios existentes de inquéritos não são habitualmente disseminados, não existe um calendário de publicações, e não são realizadas actividades de divulgação para que os utilizadores e público saibam sobre a produção de dados do SEN. Adicionalmente, raramente existem bases de dados sectoriais ou anuários para tirar vantagem da informação disponível e para efeitos de disseminação. Finalmente, não existe uma política no que concerne ao acesso aos dados, o que significa que não há uma responsabilidade definida para armazenar informação relevante, nem um procedimento preciso para garantir o acesso sistemático aos dados por parte utilizadores. Além dos constrangimentos técnicos, a ausência de disseminação é directamente relacionada com a ausência de “cultura de estatísticas” no sector público. As estatísticas são utilizadas principalmente pelos doadores. Tornar os dados acessíveis aos empregados do sector público e também da sociedade civil como um todo tem o potencial de melhorar as políticas públicas. 4.57 Tal como a restante administração pública, o sector estatístico tem uma capacidade limitada em termos de recursos qualificados e poucos recursos financeiros para empreender esta tarefa fundamental de desenvolvimento. O sector estatístico tem um staff de 447 pessoas para a totalidade do SEN, 49 dos quais apenas alguns são considerados “quadros”. Dos 447 pertencentes ao staff, apenas 4 por cento têm um background académico em estatísticas, demografia, ou informática - bem abaixo dos níveis exigidos para fornecer informação de qualidade. 47 A informação incluída no portal do INEC provém de diferentes fontes, e provavelmente deveria ser revista e completada. Deverá também ser realçado que se os dados administrativos são focado num sector, os dados dos inquéritos providenciam estatísticas para um área ampla de sectores, e por isso a desagregação por domínios não é mutuamente exclusiva. Por exemplo, é possível encontrar dados sobre educação em todos os inquéritos, qualquer que seja o tópico. Estes domínios têm ainda de ser normalizados e adaptados às especificidades da Guiné-Bissau de forma a normalizar a produção estatística. Uma tentativa para essa normalização é proposta no documento «Annexe au Bilan de l’existant» e será discutido durante o processo de definição da Estratégia Nacional de Desenvolvimento das Estatísticas. 48 Este é o caso do sector do emprego, segurança social, transportes, telecomunicações e turismo. 49 Em diversas ocasiões, foi feita uma tentativa para propor metas sobre o número de quadros estatísticos per capita, sem alcançar resultados convincentes. 117 4.58 Foram propostos quatro eixos de desenvolvimento para o fortalecimento do Sistema Nacional de Estatísticas da Guiné-Bissau:  Fortalecer o quadro institucional e de coordenação através de: (i) melhoria do quadro institucional e organizacional, e (ii) fortalecimento da coordenação estatística.  Aumentar a capacidade de produção de dados por parte dos actores do SEN através de (i) envolver o pessoal qualificado nas estatísticas e demografia, e (ii) melhorar as condições de trabalho dos agentes estatísticos em todo o SEN.  Melhorar a produção de dados através de: (i) produção de dados desagregados sociodemográficos e económicos para 2011-2015; (ii) produção de dados administrativos - fiáveis e frequentes - para 11 domínios prioritários do DENARP; e (iii) melhorar a qualidade geral da produção do SEN.  Promover, disseminar e utilizar as estatísticas através de: (i) melhoria no arquivamento e disseminação dos dados estatísticos, e (ii) advogar o uso de estatísticas. 4.59 A construção de sistemas estatísticos eficientes, relevantes e sustentáveis irá exigir enfrentar cinco desafios chave: (i) fortalecimento e clarificação da procura; (ii) divulgar o desenvolvimento das estatísticas; (iii) conceder à Estratégia Nacional de Desenvolvimento das Estatísticas (ENDE) o papel de referência; (iv) disseminação; e (v) tornar o sistema estatístico eficiente: Fortalecer e tornar a procura explícita e clara. 4.60 Em muitos casos, há uma procura por dados para efeitos de elaboração do DENARP II ou indicadores ODM, mas esta não é traduzida em operações estatísticas ou de apoio ao sistema estatístico. É essencial que cada utilizador ou potencial utilizador seja ciente das operações estatísticas necessárias para produzir os dados, e que se facilite o diálogo entre os dois grupos como uma forma de ancorar o sistema estatístico no contexto geral de desenvolvimento. A experiência internacional sugere que o aporte de dados objectivos para a discussão tem registado repercussões positivas nas negociações laborais, assim como tem fortalecido a supervisão construtiva do ramo legislativo e da sociedade civil. Divulgar o desenvolvimento das estatísticas 4.61 O desenvolvimento estatístico deve ser considerado uma parte regular da agenda de desenvolvimento. Por vezes é antes considerado com uma matéria técnica, e de forma ad hoc. Tendo em conta o uso das estatísticas, estas devem ser discutidas em todos os passos do processo de desenvolvimento, desde as estratégias de desenvolvimento gerais tais como o DENARP II até às políticas e programas sectoriais. O reporting sistemático da capacidade estatística e resultados do SEN deverá alimentar esta divulgação. Adicionalmente, assim como para outras áreas carentes de desenvolvimento de capacidades, os parceiros de desenvolvimento e o Governo devem focar-se em desenvolver capacidade sustentável para realizar produção, análise e disseminação de dados estatísticos. Conceder à Estratégia Nacional de Desenvolvimento de Estatísticas (ENDE) um papel de referência 4.62 A estratégia nacional é o elemento chave na renovação das estatísticas na Guiné- Bissau. Esta irá definir a visão do país no plano do desenvolvimento estatístico ao apresentar uma abordagem ampla que irá permitir a todos os participantes nesta agenda uma definição clara das respectivas áreas de intervenção no contexto de um plano mais amplo. A melhoria no planeamento e coordenação entre as diferentes agências governamentais e com os doadores irá garantir o desenvolvimento estatístico mais eficiente também em termos de custos. 118 Disseminação 4.63 A disseminação das estatísticas, associada ao acesso público aos dados, deverá ser considerada uma das bases da produção estatística. Nos países frágeis, onde a produção de dados é menos prevalecente, a disseminação torna-se ainda mais vital. Um dos objectivos mais urgentes passa por tornar todos os dados acessíveis utilizando standards internacionais, tais como aqueles desenvolvidos pela International Household Survey Network (IHSN) eAccelerated Data Program (ADP), e desenvolver e aplicar uma política de acesso livre aos dados. A base de dados nacional e o website actualizado são outputs essenciais para uma política de disseminação renovada. O uso da Internet, a disponibilidade de dados em lugares públicos, tais como livrarias, edifícios governamentais (edifícios municipais, ministérios e embaixadas, por exemplo), ou a criação de pontos de informação podem ser considerados no contexto do quadro geral de melhoria da disseminação e de disponibilidade de dados. Tornar o sistema estatístico mais eficiente 4.64 O desenvolvimento estatístico e a produção de dados em países frágeis enfrentam diversos constrangimentos severos, incluindo a baixa capacidade dos recursos humanos e o financiamento limitado. É por isso imperativo que ambos os recursos sejam utilizados da forma mais eficiente possível. Com base em desempenhos passados e comparadores internacionais, podem ser estabelecidos objectivos de produção estatística para cada participante no processo de desenvolvimento e disseminação estatística. É também essencial que se estabeleça um quadro para a revisão sistemática da informação estatística. 6. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS A construção da capacidade do sector público num contexto frágil exige um equilíbrio cuidado entre as necessidades e prioridades com as expectativas, sempre tendo em conta os recursos e a capacidade disponível. A sobrecarga de um sector público fraco pode levar a recuos significativos, e a falta de produtividade pode criar frustrações e minar a boa vontade. Os controlos adequados são cruciais para construir a capacidade, tanto domesticamente como com os parceiros. As seguintes recomendações de políticas foram elaboradas com estes elementos em mente:  Tornar o Orçamento o principal instrumento de políticas que determina as prioridades de despesas. Isto irá exigir o investimento na elaboração do Orçamento, incluindo uma consulta real e um processo de negociação, liderado por alguém com a competência e autoridade para avaliar propostas, negociar com as unidades de despesas, arbitrar entre as prioridades em concorrência e tomar decisões finais sobre as prioridades orçamentais. O Governo agora em exercício tem a oportunidade de cumprir estes pressupostos no exercício do orçamento de 2015. Poderá ser necessária assistência técnica.  Fortalecer a GFP. Recuperar os avanços feitos na agenda de GFP através de (i) promulgação e aplicação da legislação relacionada com a UEMOA; (ii) utilizar o SIGFIP para capturar todas as aprovações, compromissos, despesas, e produzir todos os relatórios relevantes; (iii) garantir a monitorização atempada do Orçamento através dos relatórios de execução trimestrais; (iv) garantir o funcionamento pleno da função de controlador orçamental; (v) limitar significativamente o uso de procedimentos orçamentais excepcionais.  Colocar em prática controlos de despesa adequados. Os gestores das tutelas têm de estar aptos a controlar e rejeitar despesas que não estão em linha com as prioridades de políticas conforme definidas no orçamento nacional. O Comité do Tesouro entretanto extinto pode ser um instrumento útil para impor este controlo, filtrar as despesas numa perspectiva de políticas, e garantir a gestão eficiente dos fluxos de caixa e controlos fiduciários, todos os quais são necessários na Guiné-Bissau. O convite aos doadores para participar como 119 observadores neste Comité ajudaria também a reconstruir a confiança. Todas as despesas orçamentais e o reporting atempado do orçamento devem ser efectuadas através do SIGFIP.  Aumentar as receitas tributárias: Existe margem para aumentar significativamente as receitas domésticas através de uma política de colecta tributária mais eficiente. As opções incluem a melhoria dos processos burocráticos e o estabelecimento de um sistema tributário mais transparente e simples. As licenças de pesca, e a melhoria da colecta sob grandes empresas, incluindo empresas estatais, são outras áreas de potenciais ganhos. Implementar a Conta Única do Tesouro (CUT) é essencial para o seguimento eficaz das receitas. O Governo deverá evitar impostos regressivos que impactam negativamente nos mais pobres.  Redimensionar o sector público no médio prazo: A folha de salários actual, que se situa em cerca de 137% da receita doméstica, comparado com o standard UEMOA de 35%, é claramente insustentável. O sector público é desequilibrado, sobredimensionado e mal remunerado. Embora alguns sectores sociais tenham uma escassez de recursos humanos, outros têm um excesso. O Governo deverá examinar urgentemente cenários distintos e opções para as reformas tendo em conta as necessidades actuais, incluindo redução de pessoal através de cortes, realocação de staff, contratação selectiva, revisão dos salários e benefícios - incluindo benefícios para os ex-funcionários e quadros militares - e uma melhoria na gestão da folha de salários.  Fornecer serviços sem sobrecarregar o sector público. O Governo deverá usar programas de assistência social focalizada, incluindo mecanismos de transferências monetárias que podem ser implementados num quadro institucional fraco, e que são uma forma efectiva de providenciar soluções alternativas onde as políticas públicas falharam. Estes programas têm o benefício de responder às necessidades sociais imediatas sem sobrecarregar um sector público fraco, ao mesmo tempo que fornecem benefícios para a população, constroem a confiança, estabilidade e legitimidade e reduzem a pobreza, permitindo também ganhar o tempo necessário para construir lentamente as instituições públicas.  Priorizar a colecta, tratamento e produção atempada de estatísticas para guiar e medir as políticas nacionais para o desenvolvimento e redução da pobreza através (i) fortalecimento e clarificação da procura por estatísticas; (ii) divulgação do desenvolvimento das estatísticas; (iii) Conceder à ENDE um papel de referência; (iv) disseminação; e (v) tornar o sistema estatístico mais eficiente. 120 CAPÍTULO 5: PARCERIAS PARA UM MAIOR IMPACTO 1. INTRODUÇÃO 5.1 O desenvolvimento da Guiné-Bissau e os desafios de governação são formidáveis, mas o Governo recém-eleito pode contar com um número amplo de parceiros dispostos a conceder apoio. As parcerias além das fronteiras nacionais, com organizações de doadores, grupos da sociedade civil, e também organizações regionais, são vitais para apoiar os esforços para estabilizar a economia e promover o desenvolvimento económico. As contribuições dos doadores bilaterais e multilaterais desempenham um papel de reforço no apoio ao financiamento de parte das despesas dos países em desenvolvimento, e para apoiar o serviço de parte da dívida pública. Além da APD tradicional das instituições multilaterais e de países desenvolvidos, as organizações da sociedade civil desempenham também um papel cada vez mais relevante no fornecimento de serviços básicos a segmentos vulneráveis e excluídos da população; as parcerias através de acordos regionais de comércio podem também ser benéficas para a infra-estrutura regional e na atracção do IDE, e mesmo em iniciativas para fortalecer a governação. 5.2 Os doadores são parceiros importantes da Guiné-Bissau uma vez que fornecem assistência técnica e financeira. As fortes salvaguardas fiduciárias e a coordenação dos doadores são vitais para maximizar o respectivo impacto de desenvolvimento. A receita doméstica é débil na Guiné-Bissau e o país depende de financiamento externo para realizar investimentos chave, incluindo aqueles previstos na agenda de retoma. No entanto, a ajuda pode minar as instituições, o que é particularmente perigoso num ambiente já por si frágil. Este capítulo irá por isso reforçar a conclusão do Capítulo 4: um sistema forte de Gestão das Finanças Públicas (GFP) é vital para garantir que os recursos dos doadores são utilizados para os seus objectivos previstos. Até que o sistema GFP seja adequado, os doadores não devem utilizar os sistemas nacionais. O segundo ingrediente chave para garantir que a assistência dos doadores é efectiva é a coordenação forte e dinâmica dos esforços dos doadores no domínio do financiamento e da assistência técnica. 5.3 As organizações regionais têm um historial de apoio à governação da Guiné-Bissau. Os estudos empíricos sugerem que os países que são mais integrados economicamente são mais estáveis e com menor probabilidade de passarem por um conflito civil.50 A integração regional pode criar fluxos de comércio (embora possa também afastar o comércio), e pode encorajar o IDE e as infra-estruturas intra-regionais. Através da UEMOA, a Guiné-Bissau tem ganho políticas monetárias e de câmbio estáveis. No entanto as organizações regionais podem também desempenhar um importante papel político. Tanto a União Africana como a CEDEAO, mas também organizações baseadas na língua e cultura como a CPLP, têm sido vitais, por exemplo, na negociação da transição para a democracia após o golpe de 2012. 5.4 As organizações da sociedade civil (OSC) são também parceiros importantes para o Governo e doadores de forma semelhante. As OSC são críticas na transição da fragilidade para estabilidade, preenchendo habitualmente os gaps onde existe uma falta de vontade política ou uma incapacidade do Governo de providenciar serviços básicos às populações excluídas. As 50 De Soysa, I. e A. Wagner (2003), “Global Market, Local Mayhem? Foreign Investment, Trade Openness, State Capacity, and Civil War, 1989–2000”, documento apresentado nas Joint Sessions of Workshops of the ECPR, Edimburgo; Barbieri, K, e Reuveny, R,.. (2005). «Globalização Económica e Guerra Civil». The Journal of Politics 67:1228-47; Ibrahim, E, e H. Hegre (2008.) `Globalization, Economic Shocks, and Armed Conflict' , Defence and Peace Economics 19(1): 37-60 121 organizações não-governamentais (ONGs), por exemplo, são parceiros vitais em projectos liderados pela comunidade (CDD). O Governo frequentemente implementa estes projectos com financiamento dos doadores e implementação em parceria próxima com as ONGs. As OSCs são também frequentemente defensoras importantes do processo de paz e reconciliação, um papel particularmente relevante no contexto de um país frágil como a Guiné-Bissau. As secções seguintes vão explorar em maior detalhe como é que o Governo da Guiné-Bissau pode alavancar as parcerias para conseguir promover o crescimento partilhado com assistência suficiente para evitar a armadilha da falta de capacidade. 2. DOADORES E AJUDA PÚBLICA AO DESENVOLVIMENTO Ajuda, instituições e crescimento 5.5 As provas empíricas sobre a efectividade dos fluxos de ajuda sobre o crescimento têm sido inconclusivas. Diversos estudos demonstram que o efeito da ajuda no crescimento é inconclusivo. Os efeitos positivos da ajuda no crescimento têm sido descobertos principalmente em áreas do desenvolvimento humano e melhoria do bem-estar das famílias. 51 Um ambiente económico saudável, associado a uma boa política económica para promover a abertura ao comércio e elevados volumes de comércio, reduzidos níveis de inflação, e disciplina fiscal e monetária, tem demonstrado a eficácia da ajuda e promovido o crescimento, e a ajuda providenciada num ambiente institucional forte tem provado também ser mais efectiva. O vigor do ambiente institucional, que mede a capacidade de um Estado de absorver ajuda, tem demonstrado ser importante no aumento da eficácia da ajuda em países como o Botsuana e Moçambique, enquanto um maior nível de liberdades civis entre a população tem também promovido uma correlação positiva entre a ajuda e o crescimento em países que recebem projectos do Banco Mundial.52 No entanto, outros estudos descortinaram efeitos menos positivos sob o crescimento e as instituições. 5.6 É importante manter em mente que a ajuda pode ter efeitos negativos no crescimento. A ajuda fornece incentivos para que os Governos cortem o investimento quando a ajuda decresce e para expandir o consumo do Governo quando ela resume de forma inesperada. 53 Os Governos podem utilizar recursos da ajuda para objectivos não esperados e promover a corrupção. Se os controlos fiduciários forem fracos, a ajuda pode constituir outra fonte de rendas para as elites e aumentar a corrupção. Conforme argumentado no Capítulo 1, a concorrência entre as elites está no cerne da fragilidade. A ajuda pode por isso minar as instituições e inadvertidamente intensificar as fragilidades. 54 Existem um número de estudos empíricos que 51 E.g. Owens, T., e J. Hoddinott, (1999) ‘Investing in Development or Investing in Relief: Quantifying the Poverty Tradeoffs using Zimbabwe Household Panel Data’. Centre for the Study of African Economies Working Paper 99-4. Universidade de Oxford. Clemens, M. A., S. Radelet, R.R. Bhavnani, (2004) ‘Counting Chickens When They Hatch: The Short-term Effect of Aid on Growth’, Working Paper 44. Washington, D.C.: Center for Global Development. 52 Isham J., D. Kaufmann e L. Pritchett (1997) ‘Civil liberties, Democracy, and the Performance of Government Projects’. World Bank Economic Review 11(2): 219–242; Dollar D., e C. Burnside (2004) ‘Aid, policies, and growth: Revisiting the evidence’. World Bank Policy Research Working Paper 3251. 53 Celasun, O. e Walliser, J. (2008) ‘Predictability of aid: Do fickle donors undermine aid effectiveness?’ Economic Policy, 23: 545–594. 54 Grossman, H.I e M. Kim (1996), ‘Predation and Accumulation’, Journal of economic Growth 1:333- 351. ;Boone, P. (1996) ‘Politics and the Effectiveness of Foreign Aid’, European Economic Review, vol. 40, 289-329. ; Remmer, K. (2004) ‘Does Foreign Aid Promote the Expansion of Government?’ American Journal of Political Science, vol. 48, 77-92. ; Knack, S (2004) ‘Does foreign aid promote democracy?’ International Studies Quarterly 48: 251-266. 122 indicam que a ajuda pode ter um efeito negativo na instituição política.55 Um determinado estudo concluiu que o efeito negativo da ajuda nas instituições é comparável em magnitude ao efeito do petróleo à luz da “maldição dos recursos naturais”. 56 Nestes estudos, a ajuda tem um efeito negativo no crescimento ao minar a força das instituições locais. 5.7 A capacidade de absorção dos Estados frágeis é reduzida, afectando assim o retorno da ajuda e o seu impacto no crescimento. Os Estados frágeis podem receber ajuda em excesso, uma vez que não têm capacidade para absorver efectivamente níveis mais elevados de ajuda - a armadilha de capacidade descrita no capítulo 4. Os países que não têm capacidade para efectuar funções de governação básicas tendem a ter uma responsabilização fraca e um serviço limitado. As estimativas sugerem que, com a falta de instituições fortes, a eficácia da ajuda em estados frágeis declina cerca de sete anos após um conflito, com evidências de Moçambique, Uganda e Serra Leoa a demonstrarem que a ajuda pode de facto apoiar o crescimento para a reconstrução depois de um conflito civil, mesmo na ausência de instituições fortes.57 O provimento de assistência técnica para fortalecer a governação, nas linhas sugeridas no capítulo 4, executando os projectos através de Unidades de Implementação de Projectos, alavancando o apoio das ONGs, mas também fornecendo recursos aos mais pobres através de programas de assistência social, conforme argumentado nos capítulos 4 e 6,58 pode limitar o risco de cair na armadilha de capacidades. 5.8 A ajuda é frequentemente alocada com base na força das instituições. Em coerência com a noção de que os países com boas políticas e instituições estão mais aptos a atrair e utilizar a ajuda de forma mais eficiente, o rating CPIA da Guiné-Bissau e APD per capita (Figura 57) reflectem o facto de que os doadores tendem a recompensar os governos com instituições de qualidade ao alocar recursos para os países com base na sua qualidade institucional. A resposta dos doadores ao golpe militar de 2012 foi consistente com esta política, uma vez que os golpes são manifestações fortes de fracassos na governação: A APD colapsou (Figura 58). 5.9 Os doadores recompensam investimentos em instituições. Na Guiné-Bissau, os doadores provavelmente não estarão disponíveis para canalizar ajuda através de sistemas nacionais, conforme recomendado pela Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda. No entanto, se o Governo implementar reformas importantes para fortalecer as salvaguardas fiduciárias, os doadores provavelmente vão providenciar ajuda através dos sistemas nacionais, incluindo ajuda não cativada como apoio orçamental. Adicionalmente, com as reformas do sector público, conforme sublinhadas no capítulo 4, os doadores são mais predispostos a aumentar os seus compromissos com a Guiné-Bissau uma vez que as fugas são menos prováveis e a capacidade do Governo de implementar políticas públicas essenciais tem aumentado. Os doadores encontram-se também preparados para providenciar assistência técnica para apoiar o Governo com estas reformas. 55 E.g. Reinikka, R. and J. Svensson (2004) ‘Local Capture: Evidence from a Central Government Transfer Program in Uganda.’ Quarterly Journalof Economics, 119 (2): 679-705. 56 Djankov, S., J. G. Montalvo, M. Reynal-Querol (2008) ‘The Curse of Aid.’ Journal of Economic Growth 13(3): 169–94; 57 M. McGillivray, S. Feeny, N. Hermes, R. Lensink (2006) ‘Controversies over the impact of development aid: it works; it doesn’t; it can but that depends …’ Journal of International Development, 18 (7): 1031– 1050. 58 Ver também Harvey, P. (2007) ‘Cash Based Responses in Emergencies’. HPG Report 24, Humanitarian Policy Group, Overseas Development Institute. 123 Figura 57: As instituições mais fortes são associadas a Figura 58: A APD permanece o mais importante um maior fluxo de APD influxo financeiro na Guiné-Bissau; colapsou em 2012 (score CPIA e APD per capita) em resposta ao golpe (percentagem do PIB) 180 20 APD líquida recebida 18 Influxos líquidos de IDE 160 Remessas 140 16 14 120 APD per capita 12 100 10 80 8 60 GNB 6 40 4 20 2 0 0 1 2 3 4 5 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 CPIA -2 Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial (WDI). Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Mundial (WDI). Nota: A Avaliação Institucional e de Políticas do País (CPIA) é um índice do Banco Mundial que mede a força institucional dos países em desenvolvimento. Alavancar os recursos dos doadores e coordenar os doadores 5.11 A Guiné-Bissau é altamente dependente de APD para financiar as despesas de capital e implementar as suas políticas de desenvolvimento. Em 2011, o país situou-se em 20º entre os países mais dependentes de ajuda, e a proporção da ajuda em relação ao PIB situou-se entre as mais elevadas de África. As receitas domésticas para o período de 2007-2012 - financiadas principalmente por donativos - foram mais reduzidas do que a média da África Ocidental e do resto da sub-região. Os donativos para a Guiné-Bissau correspondem a quase 10 por cento do PIB em 2012. No entanto, o decréscimo no financiamento externo devido à retirada da Figura 59: A infra-estrutura e a educação são as principais áreas apoiadas pela APD na Guiné-Bissau ajuda por vários doadores em 2012 e 2013 (APD por sector, em percentagem do total em 2012) na sequência da crise política de 2012 levou à redução da APD. Agricultura 5.12 A maior quota de ajuda na 10% Guiné-Bissau tem como destino os Conflitos, Paz e Educação sectores de educação e infra-estruturas, Segurança 30% seguido de saúde (Figura 59). A 10% educação, saúde, agricultura, infra- estrutura, e paz e segurança são considerados críticos para o alcance dos ODMs, melhoria do capital humano e Infra- promoção do crescimento de longo prazo. estrutura Saúde 32% A despesa nestas áreas é crítica para a 18% formação de capital humano e melhoria nos serviços públicos, e espera-se que possa vir a aumentar a produtividade do Fonte: CAD OCDE. trabalho na Guiné-Bissau no longo prazo. Os fluxos de ajuda para o sector da educação mais do que duplicaram de 2009 (US$ 9,1 milhões) 124 até 2010 (US$ 18,4 milhões), mas entretanto caíram drasticamente em 2012. Os doadores que lideram o apoio ao sector educação na Guiné-Bissau são Portugal, o Banco Mundial, Espanha e França. O sector de infra-estrutura é financiado principalmente por doadores multilaterais, especialmente a União Europeia e Banco Mundial. A ajuda ao sector da infra-estrutura atingiu o pico em 2007 como resultado de grandes desembolsos efectuados pela UE para suportar a construção de duas pontes ao longo da principal estrada que liga a Guiné-Bissau ao Senegal, assim como para manutenção da estrada. Em 2009, o fluxo de ajuda para este sector correspondeu a 13,2 por cento do total de ajuda mas começou a decrescer em 2010 devido à instabilidade política e abrandamento económico global. O apoio ao sector das infra-estruturas retomou novamente em 2011, aumentando de US$ 5,8 milhões para US$ 8,9 milhões, e decresceu ligeiramente em 2012 para US$ 8,5 milhões. 5.13 Os principais doadores bilaterais e multilaterais da Guiné-Bissau são a UE, os EUA, a IDA, Portugal, e Japão, que providenciam o grosso da ajuda. O contribuinte financeiro mais substancial, a UE, contribuiu com um total de US$ 14,74 milhões em 2012 para a Guiné-Bissau, representando um decréscimo de 75 por cento nos fluxos de ajuda provenientes da UE desde 2009 no seguimento das crises financeiras. Os maiores aumentos de fluxos de ajuda ocorridos no período de 2009-2012 vieram dos EUA, cuja ajuda aumentou de US$ 1,14 milhões em 2009 para US$ 7,4 milhões em 2012. A ajuda dos doadores pertencentes ao Comité de Apoio ao Desenvolvimento (CAD) segue um padrão semelhante; atingiu o pico em 2003 com cerca de US$98 milhões, e iniciou o decréscimo durante a presidência de Kumba Yalá. Os fluxos de ajuda de doadores pertencentes ao CAD retomaram um aumento em 2006, atingindo US$ 54,3 milhões em 2010, e decresceram para US$ 37,2 milhões em 2012. O envolvimento dos doadores tem retomado em 2014, no seguimento das eleições, e o FMI prepara-se para reiniciar um programa, começando com um instrumento de crédito rápido (Rapid Credit Facility), a ser seguido por um instrumento de crédito de médio e longo prazo (Extended Credit Facility). Adicionalmente, em anos recentes, alguns doadores bilaterais menos tradicionais iniciaram o seu apoio à Guiné-Bissau, incluindo Timor Leste. A extensão das parcerias além dos doadores tradicionais é promissora. 5.14 Os parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau providenciam quantidades substanciais de apoio em diversas áreas. A coordenação destes apoios é crucial. A coordenação dos doadores é importante por uma série de razões. Primeiro, a coordenação é necessária para garantir que o desembolso dos fundos dos doadores está em linha com os objectivos do Governo. Segundo, a coordenação é necessária para ter os constrangimentos de capacidade em conta e para evitar sobrecarregar as autoridades com diferentes processos administrativos. Terceiro, a coordenação melhorada dos doadores pode garantir consistência entre os programas dos diferentes doadores. Um dos exemplos para ilustrar isto é o sector da electricidade (ver também o capítulo 2). A melhoria do acesso à electricidade é uma prioridade para o Governo. No entanto se os doadores apoiarem o reforço da capacidade de produção, a cobertura de electricidade poderá não aumentar se a rede não conseguir absorver capacidade adicional. Finalmente, quaisquer reformas no sector podem falhar se a capacidade da EAGB para as administrar não for aumentada. Os doadores podem providenciar apoio em todas estas áreas mas este deve ser coordenado para uma reforma exaustiva e sustentável do sector. 5.15 A coordenação da ajuda entre os doadores na Guiné-Bissau permanece um desafio. A somar ao decréscimo dos fluxos de ajuda, têm-se realizado poucas actividades de seguimento e coordenação na Guiné-Bissau, o que resulta num desperdício desnecessário de recursos escassos devido a atrasos, e implementação de mecanismos de seguimento e avaliação duplicados. Embora os doadores na Guiné-Bissau tenham a tendência de se coordenar bem entre si, é essencial que o Governo lidere a coordenação. A falta de coordenação limita a capacidade que o país tem de implementar com sucesso as políticas de desenvolvimento que vão permitir o fornecimento de serviços públicos e o alcance dos ODMs. A nível do Governo, não existe um quadro institucional 125 claro para a coordenação da ajuda entre os diferentes ministérios, o que leva a duplicações e deficiente partilha de informação. 5.16 A Guiné-Bissau necessita de capacidade institucional reforçada para o diálogo regular entre o Governo e os seus parceiros, e as discussões com os doadores são principalmente bilaterais. Existe uma escassez severa de recursos humanos adequados e qualificados no sector público, incluindo na área de coordenação da APD, conforme reconhecido no relatório da Guiné-Bissau a respeito dos Princípios de Bom Envolvimento Internacional em Países Frágeis (Principles for Good International Engagement in Fragile Countries). Os oficiais governamentais envolvidos no planeamento do desenvolvimento e coordenação da ajuda têm pouca formação e experiência a lidar com os doadores. Muitos deles não foram expostos ao novo paradigma da ajuda. Para responder a esta situação, foi providenciada formação em Eficácia da Ajuda antes do golpe militar de 2012, para desenvolver capacidades entre o staff governamental, e mais formações e workshops vão ser desenvolvidos no futuro próximo. É importante expandir estes esforços. Um sistema de coordenação efectiva dos doadores, liderado pelo Governo, irá ser crucial para alavancar o apoio dos parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau. A criação de um sistema forte de coordenação pode ser um dos mais importantes investimentos do novo Governo para conseguir o maior impacto possível dos recursos externos. 3. ORGANIZAÇÕES REGIONAIS E INTEGRAÇÃO REGIONAL 5.17 A cooperação com os parceiros regionais pode providenciar um apoio crítico à Guiné-Bissau. A integração regional tem o potencial de aumentar o comércio do país com a região e nos mercados globais, permitindo assim o aumento da competitividade e a promoção do crescimento. O comércio além-fronteiras entre países aumenta a actividade económica promove o comércio e a competitividade económica.59 Em particular, o comércio além-fronteiras tem sido identificado como um potencial instrumento para aumentar o crescimento entre países, aliviar a pobreza, aumentar a competitividade nacional, e reduzir a insegurança alimentar em regiões altamente vulneráveis. Adicionalmente, a integração regional tem sido eficaz na promoção da paz e segurança entre países vizinhos, uma vez que o aumento do comércio pode reduzir os custos de oportunidade de conflitos e melhorar a segurança entre países. Os países mais pequenos podem beneficiar da integração regional ao utilizar acordos de comércio para fortalecer a sua posição negocial vis-à-vis outros países e para aumentar a sua capacidade tecnológica.60 Esta secção foca- se em particular na CEDEAO como parceiro para a Guiné-Bissau não apenas através de ligações económicas, mas também com apoio político. A União Africana é no entanto um importante parceiro político, enquanto a UEMOA beneficia a Guiné-Bissau com um Banco Central forte, que governa a inflação e as políticas de câmbio, mas também promove regras orçamentais comuns que fortalecem as finanças públicas. 59 As estimativas indicam que a cooperação regional aumenta o emprego e a produtividade do trabalho entre os membros da CEDEAO a vários níveis (Von Euxell 2013) e providencia segurança alimentar para as populações rurais (Afrika e Ajumbo 2012). 60 Andriamananjara e Schiff 2000; Verdier 2012. 126 5.18 As exportações e importações intra- Figura 60: O comércio intra-regional é reduzido na regionais na CEDEAO correspondem a CEDEAO menos de 20 por cento do total do comércio (quota de comércio como percentagem do total do (Figura 60). Isto significa que os membros da comércio da CEDEAO) CEDEAO têm mais actividade comercial com 100 países fora do grupo regional do que com aqueles dentro dele. O acordo para uma tarifa 90 externa comum (CET) para os membros da 80 CEDEAO foi oficializado em 2013 na 70 sequência de negociações com a UE no âmbito do Acordo de Parceria Económica 60 Exportações Importações (APE), que pode encorajar o comércio intra- 50 regional. No entanto, as barreiras não tarifárias 40 (checkpoints nas estradas, corrupção nos oficiais aduaneiros) continuam a afectar o 30 comércio. Adicionalmente, a infra-estrutura 20 precária e a fraca capacidade institucional 10 permanecem constrangimentos que afectam a facilitação do comércio na CEDEAO. O 0 estudo sobre o impacto da infra-estrutura ECOWAS Trade with ECOWAS Trade with ECOWAS Trade World Africa within Group rodoviária regional na CEDEAO revela que a melhoria das estradas só por si tem o potencial Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. de aumentar o comércio intra-regional em 5,3 por cento relativamente à taxa de 2012.61 5.19 As exportações da Guiné-Bissau para a CEDEAO estão entre as mais baixas do grupo regional, correspondendo a menos de 1 por cento da quota total das exportações do país. A quota de exportações da Guiné-Bissau para a CEDEAO situava-se em 0,1 por cento em 2001, 2003 e novamente em 2007. Comparado com o país mais pequeno na Comunidade do Leste de África, cuja quota de exportações para região é de cerca de 15 por cento, este valor é reduzido. A maioria das exportações da Guiné-Bissau para a CEDEAO destina-se à Nigéria, que assume cerca de 27 por cento do total de exportações para a CEDEAO e Togo (cerca de 6 por cento). A Guiné-Bissau exporta peixe para a Costa do Marfim, Gana, e Nigéria; vegetais e bebidas não alcoólicas para a Gâmbia, reexporta bens manufacturados para o Mali; e envia arroz para o Senegal. Em 2011, o Togo correspondeu a cerca de 2,5 por cento do total das exportações da Guiné-Bissau, enquanto a Costa do Marfim, Gâmbia, Cabo Verde, Nigéria, e Gana correspondem a menos de 1 por cento das suas exportações para a CEDEAO. A Europa é a principal fonte das importações da Guiné-Bissau e a Índia é o principal importador de bens da Guiné-Bissau (quase exclusivamente caju) seguida pelo Vietname e China. 5.20 A CEDEAO tem no entanto um potencial considerável para a Guiné-Bissau, tanto no plano económico como político. Além do potencial largamente inexplorado para o IDE e comércio regionais - com benefícios imediatos para o crescimento através de exportações, mas também através do aumento da produtividade através da concorrência e adaptação da tecnologia - a CEDEAO é um importante parceiro político nas áreas da segurança e governação. Adicionalmente, através da parceria com os vizinhos, e também através das políticas regionais na infra-estrutura, agricultura, e outras áreas, a Guiné-Bissau pode alavancar recursos com rendimentos crescentes à escala e colher efeitos regionais positivos. 61 Akpan, U., (2013) ‘Impact of Regional Road Infrastructure Improvement on Int ra-Regional Trade in ECOWAS’, Working Paper, Banco Africano de Desenvolvimento 127 a) Segurança e Governação 5.21 A CEDEAO pode desempenhar um papel importante na estabilização, governação e construção de instituições. Embora a CEDEAO tenha sido estabelecida com o objectivo de fomentar a integração económica entre os seus membros, o papel da organização tem evoluído para a promoção da governação, paz, e redução das ameaças de instabilidade política entre os seus estados membros. As alterações foram motivadas pelo papel que a CEDEAO desempenhou na manutenção da paz e estabilidade durante as guerras civis de longa duração na Libéria e Serra Leoa. No seguimento da adopção do Mecanismo para a Prevenção, Gestão e Resolução do Conflito, Manutenção da Paz e Segurança pelos Estados Membros em 1999, o mandato da CEDEAO ampliou para incluir prevenção, gestão e resolução de conflitos; manutenção da paz e segurança; apoio humanitário; construção da paz; controlo do crime transfronteiriço; e combate à proliferação de pequenas armas. 62 Reconhecendo que a integração económica só pode ser alcançada na presença de paz, segurança e estabilidade política, tornou-se crucial para a CEDEAO a assistência aos Estados Membros na prevenção, preparação e resposta mais célere e melhor a assuntos que possam desafiar a segurança e estabilidade. 5.22 A Guiné-Bissau beneficiou da presença da CEDEAO na organização de diálogos, mediação, missões militares, e assistência com a organização das eleições. A organização tem sido vocal em encorajar os Estados Membros a abraçar valores democráticos e a protecção dos direitos dos cidadãos. Na sequência do golpe militar de 2012, a CEDEAO, em conjunto com outras organizações internacionais, providenciou liderança na reunião e mediação entre os diferentes stakeholders chave no Governo da Guiné-Bissau para terminar o impasse que se verificava. A CEDEAO providenciou assistência técnica na implementação do programa de Reforma do Sector da Segurança (SSR), que incluiu planos para reestruturar as Forças Armadas. Financeiramente, a CEDEAO comprometeu-se com cerca de US$ 60 milhões para a reforma do sector militar, incluindo US$ 2 milhões em fundos de pensão para membros reformados do exército antes do golpe militar que estagnou a adopção do programa SSR. Em 2009, a organização tornou possível o pagamento de atrasos de salários aos membros do exército com um donativo de US$ 3,5 milhões. Em 2014, a CEDEAO renovou os seus esforços no apoio ao recém-eleito Governo da Guiné-Bissau na área da reforma do Exército. 5.23 Talvez o maior benefício que a Guiné-Bissau colheu com a sua participação na CEDEAO em termos de segurança e governação tem sido o papel da Missão da CEDEAO na Guiné-Bissau (ECOMIB) na estabilização do país. Na sequência da retirada da Missão de Segurança de Angola em 2012, a ECOMIB colocou cerca de 630 soldados e oficiais de polícia para gerir a paz, segurança e apoiar no processo de transição, incluindo a supervisão das recentes eleições. O mandato da ECOMIB foi estendido e uma missão de observadores com 120 membros foi deslocada para monitorizar as eleições de 2014 e a correspondente segunda volta, enquanto um contingente militar patrulhava os subúrbios vulneráveis e centros de votação. 62 Theirry Verdier, Regional Integration, Fragility and Institution Building: An Analytical Framework Applied to the African Context, (European Report on Development, 2010). 128 b) Políticas de Agrupamento 5.24 As políticas de agrupamento são uma das formas mais próximas de parceria. A infra- estrutura é uma área onde a Guiné-Bissau pode beneficiar da cooperação regional. A infra- estrutura regional na CEDEAO tem o objectivo de desenvolver e promover a integração regional, apoiar o crescimento, e estabelecer um ambiente competitivo de comércio. O sector de infra- estrutura regional na sub-região da CEDEAO tem uma série de problemas relacionados com o financiamento inadequado para o investimento no desenvolvimento das mesmas. A incapacidade dos Governos de providenciarem um orçamento para melhoria das infra-estruturas ou envolver o sector privado em PPPs que possam assumir o desenvolvimento de infra-estruturas na CEDEAO constrange o crescimento do sector, em conjunto com o planeamento e políticas fracas, e quadros institucionais, legais e regulatórios descoordenados que desencorajam o IDE. As estimativas sugerem que os membros da CEDEAO necessitariam de gastar apenas 1 por cento do seu PIB para melhorar a infra-estrutura regional, embora os países mais pequenos (incluindo a Gâmbia, Guiné- Bissau e Libéria) necessitariam de investir cerca de 5 por cento do seu PIB (cerca de US$ 20-30 milhões anualmente) para conseguir trazer a sua infra-estrutura a um nível semelhante à média.63 5.25 O comércio ao longo de grandes corredores e através de hubs na CEDEAO depende fortemente das redes rodoviárias. Apesar do facto de que 73 por cento das redes rodoviárias na CEDEAO estão em condição boa ou aceitável quando comparadas com outros grupos económicos regionais de África,64 as redes rodoviárias são desequilibradas entre países e variam em termos de manutenção e qualidade. A ausência de uma rede ferroviária regional, um sistema de transporte aéreo mal desenvolvido, e a escassez de outras alternativas de transporte na região aumentam o custo de transportar bens através das redes rodoviárias. Adicionalmente, as barreiras não tarifárias, incluindo os numerosos checkpoints aleatórios, os subornos recebidos pelos oficiais aduaneiros, e a falta de harmonização de procedimentos para bens e passageiros entre países, assim como ligações em falta ou pouco desenvolvidas ao longo das grandes redes de infra-estrutura, aumentam ainda mais os custos de transporte. 5.26 Apesar destes desafios, os desenvolvimentos recentes revelam o potencial para o crescimento da infra-estrutura na CEDEAO, com tremendos ganhos para a Guiné-Bissau em termos de energia, estradas, e outros sectores regionais de infra-estruturas. As melhorias nas infra-estruturas tiveram um impacto estimado no crescimento do CEDEAO na ordem de um ponto percentual per capita por ano no período entre 1995-2005, principalmente devido ao crescimento do sector TIC.65 Foram lançados dois projectos de cooperação na área de energia pela CEDEAO para fornecer energia, fiável, sustentável e com menores custos para os seus membros. A distribuição actual de recursos energéticos dentro da CEDEAO é reduzida e desequilibrada, com uma escassez severa em alguns países membros devido à subexploração dos recursos para financiar energia. O sector de energia actualmente responde apenas a 30 por cento da procura a atinge cerca de 50 por cento da população. O projecto WAPP tem o potencial de integrar os sistemas nacionais de electricidade dos Estados Membros da CEDEAO sob um mercado regional de electricidade unificado ao encorajar o comércio de energia entre os Estados Membros, enquanto o Pipeline de Gás da África Ocidental (WAGP) deverá providenciar energia barata e limpa para o desenvolvimento industrial. 63 Ranganathan e Foster; ECOWAS’s Infrastructure; A Regional Perspective . World Bank Working Paper (2011). 64 Cerca de 73 por cento das estradas na CEDEAO são consideradas desenvolvidas. 65 Ranganathan e Foster; ECOWAS’s Infrastructure; A Regional Perspective. World Bank Working Paper (2011). 129 5.27 A Guiné-Bissau poderá beneficiar da importação de energia e gás natural para responder à procura doméstica se o WAPP for implementado com sucesso. As estimativas sugerem que a Guiné-Bissau poderia reduzir os custos de energia entre 11 a 44 por cento e poderia poupar uma soma equivalente a 1 por cento do PIB em energia. O país poderia tornar-se um importador de energia, importando mais de 80 por cento da sua energia para cobrir a procura doméstica.66 A Guiné-Bissau já é um dos primeiros países na região CEDEAO a beneficiar do programa regional de emergência de energia lançado em 2010, que providencia donativos aos países da CEDEAO para permitir que efectuem melhorias significativas na produção e oferta de energia. Estão em curso planos para expandir o WAPP à Guiné-Bissau além da Costa do Marfim, Libéria, Serra Leoa, Guiné, Gâmbia, Senegal, Níger, Burkina Faso e Mali. 5.28 Têm sido identificados ganhos adicionais que a Guiné-Bissau pode colher da sua participação na CEDEAO, especificamente na área de transporte aéreo doméstico, que se encontra pouco desenvolvido apesar de ser um sector de transporte relativamente liberalizado. As estimativas sugerem que a conectividade internacional na CEDEAO é aceitável, mas o mercado aéreo doméstico para os países da CEDEAO, que inclui ligações pouco frequentes aos hubs regionais, não encoraja o livre movimento de bens e serviços. A liberalização do sector, encorajada pela Declaração de Yamoussoukro,67tem sido implementada em pleno na CEDEAO. A declaração apoia a liberalização dos serviços de transporte aéreo intra-africanos em termos de acesso, capacidade, frequência, e tarifas para aumentar o comércio regional e intercontinental. Como resultado da liberalização, ASKY, uma nova companhia aérea privada estabelecida por investidores da África Ocidental e baseados no Togo, está agora a servir a maioria das cidades na África Ocidental, incluindo Bissau. Adicionalmente, algumas das principais companhias do Leste de África, incluindo a Kenya Airways ou Ethiopian Airlines, começaram a estabelecer a sua presença na África Ocidental. A cooperação regional pode ajudar a desenvolver o sector dos transportes na CEDEAO e melhorar os standards, segurança, e supervisão, se os membros agregarem os seus recursos. 5.29 Por fim, a Política de Agricultura da CEDEAO (ECOWAP) foi estabelecida para responder aos constrangimentos que a agricultura enfrenta e para promover as exportações e a segurança alimentar na região. O objecto é complementar e coordenar todas as estratégias e iniciativas de desenvolvimento regional que apontam a aumentar a produção de alimentos, para que os sistemas de produção sejam modernizados, os rendimentos das famílias sejam melhorados, a dependência alimentar dos Estados Membros seja reduzida, e a região como um todo consiga alcançar a segurança alimentar. A Caixa 9 descreve a importância da produção de arroz sob a ECOWAP para a Guiné-Bissau. 66 Ibid., p. 47-49. 67 Cerca de 44 países africanos comprometeram-se, em 1999,a desregular os serviços aéreos e promover mercados aéreos regionais abertos concorrência transnacional. 130 Caixa 9: Guiné-Bissau: Ganhos Potenciais da Política Agrícola (ECOWAP) no Suplemento às Importações de Arroz Dependência e Procura Crescente por Arroz na Guiné-Bissau As importações de arroz para a CEDEAO foram estimadas em cerca de 39 por cento das importações de alimentos em 2010. O total de importações em 2009 foi estimado em 5,2 milhões de toneladas. Aumentaram ligeiramente para cerca de 7 milhões de toneladas em 2010. Em 2011, as importações de arroz para toda a CEDEAO atingiram uns impressionantes US$ 3,6 mil milhões. Conforme o capítulo 9 explica, o arroz na Guiné-Bissau é também maioritariamente importado - embora o país tenha uma vantagem comparativa na produção de arroz. Papel e Potencial da ECOWAP O mercado de arroz na CEDEAO tem provado ser bastante integrado. O arroz regional é fornecido principalmente através do porto de Dakar, por onde passa cerca de 70 por cento do arroz importado. O arroz importado da Ásia e América do Sul é também encaminhado através dos mesmos canais, embora os constrangimentos de produção e marketing afectem o movimento de bens entre as fronteiras. Têm sido focadas três áreas de intervenção para aumentar a produção de arroz sob a ECOWAP: 1 Intensificar a produção: a produção de arroz na CEDEAO tem aumentado significativamente ao longo dos últimos 10 anos, particularmente em 2008 e 2010. A oferta regional aumentou em 30 por cento entre 2008 e 2009, devido aos esforços de países individuais para aumentar a produção e às boas condições climatéricas nas regiões do Sahel. O Burkina Faso, Mali, Senegal e Costa do Marfim registaram conjuntamente um aumento de 25 por cento na produção de arroz nos anos 2012/2013. 2 Aumentar o valor da produção de arroz, incluindo (i) desenvolver diferentes cadeias de valor para as exportações; (ii) desenvolver o processamento do produto; (iii) fortalecer os serviços de apoio providenciados pelos operadores, e (iv) promover o comércio nacional, regional e internacional. 3 Promover um ambiente favorável para o produto arroz, incluindo o seguimento dos efeitos da união aduaneira no mercado regional, e o desempenho de um papel de advocacia junto dos países para que removam os obstáculos técnicos ao movimento do arroz. 4 Coordenar as políticas ligadas ao arroz entre os Estados Membros da CEDEAO. O aumento da produção agrícola é apenas um passo no aumento do comércio no interior da CEDEAO. Um aumento de 10 por cento na produção agrícola, por exemplo, leva a um aumento de cerca de 72 por cento nas exportações agrícolas entre os Estados Membros da CEDEAO. No entanto, o ambiente regulatório fraco, causado por instituições sem capacidade e infra-estruturas de comércio precárias, afecta o comércio entre os Estados Membros da CEDEAO. A experiência sugere que as políticas para melhorar as condições para o comércio podem aumentar a produção agrícola e aumentar as exportações agrícolas para os membros da sub- região da CEDEAO. A infra-estrutura de serviços, em particular a expansão da cobertura de telefones móveis para 100 por cento, teria um impacto estimado de 4 por cento no aumento das exportações de produtos agrícolas na CEDEAO. De forma similar, a redução no número de dias necessários para processar documentos para exportação em 100 por cento poderia levar a um aumento de 7 por cento nas exportações de produtos agrícolas. O potencial do ECOWAP para a Guiné-Bissau, com uma vantagem comparativa no arroz, é considerável. Fontes: Comissão CEDEAO (2010); Olayiwola e Ola-David (2013); ICTSD.org. 131 4. ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL 5.30 As Organizações da Sociedade Civil (OSCs) são importantes para as necessidades de curto prazo dos Estados frágeis. No longo prazo, as OSCs são também importantes para o desenvolvimento da capacidade em Estados frágeis. Estas organizações são formadas com base num conjunto amplo de valores e interesses, e frequentemente juntam trabalhadores estrangeiros e domésticos. As suas actividades em Estados frágeis gravitam em torno da provisão de serviços públicos e ajuda humanitária em áreas onde o Estado falha ou não se encontra apto a implementar a sua agenda de políticas de forma eficaz devido à fraca infra-estrutura e sistemas. Estas organizações podem ser promotoras e facilitadoras do debate de políticas que conduz a bons processos de governação ao reduzir a tensão entre grupos sociais, económicos e políticos. Elas têm também um papel no fortalecimento da responsabilização doméstica do Estado ao servir como um contrapeso ao Governo. 5.31 As OSCs têm uma presença ampla na Guiné-Bissau, complementando diversas vezes a actividade dos doadores. A ajuda providenciada por organizações voluntárias privadas envolve as actividades de grupos religiosos, organizações de caridade, fundações, ou companhias e indivíduos privados. Os dados sobre a contribuição de grupos da sociedade civil na Guiné-Bissau são limitados; no entanto, as organizações não-governamentais locais e internacionais registam uma forte presença nos sectores sociais onde os serviços governamentais não existem. As evidências sugerem que as ONGs em países em desenvolvimento tendem a complementar a assistência ao desenvolvimento e trabalhar em áreas onde os doadores bilaterais são mais activos, ao assistir por exemplo na provisão de serviços básicos para pequenos grupos da população num horizonte de curto prazo.68 As ONGs são frequentemente mais activas no sector das microfinanças (ver também o capítulo 3), e no apoio aos empreendedores locais. 5.32 As OSC na Guiné-Bissau foram oficialmente reconhecidas pelas Leis governamentais em 1992, e tiveram uma forte presença durante as crises políticas de 1998-1999. As suas actividades focam-se principalmente na saúde, educação, actividades produtivas, protecção de grupos vulneráveis, e advocacia. As suas categorias incluem: ONGs estabelecidas por doadores externos, que providenciam serviços básicos principalmente em saúde e educação nas áreas rurais; Organizações Baseadas na Comunidade (CBOs) fundadas pelas comunidades para responder às suas necessidades sociais; e organizações religiosas, que consistem de igrejas e instituições Islâmicas, que têm uma presença ampla nos sectores de educação e saúde onde as actividades das CBOs são reduzidas, e que podem desempenhar um papel activo na reconciliação e manutenção da paz. 69 Outras apoiam as instituições democráticas, imprensa independente, e governação. Mais recentemente, algumas empreenderam esforços para mitigar o fluxo de drogas ilícitas na Guiné- Bissau. 5.33 As ONGs em particular têm sido conhecidas por associarem-se a instituições multilaterais e a outros doadores para providenciarem serviços na Guiné-Bissau. As ONGs nacionais foram por exemplo recrutadas e formadas pelo Programa Alimentar Mundial (WFP) com base no seu conhecimento do contexto local, para distribuir alimentos e monitorizar as actividades dos seus projectos, incluindo o programa de alimentação escolar e os programas de alimentos por trabalho. 70 As ONGs foram também envolvidas na implementação, colecta de 68 R. J. Utz, Will Countries that Receive Insufficient Aid Please Stand Up. CFP Working Paper Series No. 7. (Banco Mundial, 2011). 69 Ver: Engaging Civil Society Organizations in Conflict-Affected and Fragile States: Three African Country Case Studies (Washington, DC: Banco Mundial. 2005). 70 Banco Mundial, Guinea-Bissau - Emergency Food Security Response Project. (Washington DC: Grupo Banco Mundial, 2014). 132 dados, e monitorização do programa, e a formação oferecida pelas organizações internacionais providenciou oportunidades para estas organizações melhorarem a sua capacidade de fornecerem serviços. Num projecto actualmente em curso financiado pelo Banco Mundial, as ONGs estão a apoiar as comunidades rurais na implementação de acções de desenvolvimento liderado pela comunidade (CDDs). 5.34 As Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau são confrontadas com desafios relacionados com o apoio financeiro, constrangimentos de capacidade, e a falta de harmonização das suas actividades. O apoio financeiro às OSCs provém principalmente dos doadores internacionais, parceiros locais, e algumas actividades remuneradas que são de curto prazo, esporádicas e insustentáveis. Adicionalmente, não têm a capacidade técnica para implementar as suas actividades de apoio ao desenvolvimento, o que mina o seu impacto institucional, uma vez que não podem empregar quadros técnicos ou procurar formação especializada. As suas actividades tendem também a ser duplicadas com outras organizações e grupos similares, e permanecem descoordenadas devido a mecanismos fracos de coordenação, o que justificaria parcerias entre e com outros grupos. 5.35 Pode argumentar-se a favor de envolver as OSCs de forma mais eficiente na Guiné- Bissau tendo em conta o papel central que estas organizações desempenham no processo de reforma. Estas organizações fazem contribuições significativas no fornecimento de serviços, promoção dos direitos humanos em grupos vulneráveis, e promoção da responsabilização do Governo. Na ausência de instituições fortes e à luz da dependência das OSCs na Guiné-Bissau, é importante que os doadores trabalhem de forma próxima na mobilização de recursos, de natureza técnica e financeira, para fortalecer a capacidade das OSCs para que estas consigam planear a implementar as suas actividades de forma mais efectiva. É também importante que as redes de OSCs na Guiné-Bissau fortaleçam a sua capacidade de gerir fundos de doadores e garantam a sua responsabilidade vis-à-vis as comunidades que servem. 133 CAPÍTULO 6: REMESSAS E PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL 1. INTRODUÇÃO 6.1 As transferências monetárias privadas e públicas podem fazer uma contribuição vital para a redução da pobreza e crescimento económico. Por um lado, as remessas são transferências monetárias privadas da Diáspora para os familiares no país de origem. Tendem a chegar a famílias que têm frequentemente um nível de educação mais elevado e são por isso menos pobres, o que permitiu desde logo que alguns dos seus membros pudessem emigrar. As remessas são também frequentemente limitadas pela infra-estrutura financeira que liga a Diáspora aos receptores. Este facto coloca mais uma vez as famílias mais pobres em desvantagem uma vez que tendem a ter um acesso mais limitado a intermediários financeiros. Os programas de assistência social, por outro lado, são concebidos para se focar nos mais pobres e vulneráveis. Existem diferentes tipos de assistência social ou programas de rede de segurança social (SSN), que passam desde transferências monetárias e não monetárias, até transferências de bens alimentares, programas de dinheiro por trabalho (obras pública intensivas em termos de trabalho), ou isenção de taxas. A assistência social ou programas de SSN aplicam por vezes algumas condições em termos de comportamentos das famílias, por vezes relacionados com investimentos em nutrição, saúde, educação, formação, ou participação em actividades específicas. As remessas e os programas de assistência social podem harmonizar as flutuações em termos de consumo e ajudar a reduzir a pobreza, em simultâneo com a promoção de investimentos no capital humano, assim como actividades empreendedoras de natureza agrícola ou outras. 6.2 As remessas e os programas de assistência social têm um potencial considerável de desenvolvimento para a Guiné-Bissau. A Parte I deste capítulo irá focar-se nas remessas e demonstra como é que estas podem contribuir para reduzir a pobreza e harmonizar o consumo em simultâneo com a possibilidade de encorajar investimentos e crescimento liderado pelo sector privado. A promoção de um ambiente que reduza os custos das transferências da Diáspora e outras medidas para encorajar os fluxos de remessas pode provavelmente render ganhos significativos para as famílias e empreendedores da Guiné-Bissau. A Parte II do capítulo irá focar-se nos programas de assistência social. O principal papel para tais programas na Guiné-Bissau, conforme o capítulo 4 argumenta, é responder às necessidades imediatas de redução da pobreza e contribuir para o capital humano e produtivo dos pobres e vulneráveis. No entanto, como a Parte II deste capítulo irá demonstrar, os programas de assistência social podem também contribuir para ganhos modestos de rendimento no plano local. 6.3 As remessas e os programas de assistência social podem também contribuir em alguns aspectos para o objectivo mais amplo de desenvolvimento do mercado financeiro. Isto é especialmente verdade para países onde a informalidade é elevada, uma vez que os canais formais para o empreendedorismo e finanças são limitados na Guiné-Bissau. O investimento de capital de risco através de remessas aproveita as ligações familiares entre a Diáspora e as contrapartes locais, onde a confiança substitui um ambiente legal forte que poderia alternativamente governar a aplicação de contratos. No entanto, as remessas requerem um sistema funcional e eficiente em termos de custos que permita as transferências financeiras. O fortalecimento dos serviços financeiros, através de bancos ou Organizações de Transferências Monetárias (OTMs), poderia encorajar os fluxos de remessas. A implementação de programas de assistência social pode também encorajar as instituições financeiras a desenvolver as suas redes ou pontos de pagamento e de serviços, o que poderia beneficiar a população de forma mais geral para outros tipos de transacções. 134 PARTE I: REMESSAS 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO 6.4 As remessas de migrantes podem desempenhar um papel substancial na promoção do desenvolvimento económico e redução da pobreza na Guiné-Bissau. O total das remessas mundial triplicou de aproximadamente US$ 120 mil milhões em 2002 para aproximadamente US$ 400 mil milhões em 2012, com mais de 75 por cento a terem como destino os países em desenvolvimento. Na Guiné-Bissau, as remessas triplicaram de aproximadamente US$ 17 milhões em 2002 para cerca de US$ 50 milhões em 2012. As remessas representam o mais amplo influxo de capital privado para a Guiné-Bissau, excedendo o valor do Investimento Directo Estrangeiro em dólares norte-americanos. 71 As remessas são superadas apenas pela APD à Guiné-Bissau. Adicionalmente, as remessas vêm demonstrado uma tendência estável de crescimento, com menor flutuação associada aos choques económicos locais ou internacionais. Assim, as remessas são fluxos de capital privado substanciais, robustos e em crescendo que a Guiné-Bissau pode explorar para o desenvolvimento económico e redução da pobreza. O uso primordial das remessas é para consumo das famílias e existem provas consideráveis que as remessas são essenciais para harmonizar os choques de consumo.72 Existem também provas de que as remessas providenciam um apoio que pode fortalecer a estabilidade no pós-conflito e em Estados frágeis, o que é particularmente relevante para a Guiné-Bissau. 73 No entanto as remessas podem também desempenhar um papel importante e de liderança no financiamento e criação de novas empresas, particularmente em países com constrangimentos severos de capital e uma economia informal substancial, conforme este capítulo irá demonstrar. 6.5 Na década de 2000, a população migrante mundial triplicou, de aproximadamente 70 milhões para 200 milhões. Se os migrantes constituíssem um país seria o quinto maior do mundo. 74 Uma percentagem crescente deste crescimento tem sido na migração Sul-Sul, i.e., migração entre países em desenvolvimento. 75 As populações de migração dos países em desenvolvimento - Diásporas - variam em dimensão absoluta e relativa em relação à população do país de origem. A Mongólia tem apenas alguns milhares de migrantes, que correspondem a menos de 1 por cento da sua população total, ao invés de que os migrantes do México excedem os 10 milhões, ou cerca de 8 por cento da população. Os migrantes da Moldávia são apenas 1,2 milhões mas correspondem a mais de 35 por cento da população total. O Banco Mundial estima um número de cerca de 111.374 migrantes da Guiné-Bissau em 2010, ou cerca de 7 por cento da população do país. 6.6 A migração de Guineenses é particularmente forte durante período de disrupções económicas e políticas. Historicamente, os padrões de migração internacional na Guiné-Bissau 71 Ver Figura 58 no Capítulo 5. 72 E.g. Bettin, G., A.F. Presbitero, e N. Spatafora. 2014. Remittances and Vulnerability in Developing Countries. IMF Working Paper WP14/13 William, J. e S. Tavneet. 2014. Risk Sharing and Transaction Costs: Evidence from Kenya’s Mobile Money Revolution. The American Economic Review, 104:1: 183 - 223. 73 Universidade de Boston. 2013. Remittance Flows to Post-Conflict States: Perspectives on Human Security and Development. Universidade de Boston. 74 Vaaler, P. 2011. Immigrant Remittances and the Venture Investment Environment of Developing Countries. Journal of International Business Studies, 42: 1121-1149. 75 Banco Mundial, 2013a. Migration and Development Brief 19. 19 de Abril. Washington, DC, Banco Mundial. Banco Mundial, 2013b. Migration and Development Brief 21. 3 de Outubro. Washington, DC, Banco Mundial. 135 antes da independência ocorreram principalmente entre a Guiné-Bissau e o Senegal; e envolveram a migração temporária de trabalhadores não qualificados para o Sul do Senegal para trabalhar em agricultura, incluindo plantações de amendoim, extracção de borracha - e emprego doméstico temporário.76 Estes grupos de trabalhadores, principalmente do grupo étnico Manjaco conseguiram depois emprego nos navios mercantes e emigrar para a França para trabalhar nos sectores industriais e de manufactura.77 A luta pela Independência, liderada pelo PAIGC, alimentou ainda mais a migração para o Senegal e também para a Guiné-Conacri, onde a sede do PAIGC se situava.78 6.7 Com início em meados da década de 70 no período pós-independência, os padrões de migração começaram a aumentar em direcção a Portugal. A migração para Portugal foi facilitada por controlos regulatórios menos restritivos e devido à forte procura por trabalhadores não qualificados para obras de construção civil, como resultado da entrada de Portugal na UE e ao apertar da política migratória para a França.79Os migrantes da Guiné-Bissau eram constituídos principalmente por jovens do género masculino sem qualificações que trabalhavam no sector da construção. Uma vaga adicional de migração a partir da Guiné-Bissau naquela época envolveu estudantes que emigraram para a Rússia, Alemanha, Portugal, Brasil e Cuba como parte dos acordos bilaterais entre o Governo da Guiné-Bissau e estes países. A partir da Guerra Civil de 1998-99, diversos cidadãos da Guiné-Bissau, principalmente os mais abastados que viviam na capital Bissau, e que tinham recursos para sair do país, partiram para Portugal. Este grupo incluiu migrantes qualificados incluindo médicos e engenheiros. 6.8 Embora nem toda a migração seja Figura 61: Na África Ocidental, a Guiné-Bissau e Cabo Verde sentiram a maior emigração para fora. qualificada, o país sente uma fuga (migração líquida em milhares, média de três vagas entre considerável de cérebros. Isto é 2002-2012) parcialmente compensado por remessas. Em 40 2012, cerca de 10.000 Guineenses deixaram o país. A migração inclui trabalhadores 30 qualificados mas também aqueles com 20 competências elevadas. De acordo o livro de factos do Banco Mundial sobre Migrações e 10 Remessas, entre a população com educação 0 terciária, a migração da Guiné-Bissau é estimada em 24,4 por cento, com 71 por cento -10 dos médicos e 25 por cento das enfermeiras a -20 saírem do país. A Guiné-Bissau sente então uma fuga considerável de cérebros. De acordo -30 com standards regionais, a emigração líquida a -40 SSA BFA GIN GMB CIV GHA CPV BEN NER SLE TGO MLI LBR SEN GNB partir da Guiné-Bissau é apenas excedida por Cabo Verde (Figura 61). Embora a migração Fonte: WDI e cálculos do staff do Banco Mundial. de trabalho qualificado constitua uma perda considerável para a economia, os migrantes nacionais da Guiné-Bissau transferem parte dos 76 Gable, E. 2000. The Culture Development Club: Youth, Neo-Tradition, and the Construction of the Society in Guinbea-Bissau. Anthropological Quarterly 73:4: 195-203; Joao, M. 2003. Origem Étnica e Migração entre os Mancaha da Guiné-Bissau. Sodonda – Revista de Estudos Guineenses, 6: 107-120. 77 Organização Internacional para a Migração. 2013. Avaliação do Potencial de Desenvolvimento da Diáspora da Guiné-Bissau em Portugal e França. Organização Internacional para a Migração. 78 Abreu, A. 2012. Mobilidade e Migrações na Guiné-Bissau: Dinâmicas Históricas e Determinantes Estruturais. Revista Internacional em Língua Portuguesa, 24: 145-161. 79 Ibid. 136 salários elevados que recebem no estrangeiro para as suas famílias em casa. As remessas da Guiné-Bissau são mais substanciais com origem em Portugal, Senegal, Gâmbia e França, que correspondem ao grosso da Diáspora da Guiné-Bissau (Figura 62 e Figura 63). Numa base por migrante, as remessas são mais elevadas a partir de países Europeus, especialmente França, Espanha e Portugal, reflectindo o maior potencial de receitas nestes países. 6.9 As remessas da Guiné-Bissau em relação ao PIB são mais elevadas do que a médias dos países em desenvolvimento da África Subsaariana. Embora a Guiné-Bissau tenha uma população migrante mais reduzida do que, por exemplo, a vizinha Guiné-Conacri, as remessas da Diáspora da Guiné-Bissau contribuem mais para o PIB: 5,4 por cento versus menos de 1 por cento para a Guiné-Conacri. No entanto, outros países na região têm rácios de remessas em relação ao PIB ainda mais elevados, incluindo a Gâmbia, Senegal ou Mali. A redução dos custos de transmissão das remessas pode ajudar a Guiné-Bissau a colher fluxos de remessas ainda mais substanciais. Figura 62: Os principais destinos dos migrantes da Figura 63: Os migrantes da Europa enviam o Guiné-Bissau são Portugal, Senegal e Gâmbia. maior volume de remessas em termos relativos. (estimativas para os Guineenses em determinados países, em (remessas em milhões de US$, LHS, e remessas em milhares) US$ per migrante, RHS) 35 18 700 30 16 Remessas por 600 14 migrante (RHS) 25 500 12 20 10 Remessas 400 (LHS) 15 8 300 6 10 200 4 5 100 2 0 0 0 Portugal Senegal Nigéria Guiné-Conacri França Gâmbia Espanha Outro Norte Portugal Outro Sul Senegal Mauritânia Guiné-Conacri Cabo Verde Nigéria Gâmbia França Espanha Fonte: World Bank Migration and Remittances Factbook. Fonte: World Bank Migration and Remittances Factbook 2011 and World Bank Remittance Database, 2013. Nota: As estimativas para remessas de migrantes são apenas aproximações. 6.10 A mistura de canais de remessas existentes em países com mais fluxos de remessas que rodeiam a Guiné-Bissau favorecem canais menos onerosos, e efectivos por via electrónica. Os canais para remessas incluem transferências bancárias mas também Organizações de Transferências Monetárias (OTMs). As transferências tradicionais físicas de migrantes para receptores locais ainda são o canal mais simples, mas são também onerosas e consomem bastante tempo, limitando assim o potencial de crescimento. As transferências com base em serviços postais e de correio privado são fiáveis mas no entanto onerosas tendo em conta o baixo valor dólar de cada transferência. Um terceiro canal de distribuição de remessas utiliza redes de agências hawala, familiar a países com populações muçulmanas substanciais.80 Os remetentes de remessas 80 Qorchi, M. Munzele-Maimbo, S., & Wilson, J. 2003. Internal Funds Transfer Systems: An Analysis of the Informal Hawala System. IMF Occasional Paper 222. Washington, DC: Fundo Monetário Internacional. 137 no estrangeiro contactam com um agente hawala e transferem o valor monetário. O agente do remetente irá então entrar em contacto com outro agente da rede no país receptor e instruir para que esse agente realize a transferência monetária, subtraída da taxa. O remetente e o recipiente liquidam as suas contas numa data posterior. Os canais de remessas baseados na Hawala são substanciais em África, particularmente no Norte e Leste do continente, assim como também no Médio Oriente e Sudeste Asiático. Estes canais de remessas tradicionais continuam a ser importantes na década de 2000. Em muitos países africanos, ainda aportam a maioria dos fundos de remessas,81 embora as taxas para usar estes canais tendam a ser onerosas, atingindo por vezes 20 por cento do total de remessas na África Subsaariana.82 6.11 A década de 2000 assistiu à ascensão de canais comerciais mais escaláveis que exploram tecnologias electrónicas, frequentemente mais móveis; o Governo da Guiné-Bissau pode e deve encorajar o seu crescimento. Outros canais adicionais prometem custos mais reduzidos, mais facilidades nas transacções, e mais escalabilidade, todos os quais devem aumentar as remessas para países como a Guiné-Bissau. Estes novos canais são também mais fáceis de observar e regular para efeitos de supervisão. No entanto, cada novo canal de distribuição apresenta desafios tecnológicos e de política que devem ser enfrentados no curto prazo. 6.12 Um recente e importante desenvolvimento nos canais de remessas em África durante a década de 2000 são as denominadas tecnologias de “remessas móveis”. Os remetentes no estrangeiro utilizam a tecnologia de telefones móveis para transferir somas monetárias via mensagens de texto. Os remetentes no estrangeiro enviam um crédito via mensagem de texto através operadora local de telemóvel, que depois transfere este crédito a uma instituição financeira no país receptor e subsequentemente para o telefone móvel do receptor via mensagem de texto. Este novo canal de remessas promete transferências de reduzido custo, facilmente escaláveis, e efectuadas em minutos. Muitos países em África estão agora a explorar estas tecnologias de remessas móveis e colher os seus benefícios. Os países do Leste Africano, tais como Quénia e Uganda, estão a liderar esta tendência, mas outros países como a Nigéria ou o Congo estão também a adoptar estas tecnologias. O seu sucesso depende da ubiquidade de três factores no país receptor: 1) operadoras de telemóvel; 2) disponibilidade de crédito doméstico para o sector privado; e 3) acesso directo ou indirecto a serviços de contas bancárias. No Quénia, por exemplo, a penetração de telefones móveis, acesso local ao crédito, e acesso directo a serviços de conta bancária são elevados, uma vez que mais de 70 por cento dos adultos Quenianos têm uma conta bancária.83 6.13 Dos três factores necessários para o crescimento nos canais de remessas móveis, a Guiné-Bissau está a efectuar progresso na cobertura de telefones móveis mas a debilidade do sector privado permanece um constrangimento. A cobertura de telefones móveis tem aumentado rapidamente na Guiné-Bissau conforme demonstrado no capítulo 2. A taxa de expansão da cobertura é também promissora. À medida que a cobertura de telefones móveis aumenta, o número de potenciais receptores de remessas móveis também. No entanto a Guiné- Bissau ainda tem algum atraso nos restantes dois factores: crédito doméstico ao sector privado e acesso a serviços de contas bancárias. Conforme o capítulo 3 demonstrou, o crédito doméstico do sector privado é reduzido, embora seja comparável com aquele dos países vizinhos, tais como a 81 Geo Poll. 2013. How the Money Flows: International Remittances in Tunisia. Denver, Colorado: Geo Poll (e Inter Media).. 82 Banco Mundial. 2013c. African Migrants Could Save US$4 Billion Annually on Remittance Fees, Finds World Bank. Washington, DC: Banco Mundial. 83 Demirguc-Kunt, A. & Klapper, L. 2012. Measuring Financial Inclusion: The Global Findex Database. World Bank Policy Research Working Paper 6025 (April). Washington, DC: Banco Mundial. 138 Guiné-Conacri e Gâmbia. Em 2012, o crédito doméstico do sector privado atingiu aproximadamente 15 por cento do PIB. Mas isto representa ainda somente metade da taxa do vizinho Senegal e bem menos do que média da África Subsaariana de mais de 50 por cento do PIB. O crédito doméstico ao sector privado é importante uma vez que permite que os indivíduos e empresas financiem transacções, incluindo transferências de remessas. 6.14 A Guiné-Bissau regista um atraso considerável quando comparada com outros países africanos em termos de acesso a contas bancárias e outros serviços relacionados. A base de dados de inclusão financeira do Banco Mundial («Global Findex») não inclui dados sobre o acesso a contas bancárias, mas nota no entanto que a Guiné-Bissau é um dos países “menos bancarizados” do mundo. A vizinha Guiné-Conacri faz parte da base de dados Global Findex. Menos de 2 por cento dos cidadãos da Guiné-Conacri têm contas bancárias, um contraste forte com o Quénia e outros países do Leste Africano, onde as contas bancárias individuais são cada vez mais a norma. Conceder acesso a contas bancárias e serviços relacionados aos cidadãos da Guiné-Bissau é crítico para aumentar o respectivo uso de canais de remessas móveis. Tais contas podem também facilitar outros canais de remessas electrónicas relacionados com transferências bancárias e transferências via OTMs tais com a Western Union ou MoneyGram. De facto, um dos desenvolvimentos recentes mais promissores está associado à aliança entre a operadora Vodafone e a OTM MoneyGram para providenciar serviços de remessas a mais de 16 milhões de utilizadores do M-Pesa, um serviço móvel de dinheiro e crédito em África.84 Esta inovação permite que os clientes prospectivos não bancáveis beneficiem de remessas móveis através do estabelecimento de contas com OTMs ao invés de directamente com os bancos locais. Os receptores beneficiam agora (através de OTMs) de acesso aos serviços de contas bancárias. As entidades OTMs baseadas na Guiné-Bissau, incluindo a MoneyGram, podem inovar de forma semelhante com as operadoras locais de telefones e bancos com base nos receptores potenciais. 3. REMESSAS E O INVESTIMENTO DE CAPITAL DE RISCO 6.15 As remessas tendem a melhorar o acesso ao capital nos países em desenvolvimento semelhantes à Guiné-Bissau, promovendo o investimento privado. A Figura 64 ilustra o relacionamento entre as remessas e o acesso ao capital nos países em desenvolvimento de 2002- 2007. O eixo horizontal mede o valor em dólares das remessas divididas pela população do país receptor em desenvolvimento. O eixo vertical mede a disponibilidade de capital para empresas novas e existentes nesse mesmo país em desenvolvimento baseado nos dados de pesquisa do Instituto Milken em Los Angeles, Califórnia. 85 Cada ponto mede o relacionamento entre as remessas (per capita) e a disponibilidade de capital de 2002 a 2007. A média ajustada localmente e a linha de tendência harmonizada que cruza estes pontos de dados inclui observações de 61 países 84 Moneygram. 2014. Vodafone and MoneyGram Global Agreement: Agreement Will Allow Consumers to Transfer Funds from 200 countries to All M-Pesa Users. Press Release, February 11. Moneygram International: Minneapolis. 85 A. Apinard, J. Barth, C. Lee, T. Li, W. Lu, S. Malaiyandi, D. McCarthy, T. Phumiwasana, S. Sui, S. Trimbath & G. Yago, Capital Access Index 2001-2007 (diversas edições anuais escritas por uma combinação de autores listados em cima e publicados de 2002-2008) (Los Angeles, CA: Instituto Milken, 2001-2007). Vaaler, P. 2011. Immigrant Remittances and the Venture Investment Environment of Developing Countries. Journal of International Business Studies, 42: 1121-1149. Vaaler, P. 2013. Diaspora Concentration and the Venture Investment Impact of Remittances. Journal of International Business Studies, 19: 26-46. Martinez, C., Cummings, M., & Vaaler, P. 2014. Economic Informality and the Venture Funding Impact of Migrant Remittances to Developing Countries. Working Paper. University of Minnesota: Minneapolis, MN. 139 desenvolvidos. 86 A linha de tendência crescente indica um relacionamento claramente positivo entre as remessas e a disponibilidade de capital, particularmente quando as remessas aumentam de zero para os primeiros US$ 75 per capita. A experiência de remessas da Guiné-Bissau na década de 2000 situa-se bem dentro desse alcance. Em 2002, as remessas foram equivalentes a aproximadamente US$ 13 por cada Guineense; até 2012, esse mesmo número atingiu aproximadamente US$ 30. Assim, as remessas para a Guiné-Bissau podem ter um impacto substancialmente positivo na disponibilidade de capital vital para a criação de novos negócios e crescimento. Figura 64: As remessas melhoram o acesso ao capital de risco. (índice de acesso geral ao capital, 0-10 (mais elevado é melhor) e remessas per capita em milhares de US$) remessas totais per capita (em milhares de US$) Fonte: Vaaler (2011). Nota: A linha é um diagrama de dispersão harmonizado ponderado localmente (LOWESS). 6.16 As remessas melhoram o financiamento de novos negócios com um maior impacto em países com constrangimentos de capital mais severo e informalidade mais predominante; a Guiné-Bissau tem ambos. A pesquisa sobre o uso de remessas em países em desenvolvimento87 indica que as remessas servem como “seguro” para as famílias que ocasionalmente enfrentam choques económicos locais devido a fome ou choques económicos globais, tais como a recente recessão em 2008-2009. Nestas alturas, as remessas ajudaram a harmonizar o consumo das famílias a nível de bens e serviços básicos - notavelmente alimentos e cuidados médicos - mas também ajudaram a financiar negócios de subsistência secundários, particularmente em áreas rurais. Os agricultores preocupados com as secas ocasionais utilizam as remessas para adquirir bens de capital, tais como camiões que podem servir tanto para efeitos de agricultura como para um negócio distinto (i.e., como transporte comercial ou serviço de táxi disponível para outros na comunidade). Assim, os países em desenvolvimento com populações rurais substanciais vulneráveis a choques têm mais probabilidade de utilizar as remessas para financiar novas 86 Vaaler, P. 2011. Immigrant Remittances and the Venture Investment Environment of Developing Countries. Journal of International Business Studies, 42: 1121-1149. 87 Yang, D. 2011. Remessas dos Migrantes: Journal of Economic Perspectives 25(3), 129-152. Yang, D. & Choi, H. 2007. Are Remittances Insurance? Evidence from Rainfall Shocks in the Philippines. The World Bank Economic Review 21, 219-248. 140 empresas. Com cerca de metade da sua população a viver fora das zonas urbanas, e com uma vulnerabilidade considerável aos choques económicos locais e internacionais, a Guiné-Bissau encaixa bem no modelo de “seguro” secundário. É provável que as remessas venham a financiar mais iniciativas nessa área. 6.17 Outro factor que realoca as remessas do consumo familiar para o investimento é a informalidade, isto é, transacções económicas que ocorrem fora da capacidade do governo local ou da disponibilidade para observar e regular. Muitos países em desenvolvimento têm recursos limitados para contabilizar e regular a actividade comercial, particularmente actividade de pequena escala, em áreas mais remotas. Assim, a actividade económica existe e pode crescer na economia “informal” ou “sombra”. Na década de 2000, esta informalidade económica nos países em desenvolvimento atingiu valores tão elevados como 66 por cento do PIB (Bolívia), com muitos países africanos, incluindo a Guiné-Bissau, a registarem 40 por cento ou mais elevado.88 Nas áreas rurais de tais países, a percentagem tende a ser particularmente elevada. 6.18 A informalidade económica é uma faca de dois gumes para os investidores. Por um lado, podem operar livres da regulamentação e tributação do Governo. Por outro, não têm as protecções legais e regulatórias quando estão a transaccionar com o sector informal. Este contexto no entanto acaba por dissuadir muitos investidores estrangeiros de arriscar o portfolio, propriedades e investimentos em equipamentos. As remessas, no entanto, são diferentes. Representam pequenas transferências, habitualmente entre membros familiares em países diferentes e ou membros da comunidade com alguma relação. Significa isto que existem meios informais de supervisionar e garantir o Figura 65: As remessas aumentam a disponibilidade de uso correcto das remessas. O nível capital especialmente em economias informais (impacto marginal de cada dólar adicional das remessas na elevado de informalidade é um factor disponibilidade de capital) menos relevante para dissuadir as remessas. De facto, a informalidade elevada parece induzir uma mudança no uso das remessas para fins de investimento de capital, conforme a Figura 65 ilustra. A Figura segue de um recente estudo de informalidade económica, remessas, e investimentos de capital de risco em 48 países em desenvolvimento observados de 2001 a 2009.89 6.19 O eixo horizontal da Figura 65 mede a percentagem do PIB do país que é considerada informal. O eixo vertical indica o impacto marginal de um dólar adicional nas remessas em mais um Dimensão da economia informal (% do PIB) indicador baseado em inquéritos a respeito do acesso a capital no país, desta Fonte: Martinez, Cumming, e Vaaler (2014) 88Schneider, F. & Enste, D. 2002. The Shadow Economy. Cambridge, UK, Cambridge University Press. Schneider, F., Buehn, A., & Montenegro, C. 2010. New Estimates for the Shadow Economies All Over the World. International Economic Journal 24, 443-461. Martinez, C., Cummings, M., & Vaaler, P. 2014. Economic Informality and the Venture Funding Impact of Migrant Remittances to Developing Countries. Working Paper. University of Minnesota: Minneapolis. 141 feita proveniente do Relatório Global de Competitividade do Fórum Económico Mundial (2002- 2010).90 Os pontos representam o impacto simulado - positivo ou negativo, aproximadamente - de um dólar adicional no ranking do país no Relatório Global de Competitividade para 2001-2009. Os espaços que representam intervalos de 95 por cento de confiança por cima e em baixo de cada ponto também estão incluídos. Os resultados sugerem que quando a economia informal excede 40 por cento do PIB, as remessas podem aumentar a disponibilidade de capital de risco. Com níveis de 46 por cento ou superiores de informalidade económica, as remessas podem aumentar o capital de risco crítico para a criação de novas empresas e crescimento. Tendo em conta que a economia informal da Guiné-Bissau excede os 40 por cento, situa-se bem dentro do intervalo em que as remessas podem aumentar o investimento de capital de risco. Considerando as elevadas taxas de informalidade económica nas zonas rurais da Guiné-Bissau, existe uma elevada probabilidade de que as remessas possam financiar investimentos de capital de risco. 6.20 Os atributos estruturais da Diáspora migrante também afectam a probabilidade de que as remessas sejam utilizadas para efeitos de investimentos de capital de risco; a Diáspora migrante da Guiné-Bissau demonstra esses atributos. Conforme a Figura 66 ilustra, um dos principais atributos estruturais diz respeito à concentração ou difusão da Diáspora de determinado país. Algumas diásporas migrantes estão concentradas num determinado país ou região geográfica (Mexicanos nos EUA; cidadãos do Bangladesh no países produtores de petróleo no Médio Oriente, etc.) Outras estão mais dispersas: os migrantes Romenos e Polacos espalharam-se pela União Europeia na década de 2000, as diásporas Libanesa e Arménia espalharam-se pelo mundo ao longo de séculos. 91 As pesquisas recentes sugerem que estes contrastes não são coincidentes mas reflectem antes as decisões cumulativas dos migrantes, particularmente menos qualificados, que procuram informação e serviços de baixo custo acessíveis apenas em comunidades geograficamente concentradas com uma herança étnica semelhante.92A concentração em um ou poucos países permite que estes migrantes descubram e explorem de forma mais fácil as oportunidades para investimentos no seu país de origem. 6.21 A Figura 66 é baseada num recente estudo de concentração da Diáspora, remessas e disponibilidade de capital de risco; 93 o eixo horizontal representa as remessas anuais divididas pela população total do país, excepto que estas remessas são limitadas às provenientes apenas dos migrantes residentes (remessas de trabalhadores). O eixo vertical mede a disponibilidade de capital para empresas novas e existentes nesse mesmo país em desenvolvimento, baseado nos dados de pesquisa do Instituto Milken em Los Angeles, Califórnia. 94 Cada ponto mede o relacionamento entre as remessas (per capita) e a disponibilidade de capital de 2002 a 2007 para os migrantes que vivem numa diáspora “concentrada”. Os dados sobre a localização dos migrantes 90 Forúm Económico Mundial, 2002-2010. Global competitiveness reports para os anos 2001-2009. Davos, Suíça: Fórum Económico Mundial. 91 M. Botticini, “Commercial and Trade Diasporas,” em Oxford Encyclopedia of Economic History, Mokyr, J. (ed.). (Oxford,UK: Oxford University Press, 2003). 92 Beine, Docquier & Özden, “Diasporas,” Journal of Development Economics 95: 30-41 (2011). M. Botticini & Z. Eckstein, “Path Dependence and Occupations,” em Durlauf, S. & Blume, L. (eds.), The New Palgrave Dictionary of Economics. New York, NY: Palgrave MacMillan, 2008). Parsons, C., Skeldon, R., Walmsley, T., & Winters, T. 2007. Quantifying International Migration: A Database of Bilateral Migrant Stocks. World Bank Policy Research Working Paper 4165. Washington, DC: Banco Mundial. 93 Vaaler, P. 2013. Diaspora Concentration and the Venture Investment Impact of Remittances. Journal of International Management, 19: 26-46. 94 A. Apinard, J. Barth, C. Lee, T. Li, W. Lu, S. Malaiyandi, D. McCarthy, T. Phumiwasana, S. Sui, S. Trimbath & G. Yago, Capital Access Index 2001-2007 (diversas edições anuais escritas por uma combinação de autores listados em cima e publicados de 2002-2008) (Los Angeles, CA: Instituto Milken, 2001-2007). 142 em todo mundo 95 permitem o cálculo de um índice de concentração semelhante ao índice de concentração industrial Herfindahl-Hirschman (0-1) utilizado na pesquisa de organização industrial. Os valores do índice Herfindahl-Hirschman superiores a 0,48 são considerados pertencentes a diásporas “concentradas”, que no caso da amostra de 50 países em desenvolvimento analisados de 2002 a 2007 corresponde à quota-parte correspondente ao terço mais elevado. Cada valor x assinala o mesmo relacionamento mas para diásporas difusas (não concentradas). As linhas de tendência linear atravessam ambos os conjuntos de pontos de dados. 6.22 A linha de tendência crescente na Figura 66 indica que as remessas das Diásporas migrantes mais concentradas aumentam a disponibilidade de capital. As remessas provenientes de Diásporas mais dispersas não aumentam essa disponibilidade, o que é consistente com a noção de que são mais utilizadas para financiar o consumo das famílias. A estrutura da Diáspora migrante da Guiné-Bissau situa-se na categoria de “concentrada”, com as maiores representações em Portugal e França. Assim, novamente, as remessas desta Diáspora são mais prováveis de financiar investimentos de capital e promover o desenvolvimento económico e a redução da pobreza nesse processo. Figura 66: As remessas apoiam o acesso a capital de risco especialmente quando as diásporas se encontram concentradas. (acesso a capital de risco, 0-10 (mais elevado é melhor)) Remessas totais per capita (em milhares de US$) Fonte: Vaaler (2013). 6.23 Os Governos dedicados a assuntos da Diáspora podem coordenar a supervisão das políticas e tendências de migração e remessas; a Guiné-Bissau tem contado com um ministério “híbrido” que providencia essa supervisão de coordenação. A análise supramencionada indica o valor de compreender, seguir, e, se possível, influenciar através políticas públicas os factores relacionados com a localização dos migrantes, educação, experiência, e os padrões de remessas e objectivos associados. Para conseguir isto, diversos países têm 95 Parsons et al. 2007. 143 estabelecido organizações apoiadas pelo Governo e agências governamentais para envolver as suas Diásporas. Em 2012, mais de 80 países no mundo tinham uma organização para envolver a Diáspora, e por vezes mais do que uma. A Figura 67 ilustra o crescimento de instituições para envolver a Diáspora em países de origem desde 1980, e surge na sequência de um recente estudo sobre determinantes da criação de instituições de envolvimento da Diáspora em 144 países, incluindo a Guiné-Bissau.96 O eixo vertical ilustra a contagem de diferentes tipos de instituições de Diáspora em cada país estudado. Estas categorias incluem: 1) organizações quase governamentais (quango) uma organização apoiada pelo Estado que é parcialmente financiada ou liderada pelo sector privado (e.g. a Associação Kiwi de Expatriados da Nova Zelândia, estabelecida em 2001); 2) agência legislativa, uma agência localizada no ramo legislativo do Governo, frequentemente para representar os grupos migrantes (e.g. Alto Conselho dos Malianos, fundado em 1993); 3) sub- ministério, um escritório formal com sede num Ministério Governamental mais ampla (e.g. the Irish Abroad Unit estabelecida em 2006 e com sede desde 2008 na divisão consular do Departamento de Assuntos Estrangeiros da Irlanda); 4) agência executiva, uma organização com sede no escritório do chefe do ramo executivo do Governo (e.g. Escritório Presidencial para os Mexicanos no Estrangeiro, estabelecido temporariamente em 2000); 5) ministério híbrido, um portfolio ministerial que se divide entre responsabilidades com assuntos da Diáspora e outro assuntos ou deveres (e.g. Ministério da Solidariedade Nacional, Família e Comunidade no Estrangeiro da Argélia, estabelecido em 1996); e 6) ministério completo, um portfolio ministerial único dedicado à Diáspora (e.g., o Ministério de Assuntos Ultramarinos da Índia estabelecido em 2004). Figura 67: O número de instituições da Diáspora em todo o mundo tem aumentado. (contagem de instituições Diáspora por tipo) Fonte: Gamlen, et al. (2013). 96 Gamlen, A., Cummings, M., Vaaler, P., & Rossouw, L. 2013. Explaining the Rise of Diaspora Institutions. IMI Working Paper 78, International Migration Institute, University of Oxford: Oxford, Reino Unido. 144 6.24 As agências legislativas e os sub-ministérios compõem a maior parte das instituições de envolvimento das Diásporas. Existem países que podem ter desde uma a seis tipos de instituições num determinado ano. As instituições de envolvimento da Diáspora situadas em agências legislativas especializam-se tipicamente em políticas e tendências de migrantes relacionadas com voto no estrangeiro e representação política nas legislaturas dos países de origem. As instituições de envolvimento com Diáspora em ONGs quase autónomas (quangos) ou agências do ramo executivo especializam-se tipicamente em assuntos de desenvolvimento económico dos migrantes, incluindo a promoção de IDE, portfolio de investimentos, e remessas para iniciar novos negócios no país de origem. 6.25 A principal agência de envolvimento da Diáspora na Guiné-Bissau tomou a forma de um ministério híbrido no ramo executivo, que se denominou alternativamente entre Ministério dos Negócios Estrangeiros, Cooperação Internacional e Diáspora e Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Diáspora. Estes antecedentes significam que o Presidente e Primeiro-ministro recém-eleitos podem aproveitar o staff político e burocrático que tem alguma experiência anterior na análise das tendências actuais de migração e remessas e as respectivas implicações para o desenvolvimento económico e redução da pobreza. Neste contexto, a versão constituída de ministério hibrido no novo governo estaria melhor posicionada para formular e implementar iniciativas de políticas destinadas a melhorar o impacto do investimento de capital das remessas e os efeitos mais amplos de desenvolvimento económico e redução da pobreza associados ao envolvimento da Diáspora. 6.26 Adicionalmente, a legislatura da Guiné-Bissau inclui dois lugares para cidadãos que vivem no estrangeiro: um lugar para os Guineenses que vivem na Europa e outro para os restantes que vivem noutros locais em África. Os cidadãos que vivem no estrangeiro podem votar em pessoa nas embaixadas ou em escritórios eleitorais centrais (Bissau) na Guiné-Bissau, se estiverem de visita na época das eleições. As eleições legislativas anteriores em 2004 e 2008 deixaram dois lugares por preencher e os cidadãos residentes no exterior foram isentos de votar. Estas políticas minam os esforços para envolver os migrantes politicamente e para atrair maior participação na economia nacional através de remessas e outros influxos de capital estrangeiro. A eleição legislativa mais recente de 2014 preencheu esses dois lugares, embora as taxas de participação de votantes no estrangeiro não tenha alcançado os 76 por cento registados na participação doméstica. 4. RECOMENDAÇÕES 6.27 A análise das tendências de remessas e respectivo uso em países em desenvolvimento em geral e na Guiné-Bissau especificamente leva a várias recomendações de políticas, que são sumarizadas de seguida:  O Governo da Guiné-Bissau deverá tratar os migrantes como qualquer outro investidor estrangeiro potencial e providenciar incentivos financeiros, legais e regulatórios para que aumentem o volume e frequência das suas remessas, e os encorajem a usar novos canais de remessas electrónicos e móveis. Os investidores migrantes podem providenciar as condições para maior investimento empresarial num contexto que pode dissuadir outros investidores convencionais (não migrantes) tais como empresas e indivíduos estrangeiros que tendem a depender de protecções legais e regulatórias formais. Os migrantes têm relacionamentos informais com a família e comunidade que garantem que os investimentos das remessas sejam utilizados para os fins propostos. Os migrantes e as suas remessas são assim um ponto natural para iniciar a reconstrução do investimento estrangeiro e respectiva confiança na economia da Guiné-Bissau. 145  O Governo deveria permitir que novos bancos internacionais e OTMs entrem no mercado da Guiné-Bissau para promover mais concorrência nestes canais de transferência de remessas, reduzir os custos de transferência de remessas, encorajar novas tecnologias de transferência - incluindo tecnologias móveis - e aumentar o crédito doméstico ao sector privado. Actualmente apenas duas grandes organizações de transferência monetária (OTMs) operam na Guiné-Bissau: Western Union e MoneyGram. Outras grandes OTMs que mostraram interesse em entrar na Guiné-Bissau (e.g., Ria Financial) foram dissuadidas por regulamentações governamentais que aparentemente favorecem o actual duopólio. A revisão desta política e a permissão a novos entrantes irá decrescer as taxas de remessas e promover a adopção mais célere de tecnologias de transferência móvel. Um processo mais convidativo e harmonizado para a entrada de novas OTM estimularia também a actividade bancária, uma vez que as OTMs promovem tecnologias móveis de processamento das remessas. Isto por sua vez poderia estimular mais crédito do sector privado doméstico.  O Governo deve considerar permitir a dupla ou múltiplas cidadanias a migrantes da Guiné-Bissau, seus familiares directos, e descendentes, para promover o fluxo facilitado de pessoas e remessas para a Guiné-Bissau. Actualmente a Guiné-Bissau não permite a cidadania dupla ou múltipla. Esta política aumenta os custos de viagem de e para a Guiné- Bissau para os migrantes, famílias migrantes que vivem no estrangeiro, e seus descendentes, que podem ter assumido a cidadania nos seus países anfitriões, mas continuam a ter importantes laços familiares, de comunidade e outros com a Guiné-Bissau. Estes mesmos laços podem estimular o seu interesse em efectuar remessas eventualmente para efeitos de lançamento de um negócio. O Governo da Guiné-Bissau deverá facilitar com que estes investidores fiquem “ligados” e invistam no seu país de origem via donativos de cidadão de dupla ou múltiplas nacionalidades. No mínimo, o Governo deveria implementar um programa de vistos de longo prazo que aponte a estes mesmos indivíduos para permitir a sua facilidade de movimento e investimento.  O Governo deverá considerar delegar a autoridade para formular e implementar estas políticas a um ministério híbrido reconstituído (e.g., Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Diáspora). Tal ministério hibrido terá provavelmente mais experiência e conhecimento do que outros ministérios neste domínio e pode implementar estas políticas de forma cautelosa e com atenção a assuntos relacionados, nomeadamente o branqueamento de capitais e o tráfico de drogas. Estas iniciativas de políticas não requerem a criação de mais agências governamentais. De facto, beneficiariam do aliviar de determinadas regulamentações, tais como aquelas que constrangem a entrada das OTMs.  O ministério hibrido da Guiné-Bissau encarregue da supervisão de tais políticas poderia estabelecer uma base de dados que rastreasse a dimensão, localização e atributos demográficos da diáspora, assim como o total do volume das remessas e a sua composição e usos na Guiné-Bissau. As organizações internacionais 97 assim como os pesquisadores académicos financiados por organizações internacionais 98 já criaram plataformas globais, regionais (África) e específicas ao país (Guiné-Bissau) com estes dados 97 FMI. 2009. International Transactions in Remittances: Guide for Compilers and Users. Washington, DC. 98 Parsons et al. 2007. Docquier, F. & Marfouk, A. 2006. International migration by education attainment in 1990–2000. In C. Orden & M. Schiff (Eds), International migration, remittances and the brain drain. Washington, DC: Banco Mundial. 146 que podem ser acedidas electronicamente e têm actualizações periódicas. 99 Estes dados facilitariam a formulação de políticas com base em provas e a implementação de políticas destinadas a aumentar o impacto do investimento de capital de risco das remessas e envolvimento mais amplo da Diáspora na promoção do desenvolvimento económico e redução da pobreza na Guiné-Bissau. O contacto com os migrantes tem até o potencial para contrabalançar de certa medida a fuga de cérebros que Guiné-Bissau sofre, se os migrantes investirem alguns dos recursos e conhecimento adquiridos no estrangeiro no seu país de origem. PARTE II: PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL 5. VISÃO GERAL E CONTEXTO 6.28 Na Guiné-Bissau, os programas de assistência social podem ser ferramentas eficazes para combater a pobreza. Conforme os capítulos 1 e 2 argumentam, a pobreza é generalizada na Guiné-Bissau, e a capacidade de fornecer serviços públicos urgentemente necessários é limitada, além de que a resolução dos constrangimentos críticos ligados às infra-estruturas levará tempo. Quando sejam estabelecidos, os programas de assistência social podem ser uma forma efectiva de fornecer ajuda aos mais pobres, potencialmente evitando muitos dos riscos inerentes a outros tipos de políticas públicas. Os termos “redes de segurança sociais” ou “assistência social” são usados para referir a programas não contributivos de transferência que são focados de alguma maneira nos pobres e vulneráveis. Na política social, os programas de rede de segurança social procuram ajudar os que estão a ficar para trás economicamente antes que caiam na destituição e para providenciar assistência ou um rendimento mínimo aos que estão permanentemente pobres. Os seguintes programas são elementos comuns de uma rede de segurança: 100  Transferências monetárias ou vouchers alimentares, sejam estes testados na média ou categóricos como no caso dos abonos de família ou pensões;  Transferências em espécie, os programas de alimentação escolar ou programas de suplemento às mães/filhos são os mais comuns, mas também rações alimentares, material escolar e uniformes, entre outros;  Emprego em obras públicas trabalho-intensivas, por vezes denominados dinheiro em troca de trabalho ou trabalho social;  Transferências monetárias ou em espécie para famílias pobres, sujeitas ao cumprimento de determinadas condicionalidades a respeito de educação ou saúde; e  Isenção de taxas em serviços essenciais tais como cuidados de saúde, escolarização, serviços públicos, ou transportes. 6.29 Em anos recentes, os programas de rede de segurança social têm sido crescentemente adoptados no mundo em desenvolvimento, incluindo em países africanos, com impactos notáveis no nível de pobreza das famílias visadas. Uma revisão recente de 22 países africanos demonstra a actual combinação de programas (Figura 68), e realça que os programas ainda se focam fundamentalmente em ajuda de emergência ou em determinados grupos demográficos. No entanto as transferências monetárias estão em crescendo, focando-se cada vez mais na pobreza 99Parsons et al. 2007. Docquier & Marfouk 2006. Grosh M. C. del Ninno, E. Tesliuc, and A. Ouerghi, 2008. For Protection and Promotion: The Design 100 and Implementation of Effective Safety Nets. Washington, DC, Banco Mundial. 147 crónica. No geral algumas estimativas sugerem que os programas de transferência nos países em desenvolvimento cobrem até mil milhões de pessoas em todo o mundo. 101 Os programas de assistência financeira têm importantes impactos na pobreza - por exemplo, as transferências monetárias reduziram o gap de pobreza em 45 por cento na África do Sul e em 11 pontos percentuais na Zâmbia, com a pobreza como um todo a decrescer em cerca de 13 pontos percentuais como resultado dos programas de transferência monetária no Quénia.102 Figura 68: Os programas de rede de segurança social, de 6.30 A maioria dos programas de diferentes tipos, são comuns em vários países africanos. assistência social colocam as decisões nas (percentagem de países inquiridos) mãos dos mais pobres ao conceder-lhes 100 recursos para tomar as decisões certas no 90 que toca à utilização dos recursos nas 80 suas famílias. As provas empíricas 70 demonstram também que os mais pobres 60 gastam o dinheiro que recebem de forma 50 responsável, focando-se no consumo de 40 bens importantes, despesas relacionadas 30 com educação e saúde, e investimentos 20 produtivos. Uma recente revisão de provas 10 empíricas sugere que 82 por cento dos 0 Fee waivers School feeding General subsidies Emergency programs Categorical transfers Micro-finance Social care services Public Works Programs Other in-kind transfers Poverty targeted cash transfers estudos relevantes não encontrou um aumento de despesas nos denominados bens de “tentação”, tais como álcool e tabaco, por parte dos beneficiários de transferências monetárias. 103 Outro mecanismo é a mudança no poder relativo nas famílias, uma vez muitos programas se concentram nas mulheres, que frequentemente se focam Fonte: Monchuk, V. 2013. Poverty Reduction and mais em despesas relacionadas com as Investing in People: The New Role of Safety Nets in Africa, crianças. Experiences from 22 Countries. Social Protection & Labor Policy Note 16. Banco Mundial. 6.31 Embora os principais objectivos dos programas de assistência social sejam de reduzir a pobreza, sob algumas condições estes podem também promover os investimentos em capital que podem resultar num aumento de produtividade. Este capítulo realça que alguns programas de rede segurança social (SSN) podem ter efeitos positivos na actividade económica, especialmente nas famílias de menor rendimento, através dos seguintes canais: (i) capital humano; (ii) bens físicos; (iii) produtividade; e (iv) multiplicador económico através dos efeitos multiplicadores na economia local. As provas provêm principalmente dos programas de transferência monetária. Adicionalmente, se os programas forem efectivamente apontados aos beneficiários mais pobres, estes impactos podem contribuir para o crescimento partilhado ao providenciar oportunidades económicas às famílias mais marginalizadas. 101 Haushofer J. and Shapiro J. (2013) Policy Brief: Impacts of Unconditional Cash Transfers ; Monchuk, V. 2014. Reducing Poverty and Investing in People: The New Role of Safety Nets in Africa. Banco Mundial. 102 Project Appraisal Document (PAD) on a Proposed Credit in the Amount of SDR 26.20 Million to the Republic of Senegal for a Social Safety Net Project (2014), Banco Mundial. 103 Evans, D., (2014) Do the poor waste transfers on booze and cigarettes? No., Banco Mundial. 148 Figura 69: Uma transferência monetária equivalente Figura 70: Uma transferência monetária equivalente a a 1,5 pontos percentuais do PIB reduziria a pobreza 1,5 pontos percentuais do PIB reduziria a pobreza absoluta em dois pontos percentuais. extrema em dez pontos percentuais. (contagem da pobreza a US$ 2 por dia em percentagem (contagem da pobreza a US$ 1 por dia em percentagem do do PIB (RHS), dados de 2010) PIB (RHS), dados de 2010) 80% 8% 35% 8% 70% 7% 30% 7% 60% 6% 6% 25% 50% 5% 5% 20% 40% 4% 4% 15% 30% 3% 3% 10% 20% 2% 2% Poverty count (2 US$ per day) 5% Poverty count (1 US$ per day) 10% 1% 1% Cost in % of GDP (RHS) Cost in % of GDP (RHS) 0% 0% 0% 0% 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 Pagamentos mensais em US$ Pagamentos mensais em US$ Fonte: ILAP II e simulações do staff do Banco Mundial. Fonte: ILAP II e simulações do staff do Banco Mundial. 6.32 Na Guiné-Bissau, um programa de transferências monetárias equivalente a 1,5 por cento do PIB poderia reduzir a pobreza extrema em cerca de 10 pontos percentuais (Figura 70).104 Uma transferência do mesmo montante para os pobres sob a linha de pobreza absoluta reduziria a pobreza em cerca de dois pontos percentuais (Figura 69). Para conseguir uma redução similar da pobreza absoluta de 10 pontos percentuais, seria necessária uma transferência equivalente a 7 por cento do PIB. Para colocar estes montantes em perspectiva, em 2010, o ano para o qual estes resultados foram simulados, a Guiné-Bissau recebeu donativos dos doadores equivalentes a 9,7 por cento do PIB (7,4 por cento em donativos a projectos e 2,3 por cento em apoio orçamental) Um programa de transferência monetária, especialmente um que se concentre na pobreza extrema, seria comparavelmente mais barato - sendo que os resultados em termos de redução da pobreza e promoção do crescimento do rendimento seriam consideráveis. 6. O IMPACTO DOS PROGRAMAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL Capital humano 6.33 Os programas de rede de segurança social têm contribuído para aumentar o uso de serviços de educação e saúde entre os beneficiários. A capacidade das transferências monetárias de trazer os pobres a um nível mínimo de bem-estar permite que estes possam tirar vantagem das oportunidades económicas, particularmente investimentos em capital humano. As comunidades no vizinho Senegal, por exemplo, demonstraram um impacto positivo na educação e saúde de crianças cobertas pelo Programa de Nutrição de Crianças e de Transferências Sociais (Projet Nutrition Ciblée sur l’Enfant et Transferts Sociaux, NETS). As participações neste programa levaram a aumentos no número de refeições relatadas e a reduções de estratégias negativas de 104 As simulações assumem que as famílias gastam cerca de 100 por cento da transferência em consumo; e também assume o foco perfeito e a ausência de “derrames” dos recursos. 149 comportamento.105 Esta intervenção levou a uma redução na mortalidade infantil, particularmente de doenças de diarreia, melhoria na cobertura de vacinação, dietas mais diversas para as crianças até 23 meses, a adopção de melhores hábitos alimentares para crianças com menos de 5 anos e ao número recomendado de refeições para crianças com idades entre os 6 e 23 meses. De forma semelhante, os participantes desfrutaram de melhorias nos desempenhos educacionais, com maiores taxas de inscrição nas escolas primárias e secundárias no Quénia, Zâmbia, Malawi, Gana e África do Sul. Adicionalmente, o Quénia verificou uma taxa de conclusão maior a nível de escolaridade, enquanto os programas no Gana e África do Sul verificaram reduções na repetição de anos e absentismo, respectivamente, entre as famílias beneficiárias. 106 Finalmente, um estudo recente do programa de transferência monetária condicional da Tanzânia descobriu que as grandes melhorias registaram-se entre os beneficiários mais pobres. Os benefícios do programa foram todavia mais amplos, com as famílias participantes a registarem níveis mais elevados de saúde e educação do que a amostra de famílias não abrangidas ao fim de dois anos e meio. 107 Estas experiências são corroboradas no plano internacional, onde a participação no Bolsa Família no Brasil levou a um aumento nas taxas de inscrição escolares de longo prazo em 13 por cento.108 6.34 Os programas de obras públicas podem também causar um maior investimento em serviços de escolarização e saúde, e têm tido sucesso em focar as camadas mais pobres. A Libéria introduziu as obras públicas em resposta directa ao conflito e às crises subsequentes de preços de bens alimentares, que contribuíram para altas taxas de pobreza, insegurança alimentar, e desemprego. A avaliação do projecto revelou que 80 por cento dos beneficiários eram de famílias pobres. Esta taxa relativamente elevada de foco nas famílias pobres através de obras públicas também foi verificada na Índia, Argentina e Etiópia. No caso da Libéria, apesar do contexto de necessidade extrema, os beneficiários investiram cerca de 30 por cento dos salários das obras públicas em educação e outros 16 por cento em agricultura, empresas não agrícolas, e investimentos de cariz familiar.109A avaliação do Programa de Rede de Segurança Produtiva da Etiópia (Ethiopian Productive Safety Net Program), demonstra também que as famílias beneficiárias relataram uma taxa mais elevada e sustentada de inscrição escolar para as suas crianças depois de um ano de participação no programa (ver também Caixa 8 no capítulo 4).110 6.35 A imposição de condições para as transferências monetárias, sob as quais as transferências são contingentes de determinados comportamentos dos beneficiários, podem aumentar ainda mais os investimentos no capital humano. A pesquisa sugere que os programas que incluem condicionantes ligados à educação e saúde podem resultar numa captação maior destes serviços do que programas não condicionais de transferência, ao acrescentar o efeito rendimento às próprias transferências. 111 A imposição do cumprimento das condicionalidades aumenta escolarização e taxa de frequência nos centros de saúde; mesmo os “condicionalismos leves”, para os quais os pagamentos não se encontram associados estritamente ao cumprimento de 105 Insitut Fondamental d’Afrique Noire (2012) Impact Evaluation of Cash Transfers in the NETS Program of Social Transfers Targeting Children, Laboratory of Research on Social and Economic Transformations, Universidade de Dakar. 106 PAD Senegal, 2014. 107 Evans, D., Hausladen, S., Kosec, K., Reese, N. (2014) Community-Based Conditional Cash Transfers in Tanzania: Results from a Randomized Trial, Banco Mundial. 108 Ibid. 109 Grosh, M., C del Ninno, E. Tesliuc, and A. Ouerghil., 2008. For Protection and Promotion: The Design and Implementation of Effective Safety Nets. Banco Mundial, Washington, DC. 110 Banco Mundial. 2010. Designing and Implementing a Rural Safety Net in a Low Income Setting; Lessons Learned from Ethiopia’s Productive Safety Net Program 2005 -2009. Banco Mundial. 111 Alderman H. and Yemtsov, R. (2014) ‘How Can Safety Nets Contribute to Economic Growth?’ em World Bank Economic Review, 28(1): 1-20. 150 condições, podem aumentar os investimentos no que toca ao efeito rendimento por si só. 112 Conforme a Figura 71 demonstra, cd Figura 71: As transferências monetárias têm efeitos representa o novo constrangimento duplos de rendimento e substituição. orçamental da família depois de receber a 113 transferência monetária. De forma a encorajar os beneficiários a aumentar o seu nível de escolarização ao invés de aumentarem o consumo de outros bens, i.e. moverem-se simplesmente de h para i, os responsáveis do programa requerem um nível g de consumo ou escolarização para permitir a transferência. No entanto, na prática, em países onde a oferta de serviços básicos é limitada, a imposição de condições severas é menos desejável, uma vez que os mais pobres são também aqueles que têm menos probabilidade de terem acesso efectivo a serviços básicos de saúde ou educação. Adicionalmente, embora a imposição de condições possa resultar em maiores investimentos de capital humano, a monitorização das condições é onerosa e requer capacidade. Como exemplo, os custos de segmentação, condicionamento e Fonte: Barrientos (2012). seguimento correspondem a cerca de 60 por cento dos custos administrativos do PROGRESA no México. Adicionalmente, estas condições são mais facilmente aplicáveis em países de rendimento médio onde a capacidade institucional mais forte torna a supervisão mais exequível. 6.36 A procura acrescida por serviços sociais básicos por parte dos beneficiários de programas de assistência social, através da maior frequência de serviços escolares, nutrição e de saúde, será difícil de enquadrar na Guiné-Bissau tendo em conta a capacidade actual do sector público nacional nestes sectores. Por esta razão, serão necessárias acções decisivas para reverter a situação económica da Guiné-Bissau e garantir que os serviços adequados de nutrição, educação e saúde são providenciados aos mais pobres e vulneráveis. Conforme discutido no capítulo 3, a acumulação de atrasados nos salários de professores públicos leva a greves frequentes, que ocorrem também entre os trabalhadores da saúde. Frequentemente, a oferta de escolarização é tão reduzida que os anos escolares são anulados. Um programa de assistência social, particularmente se introduzido com alguma forma de condicionalidade, iria exigir investimentos concomitantes na provisão dos serviços, o que significaria a resposta à questão de pagamento dos professores e trabalhadores do sector da saúde. Em alguns países onde o Governo não esteve apto a providenciar este apoio, as ONGs e outras OSCs contribuíram temporariamente para preencher alguns gaps nos serviços (ver o capítulo 5), no entanto, no médio prazo, o financiamento destes serviços é uma das principais responsabilidades do Governo. 112 Alderman and Yemtsov, 2014. Ozler, B. and Ferreira, F. (2011) Conditions work! But are they a good thing? Part I, Banco Mundial. 113 Barrientos, A. (2012) ‘Social Transfers and Growth: What Do We Know? What Do We Need to Find Out?’ World Development 40(1) 11–20. 151 Activos físicos 6.37 Novas provas sugerem que os programas de rede de assistência social têm um efeito positivo na formação de activos. Um estudo randomizado e controlado do programa de transferências monetárias no Quénia Ocidental conduzido pela ONG Give Directly registou reduções significativas na pobreza e insegurança alimentar entre os receptores, assim como um aumento na acumulação de activos.114 Os beneficiários da Give Directly, que representaram uma amostra da população em geral, receberam transferências monetárias sem condicionalismos. Entre 2011 e 2012, as famílias pobres que participaram aumentaram o seu consumo e investimento em gado e pequenos negócios, e reduziram o flagelo da fome e de stress psicológico. 115 Os beneficiários verificaram que os seus activos cresceram em 58 por cento quando comparado com o grupo de não beneficiários, particularmente através de melhoria na casa familiar e aumento do gado, demonstrando simultaneamente aumentos fortes no consumo de alimentos, medicamentos e despesas sociais e sem provas de um aumento no consumo de bens de “tentação”; registou-se inclusive uma redução de 42 por cento no número de dias que as crianças passaram sem alimentos. 6.38 A assistência social, seja através de transferências monetárias ou obras públicas, pode ajudar as famílias a manter os activos. Por exemplo, quando se materializam choques de rendimento adversos, os pobres são forçados a vender activos para absorver o choque. Se o choque é sistémico e um número amplo de famílias é forçada a vender activos em vendas rápidas, os preços dos activos colapsam, aumentando assim a quantidade de activos que têm de ser vendidos para cobrir as necessidades de consumo. Isto aumenta a dimensão dos choques e tem um efeito negativo nos pobres. As transferências monetárias providenciam uma almofada que reduz o efeito dos choques. Um estudo que examinou por exemplo o PSNP na Etiópia determinou que os beneficiários sob o programa registaram menos vendas de emergência, e estatisticamente um aumento mais amplo dos activos ao longo do tempo do quando comparados com famílias sem transferências monetárias.116 6.39 O efeito da assistência social na formação dos activos aumenta a sustentabilidade dos rendimentos locais. Embora a produtividade dos activos em que os pobres investem varie (e.g. habitação versus gado), existem provas de que as receitas aumentam fruto da acumulação de activos. No estudo do Quénia, a receita total de pequenos negócios nos quais os receptores investiram parte das suas transferências aumentou em 38 por cento. Por outro lado, a receita da criação de animais domésticos aumentou em 48 por cento entre os receptores das transferências. De facto, o gado parece ser uma área comum para a criação de activos entre os receptores de transferências monetárias, conforme ilustrado por outras experiências da Zâmbia e Malawi.117 A acumulação de activos físicos aumenta a receita que por sua vez pode ser investida em mais activos, colocando assim em movimento um círculo virtuoso. Embora os montantes permaneçam modestos, isto pode aumentar os rendimentos locais de forma moderada, mas sustentável. 6.40 Através de um modelo de obras públicas, as redes de segurança sociais podem contribuir para construir ou reabilitar infra-estruturas de pequena escala. Os programas de obras públicas podem ajudar a alcançar o bem-estar de longo prazo das famílias e comunidades através de um outro canal de investimento que gera serviços para as famílias - a construção ou manutenção de infra-estruturas. O PSNP da Etiópia financia obras públicas trabalho-intensivas nas 114 Haushofer e Shapiro, 2013. 115 Ibid. 116 Berhane, G., J. Hoddinott, N. Kumar, and A. Seyoum Taffesse. 2011. “The Impact of Ethiopia’s Productive Safety Nets and Household Asset Building Programme: 2006-2010.” International Food Policy Research Institute, Washington, DC. 117 PAD Senegal, 2014. 152 áreas de infra-estruturas de serviços sociais (fornecimento de água, postos de saúde, e escolas) e providenciam um bem-estar público mais vasto, além do bem-estar das famílias directas beneficiadas. Nas zonas altas da Etiópia, 65 por cento das famílias relata que beneficiaram dos trabalhos do PSNP nas escolas locais e 62 por cento relatam que têm beneficiado dos trabalhos do PNSP nos postos de saúde locais. 118 As obras públicas também são utilizadas para reabilitar estradas de acesso, particularmente através de métodos trabalho-intensivos. A melhoria nas estradas de acesso pode ajudar as famílias a trazer os seus produtos ao mercado ou a terem acesso mais célere a serviços governamentais existentes de saúde, educação ou outros.119 Produtividade 6.41 Existem provas que os pobres investem parte das suas transferências recebidas em melhores inputs de produção e actividades com alto valor acrescentado, que têm o potencial de aumentar a produtividade. De forma similar aos activos físicos, as avaliações dos programas sugerem que os beneficiários podem também investir parte de uma transferência monetária em melhores inputs, incluindo sementes e fertilizantes que aumentam a produtividade dos seus terrenos como um todo. Adicionalmente, os recursos adicionais vão permitir aos mais pobres investirem em actividades com elevado valor acrescentado. Na Zâmbia, por exemplo, as transferências monetárias levaram a um aumento no uso de inputs agrícolas, particularmente entre famílias mais pequenas, e estimularam também uma mudança para a produção agrícola de maior valor (de mandioca para milho e arroz).120 6.42 Os programas que adoptem um modelo de obras públicas podem encorajar os investimentos produtivos. Conforme mencionado acima, as actividades de obras públicas podem contribuir para melhorar os terrenos agrícolas, através da construção de socalcos, e abertura ou reabilitação de estradas. Como exemplo, uma avaliação de 2008 das actividades do PNSP descobriu que estes investimentos tiveram retornos positivos na produtividade das famílias na agricultura, particularmente no que respeita aos solos e conservação da água, e na expansão nas posses de gado.121 6.43 Os programas de rede de segurança social podem mitigar os riscos associados à exploração de novas - e mais arriscadas - actividades económicas. As transferências monetárias providenciam uma forma de seguro social que permite aos pobres assumirem riscos na busca de actividades com maior valor acrescentado e rendimentos associados mais elevados.122 De facto, existem provas de casos na África do Sul de que as transferências monetárias financiam a migração e a busca de trabalho.123 Isto sugere que as transferências monetárias podem encorajar o fluxo de trabalho, como factor chave para a produtividade, para actividades mais produtivas, apoiando assim o crescimento económico. 118 Berhane, G., J. Hoddinott, N. Kumar, e A. Seyoum Taffesse. 2011. 119 Grosh et al., 2008. 120 PAD Senegal, 2014. 121 MA Consulting Group and Prospect Development Consult (2009). Impact Assistant of the PSNP Public Works Program. Vol. II, Main Report. Entregue ao Banco Mundial, Washington, DC e ao Governo da Etiópia, Adis Abeba; Lieuw-Kie-Song M. 2011. Integrating Public Works and Transfers in Ethiopia: Implications for Social Protection, Employment and Decent Work. IPC-IG/ILO Working Paper No. 84 Brasilia e Geneva, International Policy Centre for Inclusive Growth and International Labour Organization. 122 Hanlon, J., A. Barrientos, e D. Hulme (2013) Just Give Money to the Poor: The Development Revolution from the Global South. Kumarian Press. 123 Ardington, C., A. Case, e V. Hosegood (2009) “Labor Supply Responses to Large Social Transfers: Longitudinal Evidence from South Africa.” American Economic Journal: Applied Economics 1(1): 22–48. 153 6.44 Os programas de rede de segurança social (SSN) facilitariam as transacções monetárias fora do sistema de troca directa baseado no caju. Isto encorajaria novas formas de actividade económica, com uma produtividade potencialmente mais elevada. Na Guiné- Bissau, o principal bem de consumo, arroz, é frequentemente adquirido em troca com caju. Este sistema de troca directa é bem estabelecido mas é largamente limitado ao comércio de arroz por caju. A entrada em outras actividades económicas, incluindo a venda de fertilizantes, sementes, e outros tipos de bens de investimento ou até de consumo é desencorajada por um sistema de troca directa que é limitado a dois bens: caju e arroz (ver também o capítulo 9). O dinheiro por seu lado é fungível e amplia o mercado para incluir o comércio de todos os bens e serviços. A monetização da economia é por isso uma chave para libertar os mecanismos de mercado e permitir uma melhor ligação entre a oferta e procura, encorajando novas actividades económicas, e aumentando assim a produtividade da economia. As injecções de dinheiro sob os programas SSN tendem a ser relativamente pequenas, mas com o tempo podem contribuir para monetizar a economia. Efeitos multiplicadores e de derrame  O dinheiro adicional injectado nas economias locais aumenta o poder de compra dos consumidores, o que pode estimular as economias locais. Os programas de assistência social promovem o poder de compra dos beneficiários, aumentando o seu consumo de bens e serviços que vão desde alimentos, educação, saúde, bens produzidos localmente, assim como bens de outras regiões e países. Assim, as transferências monetárias têm um impacto indirecto na economia como um todo, particularmente agricultores locais e empresas que lucram do aumento da procura entre as famílias beneficiárias. No Gana, por exemplo, os receptores do programa LEAP utilizaram cerca de 80 por cento das suas transferências na economia local, o que libertou uma nova ronda de aumentos de rendimentos na comunidade. 6.45 Os multiplicadores para os programas de SSN indicam que o impacto geral destes programas na comunidade como um todo supera a quantidade de dinheiro transferido à família beneficiária.124 Os benefícios associados aos receptores secundários devem também ser tomados em consideração ao medir o impacto total das transferências monetárias nas comunidades. As famílias que não recebem transferências podem beneficiar dos efeitos mais amplos do programa, por exemplo, através dos salários gerados em parte por as despesas do beneficiários ou através de presentes entre famílias. Os mercados periódicos e as aquisições realizadas fora das aldeias mudam estes efeitos de rendimento para outras comunidades e, no longo prazo, uma vez que os programas de transferência sejam expandidos, as transferências podem ter efeitos directos e indirectos mais amplos. É por esta razão que as avaliações têm utilizado a abordagem de multiplicador para analisar o impacto dos programas de transferência monetária nos mercados locais. A análise do programa DECT no Malawi rural, por exemplo, estimou um multiplicador entre 2,02 e 2,45 nas comunidades afectadas.125 Embora se tratem de pequenos montantes, e portanto de dimensão limitada, estes impactos são importantes de se terem em conta. 6.46 Os programas de assistência social têm uma pouca probabilidade de resultar em inflação. A inflação na Guiné-Bissau é largamente importada e devido à forte política monetária do BCEAO, não tende a ser uma preocupação. As transferências de assistência social são relativamente pequenas, e por isso não há provas de que causem inflação.126 Finalmente, quando 124 Brewin, 2007. 125 Davies e Davey, 2008. 126 Bruni, L. e Eddy, M. (2012) Reversing the State: The Role of a Local Public Goods Transfer in Promoting Stability and Alleviating Poverty in South Sudan, Universidade de Harvard. 154 combinada com uma agenda de políticas mais vasta, a assistência social seria parte de um pacote de intervenções do lado da oferta e da procura, limitando assim o risco de inflação. 7. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS 6.47 Um programa de assistência social - que apoie o consumo dos pobres e vulneráveis enquanto fornece incentivos para investimentos mais vastos em capital humano - deve ser parte integrante da agenda de retoma. Existe uma vasta experiência regional e internacional que pode suportar o desenvolvimento de um programa na Guiné-Bissau e uma série de opções de concepção que podem ser afinadas para ter em conta o contexto específico do país. Este CEM sugere as seguintes recomendações de políticas para implementar um programa de assistência social na Guiné-Bissau:  Conduzir uma análise, diagnóstico e uma avaliação de necessidades para informar sobre as linhas mestras do programa, assim como a sua concepção. A escolha entre diferentes tipos de programas - transferências monetárias, transferências em espécie de bens alimentares, obras públicas de trabalho intensivo em troca de dinheiro, isenções de taxas - irá depender de uma série de elementos. A capacidade de implementação, estrutura da economia local, padrões de consumo, estado da infra-estrutura, natureza dos mercados, etc. todos têm um papel quando se selecciona o tipo de programa a implementar. Quando se selecciona um tipo de intervenção, será necessária uma análise profunda para definir os objectivos prioritários de tal programa, apontar aos grupos beneficiários, avaliar a capacidade de implementação actual e os gaps que possam necessitar de assistência técnica, assim como o custo das diferentes opções.  O estabelecimento de critérios e mecanismos de segmentação transparentes será vital. Independentemente do tipo de programa seleccionado, é crítico que se defina um mecanismo claro e transparente de segmentação para que se consiga atingir a população-alvo. De facto, este é um elemento crítico para a eficácia do programa e respectivo impacto na pobreza.127 Como é o caso para a escolha de programa, existem mecanismos alternativos para alcançar os beneficiários desejados, e a escolha última irá depender do objectivo do programa, assim como das condições locais. Outro dos elementos críticos é garantir a objectividade e transparência, no sentido de promover a responsabilização e limitar a corrupção.  Investir em mecanismos robustos operacionais e de monitorização. O desenvolvimento de um programa de assistência social exige investimentos em ferramentas e instrumentos utilizados para identificar beneficiários, organizar serviços, implementar pagamentos, etc. Adicionalmente, os mecanismos de responsabilização podem ajudar a garantir que o fluxo de fundos chega aos beneficiários desejados.  Conceber uma avaliação de impacto exaustiva. As experiências de outros países, destacadas neste capítulo, sugerem que os programas SSN podem aumentar substancialmente os rendimentos locais. No entanto, cada país é diferente e alguns dos efeitos esperados não vão materializar-se em determinados contextos ao invés de outros em que sim. Deve ser concebida uma avaliação de impacto exaustiva em conjunto com os programas SSN para medir o impacto do programa nos investimentos da família em capital físico e humano, produtividade, e derrames ou efeitos multiplicadores locais. Uma vez que os impactos de tais programas levam algum tempo a materializar-se, a avaliação de impacto deve ser conduzida regularmente. 127 PAD Senegal, 2014. 155 CAPÍTULO 7: COLHER A RIQUEZA DOS RECURSOS NATURAIS 1. INTRODUÇÃO 7.1 O grosso da riqueza da Guiné-Bissau encontra-se nos seus recursos naturais, especialmente recursos naturais renováveis. As metodologias de contabilização da riqueza sugerem que o total da riqueza natural na Guiné-Bissau pode atingir os US$ 3.874 per capita (Figura 72).128 Os recursos naturais renováveis correspondem a mais de 90 por cento desta riqueza, incluindo terras agrícolas (terras para colheita e pastagens), pescas, florestas (madeira, recursos florestais não madeireiros, carbono), e os habitats naturais e ecossistemas protegidos nos parques nacionais. Estes recursos providenciam uma série de bens e serviços, que contribuem directamente para o bem-estar dos cidadãos do país. O capital natural na Guiné-Bissau é a mais importante forma de capital (Figura 73). Figura 72: A Guiné-Bissau possuiu recursos renováveis Figura 73 ...que correspondem à maior quota do total e não renováveis consideráveis... da riqueza do país (US$ per capita, preços de 2010) (em percentagem do total da riqueza, 2010) Crop Land 90% Pasture 80% Capital Non-timer forest resources 70% Intangível 60% Fishing 50% Biodiversity 40% Capital Timber 30% Natural Phosphate 20% Carbon 10% Capital Activos 0% Produzido líquidos Bauxite no -10% estrangeir 0 500 1000 1500 2000 o -20% Fonte: Optimizing Guinea-Bissau’s Natural Wealth, 2014 Fonte: Optimizing Guinea-Bissau’s Natural Wealth, 2014 7.2 Os recursos naturais renováveis são essenciais para a subsistência das comunidades. A agricultura corresponde a mais de 80 por cento do emprego oficial - um número que pode ser ainda mais elevado em áreas rurais onde 56,5 por cento da população habita.129 O caju e o arroz são as principais colheitas, embora a horticultura esteja a aumentar e a criação de gado permaneça importante. O rendimento das famílias rurais e por isso a redução da pobreza está dependente das vendas das colheitas mais procuradas (caju e arroz) e na produtividade da agricultura de subsistência. Os ecossistemas diversos e largamente ricos do país dentro e fora de zonas protegidas providenciam múltiplos serviços (alimentos, água, abrigos, rendimento, resiliência à mudança climática) e são críticos para as estratégias de sobrevivência dos membros mais pobres da sociedade, assim como para a prosperidade futura do país. De forma semelhante, as florestas do país providenciam serviços ecológicos valiosos, tais como a manutenção do ciclo hidrológico, preservação da qualidade do solo, protecção contra a erosão, e servem também como almofada contra desertificação, absorvente de carbono e refúgio para a biodiversidade. As florestas de 128 Ver “The Changing Wealth of Nations ”, 2011, Banco Mundial, para um resumo das metodologias utilizadas para calcular a riqueza natural. 129 Dados do ILAP II. 156 mangue são particularmente ricas em recursos, providenciando às aldeias uma importante defesa contra inundações dos níveis crescentes oceano e actuando como um terreno essencial para a reprodução e crescimento para o stock pesqueiro do país. Estes stocks de pesca providenciam uma fonte alternativa de rendimentos para muitos habitantes das zonas costeiras, especialmente do género feminino. 7.3 Colher a riqueza de recursos naturais pode também apoiar o Governo no aumento do capital intangível e produzido pelo país. O capital intangível (e.g. educação e saúde) e produzido (e.g. infra-estrutura) é relativamente pequeno na Guiné-Bissau, o que converge com as conclusões de capítulos anteriores que apontam a défices significativos nestas áreas. A riqueza natural pode ser transformada em outras formas de capital, por exemplo explorando o potencial mineiro do país e investindo as receitas em capital humano e físico. No entanto, a riqueza natural, especialmente de recursos renováveis pode também gerar um fluxo constante de rendimentos. Investir nesses rendimentos ou em outras formas de riqueza nacional aumenta a base para a geração de rendimentos - um investimento em prosperidade futura. É responsabilidade do Governo capturar as receitas da riqueza natural e investir estes fundos de forma sensata para crescer o capital do país, o que irá eventualmente permitir aos seus cidadãos escapar da pobreza e embarcar num caminho em direcção a uma prosperidade maior e partilhada. 7.4 Este capítulo irá olhar ao papel que a riqueza natural desempenha na Guiné-Bissau. Irá explorar como é que a riqueza natural enquadra a actividade económica do país, colocando o cenário para os capítulos seguintes da Parte II deste CEM. Irá também considerar a receita que pode ser gerada por parte da riqueza natural, que o Governo poderá utilizar para apoiar o desenvolvimento do país. As últimas secções vão explorar como é que a riqueza natural deve ser gerida para gerar um efeito máximo e irá concluir com algumas implicações nas políticas. 2. RIQUEZA NATURAL E ACTIVIDADE ECONÓMICA 7.5 Os capítulos cobertos na Parte II deste CEM ilustram as oportunidades que a riqueza natural imensa da Guiné-Bissau representa. Os sectores baseados em recursos naturais são os factores motores do crescimento e são os maiores empregadores da Guiné-Bissau. Eles têm até o potencial de contribuir ainda mais para a economia, ajudando a tirar as pessoas da pobreza. A agricultura, especialmente o cultivo do caju e arroz, é o sector dominante do país. A agricultura é praticada pela maioria dos Guineenses e é uma forma de rendimento, especialmente de caju (capítulo 8), e alimentos como arroz (capítulo 9). Em conjunto com as pescas (capítulo 10), estes sectores correspondem a 49 por cento do PIB e empregam perto de 80 por cento da força laboral. As exportações minerais e o aumento da actividade em cidades baseadas em recursos minerais são uma nova e importante fonte de crescimento (capítulo 11). O turismo, embora ainda na sua fase de infância, tem o potencial de alavancar o sector de serviços, particularmente turismo baseado na natureza (capítulo 12). 7.6 Este CEM foca-se em sectores com o maior potencial para o crescimento e emprego. A lista não é exaustiva. A horticultura, por exemplo, oferece oportunidades de aumento de produtividade no sector da agricultura. O sector pouco divulgado da horticultura oferece aos habitantes do meio rural uma fonte alternativa de rendimentos. As margens de lucro sob os frutos tropicais podem ser mais elevadas do que para bens alimentares tradicionais.130 As mangas são um fruto particular que se pode tornar uma exportação da Guiné-Bissau. Um grande número de agricultores de subsistência e agricultores mais modernos estão familiarizados com o cultivo de Maertens, M. e E. Verhofstadt. 2013. “Horticultural Exports, Female Wage Employment and 130 E.g. Primary School Enrolment: Theory and Evidence from Senegal.” Food Policy 43: 118-231. 157 mangas, incluindo enxertia e outras práticas que são necessárias para aumentar a produção de mangas e atender aos requisitos de qualidade dos mercados externos. Os países vizinhos (e.g. Mali e Burkina Faso que têm condições climatéricas inferiores às da Guiné-Bissau, e a Costa do Marfim, cujas condições são semelhantes) já estão a exportar mangas para a Europa. A diversificação das fontes de rendimento associadas à agricultura diversificaria o risco dos agricultores ao não dependerem somente do caju. A melhoria na produtividade da agricultura pode também abrir tempo e criar os recursos para que os agricultores entrem em outras actividades económicas tais como empresas rurais, uma tendência vista na China no seguimento das reformas agrícolas do período entre 1970-89. 7.7 A criação de gado tem também potencial económico. Conforme a Figura 72 ilustra, os terrenos de pasto são o segundo maior activo natural do país. De facto, a Guiné-Bissau tem cerca de 1,3 milhões de cabeças de gado - 305.000 ovelhas, 646.000 cabras, e 330.000 porcos - e o subsector de criação de gado ou pecuária pode desempenhar um papel importante no complemento à produção agrícola. No entanto o subsector de criação de gado é extremamente subdesenvolvido em termos de produção total, produtividade marginal e capacidade de processamento. No caso do gado bovino, as mesmas espécies são utilizadas para produzir leite e carne, rendendo em média cerca de ½ a 1 litro de leite por dia, por vaca, e um rendimento de 48 por cento da carcaça para efeitos de carne, com os animais a demorarem até 5 anos para alcançarem um peso vivo de 200 kg. Em termos de instalações de processamento, Bissau tem um matadouro, que processa entre 20 a 30 cabeças de gado/dia (cerca de 100 durante o período de festival) e não preenche as condições mínimas sanitárias. Cerca de 60 por cento dos animais massacrados são provenientes da vizinha Guiné-Conacri, não da Guiné-Bissau, e o país importa carne, leite, e outros produtos derivados de leite. Existe a necessidade de mais análises económicas do sector, mas para explorar a riqueza natural - renovável - da terra de pastagem, o gado terá provavelmente um potencial económico considerável. 7.8 As florestas do país têm potencial para a produção de madeira. No entanto, esta área também necessita de análises adicionais. As florestas representam uma oportunidade significativa para a geração de rendimentos para o Governo e são uma importante fonte de rendimentos e recursos para os pobres do país. A madeira do país tem uma elevada procura entre os compradores internacionais. As provas emergentes sobre a extracção ilegal de madeira sugerem que esta procura está a ser correspondida sem o devido respeito por as leis e regulamentações do país (Caixa 10: Travar a pilhagem das florestas da Guiné-Bissau). As rendas económicas deste sector não estão a ser devidamente capturadas e, mais preocupante, a madeira está a deixar o país na forma bruta (actividade ilegal) ao invés de ser processada por serrarias nacionais. A Guiné-Bissau está por isso a perder três tipos de rendimentos. Primeiro, a extracção de madeira permite taxas, que autorizam as actividades de extracção legal; segundo, as rendas económicas de produtos baseados na madeira, que não estão actualmente a ser manufacturadas domesticamente; e terceiro, rendimentos associados a receitas orçamentais. O sector das florestas é também de importância crítica para a subsistência e biodiversidade locais, ambas as quais são ameaçadas por a perda de florestas e degradação que surge das técnicas maioritariamente ilegais e não selectivas de abate. Os recursos florestais além da madeira providenciam inter alia alimentos, medicamentos, materiais de construção, abrigos, e combustíveis. O combustível, madeira, e carvão, conjuntamente com a biomassa agrícola, compõem 80 por cento do consumo de energia do país; os mais pobres gastam 15 a 20 por cento do seu rendimento somente em energia. A nível de subsistência, a colecta de combustíveis, principalmente por mulheres, absorve uma quantidade considerável de tempo e esforço. A gestão melhorada e sustentável da floresta poderia então trazer múltiplos benefícios, assim como potencialmente libertar tempo e energia entre os pobres rurais para a diversificação em oportunidades alternativas de geração de rendimento. 158 Caixa 10: Travar a pilhagem das florestas da Guiné-Bissau A madeira é um importante recurso natural da Guiné-Bissau. As florestas nacionais são de importância crucial para os pobres. As estimativas do Banco Mundial indicam que os recursos de madeira podem constituir até US$ 304 per capita em termos de contabilização da riqueza, tornando-os o terceiro ou quarto recurso natural da Guiné-Bissau. Em combinação com outros recursos florestais, o valor é cerca do dobro da dimensão. Os recursos florestais são importantes para as comunidades locais, providenciam lenha para fogueiras, materiais de construção e produtos não madeireiros incluindo plantas medicinais e uma das poucas fontes de proteínas para as famílias pobres que caçam animais que habitam nas florestas. As florestas também providenciam um refúgio para biodiversidade de forma mais ampla, assim como múltiplos serviços de ecossistema, incluindo o aumento da resiliência à mudança climática. A madeira pode também ser uma importante fonte de rendimentos. Se for gerida de forma sustentável, a madeira pode ser recolhida e processada para fabricar mobiliário ou outros bens de consumo. Para encontrar um equilíbrio entre a preservação das florestas, protecção das comunidades locais, e corte de árvores, está em curso um regime de licenciamento que governa a colecta de madeira, e que inclui a exigência de avaliações ambientais e potenciais replantações. A madeira é também uma mercadoria valorizada no estrangeiro. A pobreza e a má governação têm resultado no aumento da extracção e exportação ilegal de madeira. A madeira da Guiné-Bissau, especialmente pau-sangue, é procurada em mercados internacionais, especialmente na China que tem importado toros - e alguma madeira serrada - do país (Caixa Figura 4). Na sequência do golpe militar de 2012, a governação deteriorou, enfraquecendo também os mecanismos de aplicação o regime de licenciamento da madeira. Isto resultou no aumento da extracção ilegal de madeira. De acordo com a GlobalTimber.org.uk, uma ONG, a importação Chinesa de troncos da Guiné-Bissau aumentou em cerca 70 por cento em 2013 e acelerou dramaticamente na primeira metade de 2014. O desespero entre os pobres como consequência das más colheitas de caju em 2012 e 2013 e também a insegurança alimentar crescente - assim como incidentes relatados de subornos e intimidação por parte de madeireiros a forças de segurança nacional - providenciam um apoio adicional à extracção ilegal de madeira. De acordo com o IRIN, os madeireiros pagaram a aldeões locais entre US$ 2-6 para cortar uma árvore em 2013, comparado com cerca de dois cêntimos de US$ por kg de caju não processado; um contentor cheio de madeira foi vendido por um valor duas a três vezes superior ao valor de um contentor cheio de caju. Há também relatos de estrangeiros de países vizinhos a participar na extracção ilegal de madeira na Guiné-Bissau. A extracção ilegal destrói o capital natural e tem um efeito negativo duradouro na subsistência dos pobres. Os incentivos aos mais pobres para apoiarem a extracção ilegal de madeira providenciaram algum rendimento de curto prazo - em épocas de desespero - mas colocaram a subsistência de longo prazo em causa ao destruir os habitats naturais, com efeitos concomitantes na função do ecossistema e resiliência à mudança climática. Isto não afecta apenas a nutrição, saúde e disponibilidade de lenha para fogueiras e material de construção, como também os futuros fluxos de rendimento que poderiam advir das florestas: embora a madeira seja um recurso renovável, uma das espécies mais visadas Pterocarpus erinaceus, também conhecida como pau-sangue, leva cerca de 50 anos, o equivalente a duas gerações, para amadurecer. É crucial parar a extracção e exportação ilegal de madeira. Isto requer o fortalecimento do Estado. No papel, a Guiné-Bissau tem um regime adequado que governa a extracção e exportação de madeira. No entanto, este regime necessita de ser reforçado. O governo recém-eleito já tomou medidas no sentido certo ao suspender a exportação de madeira em Julho de 2014. Esta decisão foi motivada em parte por uma priorização das exportações do caju que começaram a ter concorrência das exportações de madeira. A aplicação mais forte das leis no porto e nas fronteiras terrestres é 159 uma das formas através das quais o Governo pode impor a proibição sobre madeira não processada, que provavelmente adveio de actividades de extracção ilegal. Adicionalmente, a Direcção Geral de Florestas e Fauna, assim como os oficiais de controlo de fronteiras, necessitam de um reforço adicional para aplicar o licenciamento das actividades de extracção de madeira com mais rigor e integridade. Um Estado mais forte, que aplique as suas leis através do licenciamento e vigilância contínua, conseguirá parar a pilhagem dos recursos da Guiné-Bissau. Caixa Figura 4: As exportações de madeira da Guiné-Bissau são dominadas por toros não processados. Fonte: GlobalTimber.org.uk, com base em dados relatados pelos países importadores. Fontes: IRIN, GlobalTimber.org.uk, e Banco Mundial. 3. RIQUEZA NATURAL E RECEITA DO GOVERNO 7.9 Se geridos de uma forma Figura 74: Receitas das pescas e vendas de caju sustentável, os activos naturais podem (percentagem do total das receitas do Governo) gerar fluxos de receita pública consideráveis. A somar ao fornecimento 100 de múltiplos bens e serviços associados 90 ao ecossistema, essenciais para 80 subsistência dos pobres e que sustentam 70 as oportunidades de rendimento local, os 60 bens e serviços suportados nos recursos 50 naturais do país podem apoiar as finanças 40 governamentais. As exportações de 30 produtos da agricultura são uma fonte 20 necessária de divisas internacionais. São 10 também uma fonte importante de receita governamental, atingindo em média 10- 0 2009-2011 2012-2013 15 por cento em anos recentes. As licenças de pescas, em média, Fishing licences Taxes on cashew Other domestic revenue corresponderam a 15,5 por cento da Fonte: Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial. receita governamental entre 2009 e 2011 (reduzindo para apenas 4,9 por cento em 2012-2013 na sequência do golpe militar de 2012). Este 160 fluxo de rendimentos poderia ser ainda mais elevado se as taxas de licenciamento fossem aumentadas para reflectir a capacidade de captura dos navios estrangeiros que entram nas águas da Guiné-Bissau. As áreas florestais e protegidas não contribuem para as finanças governamentais actualmente. A melhoria na governação das florestas e na colecta de impostos poderia resultar num aumento da receita de impostos provenientes da venda de madeira e de produtos relacionados com a madeira. Adicionalmente, as florestas têm o potencial de providenciar ao país créditos de carbono para vender nos mercados internacionais de carbono. Os sistemas nacional de áreas protegidas e a Reserva da Biosfera do Arquipélago Bolama Bijagós também apresentam um potencial significante de recursos económicos indirectamente através da sua contribuição para a protecção de ecossistemas produtivos, e também directamente através do seu potencial para trazer receitas baseadas no turismo de natureza. 7.10 Diversos recursos naturais renováveis da Guiné-Bissau trazem também benefícios regionais e globais, o que pode também atrair alguma forma de rendimento. A nível regional, os manguezais da Guiné-Bissau são um importante berçário e zona de desenvolvimento para a maioria dos peixes ao largo da costa ocidental de África. A disrupção deste sistema poderia afectar a região como um todo. A nível global, o país é o lar de várias biodiversidades e ecossistemas raros e em vias de extinção, incluindo florestas. O “carbono azul” que se encontra preso nas florestas manguezais é particularmente importante. Estes benefícios são reconhecidos e valorizados pela comunidade internacional. Existem uma variedade de mecanismos de financiamento internacionais especificamente para providenciar apoio financeiro a países que administram estes recursos regionais e globais (por exemplo GEF, FFEM, LDCF, Fundo de Adaptação, CDM, FCPF e outros).131 A importância da capacidade da Guiné-Bissau de gerir estes recursos é reconhecida na comunidade internacional, e reflectida no aumento de recursos financeiros especificamente alocados para a gestão destes recursos globalmente valorizados e em vias de extinção. A somar aos mecanismos internacionais de financiamento, os mercados emergentes internacionais, tais como o do carbono, também apresentam oportunidades para a geração de receitas. A Guiné-Bissau encontra-se actualmente a desenvolver o seu primeiro projecto de Emissões Reduzidas da Desflorestação e Degradação da Floresta (REDD) em duas zonas costeiras protegidas, Cacheu e Cantanhez. Este projecto inovador pretende vender créditos de “carbono azul” nos mercados voluntários internacionais, utilizando as receitas para reforçar o Governo local e os esforços das comunidades locais para conservar e utilizar de forma sustentável estes recursos. Ao proceder desta forma, as florestas não só vão continuar a providenciar os múltiplos bens e serviços associados mas também vão gerar receitas para os cofres governamentais e providenciar um fluxo de receitas para os stakeholders locais, contribuindo directamente para o alívio da pobreza e para a prosperidade partilhada. 7.11 Os recursos naturais não renováveis do país, embora não actualmente explorados, podem providenciar ao Governo outra fonte de rendimentos. O fosfato e a bauxite não estão ainda minados nos solos da Guiné-Bissau. Ao largo nas águas costeiras as zonas petrolíferas relativamente grandes estão ainda à espera de ser exploradas (ver capítulo 11). Os preços das mercadorias em crescendo estão a ajudar a tornar os minerais da Guiné-Bissau mais atractivos a investidores estrangeiros. Apesar da má infra-estrutura (estradas de acesso, electricidade, água) as companhias de mineração estão a sondar o país e a contactar o Governo para futuras possibilidades de investimentos. As oportunidades são vastas, assim como os riscos. Se geridos da forma correcta, os dividendos dos minerais podem ser capturados e transferidos para a população, 131 Instrumento Global para o Ambiente (Global Environment Facility (GEF); Fonds Français pour l’Environnement Mondial (FFEM), acrónimo francês; Fundo dos Países Menos Desenvolvidos (LDCF); Adaptation Fund; Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (CDM); Instrumento de Parceira para o Carbono de Florestas (FCPF). 161 providenciando um rendimento transformacional para arrancar com o crescimento (ver capítulos 4, 5 e 11). As rendas de minerais podem também ser canalizadas para um fundo pré-desenhado para o investimento em outras formas de capital (infra-estruturas, educação, saúde e gestão ambiental). Estas medidas podem ajudar a garantir a criação líquida de riqueza para a geração actual e futura. A má gestão ou gestão negligente podem no entanto causar que importantes áreas locais sejam afectadas adversamente por danos ambientais e uma quebra da coesão social. 4. GESTÃO DOS RISCOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 7.12 A preservação da riqueza natural do país é essencial para o crescimento, empregos, redução da pobreza e prosperidade partilhada. A gestão dos recursos naturais encontra-se numa encruzilhada crítica. A Guiné-Bissau é relativamente única na medida em que se encontra entre os últimos países da África Ocidental onde o desenvolvimento tem tido um impacto limitado no ambiente. Pode ser um dos únicos poucos países que conseguirá evitar a “Curva de Kuznets” ambiental, frequentemente reflectida no mote “crescer agora, limpar depois”. No entanto, o cenário está a mudar. Os recursos da Guiné-Bissau estão sob ameaça, e consequentemente também a subsistência das pessoas e dos factores de crescimento económico do país. O investimento na gestão de recursos naturais é essencial se os activos naturais do país são para ser preservados para continuarem a contribuir para o crescimento económico. Gestão dos recursos renováveis 7.13 As instituições existentes para a gestão dos recursos naturais não têm recursos suficientes e têm constrangimentos severos a nível de capacidades. O Governo está ciente da importância dos recursos naturais do país e implementou uma série de instituições e agências para supervisionar a gestão destes recursos. Desde o início da década de 1990, desenvolveram-se uma série de planos e visões para proteger e promover o uso sustentável do ambiente natural. Mais recentemente, uma rede de cinco parques nacionais costeiros e uma área protegida de comunidade (Urok) foram estabelecidas para preservar a biodiversidade rica do país e as vivências rurais. O estabelecimento de um complexo adicional de zona terrestre protegida está em curso. Estas iniciativas são bem colocadas, mas não bem financiadas. A canalização de recursos escassos para a gestão das pescas, madeira e biodiversidade pode ser difícil para o Governo justificar no curto prazo quando diversas outras áreas estão em competição por recursos públicos. No entanto, no médio e longo prazo, o investimento na gestão dos recursos pode resultar em rendas económicas e receitas mais elevadas. 7.14 Enquanto Estado frágil, os fluxos de ajuda têm variado bastante, tornando a orçamentação para a gestão de recursos - que depende de donativos oficiais - difícil. Este desafio já está a ser sentido nas agências estabelecidas para gerir as áreas protegidas do país. A conservação da biodiversidade e habitats naturais críticos não é um esforço pontual mas antes algo que deverá ser sustentado ao longo do tempo. O acesso a um fluxo sustentável e estável de fundos é essencial para planear e executar a conservação da biodiversidade e actividades de gestão dos parques. Actualmente, os principais esforços do país mantêm-se dependentes de financiamentos externos associados a projectos com datas de encerramento, e com a alocação de fundos a ser liderada por doadores ao invés das prioridades locais. Isto torna os ganhos de conservação de biodiversidade e habitats ao longo dos últimos 14 anos vulneráveis a recuos. Coloca também em risco as oportunidades para desenvolver uma indústria de turismo baseada na natureza, que poderia favorecer a criação de empregos e de fluxos de receitas. Vão ser implementados esforços para operacionalizar e capitalizar um trust fund de conservação, a Fundação BioGuinea, como forma de garantir os fluxos mínimos necessários. A dotação deste fundo não foi ainda capitalizada. 7.15 A fraca capacidade do país para gerir os seus recursos naturais está a ser explorada, particularmente nas florestas e pescas. O corte indiscriminado de florestas para extrair as 162 espécies valiosas que restam tem resultado na perda de riqueza natural valiosa e em dados significativos no ecossistema da floresta. Isto tem tido um efeito adverso nos meios de subsistência locais, conservação de espécies e serviços associados aos ecossistemas. No sector das pescas, a fraca capacidade institucional para seguir e aplicar os acordos de pescas está a minar a capacidade do país de gerir os seus stocks pesqueiros. A pesca ilegal é comum, com algumas espécies em particular a ficar sob ameaça. 7.16 A nível doméstico, algumas práticas agrícolas e florestais estão a ameaçar os ecossistemas locais. As técnicas de corte e queima, e de pastoreio excessivo do gado não são incomuns e a expansão para novas áreas podem levar à degradação dos terrenos e fragmentação dos habitats. A expansão rápida das áreas de plantação do caju, e a certa larga medida o impacto cumulativo das tentativas dos pequenos agricultores de aumentar o seu rendimento, estão também a desalojar os ecossistemas naturais das florestas e os sistemas agrícolas tradicionais. Adicionalmente, o surgimento da monocultura do caju não ameaça apenas a integridade do ecossistema mas também aumenta a vulnerabilidade nacional económica no caso de uma peste ou surto de doença. O estado precário da infra-estrutura de energia do país tem aumentado a dependência de combustíveis básicos como o carvão. A desflorestação é uma fonte de iluminação, e a cozinha com lenha está a começar a ter um efeito desestabilizador nas florestas do país, em simultâneo com o aumento de doenças respiratórias devido à poluição aérea dentro de portas. Em áreas menos rurais, a geração de energia eléctrica está também a dar azo a preocupações ambientais (ver o capítulo 3). 7.17 A mudança climática adiciona uma pressão extra na necessidade de preservar os habitats naturais. As zonas costeiras rasas do país são altamente vulneráveis ao aumento dos níveis dos oceanos. Estas áreas albergam aproximadamente 80 por cento da população e uma boa parte da pouca infra-estrutura existente do país. Os riscos crescentes de inundação e erosão costeira podem levar ao desaparecimento de reservas de biodiversidade e terrenos agrícolas nos quais a economia local é baseada. A Guiné-Bissau é também altamente vulnerável a mudanças nos padrões de chuvas. O recente NAPA (2011) identifica a redução das chuvas em 11,7 por cento até 2100 como um dos riscos climáticos mais sérios enfrentados no país. Prevê-se que a crescente irregularidade da pluviosidade e o aumento previsto de 1,95ºC resultem em agricultura com menos produtividade e na degradação dos solos devido à evapotranspiração. A mudança do clima do país realça a elevada vulnerabilidade da Guiné-Bissau e sublinha a necessidade urgente do Governo colocar as questões de mudanças climáticas nos planos desenvolvimento locais e nacionais. Gestão baseada em minerais 7.18 A governação e capacidade de gerar rendas dos minerais é também fraca. As experiências em outros países demonstram que a extracção de recursos pode levar a uma degradação significativa do ambiente local, para detrimento das populações locais. Os pobres são os mais vulneráveis à má gestão das riquezas naturais do país, uma vez que são directamente dependentes dos recursos naturais para a subsistência diária. Com este facto em mente, deve ser desenvolvida uma infra-estrutura legal para proteger o ambiente e as comunidades locais que podem ser afectadas por interesses mineiros na Guiné-Bissau. A capacidade para aplicar estas leis e regulamentações é no entanto fraca. Em 2008, por exemplo, a Bauxite Angola requalificou parte de uma estrada existente que atravessava o parque nacional de Cufada (alargamento e melhoria), além de limpar 113 hectares de terreno para permitir um porto maior. Não foram efectuadas avaliações de impacto ambiental a respeito da construção, e os pedidos para cessar os desenvolvimentos por parte do Instituto de Biodiversidade e Áreas Protegidas (IBAP) não foram respeitados. Desde estes eventos, os constrangimentos de capacidades e recursos têm continuado e as preocupações locais subsistem de que as obras vão ser resumidas sem as salvaguardas necessárias implementadas. 163 7.19 As instituições que gerem os minerais devem ser capacitadas antes do início das extracções. Os activos de subsolo da Guiné-Bissau podem produzir rendas económicas que podem ser investidas em outras formas de riqueza ou directamente transferidas para aumentar os rendimentos dos membros mais pobre da sociedade, motivando o crescimento através de uma maior prosperidade partilhada. No entanto, se as salvaguardas para a governação adequada não forem colocadas, o crescimento sustentável não irá surgir. A nível macroeconómico, é necessário uma disposição de governação para gerir os fluxos de recursos - para reduzir a volatilidade de rendas dos recursos, e para prevenir a apreciação da taxa real de câmbio. Um forte impulso em direcção a compromissos de transparência tais como a Iniciativa para a Transparência das Indústrias Extractivas (EITI) podem ajudar a promover a extracção mineral e criar incentivos para o Governo gerir os recursos em benefícios das comunidades locais e interesses nacionais em simultâneo. 5. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS 7.20 Não será possível maximizar as rendas de recursos naturais em todos os sectores; devem ser realizados alguns trade-offs importantes. Existem três grandes áreas onde se podem identificar trade-offs:  Extracção mineral e biodiversidade. A extracção mineral e de petróleo, a somar à construção e operação das infra-estruturas associadas, irá causar stress significativo em pelo menos duas áreas protegidas nacionais e respectivos corredores de vida selvagem. De forma similar, a Reserva da Biosfera Arquipélago Bolama Bijagós, uma arma essencial do arsenal de turismo do país, situa-se na área de futura exploração de petróleo.  Produção de arroz e florestas manguezais. As políticas para promover a expansão das terras baixas e de cultivo de arroz, com o objectivo de melhorar a produtividade agrícola e melhorar a segurança alimentar, podem aportar um custo às florestas manguezais. Isto por sua vez teria um impacto negativo nas áreas de reprodução e berçário dos peixes, assim como na resiliência à mudança climática.  Créditos de carbono e rendas da madeira. A recente preparação para um projecto de REDD poderá trazer numerosos benefícios incluindo sequestro de carbono e acesso a receitas de créditos de carbono; melhoria na gestão das florestas; e produtos diversificados não associados à madeira além de serviços associados a ecossistemas. No entanto as políticas do REDD vão também provavelmente impor restrições às actividades de extracção de madeira e assim reduzir as receitas provenientes dessa actividade. Os meios de subsistência local dependem do carvão como uma fonte de calor e para cozinhar, e podem por isso ser afectados. 7.21 Existe também um trade-off entre os custos imediatos e os retornos futuros sustentáveis. O investimento em instituições e gestão de recursos tem um custo imediato - tanto financeiro como humano. Num ambiente constrangido em termos de recursos, isto pode ser difícil de justificar, especialmente se os retornos do investimento não se materializarem até uma data futura. Esta tensão é amplificada num Estado frágil onde a governação é débil e a transparência é escassa. O envolvimento dos cidadãos é por isso essencial para que os governantes possam entender as preocupações locais. É necessário argumentar uma lógica e um caso a favor do investimento em gestão de recursos naturais. Com base no potencial da riqueza natural do país para gerar receitas significativas, crescimento, e oportunidades de emprego, este não deverá ser um caso difícil de se defender. Os trade-offs são inevitáveis. Os governantes devem ter em conta o equilíbrio da sustentabilidade, composto por considerações económicas, sociais e ambientais. É necessário um planeamento nacional cuidadoso para optimizar o uso dos recursos naturais, especialmente quando as decisões são difíceis de reverter, por exemplo, porque o recurso é não renovável. 164 7.22 Para fortalecer a capacidade do Governo e dos utilizadores dos recursos para avaliar estes tipos de trade-offs e tomar decisões informadas sobre a gestão dos recursos de riqueza natural nos níveis nacional e local, existe a necessidade de se reforçar a base de conhecimento, governação e de tomada de decisões. A prioridade deve ser dada ao sector das pescas, florestas e minerais, todos os quais apresentam oportunidades económicas imediatas consideráveis se forem bem geridos, e para os quais as repercussões potenciais económicas, sociais e ambientais da má gestão são significantes. É também importante garantir os esforços de preservação em curso do Sistema Nacional de Áreas Protegidas se os serviços associados aos ecossistemas e oportunidades económicas apresentadas na área do turismo são para ser preservadas no futuro.  No curto prazo, os esforços devem focar-se em (i) melhor entendimento e seguimento da dinâmica que afecta os recursos para permitir uma tomada de decisão mais informada e (ii) fortalecer a capacidade de governação. Isto também se reflecte nas prioridades estabelecidas no Programa de Estabilização e Crescimento do Governo elaborado em 2014. Existe uma necessidade de rever, actualizar, e disseminar o quadro legislativo (conforme necessário); fortalecer as instituições responsáveis por aplicação das normas; e aumentar a transparência e informação da tomada de decisões. As abordagens devem incluir não só o reforço das agências governamentais responsáveis, mas também o aumento da transparência e das parcerias com a sociedade civil.  No médio a longo prazo, o Governo deve integrar abordagens de contabilização dos recursos naturais nos seus sistemas de planificação e gestão financeira. Ao proceder dessa forma, os custos e benefícios da exploração dos recursos naturais e de decisões de gestão irão tornar-se mais explícitos, e os verdadeiros ganhos/perdas na riqueza do país podem ser rastreados e geridos.  Por fim, à luz das ameaças presentes na mudança climática mundial, existe uma necessidade de incluir os riscos de mudanças climática no planeamento e tomadas de decisão. A resiliência à mudança climática pode ser aumentada através da capitalização da infra-estrutura “verde” do país (e.g. biodiversidade, floresta, agro-ecossistemas) assim como garantindo que os futuros investimentos de capital são resilientes ao clima (e.g. portos, estradas, etc.) para reduzir os riscos sociais e físicos associados aos choques externos. 165 PARTE II: ARRANCAR OS MOTORES DO CRESCIMENTO 166 CAPÍTULO 8: CAJU - SUBIR NA CADEIA DE VALOR 1. INTRODUÇÃO 8.1 O sector do caju é o sector agrícola mais importante da Guiné-Bissau, e tem um papel determinante na economia do país. O caju ocupa cerca de 50 por cento da área sob cultivo e é plantado principalmente por pequenos agricultores que plantam uma média de 2 a 3 hectares de terreno. O caju corresponde a cerca de um terço da média de rendimentos na maioria das áreas do país. Durante muitos anos, a exportação de castanhas de caju foi responsável por mais de 90 por cento das receitas de exportação da Guiné-Bissau. 8.2 Dois desafios são agora de relevância primordial na perspectiva do crescimento da dimensão da cadeia de valor do caju e correspondente redução da pobreza:  Os agricultores estão “encurralados” num ambiente de baixo rendimento e poucas oportunidades constrangidos no acesso a melhores desfechos económicos. Os produtores dependem largamente de uma venda anual de caju para satisfazer as suas necessidades, e na altura da colheita vendem 3 kg de caju por 1 kg de arroz para alimentar as suas famílias.  A maioria da colheita de caju da Guiné-Bissau é exportada em forma não processada, principalmente para a Índia e Vietname. Existe uma pequena capacidade instalada de processamento de 13 por cento da produção. Isto traduz-se em substanciais perdas de receita. Ao exportar de caju não processado, a Guiné-Bissau está: (i) numa posição de dependência vis-à-vis os dois principais compradores; e (ii) está a privar-se do valor acrescentado e empregos criados na indústria de processamento. As castanhas de caju em bruto (CCC) são vendidas por US$ 0,5 por kg, ao invés que quando processadas e embaladas num saco de plástico podem atingir um preço de US$ 7 por kg. Cerca de três toneladas de CCC processadas por ano representariam três novos postos de trabalho. 8.3 Enfrentar estas questões irá ajudar a reduzir a pobreza extrema aumentando em simultâneo a participação da Guiné-Bissau no mercado mundial. A reposta a estes desafios requer a resolução de constrangimentos severos para os produtores de caju e potenciais processadores. Estes constrangimentos incluem: (i) Questões de informação. Os agricultores de subsistência (80 por cento da produção) seguem práticas de criação fracas. Como resultados, a produtividade encontra-se abaixo do seu nível potencial. A informação sobre os preços também flui de forma imperfeita nas comunidades rurais. (ii) Poder negocial limitado. Na ausência de uma melhor organização das comunidades rurais, os produtores têm um poder negocial limitado na época das colheitas, o que combinado com outras disrupções que impactam no fluxo de informações, tem impactos consideráveis nos rendimentos. (iii) Constrangimentos de capital. Os produtores e os potenciais processadores deparam-se com restrições de capital na expansão dos seus negócios. A compra do CCC envolve o desembolso de um capital substancial num curto período de tempo. Isto pode impedir a entrada de novas empresas, tendo em conta a ausência de mercados de capital com um bom funcionamento. (iv) Questões de coordenação. Uma vez que os pequenos proprietários individuais não têm os meios financeiros e técnicos para apoiar a coordenação entre os produtores locais, o sector não se encontra bem organizado e acaba por ser orientado pelos compradores. 167 (v) Política de Disrupção As intervenções anteriores do Governo - notavelmente a instabilidade em políticas como a estratégia do sector, preços de referência, e impostos - têm reduzido a probabilidade de investir no sector. Isto num país que já sofreu o impacto severo da instabilidade política. 8.4 O caju processado implica um valor acrescentado mais elevado se for efectuado de forma eficiente, e pode gerar um número substancial de empregos em simultâneo com a expansão da base industrial. Conforme o capítulo 3 argumentou, o caju é o impulsionador do crescimento mas é importante que suba na cadeia de valor. Esta actividade poderia impulsionar o crescimento equitativo e partilhado, isto se os interesses dos agricultores forem protegidos, e desenvolver a economia de uma base de produção de matérias-primas para uma base com mais oportunidades ao longo da cadeia de valor. Existe um potencial considerável para o processamento na Guiné-Bissau, mas há também importantes desafios e riscos. Este capítulo providencia um resumo dos principais tópicos e constrangimentos e providencia recomendações de políticas que podem apoiar o processamento da castanha de caju no país.132Providencia também recomendações sobre os mecanismos de melhoria da produtividade dos agricultores de caju, assim como para aumentar o poder de diversificação e negocial destes. 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO 8.5 As exportações de caju têm crescido rapidamente. As exportações têm crescido a quase 6 por cento por ano de 1994 até 2013 (Figura 75). Este aumento nas exportações tem sido motivado por produção adicional, largamente devido às áreas sob cultivo em expansão. Embora a vasta maioria do caju seja transportado através do porto de Bissau, algum é vendido nas fronteiras domésticas - frequentemente de forma ilegal através de contrabando para evitar a tributação doméstica. 8.6 As castanhas de caju têm requisitos de produção extremamente reduzidos, mas as árvores na Guiné-Bissau estão em processo de envelhecimento, o que irá impactar na produtividade. O investimento na melhoria de inputs ou irrigação são escassos tendo em conta as características da variedade local. Os pomares actuais de cajueiros são de natureza selvagem, os agricultores não tratam de podar as árvores. Com o envelhecimento, as árvores tornam-se menos produtivas devido ao entrelaçamento e sobrelotação das copas. É por isso necessário reabilitar as plantações, especialmente no caso de pomares que têm mais de 20 anos, em regiões com o Biombo. Para seguir as melhores práticas, os agricultores podem replantar antigas plantações de acordo com as recomendações agrícolas correctas. Os agrónomos locais concordam que aprumar as árvores e manter um espaçamento de 8 a 10 ou 10 a 12 metros melhoraria substancialmente os rendimentos uma vez que a exposição acrescida ao sol tornaria as árvores mais produtivas. As provas da Aliança Africana do Caju (ACA) indicam que a poda tem a maior correlação directa com os rendimentos de caju. A poda é essencial na fase inicial do crescimento para obter a forma correcta. O desbaste colectivo de árvores de baixo rendimento é também sugerido. Afortunadamente, a produção de castanha de caju na Guiné-Bissau não tem sofrido de doenças tais como as ocorridas no Leste de África ou Índia. No entanto é necessário uma atenção urgente ao desenvolvimento de variedades para evitar a propagação de doenças, que seriam um desastre para o sector e país. 132 Conforme mencionado no capítulo 3, no futuro poderá existir potencial para entrar no processamento da maçã de caju para a produção de bebidas. 168 Figura 75: As exportações de caju têm crescido a uma média de 6 por cento por ano (exportações e venda em toneladas) 8.8 No estado actual da cadeia de valor onde todas as vendas de caju são orientadas para a exportação, os agricultores têm um poder negocial muito limitado. A volatilidade internacional de preços é largamente importada através dos compradores. Em 2013, para cada tonelada de castanha de caju vendida, os agricultores receberam apenas 35-42 por cento do preço de referência. Em contraste, entre 2010 e 2012, os agricultores conseguiram receber entre 72-85 por cento dos preços de referência, sugerindo que existem margens amplas para estes aumentarem as suas receitas. A ausência de informação acerca do preço de referência compromete a capacidade negocial dos agricultores de conseguirem negociar melhores acordos. Adicionalmente, a falta de acesso a armazéns na comunidade limita a capacidade dos agricultores de vender parte da produção a uma taxa mais favorável. 8.9 A somar a isto, embora a Guiné-Bissau seja um grande exportador de castanhas de caju em bruto, a sua capacidade de processamento é ainda muito reduzida. A Guiné-Bissau é um grande player internacional na produção e exportação de castanhas de caju, apesar da pequena dimensão do país. Em 2012, a Guiné-Bissau foi o quinto maior produtor de castanha de caju crua depois da Índia, Costa do Marfim, Vietname e Brasil (Figura 76). No entanto, a Guiné-Bissau exporta a quase totalidade das castanhas de caju que produz, e a indústria local de processamento é pequena e subutilizada. De 1995 a 2014, a Guiné-Bissau exportou em torno de 95 por cento das castanhas de caju que produziu, a maioria das quais para a Índia. A exportação informal através das fronteiras terrestres também tem sido historicamente significante. Por exemplo, existem relatórios de que 50.000 a 75.000 toneladas de castanhas de caju não processadas da Guiné-Bissau foram exportadas através do Senegal em 2013 e 2014. 8.10 Isto significa que, apesar de ser um grande produtor de castanha de caju em bruto, a Guiné-Bissau acaba por ser um player pouco relevante na produção de castanha de caju processada. Em 2010, o país tinha a capacidade de processar menos do que 15.000 toneladas de caju por ano, distante do maior player do sector (Figura 77). Desde 2010, a capacidade instalada 169 de processamento expandiu, e em 2013 atingiu cerca de 40.000 toneladas de castanha de caju em bruto, o que equivale à produção de cerca de 10.000 toneladas de castanhas de caju processadas. No entanto, a capacidade de produção tem permanecido reduzida; em 2013 o país produziu menos do que 250 toneladas de castanha de caju processada (inferior a 4 por cento da capacidade de utilização), das quais 118 toneladas foram exportadas para Portugal, Rússia, Turquia, e Estados Unidos, e 99 toneladas aguardam ainda um comprador. Esta é uma tarefa mais desafiante na prática do que se poderia imaginar à partida. Figura 76: A Guiné-Bissau é o quinto maior exportador de Figura 77:... embora o país quase não produza castanha de caju em bruto no mundo… castanha de caju processada. (produção de castanha de caju em bruto, milhares de toneladas (capacidade instalada para o processamento de caju, métricas, 2012) milhares de toneladas métricas, 2010) Fonte: Banco Mundial. Fonte: Pal e Mota (2010). 8.11 Com este contexto, a Guiné-Bissau está longe de alcançar o seu potencial. As condições são favoráveis para o desenvolvimento da indústria de processamento do caju: o país tem uma oferta abundante de castanha de caju de boa qualidade, o capital humano está disponível, e os problemas de infra-estruturas não são inultrapassáveis. O país é agora o quarto maior produtor de castanha de caju (tendo ultrapassado recentemente o Brasil), e com a oferta actual de cerca de 200.000 toneladas de castanha de caju em bruto, pode em teoria aumentar o volume da sua indústria de processamento de menos de 250 toneladas para quase 50.000 toneladas de caju. Adicionalmente, a qualidade da castanha de caju na Guiné-Bissau encontra-se entre as mais elevadas do mundo. No entanto, é necessário enfrentar diversos desafios em simultâneo. 8.12 O financiamento pode constituir o constrangimento mais significativo. Uma empresa de sucesso deverá operar ao longo do ano, mas a colheita de caju dura apenas três meses. Assim será necessário garantir financiamento para adquirir stocks suficientes de matéria-prima para armazenagem133. Os bancos locais são geralmente avessos ao risco e já passaram por diversas tentativas falhadas de processamento de caju na Guiné-Bissau. O custo de financiamento é também relativamente elevado. Uma das vantagens dos investidores estrangeiros é a de que podem trazer acesso a financiamento mais barato. As parcerias com agricultores podem ajudar se estes estiverem dispostos a armazenar os cajus em bruto até que a fábrica de processamento esteja apta a utilizá-los. 133 Esta é uma das principais vantagens de que Índia desfruta, uma vez que importa caju em bruto de diversas fontes ao longo do ano e por isso minimiza os requisitos de inventário. 170 Figura 78: A Guiné-Bissau tem um potencial considerável para produzir castanha de caju processadas. (milhares de toneladas, 2013) Fonte: Banco Mundial. 8.13 Um exemplo de uma medida tomada para facilitar os constrangimentos de financiamento foi o estabelecimento, em 2013, de um programa de garantias para o sector do caju. Embora este programa de garantias tenha o potencial de aumentar o acesso ao financiamento e promover a industrialização do sector, já enfrentou três grandes problemas que têm limitado o seu impacto. Primeiro, o volume de créditos cobertos - $2,6M em 2013 - tem sido reduzido, devido à utilização da maioria dos fundos para outros objectivos que não a garantia de crédito. Segundo, a gestão do fundo tem sido fraca, e será necessária uma equipa de gestão permanente com capacidades técnicas adequadas e um mandato forte para liderar a mudança. Terceiro, de momento o fundo de garantia só está a beneficiar directamente a comercialização de castanha de caju. A industrialização do sector beneficiaria de ter o fundo de garantia a alocar parte dos fundos para garantir os créditos que apoiem directamente o processamento de castanhas de caju em bruto, através de um modelo de crédito adequado. 8.14 Apesar da pequena dimensão do país, não há escassez de capital humano, e a maioria da população (70 por cento) está dispersa em áreas rurais, dentro ou perto de áreas de produção de caju. As mulheres preenchem a maioria das posições disponíveis. No entanto, as fábricas têm sofrido no passado com altas taxas de rotatividade e absentismo, devido em parte às condições de trabalho134. Isto exige acções em termos de informação, recrutamentos, contratos, e compensações para permitir uma participação acrescida, permanência durante mais tempo, e redução no absentismo. 8.15 Existem também requisitos ligados à escala mínima e qualidade. Tipicamente, considera-se que alguém deve ter a capacidade de exportar um contentor por mês para satisfazer os compradores estrangeiros. A dimensão das castanhas de caju deve ser também bastante uniforme, significando que várias terão de ser rejeitadas para o mercado de exportação. Os projectos de pequena escala a nível das aldeias, dos quais têm havido vários, não podem sobreviver senão cooperarem para alcançar este nível de volumes, qualidade e regularidade. 134 O trabalho é relativamente tedioso e as pequenas unidades podem ser quentes e não ter circulação de ar adequada. 171 8.16 A infra-estrutura é um constrangimento severo para as empresas que operam na Guiné-Bissau (ver capítulo 2). De facto, a indústria de processamento de caju iria beneficiar de um aumento na disponibilidade e fiabilidade de electricidade, da melhoria nas infra-estruturas rodoviárias (especialmente de estradas secundárias), e de melhorias no porto de Bissau. A indústria de processamento poderia ainda beneficiar da produção de electricidade a nível das fábricas, que pode ser realizada utilizando cascas de caju, um dos produtos do processamento. Assim, embora a infra-estrutura precária seja um obstáculo, não deverá ser um impedimento para o desenvolvimento da indústria de processamento do caju. 8.17 O estímulo ao desenvolvimento da indústria de processamento do caju pode trazer benefícios significativos para a economia e para a população rural da Guiné-Bissau. Primeiro, a economia poderia crescer, alimentada por um aumento na dimensão do sector da indústria. Segundo, a criação de emprego iria aumentar: estima-se que o agro-processamento do caju crie cerca de um emprego full time para cada três toneladas de caju processadas. O processamento de 30.000 toneladas de caju por ano iria por isso criar cerca de 10.000 empregos, principalmente em zonas rurais. Conforme descrito mais adiante no capítulo, minimizar a distância entre as fábricas e as instalações de produção local é importante, e a produção é distribuída ao longo das áreas rurais do país. Este aumento na quantidade de empregos iria beneficiar em particular as mulheres, que constituem a maioria dos trabalhadores das fábricas. A organização das comunidades rurais e a melhoria da cadeia de valor pode aumentar significativamente os rendimentos, contribuir para a segurança alimentar, e reduzir a pobreza. O relacionamento entre os compradores e os produtores pode tornar-se mais equitativo uma vez que os processadores teriam um forte incentivo para estabelecer parcerias construtivas entre os agricultores para garantir uma oferta fiável, com benefícios mútuos para ambos. Finalmente, os riscos na cadeia de valor podem potencialmente ser reduzidos, tendo em conta que o sector iria reduzir a sua dependência do mercado indiano. A Figura 79 demonstra estes benefícios, assim como outros que o país poderia colher com a industrialização do sector do caju. Figura 79: O desenvolvimento da indústria de processamento de caju teria um impacto considerável na economia. Fonte: Banco Mundial. 172 8.18 Embora a concretização deste potencial seja desejável, é provável que se torne cada vez mais necessário, por duas razões: a procura por castanhas de caju na Guiné-Bissau pode decrescer, e a concorrência no mercado da castanha de caju poderá tornar-se mais intensa. Por um lado, a Índia, que é actualmente o principal destino da castanha de caju em bruto da Guiné- Bissau, está a aumentar a sua produção de caju interna e tem como objectivo declarado atingir a auto-suficiência. Mesmo se a Índia continuar a importar castanha de caju em bruto, os produtores em ascensão, tais como a Indonésia, podem beneficiar da sua proximidade para competir com a Guiné-Bissau por aquele mercado. Por outro lado, a oportunidade de aproveitar a procura crescente por castanha de caju pode não durar para sempre. De facto, países como Moçambique, Costa do Marfim e Tanzânia têm desenvolvido de forma constante a sua capacidade de processamento. Quanto mais tempo a Guiné-Bissau esperar para desenvolver a sua própria capacidade de processamento, mais difícil poderá ser obter uma parte desse mercado, tendo em conta a concorrência crescente de outros países no continente. A transição de exportador de caju em bruto para caju processado representa não só uma oportunidade que a Guiné-Bissau deverá aproveitar, mas também uma que país não se poderá dar ao luxo de desperdiçar, especialmente num contexto em que o caju continua a desempenhar um papel importante na economia, e quando a diversificação para outros potenciais motores económicos levará ainda alguns anos. 8.19 É importante avaliar se o país pode competir no mercado internacional de caju uma vez que os mercados domésticos e regionais são muito limitados. O mercado doméstico para caju processado, que se estima em 20 toneladas por ano, é reduzido. Apesar de existir algum espaço para o marketing doméstico, não se espera que este mercado cresça significativamente, tanto por razões culturais (o consumo de caju na Guiné-Bissau não é comum), e também devido ao elevado custo (não é provável que a população veja um aumento significativo no poder de compra no curto prazo). O mercado sub-regional, constituído por Senegal e Guiné, é maior do que o mercado nacional. Ainda assim, em 2010, não superou as poucas centenas de toneladas. As mesmas razões que impedem o crescimento do mercado doméstico também limitam a expansão significativa do mercado sub-regional. Uma vez que os mercados domésticos e sub-regionais são pequenos (inferiores a 1.000 toneladas por ano) não é provável que cresçam significativamente no futuro próximo, e assim a Guiné-Bissau deverá focar-se na exportação para o mercado internacional, onde a América do Norte, Europa Ocidental, e China são os maiores compradores. 8.20 O mercado internacional é atractivo. A procura mundial por caju tem crescido intensamente (7-8 por cento por ano) de 2000 a 2010, e espera-se que aumente em 5-8 por cento por ano de 2010 a 2020, com base principalmente no aumento da procura na Ásia. A Figura 80 demonstra a evolução das importações de castanha de caju nos EUA e Europa. A indústria de serviços e retalho poderia ser um bom mercado para vender castanhas de caju inteiras, ao invés que a indústria alimentar poderia ser um bom mercado para vender partes ou castanhas quebradas. 8.21 A concorrência no mercado internacional significa que a Guiné-Bissau teria de satisfazer três requisitos: qualidade, volume e preço: 8.22 Em termos de qualidade, o mercado internacional é exigente. Os mercados internacionais exigem qualidade em termos de higiene e certificações (por exemplo, um certificado de origem e um certificado de aflatoxinas), e também em termos de gosto e sabor. Estes mercados exigem também uma experiência constante associada ao produto (i.e., o sabor e a qualidade do produto não devem variar na geografia e tempo). A Guiné-Bissau produz castanhas de caju de alta qualidade (Figura 81) com um sabor doce. O desenvolvimento de fábricas com uma escala adequada podem produzir cajus com uma qualidade elevada e constante, mantendo os standards adequados de higiene e certificação. As exportações recentes para os mercados da América do Norte e Europa, embora em pequenos volumes, deverá ao menos fornecer a prova de conceito de que a Guiné-Bissau está apta a atingir os standards de qualidade exigidos no mercado internacional. 173 Figura 80: A procura dos Estados Unidos e Europa por castanha de caju tem aumentado de forma constante (importações de castanhas de caju, toneladas métricas) Fonte: Pal e Mota (2010). Figura 81: A qualidade do caju da Guiné-Bissau é elevada de acordo com os standards globais (out turn) Fonte: Pal e Mota (2010). 174  Em termos de quantidade, a Guiné-Bissau está bem posicionada para satisfazer os requisitos de volume do mercado internacional. O mercado internacional exige por norma elevados volumes e a separação entre diferentes tipos de qualidade. Isto exige também um fornecimento constante de castanha de caju ao longo do ano. Conforme descrito em cima, a Guiné-Bissau produz castanha de caju em quantidade suficiente para garantir um volume elevado de produção de caju processado quando (e se) as instalações de processamento com uma escala adequada estiverem implantadas e a capacidade for satisfeita. O rendimento da produção do caju em bruto é de 500-600 kg/ha, comparável com aquele da Índia e Brasil, embora abaixo dos rendimentos alcançados no Vietname. Tendo em conta o envelhecimento das plantações de árvores, é necessário um trabalho considerável no processo de replantação. Tendo em conta a atractividade do mercado de retalho, incluindo o contrabando de caju em bruto através das fronteiras terrestres para o Senegal, é importante identificar mecanismos que garantam a venda estável e constante de caju em bruto para as futuras instalações de processamento.  Por fim, a Guiné-Bissau deveria ficar apta a exportar castanha de caju processada para o mercado internacional com uma margem de lucro acima daquela que é obtida através da exportação de caju em bruto. A análise dos dados de 2010 demonstra que isto é possível. No entanto, é importante actualizar estas análises de custos para avaliar se a Guiné- Bissau permanece competitiva em termos de preços. Isto não é somente devido à potencial mudança de custos ao longo da cadeia de valor desde 2010, mas também, e mais significativamente, porque uma nova tecnologia de processamento foi recentemente disponibilizada no plano internacional, que afectou o sector ao aumentar significativamente a produtividade do processamento de caju. De acordo com a Associação de Processadores de Caju, estas novas máquinas, que já estão em uso na região (por exemplo, no Burkina Faso), permitem o descascar de 350 kg por hora, ao invés dos 200-300 kg por dia que vinha sendo a norma com o equipamento tradicional. As novas máquinas de descasque permitem agora o descasque de toneladas de caju por dia. Tendo em conta a natureza competitiva desta tecnologia, parece inevitável que a Guiné-Bissau necessitará de a adoptar para conseguir prosperar no mercado. No entanto, pode também reduzir a vantagem do factor trabalho relativamente barato e aumentar a importância do acesso ao capital. 3. ESTABELECER O POTENCIAL DA GUINÉ-BISSAU PARA PROCESSAR CAJU 8.23 Esta secção irá examinar em maior detalhe o potencial da Guiné-Bissau para processar caju. Os dados utilizados serão de 2010 - e assumem o uso da tecnologia tradicional - para demonstrar que (i) a Guiné-Bissau está apta a ser competitiva em termos de preço no mercado internacional; (ii) essa competitividade será mais facilmente alcançada se algumas decisões importantes forem tomadas, especialmente em termos de localização das fábricas de processamento; (iii) a margem de lucro para as empresas seria maior através da exportação do caju processado ao invés do caju em bruto; e (iv) ainda existe margem para aumentar a rentabilidade do negócio de processamento de caju. 8.24 A Guiné-Bissau consegue competir em termos de preço nos mercados internacionais de caju processado. A Figura 82 demonstra que uma fábrica com uma capacidade de 1000 toneladas métricas gastaria US$ 850 para processar uma tonelada de castanhas de caju em bruto. A Figura 83 prossegue a soma dos custos até à exportação. Tendo em conta os preços de mercado de 2009, a exportação teria um lucro de cerca de US$ 220 por tonelada métrica adquirida de castanha de caju em bruto. A Figura 84 demonstra como é que o lucro anual de uma fábrica com a capacidade para processar 1000 toneladas métricas variaria de acordo com as mudanças dos preços internacionais CIF e dos preços agrícolas domésticos do caju em bruto. 175 Figura 82: O custo total de processamento para uma fábrica com 1000 toneladas de capacidade é estimado em US$ 850 por tonelada métrica (custo por tonelada de caju em bruto adquirida (US$)) Fonte: Pal e Mota (2010). Figura 83: O valor da exportação do caju processado é estimado em US$ 220 por tonelada métrica processada. (custo por tonelada métrica de caju em bruto processada) Fonte: Pal e Mota (2010). 176 Figura 84: Os lucros do processamento podem variar de acordo com os preços CIF e os preços agrícolas (lucro líquido por mil toneladas métricas de caju em bruto processadas) Fonte: Pal e Mota (2010). 8.25 A rentabilidade estimada pode ser mais facilmente alcançada se os seguintes aspectos forem tomados em consideração: (i) a infra-estrutura de transporte é mais relevante para o lucro líquido do que os custos de electricidade e portuários, e (ii) minimizar a distância da produção local - mesmo com o risco de aumentar a distância para o porto - é essencial. A Figura 84 demonstra a análise que suporta estas conclusões. Conforme pode ser visto, o lucro líquido varia consideravelmente mais com a localização da fábrica do que do que com a utilização de geradores ou custos portuários. No que toca à localização, minimizar a distância da fábrica à fonte das castanhas de caju em bruto tem mais vantagens do que minimizar a distância da fábrica em relação ao porto. Esta opção teria também o benefício acrescido de estabelecer uma indústria nas zonas rurais. Afortunadamente, as zonas de maior produção e com mais qualidade são próximas da costa (Figura 86), e por isso pode ser estabelecido um equilíbrio entre a proximidade da produção local e proximidade relativa ao porto. 8.26 A margem de lucro para as empresas seria maior ao exportar caju processado ao invés de caju em bruto. Conforme visto em cima, a aquisição, processamento e exportação de 1000 toneladas de caju em bruto aportaria um lucro de US$ 220.000 por uma fábrica a operar em capacidade plena. Se essas 1000 toneladas de caju em bruto fossem exportadas, o lucro seria de apenas US$ 13.000, tendo em conta os preços de mercado de 2009 (Figura 87), se todos os custos permanecerem iguais (incluindo os 250 XOF por kg de preço agrícola), o valor FOB teria de ser na ordem dos US$ 850 por tonelada para que lucro igualasse o obtido através da exportação de caju processado. De 1998 até 2013, isso só aconteceu numa base consistente de 2010 a 2012. 177 Figura 85: A distância das fábricas de processamento até à fonte das castanhas de caju em bruto é um dos determinantes-chave dos lucros líquidos (lucro líquido por mil toneladas métricas de caju em bruto processadas, em US$) Fonte: Pal e Mota (2010). Figura 86: O caju de maior qualidade é colhido perto do mar Fonte: Pal e Mota (2010). 178 Figura 87: Se essas 1000 toneladas de caju em bruto fossem exportadas em 2009, o lucro teria sido de apenas US$ 13.000 (custo por tonelada de caju em bruto adquirida, US$) Fonte: Pal e Mota (2010). 8.27 Existe ainda espaço para aumentar a rentabilidade do negócio de processamento de caju, através da melhoria da produtividade e qualidade do trabalho efectuado por parte dos trabalhadores de processamento, e através da redução da percentagem de rotatividade destes mesmos trabalhadores. Em 2010, os trabalhadores na Guiné-Bissau estavam a descascar uma média de 11 kg por dia, comparado com 12 kg na Costa do Marfim, 13 kg na Tanzânia, 16 kg no Vietname, e 17 kg na Índia. Com este nível de produtividade, o lucro por caju processado seria cerca de US$ 220 por tonelada por caju bruto processado. Se a produtividade da Guiné-Bissau no descasque fosse elevada ao nível da Costa do Marfim, o lucro subiria para US$ 237 por tonelada; e atingindo o da Índia significaria um aumento para US$ 252 por tonelada. Os benefícios seriam também repassados para os trabalhadores. Se a Guiné-Bissau conseguisse atingir o patamar da Costa do Marfim, os salários anuais dos trabalhadores aumentariam de US$ 813 para US$ 899 (11 por cento). Se a produtividade no descasque subisse para um nível equivalente ao da Índia, os salários anuais médios poderiam aumentar para US$ 1273 (57 por cento). Existe também uma margem para melhoria de produtividade em termos de apuramento e classificação. É importante realçar uma vez mais que a adopção de novas tecnologias poderia alterar por completo o racional económico do processamento. 8.28 Outra importante alavanca para aumentar a rentabilidade é o decréscimo na rotatividade dos trabalhadores, que em 2010 rondou os 30 por cento. Por exemplo, de acordo com as simulações, um aumento no salário mensal dos trabalhadores de US$ 65 para US$ 75 (mais 15 por cento), teria um impacto positivo no lucro líquido da empresa, se esse aumento se traduzisse numa redução na taxa de rotatividade dos trabalhadores de 30 por cento para taxas inferiores a 10 por cento. As condições laborais devem também melhorar. Os programas piloto para decrescer a rotatividade dos trabalhadores e o absentismo são necessários para garantir a sustentabilidade do sector. 179 8.29 O potencial, atractividade, e necessidade de desenvolver a indústria de processamento de caju na Guiné-Bissau descritos em cima, não são novos, e estas recomendações apelando à industrialização do sector já foram apresentadas no passado. Por exemplo, a sobretaxa FUNPI foi introduzida para criar um fundo para apoiar o processamento, e recentemente tem sido sugerido que a Guiné-Bissau pode exigir a partir de 2016 que as empresas que queiram exportar caju tenham que ter uma capacidade mínima de processamento não inferior a 500 toneladas por ano. No entanto, a imposição de uma capacidade mínima de processamento, além de não afectar os volumes actuais processados, pode ter consequências negativas no sector. A imposição irá provavelmente afectar o poder negocial dos produtores, ao reduzir o número de compradores; irá também promover o contrabando de caju em bruto para outros países - uma prática que tem crescido na ausência de controlos fronteiriços e com os custos crescentes para exportar; e provavelmente afectar a industrialização do sector, ao limitar a possibilidade de criar um modelo cluster/satélite de pequenas unidades de processamento. Ainda mais relevante, tais esforços para apoiar o processamento tendem também a reduzir o bem-estar dos agricultores mais pobres. Conforme a Caixa 7 no capítulo 4 demonstra, a maioria da sobretaxa FUNPI tem sido inquestionavelmente passada para os agricultores devido aos reduzidos preços agrícolas. A restrição da opção de exportar caju em bruto irá provavelmente reduzir os preços ainda mais, uma vez que irá inevitavelmente proteger as unidades de processamento ineficientes que de outra forma não seriam capazes de competir com o preço oferecido pelos exportadores de caju em bruto. Qualquer política que aponte à promoção do processamento de caju não deve ser feita à custa dos agricultores. 4. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS 8.30 Apesar da sua relevância para o país, o sector do caju na Guiné-Bissau representa apenas 4 por cento do mercado mundial de caju, que totaliza US$ 4,3 mil milhões. De forma a ganhar uma maior quota de mercado mundial, a Guiné-Bissau deverá investir para actualizar a cadeia de valor e promover a indústria de processamento. As intervenções devem ser informadas por fracassos anteriores e sucessos recentes de outras agências de desenvolvimento internacionais de forma a colocar em prática um sistema que: (i) é sustentável e opera numa escala rentável; e (ii) apoia os grupos mais desfavorecidos através de um crescimento mais equitativo. 8.31 A cadeia de valor requer uma abordagem integrada de desenvolvimento, complementada por actividades para promover a diversificação. A abordagem integrada para desenvolver o sector é crítica para enfrentar as questões de segurança alimentar, aumentar a resiliência dos agricultores aos choque externos, obter a participação das comunidades rurais no trabalho ao longo da cadeia de valor, desenvolver novas oportunidades sustentáveis na agricultura, e informar as futuras políticas de mudança estrutural. 8.32 Na agricultura, é importante garantir a sustentabilidade de longo prazo do sector do caju através da melhoria da produtividade, em simultâneo com a harmonização dos rendimentos e promoção da diversificação, notavelmente para produtos como o arroz. É crítico promover melhores práticas agrícolas incluindo enfrentar questões como a densidade de arborização, assim como o entrelaçamento de árvores de caju com colheitas estáveis tais como o arroz de terras altas. Estas medidas vão também permitir a melhoria do poder negocial dos agricultores, estabelecendo um sistema de informação de preços e instalações de armazenamento comuns. As instalações de armazenagem servem o duplo propósito de melhorar o poder negocial dos agricultores e fortalecer as ligações com as unidades locais de processamento. Os agricultores não serão forçados a vender a sua colheita inteira e assim vão conseguir negociar melhores preços. Ao ligarem-se com fábricas de processamento, os agricultores estarão aptos a participar nos rendimentos destes investimentos ao mesmo tempo que garantem um preço justo para o seu caju. 180 8.33 No que toca ao agro-processamento do caju, a questão chave é porque é que a Guiné- Bissau continua a exportar a quase totalidade da sua colheita de caju em bruto, ao invés de outros grandes produtores de caju, apesar de ter condições agro-ecológicas mais favoráveis, caju de alta qualidade, e de poder contar com vantagens económicas e financeiras promissoras associadas ao processamento? Para os investidores externos, os principais constrangimentos têm sido a falta de estabilidade política e o mau ambiente para investimentos. Para os investidores locais, além dos factores que afectam os investidores externos, os constrangimentos mais importantes são a escassez de crédito, desafios associados ao capital humano, a ausência de uma estrutura institucional com recursos suficientes e um mandato para promover o processamento do caju, e a falta de capacidade empreendedora. A Figura 88 demonstra estes e outros assuntos que afectam o desenvolvimento da indústria de processamento do caju. Figura 88: Uma série de constrangimentos estão a afectar o desenvolvimento da indústria de processamento de caju 8.34 A melhoria do ambiente de negócios será crucial para desenvolver o processamento de caju. Estas áreas são exploradas em parte no capítulo 3. A estabilidade política, especialmente em termos de políticas e visão para o sector, é crítica para atrair investimento estrangeiro. Uma estratégia compreensiva, suportada por medidas institucionais, será essencial para promover a transição para uma capacidade adicional de processamento no país. Alcançar este objectivo envolveria duas acções em paralelo. Primeiro, devem ser estabelecidas uma visão e estratégias claras para a industrialização do sector, respondendo a questões como “Qual é a percentagem de caju em bruto que o país quer processar até 2020?”; “Como fazer a transição do estado actual da indústria até à visão almejada até 2020?”; “Qual seria o número, volume, e localização ideais para as fábricas de processamento?”; “Que incentivos devem ser implementados para apoiar estes objectivos?”. 8.35 Pode ser realizado um processo de consulta efectivo em todo o sector para garantir que todas as partes interessadas são envolvidos nas respostas a estas questões. É particularmente importante aumentar a coesão das associações do sector do caju, e garantir que estas entidades falam a uma só voz e estão comprometidas - e são responsabilizadas – a favor da implementação da estratégia definida. Em outras palavras, é igualmente importante definir uma 181 visão e estratégias fortes, como também garantir que todos as partes interessadas são envolvidas no processo, e sentem autoria e responsabilidade no que toca à implementação na estratégia. Isto é particularmente desafiante no caso dos produtores. Serão necessários vários anos para desenvolver esta representação oficial dos produtores. Entretanto, o Governo poderá ter que intervir em sua representação. 8.36 Devem ser tomadas medidas para atrair investimento estrangeiro. Primeiro, deve ser preparada uma argumentação para investimento e materiais de marketing que demonstrem o potencial retorno para os investidores em unidades industriais de processamento, e estas devem ser apresentadas aos melhores potenciais investidores internacionais. Isto pode promover um fluxo grande de investimento estrangeiro para a economia. Adicionalmente, as autoridades nacionais (tais como a DGPIP e ANCA) podem mapear e segmentar determinados investidores internacionais e participar em feiras comerciais ou conferências de investimento para promover investimentos no agro-proc essamento de caju da Guiné-Bissau. Estas mesas redondas podem incluir a Aliança Africana de Caju, uma importante fonte de referências para potenciais investidores. A organização de um evento deste tipo na Guiné-Bissau também traria a atenção das grandes empresas envolvidas neste mercado. 8.37 Além de atrair investimentos para as unidades de média escala de processamento de caju, há também um âmbito considerável para organizar as instalações de processamento da comunidade. Os investimentos complementares em ambos os níveis de escala serão benéficos nesta etapa, uma vez que aumentariam a visibilidade da Guiné-Bissau no agro-processamento, e assim ajudariam a estabelecer relacionamentos de longo prazo com os compradores. A recente experiência EU/SNV no estabelecimento de unidades de processamento a nível da comunidade demonstrou que ligar os agricultores com as unidades de processamento ajuda a aliviar os constrangimentos de capital e facilita o desenvolvimento da indústria de processamento. As experiências da Índia, Vietname e Moçambique têm demonstrado que as pequenas unidades de processamento de caju estabelecidas a nível das aldeias podem operar competitivamente se trabalharem em conjunto. A Fundação Gates tem investido com algum sucesso no desenvolvimento das unidades de processamento em outros países do mundo, nomeadamente Costa do Marfim, Gana e Benim. As pequenas unidades descentralizadas não são viáveis ou competitivas por si só, e podem antes ser organizadas como parte de um cluster de unidades primárias organizadas sob uma unidade central que providencia serviços e facilita o acesso ao mercado. Estas unidades são de pequena dimensão mas o procedimento para transformar a castanha de caju em bruto num caju de boa qualidade é trabalho-intensivo, e por isso pode ser um bom empregador principalmente para trabalho feminino em comunidades rurais de baixo rendimento. 8.38 A resposta à questão do acesso ao financiamento, particularmente na aquisição de caju em bruto, será crítica. O sistema bancário da Guiné-Bissau é bastante avesso ao risco, preferindo financiar a exportação de caju em bruto, que tem uma venda fácil, ao invés de financiar investimentos de médio prazo (de dois a três anos) e providenciar fundo de maneio durante períodos de um ano. Os bancos são também dissuadidos por más experiências passadas de financiamento de processamento de caju, causadas em parte devido à prática de conceder fundo de maneio às fábricas apenas para os últimos dois meses de processamento, quando os preços são mais elevados, ao invés de conceder esse crédito no início da época das colheitas, quando os preços são mais reduzidos, assim como também devido às dificuldades na análise da capacidade empreendedora e creditícia dos potenciais mutuários. O aumento no acesso ao financiamento irá facilitar o investimento no sector, mas resolver esta questão exige enfrentar os constrangimentos subjacentes. Embora as acções governamentais na linha de algumas recomendações providenciadas no capítulo 3 possam desbloquear em certa medida o acesso a crédito e promover uma resposta imediata do sector privado tanto por parte de grandes empreendedores como de 182 pequenos agricultores, suster os resultados irá exigir condições macroeconómicas estáveis, melhorias contínuas no clima de investimentos, e uma atenção rigorosa à boa governação, conforme descrito no capítulo 3. Estas questões estão inextricavelmente ligadas à profundidade do sistema financeiro e, assim, à disponibilidade de crédito. Os mercados internacionais podem por vezes não ter o luxo de ignorar grandes países produtores e consumidores, apesar da questão do ambiente de negócios, mas podem ser pouco tolerantes para pequenas economias que não criam condições atractivas, transparentes e previsíveis para o investimento. 8.39 O sector terá também de melhorar os standards de qualidade e gestão. Seria importante melhorar a qualidade. Actualmente, a maiorias das fábricas não têm certificações que seriam essenciais para vender no mercado internacional, e não há um laboratório especializado no controlo de qualidade do caju exportado. As questões ao nível do empreendedorismo e da gestão são comuns àquelas que os outros sectores enfrentam. Não é incomum que os gestores das fábricas não tenham a formação adequada de competências de gestão e financeiras, e que muitas fábricas não tenham os sistemas e procedimentos adequados de contabilidade. 8.40 Existe a necessidade de uma melhoria das competências técnicas do staff operacional que trabalha nas fábricas, assim como devem enfrentar-se as questões relacionadas com a rotatividade e absentismo do trabalho. A alta rotatividade e baixas competências dos trabalhadores causam uma redução na produtividade quando comparada com as taxas alcançadas por outros países. Podem ser estabelecidos programas públicos de formação vocacional nesta área, potencialmente com o apoio de doadores e ONGs (ver capítulo 5). Adicionalmente, se grandes investidores estrangeiros fossem atraídos ao sector, poderia ser possível estabelecer sistemas de formação in-house onde as empresas providenciariam formação aos seus empregados. Para responder às questões de participação laboral, há espaço para experimentar diferentes mecanismos. Devem perguntar-se e testar-se algumas questões: no processo de recrutamento, quais são os mecanismos de promoção mais efectivos? Devem as recomendações de outros trabalhadores ser usadas? Na fase inicial de aprendizagem, deverá a informação sobre o desempenho ser publicada internamente? No que respeita ao ambiente laboral, devem os trabalhadores ficar em equipas ou trabalhar individualmente? Devem os trabalhadores receber um salário fixo, uma parte associada à produtividade, ou uma combinação dos dois? Quais são as outras formas efectivas de aumentar a produtividade dos trabalhadores? Identificar as melhores respostas a estas questões irá facilitar a promoção de mecanismos que garantam a definição de um trabalho produtivo. 8.41 Por fim, a melhoria da infra-estrutura seria crucial (ver Capítulo 2). Durante a época das chuvas, algumas áreas, especialmente no sul do país, não têm acesso por estrada, um assunto particularmente problemático tendo em conta que a colheita do caju ocorre durante essa época. Um ponto interessante é que o sector de infra-estruturas beneficiaria da industrialização do sector do caju. De facto, uma mudança da exportação de caju em bruto para a exportação de caju processado decresceria os volumes relacionados com o caju processado no porto em cerca de 75 por cento. Esta mudança abriria também a possibilidade de produzir energia das cascas de caju, que poderiam ser usadas não só para providenciar electricidade à fábrica, mas potencialmente para as aldeias vizinhas. 183 CAPÍTULO 9: REVITALIZAR O SECTOR DO ARROZ 1. INTRODUÇÃO 9.1 O arroz é das culturas mais importantes da Guiné-Bissau. O arroz representa o principal produto alimentar e é regularmente plantado, embora actualmente somente para autoconsumo. Cerca de 40 por cento da procura doméstica por arroz é satisfeita por importações. O arroz é um dos principais bens para troca directa entre os agricultores de caju. É uma cultura com potencial considerável para aumentar a segurança e rendimentos alimentares, especialmente nas zonas rurais e pobres onde o arroz é plantado. O Governo está interessado em desenvolver a produção adicional de arroz. O Banco Mundial já está a providenciar assistência para o desenvolvimento do sector do arroz na Guiné-Bissau. 9.2 O cultivo do arroz no país iniciou no período pré-colonial há cerca de 500 anos atrás. A chuva abundante e fertilidade elevada dos solos encorajou o cultivo de arroz de mangue no Vale do Rio Mansoa no Norte do país. Os agricultores tradicionais Balanta tomaram os terrenos ao mar, dessalinizaram-nos ao construir diques em seu redor, e permitiram que as águas das chuvas descontaminassem a zona antes de iniciar o cultivo de arroz. A produção de arroz era para uso doméstico, com uso frequente para troca directa com outras mercadorias e bens importados. 9.3 A guerra colonial de 1915 degradou a situação do cultivo do arroz, uma vez que aldeias inteiras foram queimadas, e a manutenção dos sistemas de crescimento do arroz foi comprometida. O trabalho forçado que se seguiu às guerras que estabeleceram os territórios como colónia Portuguesa agravaram a crise do cultivo de arroz no Norte. O trabalho foi realocado para a construção de edifícios e casas para trabalhadores públicos coloniais, assim como para pontes e estradas. Devido às condições repressivas impostas pelo regime colonial no Norte, registou-se uma migração massiva para novas áreas do Sul, na área do Catio, região de Tombali, onde os imigrantes estabeleceram sistemas de cultivo de arroz em condições agro-ecológicas adequadas. Nestes sistemas, o arroz era produzido para fins comerciais, a somar à produção de subsistência. Como resultado, a produção nacional de arroz subiu entre 1930 e 1960 e o país exportou pequenas quantidades, com o pico a ser atingido entre 1940 e 1955. A produção média anual foi estimada 45.000 toneladas com casca ou 30.000 toneladas de arroz branco e limpo, das quais cerca de 7.000 toneladas foram exportadas. 9.4 Durante a guerra nacional de libertação, a produção de arroz decresceu. Os campos de cultivo de arroz foram bombardeados pelas Forças Armadas de Portugal, destruindo infra- estruturas hidráulicas (pontes e diques anti salinos) de forma a cortar o abastecimento alimentar para as zonas controladas por rebeldes. Também as relações de autoridade entre os mais velhos e mais jovens, um dos pilares do cultivo de arroz, despareceu com a consequente migração dos cultivadores de arroz de mangue, levando ao abandono de muitos perímetros de pântanos mangue de arroz. Os centros urbanos sob o controlo dos colonialistas tiveram que importar arroz, e em zonas controladas por o PAIGC, os produtores foram forçados a desenvolver sistemas de subsistência de cultivo de arroz nas zonas altas menos produtivas (Mpam-pam). 9.5 Os anos iniciais de pós-independência foram caracterizados por um programa para relançar a produção agrícola. Um dos principais pilares para conseguir a auto-suficiência alimentar foi a expansão do cultivo de arroz em pântanos de mangue através da reabilitação dos diques de mar, construção de açudes e reforço dos perímetros de pântanos manguezais. Cerca de 39 diques foram construídos durante este período, com nove mais adicionais após 1988, totalizando 48 diques anti salinos que protegeram mais de 100.000 hectares com um investimento médio por açude estimado pela Organização de Alimentação e Agricultura (FAO) em cerca de US$ 40.000. No entanto, estima-se que as áreas reabilitadas servidas por 23 dos açudes não foram 184 cultivadas, o que corresponde a 50 por cento de área abandonada de cultivo de pântanos mangais no país. O cultivo de arroz em zonas baixas de pequenos vales foi também encorajada no Leste, com as mulheres a predominarem na actividade e com cerca de 29.400 hectares a serem colocados sob cultivo até 1995. 9.6 A área sob cultivo recuperou da destruição da Guerra de Independência em 2011. Os investimentos na reabilitação de terrenos para o cultivo de arroz estagnaram durante a Guerra Civil e só retomaram em meados e finais da década de 2000. A produção de arroz colapsou durante a Guerra civil mas recuperou na década de 2000, parcialmente devido à reabilitação das plantações de arroz e à recuperação parcial nos rendimentos (Figura 90). No entanto, à luz de muitos standards, os rendimentos por colheita permanecem muito reduzidos na Guiné-Bissau. 9.7 Este capítulo providencia uma Figura 89: A produção de arroz recuperou da destruição da Guerra de Independência análise do potencial do sector do arroz (ha, toneladas métricas de produção e rendimento em kg por e apresenta recomendações de política hectare) para a sua recuperação. As secções 250 2.5 Thousands Thousands seguintes vão demonstrar que a Guiné- Kg/ha (RHS) Ha Toneladas métricas Bissau tem uma vantagem comparativa na 200 2 produção de arroz: com o equilíbrio certo de políticas, o país pode ainda tornar-se 150 1.5 um exportador líquido de arroz. A secção três irá olhar às políticas necessárias para 100 1 alcançar este objectivo. O aumento dos rendimentos dos agricultores e a 50 0.5 diversificação da dependência do caju são as principais razões para revitalizar o 0 0 sector do arroz. Uma vez que o arroz é 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 1996/2000 1961/65 1966/70 1971/75 1976/80 1981/85 1986/90 1991/95 também o principal alimento da Guiné- 2001/05 Bissau, irá ser dada especial atenção na secção quatro ao efeito provável na Fonte: FAOStats. segurança alimentar se o arroz se tornar Nota: Apenas produção de arroz com casca. novamente um bem de exportação. A mudança de um modelo de subsistência de produção de arroz para um modelo orientado para o mercado irá implicar políticas que promovam a produtividade dos agricultores, o que significa também que os preços do arroz vão ser determinados em função do mercado internacional. O capítulo irá concluir com recomendações de políticas para o sector do arroz. 2. O POTENCIAL DO SECTOR DO ARROZ NA GUINÉ-BISSAU 9.8 A Guiné-Bissau é um país de baixa altitude estuarino, e que apresenta condições adequadas para todos os tipos de cultivo de arroz. A zona do Sul é particularmente adequada para arroz de pântano mangue. Nas zonas costeiras, os numerosos estuários de rios e as respectivas marés desempenham um importante papel ao providenciar grandes canais de transporte e irrigação. No interior, as ribeiras de água fresca diminuem substancialmente na época seca. As fontes de águas subterrâneas são abundantes e de qualidade variável. As zonas do Sul incluem as regiões de Tombali, Quinara, e Bolama/Bijagós e são caracterizadas por um clima húmido subtropical. Esta é a zona agro-ecológica com o maior potencial agrícola na Guiné-Bissau, particularmente para arroz de pântanos mangais. A zona contém o Vale do Rio Cumbidja, que é 185 considerada a principal zona de pântanos mangais para o cultivo de arroz, com uma área estimada em 22.000 hectares.135 9.9 O norte tem potencial para cultivo de arroz em manguezais e terras baixas, e a Leste existe potencial para arroz irrigado. A zona agro-ecológica a Norte inclui Oio, Cacheu, e Biombo e é caracterizada por um clima marítimo Guineano. A zona tem um bom potencial agrícola para cultivo de arroz em mangais e terras baixas. O Vale do Rio Mansoa representa o maior potencial de cultivo de arroz, estimado em 19.000 hectares. A zone agro-ecológica a Leste é caracterizada por um clima com duas épocas distintas: uma época seca entre Novembro e Maio, e uma época chuvosa de Junho a Outubro. Devido à irregularidade da precipitação, esta zona tem o menor potencial para arroz de terras altas irrigado por chuva, mas regista bom potencial para arroz irrigado com um potencial estimado em mais de 25.000 hectares de área baixa irrigável no Vale do Rio Geba. 9.10 O arroz é actualmente produzido em três ecossistemas: regado por chuva em terrenos altos, terrenos baixos (com chuva e irrigados), e manguezais. A técnica tradicional de corte e queima de produção do arroz em terras altas é praticada em todas as zonas agro- ecológicas. A prática comum é o cultivo de múltiplas culturas de arroz, milho, grão, culturas leguminosas, frutas e raízes, etc. Depois de um ano de cultivo, a território é plantado para caju ou então deixado em pousio durante 5 a 15 anos, dependendo da densidade da população e disponibilidade de terra arável na comunidade. O sistema tem um impacto negativo no ambiente, causando a perda de vegetação e diversidade biológica. Estima-se que existem menos de 40.000 hectares de terras altas para cultivo de arroz cultivadas anualmente na Guiné-Bissau, cobrindo 26.000 com rendimentos de cultivo na ordem dos 400-600 kg por ha, e normalmente produzindo cerca de 10 por cento da produção nacional de arroz de casca sem aquisição de inputs por parte dos agricultores. 9.11 Os sistemas de produção de Tabela 3: O arroz irrigado tem o maior rendimento de terras baixas ou no interior produtividade predominam nas zonas agro- Tipo de Amplitude do Média de ecológicas do Leste, embora possam arroz de rendimento de rendimento de ser encontradas em todas as zonas cultivo cultivo cultivo agro-ecológicas. O arroz é cultivado (bom ano - mau em depressões que têm condições ano) hidrográficas durante parte do ano. Toneladas/hectare Toneladas/hectare Estima-se que existam mais de Manguezais 1,8 - 2,6 2,2 200.000 ha de área potencial adequada - Norte para produção de arroz dependente de Manguezais 1,8 - 2,6 2,2 - Sul chuva ou de terras baixas irrigadas, das Terras 5,0 - 6,0 5,5 quais cerca de 27.000 ha são baixas - cultivados sob condições de chuva por irrigado pequenos agricultores e com Terras 0,8 - 1,2 1,0 rendimentos que oscilam entre os 800 baixas - e 1200 kg/ha. Algumas das terras chuvas baixas e vales de rios no Leste - Terras 0,4 - 0,6 0,5 particularmente o Rio Geba - têm sido altas - desenvolvidas mais para efeito de chuvas terrenos irrigados, normalmente com Fonte: Serviço Nacional de Estatísticas 135 Para uma descrição detalhada da hidrologia e adequação para o cultivo de arroz, ver Spencer, Dunstan, e Rui Djata (2008), Rice Sector Report for Diagnostic Trade Integration Study . 186 financiamento do Governo ou um doador externo e dividido em parcelas de 0,25 ha, que são arrendadas aos agricultores numa base de longo prazo. A irrigação é quase exclusivamente realizada por bomba de motor e são utilizadas várias variedades melhoradas e inputs. A preparação do terreno é frequentemente realizada por tractores. Presentemente, os centros de produção irrigada são em Bafata (154 ha), Carantaba (35 ha) e Contubuel (135,5 ha). Com uma gestão adequada, são realizadas duas colheitas por ano com rendimentos de 3 a 5 toneladas para cada época de cultivo e cerca de 7 toneladas por hectare na época seca. Este sistema de produção tem o rendimento de cultivo mais elevado (Tabela 3) e correspondeu a um terço da produção total em anos recentes. 9.12 O arroz de pântano manguezal é o sistema mais prevalecente de cultivo de arroz na Guiné-Bissau e é praticado extensivamente nas regiões costeiras. Os campos de arroz são estabelecidos através da construção de diques anti salinos ao longo das margens e estuários com portas de açudes. Estes diques anti salinos evitam a intrusão de água salgada nos campos de arroz e retêm a água fresca necessária da chuva para efeitos de cultivo do arroz. Os diques são normalmente construídos com trabalho manual. A construção mecânica também tem ocorrido utilizando um serviço providenciado no passado por parte do Governo, mas que actualmente não se encontra disponível. Estima-se que existam mais de 106.000 ha de área potencial adequada para produção de arroz de manguezal, dos quais cerca de 50.000 ha foram reclamados e são parcialmente geridos por agricultores. Os campos são cobertos com água e o arroz é transplantado. Não são aplicados fertilizantes minerais. O arroz de pântano manguezal tem fornecido historicamente cerca de 80 por cento da produção do país, embora devido à falta de reparação e manutenção da infra-estrutura, especialmente depois da Guerra Civil no final de década de 90, corresponde agora a menos de 25 por cento. 9.13 A Guiné-Bissau tem uma vantagem comparativa na produção de arroz. Tradicionalmente, muitos dos grupos étnicos que compõem a maioria da população têm-se centrado no cultivo do arroz, significando isto que o capital humano inerente ao cultivo de longo prazo de uma colheita está presente e bem desenvolvido. O arroz é bem conhecido, e os “truques da actividade” úteis no cultivo da forma tradicional são também bem conhecidos. Isto significa que a adopção de tecnologias mais avançadas de cultivo do arroz devem ser relativamente fáceis de promover do que em áreas onde a colheita é desconhecida. Um recente Estudo de Diagnóstico de Integração no Comércio (DTIS) de 2010 mediu as vantagens comparativas da Guiné-Bissau. Embora estas estimativas tenham sido baseadas em dados extremamente escassos e em pesquisas limitadas nas áreas de produção, os resultados foram no entanto suficientemente fortes para tornar muito claro que a Guiné-Bissau tem uma vantagem comparativa significativa na produção de arroz. A Tabela 4 mostra que ambos os sistemas de cultivo de arroz em terras baixas irrigadas e produzido em pântanos manguezais têm estimativas atractivas de Custos de Recursos Domésticos (DRC). Os DRCs são geralmente aceites como indicadores empíricos razoáveis das vantagens comparativas. Embora os dados comparáveis sejam relativamente antigos, a Tabela 5 sugere que, na região da África Ocidental, os DRC da Guiné-Bissau comparam-se de forma muito favorável face aos dos competidores. 187 Tabela 4: Os custos de recursos domésticos são particularmente baixos para os pântanos de manguezais e arroz irrigado (sistemas de produção de arroz num ano normal de chuvas com preços de 2007) INDICADORES Pântanos Pântanos Irrigado Irrigado Terras Terras Mangueza Mangueza através através baixas altas is - Norte is - Sul das de chuvas bombas Quinta/dimensão da 2,62 4,20 0,62 0,70 0,50 1,20 parcela (ha) Trabalho de família por 319 184 1.755 923 1.148 906 hectare (dias pessoa) Trabalho contratado 74 29 29 29 29 23 por hectare (dias pessoa) Rendimento de cultivo 2.200 2.200 3.500 5.500 1.000 500 (Kg por ha) Rentabilidade para as 490.212 805.625 202.707 159.334 14.150 -2.392 famílias (Fam Lab) por quinta (CFA) Rentabilidade para as 187.104 191.815 326.946 227.620 28.301 -1.994 famílias por ha (CFA) Rentabilidade para as 587 1.045 186 247 25 -2 famílias por dia (CFA) Lucros privados 189 249 204 205 104 76 (CFA/kg) (PP) Lucros sociais (CFA/kg) 100 161 130 127 45 -47 (SP) Rácio de Custo Privado 0,19 0,15 0,16 0,24 0,30 0,37 (PCR) Custo de Recursos 0,45 0,33 0,35 0,43 0,65 2,40 Domésticos (DRC) Nota: PP = (Receita Privada - Custos Gerais a preços de mercado) SP = (Receita Social - Custos Gerais a preços sociais) PCR = (Custos não transaccionáveis) / (Receita - custos transaccionáveis) a preços de mercado DRC = (Custos não transaccionáveis) / (Receita - custos transaccionáveis) a preços sociais Fonte: Guiné-Bissau: Diagnostic Trade Integrated Study 2010. Tabela 5: Na região, a Guiné-Bissau tem uma vantagem comparativa na produção de arroz (estimativas DRC para os últimos anos disponíveis) Costa do Mali Senegal País Marfim Serra Leoa (2003) Guiné-Bissau (2007) (1996) (1996) (1996) Sistema de cultivo Irrigado Irrigado Irrigado Irrigado Manguezais Manguezais Irrigado de arroz DRC 0,73 0,4 1,12 0,2 0,68 0,33 0,43 Fonte: Spencer e Djata 2008. 188 3. AUMENTAR A PRODUÇÃO DE ARROZ 9.14 Em termos de intervenções das unidades agrícolas, o sector do arroz beneficiaria tremendamente da introdução de melhores variedades de sementes adaptadas às condições locais e uma melhor gestão da colheita. Trata-se de um caso claro de ganhos rápidos no sentido em que a Guiné-Bissau não tem tido uma capacidade de pesquisa agrícola significativa durante décadas. Isto significa que existem várias melhorias “directamente da prateleira” que podem ser rapidamente adaptadas para serem introduzidas ao nível das unidades agrícolas. Embora isto não seja algo que possa ser feito de um ano para o outro, é igualmente claro que os ganhos potenciais são muito amplos, e que estas melhorias vão ajudar a aumentar a produção e as curvas de produtividade. O fornecimento de pesquisas e inputs são áreas onde é necessário um esforço concentrado para alcançar as condições mínimas para uma resposta de output em termos de arroz vendido. No campo da pesquisa em sementes melhoradas, o Centro de Arroz de África (antigamente a Associação da África Ocidental para o Desenvolvimento do Arroz) é ponto de contacto mais óbvio e o relacionamento entre esta entidade e as entidades de pesquisa Guineenses podem ser financiadas ou promovidas como a primeira prioridade. A Guiné-Bissau poderia potencialmente beneficiar dos resultados das pesquisas na região conduzidas ao abrigo do Projecto de Produtividade Agrícola da África Ocidental, particularmente relacionadas com as sementes de variedades e práticas adequadas. 9.15 Adicionalmente, a infra-estrutura das unidades agrícolas é uma necessidade chave para o restabelecimento da capacidade de produção doméstica de arroz. Isto pode ser alcançado através da reabilitação ou construção de diques para arroz de manguezal ou através de canais de drenagem e margens anti-erosão para o arroz de cultivo em terras baixas. Os diques e as barreiras de canal no sistema de produção em manguezal assim como a melhoria nos perímetros irrigados já prevista nas propostas de projectos actuais podem fazer uma diferença significativa para o equilíbrio alimentar da Guiné-Bissau. É importante realçar que a disponibilidade de capital humano é um constrangimento muito importante para realizar este potencial. Isto é particularmente verdade no que diz respeito aos trabalhos iniciais de infra-estrutura, onde a assistência do projecto pode fazer muito para auxiliar a criar as condições para reactivar a produção. 9.16 Deve ser prestada atenção particular à melhoria da irrigação e drenagem nas terras baixas e na melhoria da gestão e manutenção através de parcerias público-privadas (PPPs). A reabilitação dos mecanismos de irrigação nas terras baixas podem melhorar a frequência das colheitas para duas por ano. As parcerias público-privadas podem ser promovidas com o intento de aumentar a intensidade do cultivo do arroz e alcançar duas colheitas por ano, aumentar o rendimento do cultivo do arroz através do uso de melhor tecnologia associada (sementes de variedades modernas de arroz, fertilizantes), promover melhores práticas agrícolas, melhor gestão dos recursos aquíferos, e a sustentabilidade do sistema no longo prazo. As terras baixas irrigadas de cultivo de arroz tendem a ser mais rentáveis em comparação com outros ecossistemas do arroz. As PPPs podem potencialmente aumentar as ligações de pequenos produtores de arroz com os mercados. 9.17 Existem também fortes requisitos em termos de capital humano em qualquer dos sistemas preferidos de produção de arroz (em manguezal, terras baixas e terras altas). Não é claro se a alocação entre a produção de caju e arroz é de soma zero. De facto, o caju é cultivado em muitos outros países da África Subsaariana em conjunto com outras colheitas base e em nenhum outro país este trade-off parece ser um problema substancial. Assim, vale a pena olhar para a situação da Guiné-Bissau de forma mais próxima para determinar qual é o constrangimento real. É importante reconhecer que existem duas questões distintas de alocação de trabalho. A primeira é o input laboral necessário para reconstruir os vários diques, barreiras de canais, e outra infra-estrutura necessária para a produção de arroz. O caju requer de forma similar inputs pontuais 189 para estabelecer plantações, mas em nenhum dos casos estes inputs são recorrentes numa base anual. A segunda questão é se as colheitas competem entre si para os inputs laborais. O arroz é uma colheita trabalho-intensiva, conforme é desenvolvida na Guiné-Bissau e em outros locais, ao invés que o caju pode ser produzido com inputs laborais mínimos quando as árvores são estabelecidas. Embora algumas práticas culturais sejam recomendadas (apuramento, etc.), não são necessárias para reduzidos níveis de produtividade. A Caixa 11 providencia uma visão de como é que um estudo da alocação de trabalho entre caju e arroz pode ser desenhado. Caixa 11: Como confirmar a viabilidade do cultivo de caju/arroz em famílias agrícolas Já se tornou um “facto” aceite na Guiné-Bissau que as famílias agrícolas abandonaram a produção de arroz a favor de caju devido aos elevados requisitos laborais do arroz. No entanto, a teoria económica diz-nos que é perfeitamente possível que duas colheitas sejam rentáveis para uma determinada família e que ambas podem ser cultivadas em simultâneo. De facto, é bastante comum em muitas economias rurais que o padrão dominante de cultivo inclua uma colheita base do tipo subsistência e outra mais rentável para venda. Essa diversificação pode ajudar a proteger o agregado familiar agrícola contra flutuações de preços ou climáticas que podem afectar uma ou outra colheita. É importante notar que não existe virtualmente nenhum problema com procuras concorrentes de território para o cultivo de caju e arroz. A produção tradicional de arroz no sistema de manguezal ocorre em áreas de terras baixas e ao longo de rios onde o controlo das águas para a produção de arroz é possível. A cultura do caju não cresce bem em tais áreas, e tem preferência por áreas mais secas. Já existem alguns perímetros irrigados e não há actualmente nenhuma proposta para a expansão destes. Um dos factores limitadores no problema de alocação em qualquer sistema agrícola é o problema de alocação de trabalho enfrentado por famílias agrícolas; a disponibilidade limitada de trabalho a ser alocado entre as diversas actividades produtivas e familiares está sujeita ao constrangimento normal do número de trabalhadores e das horas disponíveis para eles trabalharem. Na Guiné-Bissau, os estudos prévios136 confirmaram que tanto os manguezais como os sistemas de colheita irrigada são rentáveis sob a maioria das condições, embora o caju seja igualmente rentável, conforme evidenciado no grande crescimento na produção em décadas recentes. No entanto a produção de arroz estagnou ao mesmo tempo devido ao elevado custo de reabilitar as infra-estruturas de arroz (diques, barreiras de canais, portas, etc.), muitas das quais foram destruídas ou não mantidas durante a Guerra Civil dos anos 90. O problema da alocação do trabalho tem realmente duas partes distintas. Uma é o trabalho necessário para reconstruir a infra-estrutura para o cultivo do arroz, e a outra é o trabalho para o cultivo do arroz. A primeira é um investimento único em trabalho e capital necessário para permitir que o cultivo do arroz se processe numa base anual. O investimento análogo que seria necessário para o caju é a propagação e plantação de novas árvores de caju. Embora a reabilitação dos perímetros de arroz irrigados tenha sido avaliada para efeitos de projecto, existe pouca informação disponível sobre o tradicional sistema de arroz em manguezal utilizado desde há muito na Guiné-Bissau. De forma similar aos perímetros irrigados, verifica-se um custo inicial elevado, seguido por custos de manutenção subsequentes e anuais. Conforme notado acima, o investimento análogo que seria necessário para o caso do caju é a propagação e plantação de novas árvores. Neste caso verifica-se também um input único de trabalho e capital, que necessita depois de manutenção (mínima) durante o ciclo de vida de cada 136 E.g., Spencer e Djata 2008. 190 árvore. Um ponto importante no que toca ao arroz e caju é de que as despesas iniciais são o tipo de rubrica que um projecto apropriado poderia apoiar. Trata-se de uma despesa inicial única, demasiado volumosas para os agricultores financiarem por si só, mas que providencia um activo contínuo e produtivo que pode depois ser apropriado e mantido por parte dos agricultores. Os métodos convencionais de avaliação de projectos podem determinar a viabilidade de tais iniciativas seja no arroz ou no caju. Um questão prévia importante está associada ao problema da alocação laboral, e se este é solúvel numa base contínua. Isto é, uma vez que o investimento inicial em infra-estrutura e/ou plantações seja realizado, existirá um conflito entre os requisitos laborais de caju e de arroz? Embora haja uma presunção forte de que a resposta é não, é necessária mais informação para confirmar isto. Em outros países da África Subsaariana onde o caju é cultivado por pequenos proprietários (particularmente em Moçambique), o caju é frequentemente cultivado como um complemento a um sistema de colheita de base. No Norte de Moçambique, para mencionar um exemplo, muitas famílias crescem milho ao mesmo tempo que mantêm uma pequena horta de árvores de caju, que são frequentemente colhidas por crianças e não requerem um input maior de trabalho ou um conflito com o cultivo de milho. Será que o mesmo seria verdadeiro num sistema de produção de arroz de manguezal ou irrigado? Não existem actualmente estudos existentes sobre a sequência de inputs laborais para um sistema de arroz de manguezal na Guiné-Bissau. Antes de realizar os investimentos necessários à reabilitação do sistema de cultivo de arroz (que parecem uma boa ideia com base na diversificação e potencial rentabilidade), precisaríamos de executar um estudo focado nos inputs laborais necessários numa base recorrente para o cultivo e manutenção de arroz e caju nos sistemas em uso comum na Guiné-Bissau. Tal estudo necessitaria de incluir os diferentes agro- ecossistemas que existem na Guiné-Bissau assim como os diferentes sistemas de cultivo de arroz e caju no país. Deve ser mencionada uma nota adicional. O caju desfruta de um sistema de retalho actual composto por revendedores que viajam através do país e adquirem caju em bruto para exportação. O arroz não tem um sistema semelhante. O arroz não tem um sistema semelhante dedicado de comércio, embora os revendedores de caju efectuem troca directa de arroz por caju em bruto. Um sistema viável de produção e comercialização deverá ser analisado numa perspectiva ampla do sistema com um todo, e não somente na perspectiva agrícola considerada nesta nota breve. Uma importante intervenção que pode ser introduzida para estimular a produção de arroz e melhorar as ligações entre os mercados é a de ligar os pequenos proprietários agrícolas com o sector privado através de PPPs ou mecanismos de produção por contratos. Pontos importantes de sumário: 1. É errado conjugar a análise do trabalho necessário para os investimentos iniciais de infra- estruturas e reabilitação com os requisitos laborais do cultivo anual. Os investimentos iniciais ocorrem somente uma vez e podem ser apoiados por ajuda com base em projecto, enquanto o verdadeiro problema ao seguir em diante é a questão sobre se os requisitos anuais de cada colheita competem ou são complementares entre si. 2. Tendo em conta a rentabilidade de ambas as colheitas, conforme demonstrado em estudos do Custo de Recursos Domésticos no caso do arroz, e a forte procura externa de caju, em conjunto com o facto de que as questões de conflitos de terrenos são mínimas entre ambas as colheitas, faz sentido realizar um estudo sobre a alocação laboral dos requisitos recorrentes anuais de cada. Isto poderia permitir-nos avaliar a viabilidade do modelo de cultivo misturado de caju/arroz que poderia providenciar benefícios substanciais de diversificação e rendimento para as áreas rurais da Guiné-Bissau. 191 9.18 As ONGs podem apoiar ao providenciar serviços de extensão. Tendo em conta o facto de que são necessárias intervenções e melhorias ao longo de virtualmente toda a cadeia de abastecimento, desde a infra-estrutura até às sementes, cultivo, e comercialização (conforme explicado em baixo), existe a probabilidade de que a coordenação de todos estes esforços vá exigir a implementação de uma organização capaz de as incluir todas, uma vez que as falhas em qualquer uma das ligações pode causar (e no passado provavelmente causou) o colapso de todo o esforço. Para fornecer serviços de extensão, há justificativos para promover o uso de ONGs com experiência no desempenho deste tipo de funções, tendo em contas os constrangimentos de capacidade do Governo. 9.19 Em termos de intervenções fora das zonas agrícolas, o estabelecimento de um sistema de comercialização funcional é a prioridade para que o arroz chegue aos mercados. Actualmente, o arroz na Guiné-Bissau é fornecido através de dois canais (Figura 90): cerca de 40 por cento da produção doméstica de arroz é actualmente coberta por importações (Tabela 6). As importações de arroz para a Guiné-Bissau são controladas e licenciadas a nível do Governo. Em anos recentes, quatro casas de retalho licenciadas pelo Governo (Gomes e Gomes, Cogequi, Socobi e Agência Bijagós) receberam a maioria dos seus mantimentos da China, Vietname e Tailândia. Não existe uma estimativa fiável do número de retalhistas/vendedores em todo o país. A informação colhida no terreno indica que a maioria são cidadãos estrangeiros (e.g. Mauritânia, Guineenses), embora esta informação seja difícil de verificar. As importações de arroz abastecem sobretudo as áreas urbanas, e em certa medida, as áreas rurais. O arroz produzido localmente é quase exclusivamente consumido em áreas rurais, embora alguma seja fornecido a áreas urbanas através de mercadores itinerantes. O mercado local de arroz sofre de escassez considerável em termos de mecanismos de comercialização. 9.20 Embora exista uma produção doméstica substancial - a maior da qual é consumida pelos próprios produtores - o rendimento da venda não chega aos mercados locais. Estima-se que a maioria das famílias rurais esteja envolvida na produção de arroz. Destas, menos de um terço vende a sua produção. Essencialmente, a economia local do arroz funciona à semelhança dos últimos séculos: o arroz é produzido principalmente através de métodos tradicionais com poucos inputs adquiridos, e é consumido por aqueles que o cultivam. No entanto, algumas quantias são vendidas, principalmente em mercados provinciais. Tem sido relatado que algum volume de produção chega a Bissau, mas os volumes são muito reduzidos. Existem poucos comerciantes envolvidos no comércio de arroz, excluindo os que o utilizam para troca directa com caju. Uma grande porção do volume de produção é trazido para o mercado pelos próprios agricultores, que raramente viajam para longe das suas casas. A ausência de infra-estrutura básica é um grande constrangimento à ligação entre mercados e para ligar produtores e consumidores. Figura 90: Existem duas cadeias de distribuição para o arroz local e importado Fonte: Banco Mundial. 192 Tabela 6: Mais de 50 por cento do arroz para consumo doméstico é importado Milhete/Sorgo Arroz Trigo Total 2012/2013 (estimativas) Milho/outro Toneladas Toneladas Toneladas Toneladas Disponibilidade doméstica 122.602 656 43.363 166.621 Produção bruta 198.504 50.276 248.780 Produção líquida 119.102 42.735 161.837 Stocks iniciais 3.500 656 628 4.784 Necessidades 229.508 15.864 64.023 309.395 Superavit bruto/défice 106.905 15.208 20.660 142.774 Balança de importações e 101.291 9.203 5.131 115.625 exportações Importações previstas 100.055 9.203 109.258 Ajuda prevista 1.236 0 5.131 6.367 Exportações previstas … … … … Total de superavit/défice -5.614 -6.005 -15.529 -27.149 Fonte: Missão de Avaliação das Colheitas 2012/2013, GoGB/CILSS/ PAM/FAO 2013. 9.21 O papel dos Figura 91: Os termos de troca do caju e arroz em termos de comércio revendedores de caju na troca acompanham os preços internacionais do caju de produtos por arroz ao (termos de troca (ToT) em kg do caju; kg de arroz, e crescimento ano a ano invés de compra com moeda dos preços internacionais do caju) reduz os incentivos de 50 Preço internacional do caju (crescimento) 3.5 comercialização dos Termos de troca caju: arroz (RHS) 40 produtores. Porque é que um 3.0 comerciante que procura 30 comprar arroz dos agricultores 2.5 para revender em vilas ou 20 outras áreas rurais arriscaria 10 2.0 danificar o seu transporte de equipamento, muito menos para 0 1.5 assumir o risco de uma margem de comercialização incerta, -10 numa situação que a procura já 1.0 foi satisfeita por revendedores -20 de caju que fazem troca directa -30 0.5 de arroz por caju em bruto? Adicionalmente, a troca directa -40 0.0 por caju em bruto por arroz ao 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 e invés de compra com moeda Fontes: WFP (2013)137 e FMI. significa que a economia rural é, em certa medida, não monetizada - i.e. não há amplitude para vender outros produtos, tais como pequenos bens de consumo, inputs agrícolas, etc. se a população rural não tem meios para os 137 Programa Alimentar Mundial, Synthesis of Rapid Food Security Assessment in Guinea Bissau – Junho de 2013. 193 comprar. O mercado natural que necessitaria de ser abastecido por produtores locais, incluindo a cidade de Bissau e mercados provinciais, são precisamente as áreas onde os distribuidores de importação são activos no mercado de retalho. 9.22 Os investimentos em infra-estruturas, governação, acesso ao crédito, e numa economia monetizada são os requisitos chave para um sistema de comercialização funcional (que deverá considerar incluir ligações melhoradas entre os pequenos proprietários com o sector privado através de PPPs ou agricultura por contrato). Num nível físico básico, a situação muito precária da rede rodoviária secundária e terciária torna o acesso a grande parte do interior rural literalmente impossível durante vários meses do ano. Mesmo na época seca, o acesso é difícil e o transporte físico de bens que deverá resultar em mudanças de preços actuais não ocorre. O PNIA (Programa Nacional para o Investimento na Agricultura) concluído em 2010 enfatiza a importância deste problema. Até que o sistema rodoviário seja melhorado, pode assumir-se que diversas áreas do “celeiro” do Sul do país vão permanecer isoladas durante a época das chuvas e com acesso com dificuldade durante o resto do ano. O isolamento significa que os produtores não podem responder aos incentivos de preços e não podem integrar a economia nacional como um todo. Adicionalmente, os agentes potenciais de comercialização enfrentam não só as condições físicas adversas, mas também forças policiais e de autoridades locais vorazes em todos os cruzamentos que extraem rendas antes de permitir a passagem. A redução de comportamentos de busca de rendas por parte das autoridades locais será também um componente importante para permitir que o mercado local de arroz floresça. Por fim, monetizar a economia através de medidas tais como as transferências monetárias vai permitir aos produtores sair da troca directa do caju para um sistema moderno de comercialização. 4. ARROZ, SEGURANÇA ALIMENTAR, E DIVERSIFICAÇÃO DAS EXPORTAÇÕES 9.23 O arroz é o produto alimentar mais importante cultivado na Guiné-Bissau. A Tabela 7 demonstra a actual situação em termos de produção alimentar na Guiné-Bissau. O arroz é de longe o mais importante produto base, seguido do sogro, que, todavia, é equivalente a apenas 11 por cento da produção total de arroz. Existem no entanto menos produtores comerciais de arroz do que produtores de caju. A Figura 95 demonstra que o arroz corresponde a uma quota considerável do rendimento das famílias em algumas zonas rurais. 9.24 O preço do arroz não é adequado para enfrentar a insegurança alimentar. Como consequência da colheita desapontante de caju em 2013, a insegurança alimentar e a fome aumentaram na Guiné-Bissau. O preço do arroz é frequentemente culpabilizado por este fenómeno, argumentando que o preço mais reduzido do arroz melhoraria os termos de troca directa para os agricultores mais pobres de caju. Embora isto seja verdade, também pioraria os termos de troca dos agricultores locais de arroz, que também são pobres. A Figura 93 demonstra a situação actual na qual o arroz é importado a dois preços diferentes estabelecidos pelo Governo com base na sua capacidade de alterar os impostos, taxas, e também impor requisitos aos importadores de arroz.138 Com um preço elevado de importação, a produção doméstica encontra-se no ponto A, e o 138 O preço de venda do arroz é definido pelo Governo em consulta com os importadores, e é semelhante em todo o país. Ao negociar o preço de venda, os importadores chegam a um preço por saco para armazém em Bissau ao acrescentarem uma margem ao custo CIF por saco. Da informação fornecida por um dos importadores, esta margem totalizou cerca de 18 por cento do custo CIF no primeiro trimestre de 2008, composta por taxa aduaneira (12,5 por cento em 2007 e reduzida para 2,5 por cento em Março de 2008 para mitigar o efeito do aumento dos preços globais do arroz nos consumidores), taxas portuárias (CFAF 2.800 por tonelada), custos da carta de crédito e taxas dos fornecedores (5 por cento), taxa de transferência (1,25 194 consumo doméstico no ponto B. Se, conforme proposto, o Governo impusesse um preço de importação mais reduzido, então a produção seria mais baixa no ponto C e o consumo subiria para o ponto D. Os aspectos importantes a notar são que, embora os consumidores ganhassem claramente (consumindo mais arroz a um preço mais reduzido), os produtores também perderiam, vendendo menos e conseguindo um preço menor. A intervenção do Governo para reduzir artificialmente o preço do arroz impactaria nos agricultores de arroz mais pobres. Alternativamente, a intervenção do Governo para subsidiar o arroz também teria de ser financiada por impostos, o que afectaria os contribuintes, muitos dos quais são também pobres. Tabela 7: O arroz é a cultura de base mais importante da Guiné-Bissau Média Campanha Produção líquida 2012/2013 Cultura 2007-11 2012/2013 (tendo em conta produção/retenção de sementes) Toneladas Toneladas Toneladas (% diferença em relação ao bruto) Arroz de Planalto 49.735 53.915 Arroz de vale e Bolanha 68.808 97.083 Arroz de Manguezais 48.292 43.506 Arroz (produzido em Bissau) 3.760 4.000 Total de Arroz 170.595 198.504 119.102 -40% Milho 8.339 7.195 Sogro 17.066 23.547 Milhete 18.055 16.954 Fonio 478 580 Cereais secos (produzidos em Bissau) 1.474 2.000 Total de Cereais secos 45.412 50.276 42.735 -15% Total de Arroz e Cereais 216.007 248.781 161 -35% Mandioca 44.197 20.755 15.774 -24% Batata-doce 18.253 13.340 11.459 -14,1 Amendoim 34.695 45.214 45.214 0 Feijão mancanha 1.531 565 565 0 Fonte: Missão de Avaliação das Colheitas 2012/2013, GoGB/CILSS/ PAM/FAO 2013. por cento), estivadores (CFAF 110 por saco), transporte do porto para o armazém dos importadores (CFA 100 por saco), custos administrativos (3 por cento), taxa de inspecção da SGS (1,7 por cento), transporte para os retalhistas (1 por cento), e perdas (1 por cento). Os importadores transportam normalmente o arroz milhete dos seus armazéns para os dos consumidores de retalho localizados em muitas áreas urbanas do país na sua própria frota de camiões sem custos adicional para os retalhistas. Esta situação é aceitável para os importadores uma vez que eles são exportadores de caju e os camiões tendem a regressar a Bissau carregados com caju. 195 Figura 92: O arroz contribui para os rendimentos familiares, especialmente em zonas costeiras Fonte: Staff do Banco Mundial, baseado no ILAP 2010. Figura 93: O preço do arroz no curto prazo 196 Figura 94: O preço do arroz no longo prazo 9.25 O aumento da produção de arroz irá inicialmente aumentar a segurança alimentar para os cultivadores de arroz. Numa economia fechada, o aumento da produção resultaria num preço mais reduzido, sem piorar a situação dos produtores. No entanto, a Guiné-Bissau é uma economia aberta e o preço do arroz é providenciado externamente com base no preço internacional, significando que este preço não responde ao aumento da procura. A Figura 94 ilustra este ponto graficamente. O investimento no aumento da produção movimenta a curva de oferta de mercado para a direita. O gráfico, conforme desenhado, demonstra a oferta a expandir até ao ponto onde a produção doméstica pode satisfazer toda a procura doméstica no preço mais baixo dos dois presentes na Figura 94. É importante realçar que todos os preços internos desde o ponto inicial A (ou C, com custos de importação mais elevados) até ao ponto de produção D (ou B, ao preço mais elevado) ainda são governados com base no preço do mercado mundial, e o único mecanismo de ajuste é a quantidade importada, que irá depender da diferença entre a oferta doméstica e a procura doméstica no preço internacional. De facto, o preço mundial continuaria a ser o preço operativo mesmo que a oferta doméstica não expanda suficientemente para gerar exportações à direita do ponto D (ou B, ao preço mais elevado) com a quantidade a desempenhar ainda o papel de ajustamento, através das quantidades de exportação ao invés de importação. 9.26 O principal objectivo da produção de arroz é aumentar os rendimentos dos agricultores e diversificar a base de exportação da Guiné-Bissau. O Programa de Estabilização e Desenvolvimento do Governo de 2014 reconhece os perigos de depender somente do caju enquanto monocultura. Este capítulo demonstra que a Guiné-Bissau pode tornar-se um exportador de arroz uma vez mais. O sector do arroz pode tornar-se o segundo motor de crescimento, diversificando a economia a partir do caju, e ajudando a harmonizar a volatilidade de rendimentos dos preços do caju. Os agricultores de arroz beneficiariam de rendimentos mais elevados entre os agricultores tanto de arroz como de caju - assim como o Governo - e assistiriam à estabilização dos seus rendimentos através de uma maior diversificação. Poderá fazer sentido encorajar os 197 agricultores de caju para iniciarem o crescimento de arroz em simultâneo com o caju. É necessária mais pesquisa para estabelecer se o arroz e caju são complementares em termos de requisitos laborais (ver Caixa 11). Além de potencialmente encorajar os agricultores de caju para cultivarem arroz, a melhor forma de reduzir a insegurança alimentar entre os agricultores pobres de caju é aumentar e estabilizar o retorno do caju. 5. RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS 9.27 Com o equilíbrio certo de políticas, existe um espaço considerável para realizar o potencial da Guiné-Bissau em termos de produção de arroz. A forte vantagem comparativa que tem sido estimada em estudos recentes na Guiné-Bissau e demonstrada ao longo do curso da história sugere que uma política de longo prazo, baseada na vantagem comparativa, poderia começar a render retornos positivos mais cedo do que seria de imaginar. Entre as iniciativas a considerar estão:  Um programa de investimento ambicioso que poderia ser implementado ao longo dos próximos cinco anos para aumentar substancialmente a produtividade por acre e a produção geral de arroz, permitindo o alcance da auto-suficiência nacional. O núcleo deste programa seria desenvolver cerca de 10.000 hectares irrigados de arroz em solos aluviais de acordo com o um modelo já utilizado com sucesso na Guiné-Bissau no programa de cooperação do Governo da China. O Ministério da Agricultura, através do seu departamento de Engenharia Rural e em cooperação com o INPA e Departamento de Produção de Colheitas, poderia identificar terrenos detidos publicamente nas terras baixas ao longo dos grandes rios (particularmente o Geba e o Corubal), e poderia contratar ou supervisionar a preparação de terrenos para irrigação e a aquisição de equipamentos de irrigação para arrendar a pequenos agricultores (suficiente para 0,25 hectares por família), conjuntamente com a provisão de assistência técnica por parte do sector privado. O programa poderia também ser aberto a investidores privados dispostos a arrendar terrenos e a comprometerem-se com as práticas recomendadas que termos de utilização de novas variedades e inputs.  Os investimentos requeridos poderiam incluir a preparação dos perímetros irrigados - incluindo o estudo topográfico, construção das estradas rurais, terraplanagem, e construção de diques e estações de bombagem - com um custo estimado na ordem dos US$ 2500 por hectare, ou um investimento total de cerca de US$ 25 milhões. Seriam necessários cerca de US$ 8,6 milhões para um fundo de resolução para financiar o primeiro ano de inputs e assistência técnica privada para cada perímetro irrigado, e cerca de US$ 260.000 adicionais seriam necessários anualmente para o Ministério da Agricultura para a coordenação e supervisão da implementação do programa. Com a dupla época de colheitas - irrigada durante a época seca e beneficiando de água durante a época das chuvas - o aumento da produção expectável anual com a implementação total de todos os perímetros seria de cerca de 90.000 -100.000 toneladas de arroz casca, equivalente a cerca de 68.000-75.000 toneladas de arroz limpo. Se restringido a pequenos agricultores, o programa proposto beneficiaria cerca de 40.000 famílias ou cerca de 250.000 pessoas.  Tendo em conta as limitações institucionais e de crédito, a implementação de um programa deste tipo de alto impacto no curto prazo irá exigir que o Governo - apoiado por doadores - seja o principal actor em termos de financiamento aos investimentos para o desenvolvimento do sistema de irrigação, para que os novos arrozais estejam aptos para plantação. No entanto, o planeamento e execução das actividades devem ser alocados a empresas privadas nacionais ou internacionais com experiência. Adicionalmente, serão necessários recursos para investimentos em melhores sementes, fertilizantes e pesticidas, e assistência técnica para a gestão das áreas de plantações. Embora o aumento na 198 produção de arroz vá gerar receitas suficientes para pagar estes inputs e assistência técnica, a recuperação de custos não será possível após o primeiro ano. Os custos de arranque podem ser enquadrados em sistemas de matching grants, com o trabalho da comunidade como contrapartida, sem obrigações de reembolso, ou através de fundos de resolução com reembolsos efectuados para uma conta gerida na comunidade de forma a criar uma reserva para futuros custos operacionais e de manutenção, pequenas necessidades de investimento, e/ou outras melhorias na comunidade.  Por fim, a pesquisa e desenvolvimento relacionada com a agricultura e a assistência técnica aos agricultores será também essencial para implementar e suster o programa. Embora as variedades de arroz de alto rendimento tenham sido testadas e consideradas adequadas na Guiné-Bissau e estas possam ser importadas a curto prazo, a pesquisa nacional agrícola deverá desempenhar um papel chave na produção de sementes e na adaptação contínua das variedades de alto rendimento (ver parágrafos 4.57-4.60 infra). No que respeita à assistência técnica para os agricultores, a proposta é melhorar as ligações entre os pequenos proprietários e empresas para fornecer estes serviços. Esta ligação pode também melhorar a produção e comercialização. Com o apoio necessário, o INPA poderia estar apto a produzir cerca de dois terços das sementes necessárias, mas o papel do sector privado seria também fundamental para fornecer inputs, assistência técnica, processamento e comercialização. Tendo em conta os resultados positivos com a liberalização do mercado de sementes em outros países Africanos, pode ser seguida uma opção similar na Guiné-Bissau, com o objectivo de ter o sector privado a fornecer o terço restante das sementes necessárias. A Guiné-Bissau poderia considerar fazer parte do Programa de Produtividade Agrícola da África Ocidental, financiado pelo Banco Mundial e envolvendo actualmente 14 países da África Ocidental. 9.28 O cultivo do caju ao invés do arroz é uma opção racional para a maioria dos agricultores. Se o principal objectivo das famílias rurais é garantir uma disponibilidade adequada de alimentação, então não deverá ser um mistério porque é que o trabalho é alocado ao caju e não ao arroz: (i) os revendedores de caju são uma fonte fiável de fornecimento de arroz e pedem pagamento em caju em bruto e, numa economia não monetizada, há pouca margem para alternativas ao comércio de troca directa; (ii) os sistemas de produção de arroz estão num estado de falta de reparação; (iii) os inputs para a produção de arroz (incluindo sementes) estão frequentemente indisponíveis e/ou não disponíveis de forma atempada; (iv) os sistemas de comercialização para a venda dos excedentes de arroz são rudimentares e não existentes em muitas áreas. Todas estas considerações devem ser tomadas em conta para tornar claro que a alocação de trabalho para o caju e não para o arroz é possivelmente uma resposta perfeitamente razoável para o elevado custo de reestabelecer a infra-estrutura do arroz, conjugada com a relativa dificuldade em comercializar os excedentes de arroz, em conjunto com a disponibilidade pronta de uma colheita - caju - que exige bastante menos em termos de inputs iniciais em termos de trabalho e capital para estabelecer sistemas de produção viáveis. 9.29 No entanto, a massa crítica dos agricultores deverá retornar ao arroz se for realizado investimento suficiente no sector. Se forem considerados os pesados investimentos físicos necessários para reavivar o sector do arroz, o fornecimento de serviços de pesquisa e extensão, assim como os esforços para melhorar as ligações com os proprietários, o sector privado pode melhorar a disponibilidade de crédito e outros serviços para melhorar as ligações de mercado. O Banco Mundial já está a apoiar o Governo na reabilitação de terrenos para a produção de arroz e irá também apoiar o fornecimento de melhores inputs agrícolas para os pequenos agricultores para aumentarem a produção agrícola, principalmente de arroz. 199 CAPÍTULO 10: PESCAS, EMPREGO E RECEITA 1. VISÃO GERAL 10.1 A pesca é uma das principais actividades económicas realizadas na costa ocidental de África. A importância desta actividade é evidente na sua contribuição para o crescimento, redução da pobreza, e segurança alimentar nos estados costeiros, incluindo a Guiné-Bissau. 10.2 A Guiné-Bissau tem uma costa relativamente pequena com cerca de 270 km (excluindo as ilhas oceânicas). A costa é profundamente esculpida por uma dúzia de estuários e um vasto arquipélago que lhe concedem uma das maiores plataformas continentais da África Ocidental. As águas de pesca da Guiné-Bissau são muito ricas em termos de espécies de peixe abundantes e diversidade, e são sustentadas por um influxo de nutrientes dos principais estuários do país que providencia 3.400 km2 de cobertura de manguezais, quase 10 por cento do território nacional. A actividade dominante de correntes no país facilita a troca de nutrientes através das colunas de água para uma melhor produtividade das águas marinhas. A ocorrência deste fenómeno é facilitada por uma grande dimensão da placa continental (mais de 45.000 km2), profundidades rasas, e diferentes naturezas que providenciam um santuário e espaço de reprodução para muitas espécies marinhas. Figura 95: A produção industrial de pescas é dominada por pequenos pelágicos. 10.3 A configuração geográfica e o (toneladas anuais de pesca industrial) clima tropical húmido oferecem 100 Pequenos pelágios (e.g. sardinhas) Thousands condições favoráveis e produtivas de Grandes pelágicos (e.g. atum) pesca para os demersais e outros Demersais (corvinas, pargos, etc.) Vários pequenos pelágicos (Figura 95). Os 80 Crustáceos (e.g. camarão) demersais são espécies de profundidade tais Cefalópodes (e.g. polvo) como peixe, camarão, e cefalópodes, enquanto pequenos pelágicos são espécies 60 que vivem nas colunas de água, e.g. bonga e sardinela. Devido à escassez de dados (relacionados com a pescas e de fontes 40 independentes), o verdadeiro potencial de pesca da Guiné-Bissau e a sua variação ao longo dos anos não é conhecido. O último 20 estudo de recursos de pesca demersais e conduzido conjuntamente pela IMROP e CIPA em Setembro - Outubro de 2011 0 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011* (IMROP-CIPA, 2011) confirma que o país tem um potencial de pescas significativo, Fonte: Governo da Guiné-Bissau 2010 Plano de Gestão das conforme indicado nas estimativas prévias Pescas. * 2011, CIPA - Industrial Fisheries Catch Statistics, de biomassa (2004 e 2008). A Tabela 8139 2011 139 Os modelos de biomassa são utilizados para calcular o potencial das estimativas de pescas. Estes modelos são baseados numa série de premissas relacionadas com a capacidade de cada espécie de se reproduzir, por exemplo, assume-se um rácio inferior a 40 por cento de biomassa para todos os tipos de peixes, excepto para elasmobrânquios, onde um rácio inferior a 10 por cento é assumido, devido à sua longevidade, reprodução tardia, fecundidade fraca e baixa taxa de crescimento. O modelo utilizado para calcular o potencial de pesca da Guiné-Bissau é baseado em Diop, M., Abdallahi, I., Bouzouma, M., Sidina, E., Hamady, B., Meissa, B. e 200 apresenta os mais recentes (2011) potenciais estimados de biomassa e pescas da Guiné-Bissau. A biomassa de peixes demersais é estimada em 126.531 toneladas, e o potencial de peixes demersais, cefalópodes e crustáceos situa-se em 47.139 toneladas. A FAO estima que o potencial disponível de pequenos pelágicos é de mais de 100.000 toneladas por época de pescas e o nível de exploração destas espécies migrantes depende das capturas fora da ZEE da Guiné-Bissau. A FAO também indica que o esforço de global de pescas pode aumentar na vertente de pescas artesanais, com a possibilidade adicional de aumento da pesca industrial de pequenos pelágicos. A Secretaria de Estado para as Pescas estima que o potencial de pescas para pequenos peixes pelágicos seja aproximadamente de 73.000 toneladas contra uma biomassa actual de 200.000 toneladas, trazendo o potencial total de pescas para cerca de 120.000 toneladas para demersais e pequenos peixes pelágicos. Tabela 8: Biomassa e estimativas de potencial de pesca para peixes demersais, 2011 Tipo Biomassa Potencial de pesca (toneladas) (toneladas) Peixes demersais 90.932 36.373 Crustáceos 13.149 5.260 dos quais 2,3 por cento são camarões de costa e 6,4 por cento são gambas (Parapenaeus longirostris) Cefalópodes 8.308 3.323 dos quais 32 por cento são polvos e 15 por cento são lulas Gastrópodes 2.567 1.027 Elasmobrânquios (raias 11.575 1.156 e tubarões) Total 126.531 47.139 Fonte: Secretaria de Estado das Pescas Produção das pescas 10.4 À semelhança de quase todos os estados costeiros africanos, os recursos pesqueiros são extraídos por duas grandes indústrias pesqueiras nas águas da Guiné-Bissau: artesanais e industriais. As duas indústrias empregam diferentes técnicas nas suas operações de captura de peixes; a frota de pesca artesanal utiliza barcos motorizados e não motorizados, ao invés da frota industrial que utiliza arrastões e cercadores. Os barcos e equipamentos de pescas evoluíram ao longo das últimas duas a três épocas, tornando-se maiores e mais eficientes. O número total estimado de barcos de pescas artesanais a operar na Guiné-Bissau em 2013 era de 1159. Deste número, 730 são propriedade de e operados por Guineenses e 429 por pescadores migrantes estrangeiros (217 da Guiné-Conacri e 212 do Senegal). Também em 2013, 106 barcos de pesca industrial pescaram nestas águas através de joint-ventures ou algum tipo de acordo. Existiam quatro navios nacionais a pescar no país. Embora as estimativas de barcos artesanais estejam disponíveis, os dados de captura não foram colectados. O sistema de colecta de dados sobre pescas na Guiné-Bissau tem-se tornado disfuncional desde o cessar do apoio da UE à unidade de estatísticas CIPA em 2010. A avaliação socioeconómica das pescas artesanais, realizada em 2011 por parte da Secretaria de Estado de Pescas (CIPA 2011), é o último relatório disponível sobre o sector artesanal. Este relatório estima que quase 22.000 toneladas de peixe foram pescadas no sector de pescas artesanais em 2011, um aumento de 8 por cento desde 2009. Todavia, estas estimativas são muito subestimadas devido ao facto de que a avaliação não toma em conta os N. Abdoulaye, 2004., Rapport de la Campagne d’Evaluation des Resources Demersales de la ZEE de la Guinee-Bissau. p.90. 201 barcos operados por não residentes na Guiné-Bissau ou barcos baseados na Guiné-Conacri ou Senegal que estão a operar nas águas da Guiné-Bissau, assim como a cobertura estatística limitada (nem todos os locais de desembarque são cobertos e os pescadores que não utilizam barco também não estão incluídos na avaliação). A produção industrial relatada de 2005 a 2011 é apresentada na Figura 95 em cima. A captura média anual é de 70.000 toneladas. A tendência actual de produção regista um aumento gradual nos desembarques industriais desde 2008. 10.5 A produção anual estimada não inclui as capturas ilegais nas águas da Guiné- Bissau. Embora o volume de peixe pescado de forma ilegal, não regulada e não reportada (IUU) seja desconhecida, a pesca do tipo IUU é considerada muito elevada no país devido à fraca capacidade institucional de controlar efectivamente as actividades de pescas nas suas águas. Com o presente status quo, a captura estimada das águas ao largo da Guiné-Bissau pode variar da realidade. Esta situação deverá alterar-se com a implementação do Programa Regional de Pescas da África Ocidental (WARFP, Caixa 12). Caixa 12: O licenciamento como uma ferramenta para gerir de forma sustentável o stock de pescas da Guiné-Bissau Actualmente, o sistema de licenciamento da Guiné-Bissau é débil. O acesso a recursos aquáticos para pesca de pequena escala continua largamente livre e aberto a qualquer Guineense com o equipamento necessário para entrar no sector das pescas. A entrada na pesca industrial é regulada; os navios de pescas operam em águas da Guiné-Bissau através ou de acordos de pesca compensatórios, acordos bilaterais, ou através de joint-ventures onde a parte nacional é responsável por obter a licença/autorização. Para que o país proteja e reconstrua os seus stocks pesqueiros e para capturar a riqueza que é gerada através da exploração deste recurso, tem também de introduzir um sistema efectivo e sustentável de controlo de acesso e gestão para pescas de pequena escala. A fraca regulação leva à pesca excessiva, o que corrói a subsistência dos pescadores locais. Devido ao problema de recursos comuns - onde os pescadores têm tendência de competir entre si por stocks exauríveis de peixe - a gestão do acesso ao sector é crítica para evitar a pesca excessiva. No entanto, embora a pesca industrial seja regulada e licenciada, as frotas pequenas - tanto locais como de pescadores regionais - estão a operar sob regimes de acesso livre sem controlo. Este não é um problema na Guiné-Bissau mas na região como um todo. A prática de acesso livre leva à sobreexploração dos stocks de peixe, e ao decréscimo na taxa de captura, em simultâneo com a corrosão dos efeitos positivos económicos e sociais nas comunidades pesqueiras e na nação como um todo. Em 2012, estimou-se que 1159 unidades pesqueiras que providenciaram emprego directo a 20.862 pescadores estavam a ter acesso aos recursos pesqueiros sem uma licença ou autorização de pesca; no passado e actualmente estão a operar sob um sistema “não regulado” de livre acesso, contribuindo para o decréscimo das taxas de captura. A regulação pobre também resulta em receitas abaixo do potencial para o Governo. Assumindo que as taxas de captura para as unidades pesqueiras não variam, a aplicação da taxa de licenciamento (US$ 13 por tonelada por ano) utilizada por autoridades pesqueiras nos pequenos pescadores da Mauritânia ou Senegal sugere que o Governo da Guiné-Bissau pode ter perdido cerca de US$ 115.000 em capturas desembarcadas por frotas de pequena escala em 2013. No entanto, estas estimativas podem estar fortemente subestimadas devido a vários factores, especialmente devido a limitações de dados sobre navios pesqueiros estrangeiros de pequena escala, assim como pesca sem utilização de barco. A receita perdida é de facto provavelmente superior à estimativa de US$ 115.000 por ano. 202 O licenciamento e a respectiva aplicação são cruciais. Daqui em diante, o Governo da Guiné- Bissau deverá desenhar um sistema de registo e licenciamento para o acesso à pesca artesanal para unidades pesqueiras nacionais e estrangeiras. O uso desta ferramenta deverá tirar partido dos sistemas robustos e sustentáveis de seguimento, controlo e vigilância contínua suportados pela WARFP. Sob o componente 2 deste projecto (redução da pesca ilegal), as capacidades institucionais e técnicas da agência de vigilância das pescas (FISCAP) serão expandidas em termos de reformas legais e institucionais, formação e provisão dos equipamentos necessários (incluindo barcos patrulha, radares, sistemas de monitorização de barcos, etc.) e materiais para cumprir efectivamente a sua missão. Estes sistemas poderiam ser sustentados com parte da receita gerada pelo sistema de licenciamento e por multas de infracções (tanto industriais como de pescas de pequena escala) para suster as actividades da FISCAP. O envolvimento das pequenas comunidades pode também ajudar a reduzir a pesca do tipo IUU. As comunidades pesqueiras podem ser envolvidas através de sistemas de co-gestão bem definidos, tais como Direitos de Uso de Território de Pesca (TURFs). O empossamento legal de comunidades pesqueiras locais na co-gestão dos recursos pesqueiros numa zona alocada pode ter efeitos positivos na reconstrução dos stocks pesqueiros em outros lugares. Por exemplo, em Ngaparou, uma vila costeira pesqueira a 64km do Sul do Senegal, um comité local de pesca controla e gere o acesso à zona pesqueira sob a sua responsabilidade em parceria com as autoridades pesqueiras. Este acordo resultou no regresso de determinadas espécies de peixes à área, e aumentou tanto a taxa de captura como a dimensão dos peixes capturados. Os sistemas de co-gestão legalmente estabelecidos são uma chave do sucesso de qualquer sistema de licenciamento de pequena escala a ser estabelecido na Guiné-Bissau: concedendo aos pescadores nacionais um voto na gestão dos seus recursos pesqueiros e providenciando um sentimento de propriedade e agência, empossando-os para gerir e aumentar a sua subsistência. Fonte: Banco Mundial. 2. ACÇÕES PARA TRAZER A ECONOMIA OFFSHORE PARA ONSHORE 10.6 Na Guiné-Bissau e na região da África Ocidental em geral, os recursos marinhos estão a suportar uma pressão pesqueira excessiva num ambiente essencialmente não regulado, levado à sobreexploração e baixo desempenho da base de recursos. Os recursos pesqueiros são renováveis e representam uma forma de riqueza que, se for gerida de forma racional e sustentável, pode continuar a produzir um fluxo constante de benefícios económicos e sociais durante muitos anos. Com esta vasta base de recursos, o sector das pescas na Guiné-Bissau tem o potencial para fazer uma contribuição maior para o alcance de determinados objectivos de desenvolvimento, tais como crescimento económico e redução da pobreza, mas somente se forem melhor geridos para evitar a sobreexploração. Os estudos e observações de campo indicam que os stocks pesqueiros estão a reduzir devido a (a) capacidade insuficiente da Guiné-Bissau para governar e gerir o uso de recursos de forma sustentável e para prevenir a sua sobreexploração; e mais especificamente (b) a incapacidade do país de prevenir e impedir a pesca ilegal; assim como (c) o facto de que os recursos são largamente colhidos numa economia offshore por barcos industriais ou estrangeiros que raramente desembarcam a sua captura na região ou participam na economia local, levando a que os países capturem apenas uma fracção do valor. Estes desafios são reais e estão a afectar a capacidade do país de capturar a riqueza que poderia ser gerada na extracção correcta dos recursos de pesca nacionais. 10.7 O seguimento de políticas que garantam a exploração sustentável destes activos e um ecossistema saudável e produtivo requer compromissos e vontade. Para enfrentar as 203 deficiências e constrangimentos da gestão de recursos na região da África Ocidental, incluindo na Guiné-Bissau, o Banco Mundial está a apoiar a implementação do Programa Regional de Pescas da África Ocidental (WARFP). O objectivo amplo do programa é aumentar de forma sustentável a riqueza gerada por parte da exploração dos recursos marinhos da África Ocidental e da quota de riqueza capturada na região. O WARFP consiste de uma série de projectos, cada um com duas fases de cinco anos cada. O programa deverá abranger 10 anos, no final dos quais deverá ter coberto todos os sete países membros do CSRP (Cabo Verde, Gâmbia, Guiné-Bissau, Mauritânia, Senegal e Serra Leoa) além da Libéria e do Gana. O Programa Regional de Pescas da África Ocidental tem um objectivo e abordagem partilhada, significando que cada Crédito de Programa Adaptável (APL) na série teria o mesmo quadro, i.e. os mesmos componentes e subcomponentes, mas seria aplicado a diferentes países (com diferentes especificidades para cada país). Este desenho comum toma em conta três recomendações-chave: (i) encorajar a colaboração regional na gestão e desenvolvimento dos recursos marinhos de peixe na região; (ii) oferecer apoio de longo prazo (10 anos) à implementação progressiva de acções que apontem ao fortalecimento dos esforços colaborativos para gerir de forma partilhada as pescas e os recursos pesqueiros; e (iii) conceder flexibilidade a grupos de países para participar no WARFP à medida que se tornem elegíveis, ao invés de esperar pelo final da primeira fase do APL inicial para participar. O objectivo das fases iniciais da série de projectos (SOP) na Guiné-Bissau é de reforçar a capacidade do Governo de gerir de forma mais sustentável o uso dos recursos marinhos pesqueiros, reduzir a pesca ilegal, e aumentar o valor acrescentado aos produtos pesqueiros. Situação económica e financeira actual 10.8 A maioria dos países da costa da África Ocidental (e.g. Mauritânia e Senegal) têm aproveitado o dinamismo das pescas enquanto indústria alimentar para reorientar as prioridades de desenvolvimento para incluir o sector das pescas. A diversificação das operações de pescas e de oportunidades de emprego criadas por estas medidas têm levado a uma melhor contribuição do sector das pescas para as diversas economias nacionais. A Guiné-Bissau não realizou ainda o potencial pleno das suas pescas, embora estes recursos sejam extraídos numa base diária (legalmente ou ilegalmente) e desembarcados em portos estrangeiros, devido principalmente à fraca gestão e falta de infra-estruturas. O custo bruto estimado do peixe captado por barcos industriais nas águas da Guiné-Bissau em 2011 utilizando preços de desembarque (sem valor acrescentado) do Centre de Recherches Oceanographiques de Dakar-Thiaroye do Senegal para o mesmo ano é de US$ 109.124.230 (Tabela 3). Estes são desembarcados directamente nos portos estrangeiros com uma reduzida contribuição para os cofres nacionais; algumas estimativas revelam que apenas 25 por cento destas receitas foram capturadas a nível nacional. A estimativa dos valores dos custos devem ser vistas como indicativas. Tabela 9: Custo bruto indicativo do peixe capturado por pescas industriais em 2011 nas águas da Guiné-Bissau Captura Custo Est. Valor (US$) Grupo de Espécies (tonelada) (US$/tonelada) Cefalópodes (e.g., polvo) 7.038 4.105 28.890.990 Crustáceos (e.g., camarão) 2.166 1.400 3.032.400 Demersais (e.g. corvinas, pargos, etc.) 21.349 3.000 64.047.000 Pequenos pelágicos (e.g., sardinhas) 46.978 280 13.153.840 Total 77.531 109.124.230 10.9 A contribuição das pescas para o PIB da Guiné-Bissau é estimada pela Comissão Sub-regional de pescas em menos de 4%, apesar do imenso potencial pesqueiro. A contribuição seria muito mais elevada se as estruturas adequadas de governação e gestão fossem colocadas em 204 prática. Por exemplo, na Mauritânia, que tem um nível mínimo de controlo e infra-estruturas, as pescas contribuem significativamente para a produção doméstica com cerca de 10-12% do PIB. Tendo em conta reduzida dimensão da Guiné-Bissau e os stocks abundantes e diversos de peixes, as pescas têm um potencial considerável para impulsionar o crescimento económico. O país poderia gerar rendas económicas excedentes para desenvolver ou crescer o capital intangível, conforme discutido no capítulo 7, se estas reservas fossem devidamente geridas. 10.10 De acordo com o Ministério das Pescas, o sector das pescas empregou cerca de 24.586 pessoas em 2013, embora os dados não tenham desagregado em diferentes profissões socioeconómicas associadas às pescas. No Senegal, os barcos de 18 metros ou mais são impulsionados por motores de 40 cavalos e levam tripulações de 18 pescadores. O mesmo tipo de barcos também são encontrados na Guiné-Bissau e em outros países vizinhos, tais como a Gâmbia e a Mauritânia. Assumindo que todos os barcos operam da mesma forma, o número estimado de pescadores artesanais que trabalham nas águas da Guiné-Bissau em 2013 foi de cerca de 20.862; os que estão em barcos nacionais (13.140); barcos da Guiné-Conacri (3.906); e barcos do Senegal (3.816). Os restantes (3.724) podem ser envolvidos em actividades associadas às pescas, tais como processamento de peixe, comercialização, distribuição, construção de barcos, etc. Tomando em conta uma estimativa conservadora de 60 por cento dos pescadores como líderes de agregados familiares com uma média de 5 dependentes, pode assumir-se que cerca de 12.500 famílias ou 62.500 pessoas dependem directa ou indirectamente no rendimento dos pescadores na Guiné- Bissau. O número estimado de pessoas que dependem das pescas em 2013 é de cerca de 87.000. Este número pode ser mais elevado se forem incluídas nesta categoria outras pessoas envolvidas em outras actividades socioprofissionais associadas às pescas. Nesta região não é surpreendente ver mais dos que 10 pessoas por agregado familiar. A escassez de dados significa que os benefícios sociais e económicos que advêm da pesca não são adequadamente capturados. Não existem dados recentes sobre pescas artesanais, nem é possível estimar até que medida é que as pescas estão a impactar nos outros sectores económicos do país. Os pescadores produzem bens e serviços de outros sectores e também investem neles. Potenciais benefícios económicos e sociais 10.11 Os resultados do WARFP incluem: melhoria nos quadros de governação e gestão sustentável das pescas e instituições correspondentes, monitorização da pesca sustentável, sistemas de controlo e seguimento, e instalações de controlo e inspecção funcionais. O impacto destes resultados reflectir-se-á em menos pesca ilegal e não regulada, aumento no esforço de captura por unidade, e aumento dos benefícios económicos e sociais, incluindo emprego. Assumindo que os alvos são alcançados, o esforço de captura por unidade de todas espécies irá aumentar em 3-6 por cento; utilizando as capturas de 2011 como cenário base e assumindo preços constantes, o custo bruto estimado do peixe que irá ser capturado e desembarcado por parte da frota industrial é de US$ 113.414.495 (Tabela 10). Esta premissa é baseada na boa governação e gestão sustentável das pescas, assim como na instalação de um sistema de vigilância contínua efectivo. O aumento na taxa de captura de peixe é um impulsionador para a criação de emprego e criação de riqueza; estes podem seguir as mesmas tendências do que o esforço de captura por unidade. A ausência de dados não permite estimar estes parâmetros. 10.12 Qualquer aumento do emprego e rendimento irá provavelmente resultar em mais famílias a emergir da pobreza e num aumento do número de pessoas a beneficiar de um impacto positivo do sector pescas na Guiné-Bissau. Embora os Guineenses sejam maioritariamente agricultores, a taxa de rotatividade pode causar que muitos entrem na indústria das pescas. O sector das pescas tem um grande potencial de contribuir para o crescimento económico da Guiné-Bissau se existir boa governação e forem implantados quadros de gestão de gestão sustentável das pescas, incluindo um sistema efectivo de vigilância contínua. É imperativo 205 notar que o efeito multiplicador na redução da pobreza é significativo nas pescas e pode desempenhar um papel no suporte ao motor económico do país. Tabela 10: Custo bruto indicativo estimado das pescas industriais em 2015. Captura % Captura Custo Est. Valor (tonelada) Aumento (tonelada) (US$/tonelada) (US$) Grupo de Espécies 2011 2015 Cefalópodes (e.g., polvo) 7.038 4,8 7.377 4.105 30.282.585 Crustáceos (e.g., camarão) 2.166 5,2 2.278 1.400 3.189.200 Demersais (e.g. corvinas, pargos, etc.) 21.349 3,0 22.000 3.000 66.000.000 Pequenos pelágicos (e.g., sardinhas) 46.978 6,0 49.797 280 13.943.160 Total 77.531 81.451 113.414.945 3. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS 10.13 Embora a Guiné-Bissau tente aumentar de forma sustentável as rendas que as pescas podem gerar para o sector público, o país começou através do WARFP a colocar as fundações para uma transição gradual de uma economia offshore para onshore no longo prazo, de forma a acrescentar mais valor localmente aos produtos de pesca e encorajar o desenvolvimento dos serviços associados. Para alcançar esta visão e objectivos de alto valor, incluindo o desenvolvimento económico e social, as autoridades pesqueiras da Guiné-Bissau devem:  Procurar alcançar a sustentabilidade ecológica ao minimizar os potenciais impactos adversos e pressões relacionadas com as actividades de pesca;  Permitir a recuperação de stocks sobre-explorados ou populações;  Extrair os recursos de forma prudente e proteger contra a usurpação e pesca ilegal nas águas do país ao colocar em prática um sistema efectivo e sustentável de seguimento, controlo, e vigilância, reduzindo assim os incidentes de pescas ilegais, não reguladas ou não relatadas;  Fortalecer a base de conhecimento através da partilha de informações para a exploração sustentável e gestão dos recursos de pesca e ecossistemas associados;  Participar em esforços colaborativos para a gestão e desenvolvimento das pescas sustentáveis na região da África Ocidental;  Continuar o esforço de fortalecimento do Governo para a aplicação dos regulamentos sob o WARFP;  Explorar a possibilidade de utilizar navios de vigilância ou aeronaves de países vizinhos;  Realizar reformas do quadro institucional e legal, acompanhadas por melhores práticas de governação e uso e gestão sustentável de recursos pesqueiros, conduzidos de uma forma participativa e transparente;  Incluir princípios de abordagens baseadas no ecossistema às pescas e respectivos processos de gestão;  Desenvolver parcerias com as ONGs para introduzir os pescadores potenciais ao comércio da pesca. 206 CAPÍTULO 11: OS SECTORES DE MINERAÇÃO E DO PETRÓLEO: TRANSFORMAR O CAPITAL NATURAL EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 1. INTRODUÇÃO 11.1 Historicamente, os sectores de mineração e petróleo na Guiné-Bissau têm sido não existentes, com a excepção de alguma exploração de pedreiras e um pequeno volume de mineração artesanal. Embora se saiba desde a década de 70 que existem potencialmente grandes depósitos de bauxite e fosfatos, devido a questões de qualidade e infra-estruturas, preços internacionais reduzidos, e instabilidade política, estes nunca foram devidamente explorados. No entanto, em anos recentes, tanto as áreas de bauxite (2007) como de fosfatos (1997) entraram em concessões de exploração de longo prazo. No caso dos fosfatos, em 2014 os novos proprietários iniciaram um estudo de viabilidade para o desenvolvimento de uma grande mina, que poderá ser potencialmente o maior investimento na história da Guiné-Bissau. Registaram-se também diversas descobertas offshore de depósitos de óleo pesado, a mais recente das quais registou-se em 2013 em águas relativamente rasas e que mostra promessas de ser o primeiro depósito economicamente explorável, embora haja ainda um longo caminho a percorrer antes de ser concluir com alguma certeza. Diversas outras companhias estão actualmente activas no campo e estão a trabalhar em mais avaliações de outros recursos potencialmente promissores. 11.2 O recente interesse de investidores estrangeiros no sector das indústrias extractivas (IE) mostra um potencial considerável. Se algumas das oportunidades acima mencionadas forem realizadas, teriam um impacto substancial no rendimento nacional, receitas fiscais, e receita de divisas externas para a Guiné-Bissau. Os cálculos desde capítulo sugerem que, se as minas de bauxite e fosfatos entrarem em produção, as extracções podem ser na ordem dos 13 por cento a 26 por cento do PIB, 77 por cento a 121 por cento das receitas fiscais, e 90 a 102 por cento das receitas de divisas estrangeiras. Um grande projecto na área do petróleo teria um impacto ainda mais substancial. O potencial para a economia da Guiné-Bissau e Guineenses é sem dúvida amplo. 11.3 No entanto, existem numerosos exemplos de países nos quais a grande maioria da população não apenas não beneficiou mas eventualmente foi prejudicada depois da descoberta e exploração de grandes depósitos de petróleo ou de minerais. Será necessário empreender programas e políticas específicas ao longo de toda a dimensão da cadeia de valor das indústrias extractivas para garantir que os benefícios da exploração de recursos são distribuídos e novas oportunidades de desenvolvimento são realizadas. Adicionalmente, tendo em conta a forte dependência da larga maioria da população da Guiné-Bissau da agricultura e pescas, é essencial que o impacto ambiental de qualquer infra-estrutura desenvolvida e associada seja minimizada e restrita aos requisitos de espaço da operação, com a reclamação de terrenos a ter lugar na máxima extensão possível durante as operações e depois do encerramento da mina. Em suma, a exploração de recursos só irá levar ao desenvolvimento socioeconómico sustentável da Guiné-Bissau se forem implementadas políticas e programas para garantir que o capital natural é transformado em capital humano, infra-estruturas, ou capital intangível tais como melhores instituições. 11.4 Ao promover as ligações locais com a economia, a mineração pode apoiar os rendimentos locais. Experiências de outros países sugerem que trabalhar em minas e seu abastecimento pode ser uma fonte considerável de rendimento para as comunidades locais, incluindo para o sector de trabalhadores com poucas competências. As companhias de mineração apoiam frequentemente o desenvolvimento da comunidade, e os seus potenciais investimentos em competências ou educação podem aumentar o nível de capital humano do país. Embora a mineração seja uma actividade capital-intensiva, os efeitos multiplicadores do sector de mineração não são negligenciáveis. 207 11.5 As rendas do sector de indústrias extractivas (IE) podem tornar os programas de transferência monetária sustentáveis. Conforme os capítulos anteriores do CEM argumentaram, no curto prazo os programas de assistência social necessitariam de ser financiados por doadores. O financiamento de doadores não é no entanto sustentável. As rendas das receitas do sector de indústrias extractivas (IE) poderiam em parte apoiar o orçamento e ser poupadas - para o uso de futuras gerações e para evitar o “Mal Holandês” (Dutch Disease) associado à apreciação da taxa de câmbio real. Se os programas de assistência social forem autonomizados no orçamento e as rendas de mineração constituírem uma fonte estável de receita governamental, então os programas de assistência social podem tornar-se sustentáveis, financiados por recursos domésticos. Existe mesmo um argumento, revisto no final deste capítulo, que as transferências directas de dividendos, além de programas focalizados de transferências monetárias, podem melhorar a governação: se as rendas do sector IE são distribuídas pela população, todos os cidadãos têm um incentivo para garantir a governação transparente para ter a certeza que as rendas não são perdidas mas distribuídas conforme estipulado sob o mecanismo de dividendo directo. A distribuição das rendas das IE, através de transferências monetárias ou transferências directas de dividendos também podem ajudar a garantir que a maioria dos Guineenses beneficiam da extracção da riqueza não renovável do país. 11.6 Este capítulo analisa as oportunidades que surgem do sector IE da Guiné-Bissau. A próxima secção providencia um resumo do estado actual do sector IE. Na secção 3, os aspectos institucionais e legais da mineração e petróleo na Guiné-Bissau são discutidos e analisados no que diz respeito ao quadro fiscal, impactos sociais e ambientais, comunidade local e desenvolvimento nacional, e atractividade para os investidores. Na secção 4, são estimados os potenciais impactos do sector de mineração, assumindo que os depósitos de fosfatos e bauxite são desenvolvidos, seguido de uma discussão de como é que esse efeito pode ser ampliado através de um número de intervenções. A última secção providencia uma série de recomendações de políticas. 2. VISÃO GERAL E CONTEXTO 11.7 Actualmente, as únicas indústrias extractivas que estão no activo na Guiné-Bissau são pequenas pedreiras para efeitos de materiais de construção, tais como granito, calcário, argila e areia, embora uma mina relativamente pequena de areias minerais esteja quase a entrar em produção na zona de Varela, no Nordeste do país. Não existem nem nunca existiram minas ou poços de média ou larga escala na Guiné-Bissau, e as contribuições actuais do sector para o PIB e emprego consistem apenas de um pequeno número de indivíduos envolvidos na exploração de pedreiras. No entanto, o futuro da indústria extractiva do país é promissor, embora repleto de incerteza no que respeita à viabilidade comercial dos principais prospectos - fosfatos, bauxite e petróleo. 140 Se a exploração de alguns destes depósitos for comercialmente viável, resultaria imediatamente na maior indústria na história do país, assim como teria um impacto significativo na entrada de divisas e receitas fiscais. Adicionalmente, tem havido um aumento na exploração de ouro na parte Leste do país, alegadamente por nacionais russos e chineses, embora os detalhes sejam escassos. O Depósito de Fosfatos de Farim. 11.8 O recurso que está mais próximo de realizar o seu potencial é o fosfato. O projecto localiza-se perto da cidade nortenha de Farim, com uma população de 10.000, localizada a cerca 140 A West Africa Mining Holding AG, baseada na Suíça, descobriu algumas provas de potenciais depósitos de ouro nas partes centrais e leste da região norte do país, mas o trabalho ainda se encontra numa fase muito preliminar. 208 de 25 quilómetros da fronteira com o Senegal e a 100 quilómetros de Bissau. O principal local de exploração situa-se a alguns quilómetros do Rio Cacheu numa área rural composta por pequenas quintas, das quais os residentes locais colhem vários produtos. A área terreste abrangida na licença de exploração atravessa o Rio Cacheu, por isso haverá potencialmente actividades mineiras muito próximas do rio que podem afectar o ambiente e as comunidades locais. No entanto, a primeira fase de mineração (que duraria aproximadamente 12 anos) não inclui nenhuma realocação. Se minada, a rocha limpa de fosfato (concentrado beneficiado de rocha de fosfato) poderia ser transportada por camião ao longo de uma estrada existente de alta qualidade com cerca de 80 quilómetros para um novo porto dedicado na zona de Chuque, 20 quilómetros a Este de Bissau no Rio Geba, para envio para os mercados exportadores. 11.9 O depósito foi inicialmente identificado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) em 1978, e a Sofremines preparou um estudo de pré-viabilidade em 1986. No entanto, devido às condições e preocupações de mercado e infra-estrutura, não houve movimentos no depósito até que a empresa Champion Resources of Canada, assumiu a licença em 1997. A avaliação da Champion no que concerne à propriedade foi altamente positiva ao indicar reservas de cerca de 100 milhões de toneladas de minérios de alta qualidade na argila, o que torna a beneficiação fácil, com cerca de 30,1 por cento de rocha bruta de fosfato. Estimou-se ainda 400 milhões de toneladas de rocha de menor qualidade e associada ao cálcio. A exploração das reservas de maior qualidade duraria cerca de 40 anos, com 200 anos adicionais se o depósito de menor qualidade for comercialmente viável.141 11.10 A Champion Resources nunca desenvolveu a propriedade. Em 2006, o Governo da Guiné-Bissau cancelou o contracto e eventualmente atribuiu a licença a um consórcio internacional, GB Phosphate Mining Limited. Em Maio de 2008, contratou uma firma local, Alscon, para avaliar problemas técnicos associados aos níveis de aquíferos elevados, que podem levar a inundações constantes do espaço da mina durante a exploração. No início de 2009, o Governo voltou a revogar licença devido a violações do contrato, a mais importante das quais foi a de que o consórcio não estava ainda a trabalhar na propriedade.142 No entanto, em Novembro de 2009, a licença da GB Phosphate foi restaurada, com um novo nome: Minerais da Guiné-Bissau. Esta empresa foi pouco depois adquirida por uma empresa Canadiana, Plains Creek, que alterou o nome de volta para GB Minerals um ano depois, e que subsequentemente foi novamente adquirida por outro grupo com apoio russo. A Plains Creek conduziu uma avaliação económica e social do local, embora tenha sido mais uma identificação do que era necessário fazer do que uma avaliação de impacto ambiental e social. Os novos donos estão prestes a completar a avaliação económica e social mencionada; encontram-se em trabalhos activos de perfuração e têm um plano de trabalho com um investimento de aproximadamente US$ 170 milhões. A empresa está actualmente em busca de financiamento e tem tido algum sucesso recente, embora esteja ainda distante do montante necessário. Os Depósitos de Bauxite de Boe 11.11 Existem cinco depósitos de bauxite situados próximos entre si no Boe, no Sudeste do país. Estes foram identificados inicialmente por Holandeses no início da década de 1950, com exploração adicional por parte dos Soviéticos nos anos 70 e início dos anos 80. Existem cerca de 141 A avaliação mais recente pela GB Phosphate Mining (2006) repete o que a avaliação original da Champion Resources já havia dito. 142 A GB Phosphate não tinha só por si a capacidade técnica para explorar o depósito. A empresa indicou que iria contratar a exploração a outra companhia. No entanto, para uma mina desta dimensão, é muito raro que outra companhia (sénior) assumisse essa responsabilidade numa base contratual, e então seria mais provável que a GB Phosphate eventualmente procedesse à venda dos seus direitos. 209 113 milhões de toneladas estimadas de reservas com um conteúdo médio de alumina e silício de 44,9 por cento e 3,7 por cento, respectivamente.143 Embora marginalmente exequível ao preço real médio histórico da bauxite (US$ 10 ou US$ 15 por tonelada), ao preço actual entre US$ 30 e US$ 50 por tonelada, seria comercialmente viável. Obviamente a viabilidade real da mina irá depender o preço de longo prazo da bauxite. Será também necessário construir uma estrada através do mato para Buba, a 106 quilómetros de Boa, e um porto de águas profundas na mesma cidade. 144 Realizou-se de facto algum trabalho na estrada e iniciaram-se trabalhos significativos em 2008, antecipando o desenvolvimento futuro da mina. 11.12 Em 2007 foi concedida na região com bauxite uma licença à empresa Bauxite Angola. A empresa anunciou um investimento de US$ 321 milhões na região, incluindo US$ 200,000 para a construção de infra-estrutura local antes do início das actividades. A mina seria detida pela Bauxite Angola (70 por cento), Governo de Angola (20 por cento), e Governo da Guiné-Bissau (10 por cento). Embora a companhia tenha anunciado que produção em larga escala iria iniciar em 2011, três anos depois existia ainda muito trabalho por realizar na avaliação da viabilidade dos depósitos antes que alguma porção significativa destes fundos seja realmente investida.145Alguns dos depósitos são ainda localizados numa área que é localizada no “pipeline” de parques nacionais, e a estada de Boe para Buba teria de atravessar um parque nacional já existente. 11.13 A maioria dos novos 106 quilómetros de estradas iriam atravessar uma área que é actualmente quase inacessível, o que abriria uma ampla área do país mas também teria que atravessar uma proposta de nova área protegida. O porto iria providenciar à Guiné-Bissau uma avenida há muito procurada para o oceano, mas que se situa na zona protegida de Cufada, e por isso iria impactar na pesca e biodiversidade da área assim como de uma lagoa adjacente, importante para a reprodução de peixes. Em 2008 a Bauxite Angola actualizou a principal estrada através do parque - que nessa secção do parque tem uma população substancial -, construiu uma estada ampla, de boa qualidade ao longo de 8 quilómetros para a área planeada do porto, e limpou 113 hectares onde o porto irá ser construído. Todo este trabalho foi realizado sem uma avaliação de impacto ambiental, e muito menos autorização para efectuar desenvolvimentos numa área protegida. As obras de infra-estrutura pararam em Abril de 2009 e pouco depois a Bauxite Angola cessou as suas actividades. No final de 2010, a Bauxite Angola renovou as suas actividades de exploração, mas isto cessou completamente quando ocorreu o golpe. A companhia manteve-se a aguardar os resultados da eleição antes de tomar uma decisão sobre o futuro das suas posses. 11.14 Embora a operação mineira em Boe, se desenvolvida e gerida adequadamente, não tenha um impacto ambiental significante, claramente a estrada e porto de Buba teriam. Se porto fosse construído, haveria riscos associados com algum derrame para a baía ou lagoas circundantes. Como aproximação estimada, se o porto fosse capaz de lidar com navios Handymax - com cerca de 150 a 200 metros de comprimento e uma tonelagem entre 52.000 a 143 A bauxite é refinada para extrair alumina, que por sua vez é derretida para produzir alumínio. Quanto mais elevado o conteúdo de alumina, melhor; no entanto a sílica é difícil e onerosa de remover, quanto menor seja o conteúdo de sílica, melhor. 144 Alternativamente, a bauxite pode ser transportada para o recém-expandido porto de Kamsar na Guiné. Embora seja mais distante de Buba, será necessário apenas a construção de uma estada ou ferrovia para a área de bauxite de Boke na Guiné-Conacri para utilizar a infra-estrutura existente. 145 Existe uma dose considerável de secretismo em torno deste acordo. A Bauxite Angola pagou ao Governo da Guiné-Bissau cerca de US$ 13 milhões para a licença, o que é considerável para uma licença de exploração, embora não seja descabido para um licença de exploração para reservas identificadas e viáveis. A companhia parece ter recebido uma licença com um potencial estimado algures num intervalo médio. Não há muita informação acerca da propriedade da Bauxite Angola e da sua capacidade de mineração, embora parece ter sido estabelecida com financiamento do Governo de Angola. 210 58.000 – haveria um tráfego entre 40 a 50 barcos por ano. Adicionalmente, a operação de bauxite necessitaria de construir uma central térmica e de ter o combustível necessário fornecido através do porto. Outros Minerais 11.15 A companhia russa Poto assinou em Fevereiro de 2014 um contrato para a exploração de 1 milhão de m3 de areia, que se espera virem a resultar em 119.000 toneladas de areias minerais (ilmenite, zircão, rutilo). O projecto tem a duração de 4 anos, embora a exploração em áreas adjacentes possa ampliar a vida do projecto. Embora seja um pequeno projecto de acordo com standards globais, resultaria em cerca de US$ 10 milhões a US$ 20 milhões de output por ano, dependendo da mistura dos três produtos. 11.16 No médio a longo prazo, as perspectivas para o ouro podem ser muito mais significantes. Embora os detalhes sejam escassos, existem alegadamente companhias russas e chinesas a explorar no Este do país, que geologicamente se trata uma expansão dos campos de ouro do Mali que atravessam através da Guiné-Conacri. Mesmo uma descoberta modesta como, por exemplo, 60.000 onças, pode ter um valor bruto mais de dez vezes superior ao projecto de areias minerais.146 Petróleo 11.17 Têm-se realizado várias descobertas de perfuração offshore para petróleo na Guiné- Bissau, mas até à data nenhuma descoberta comercialmente viável. As áreas do petróleo são divididas em áreas do Norte e do Sul, a primeira das quais é partilhada com o Senegal. Alguns operadores - incluindo a Eni (Itália), Sterling Energy (Reino Unido), e Marmore (Malásia) - têm efectuado trabalhos exploratórios na área do Norte. Foram descobertos depósitos substanciais de óleo pesado mas são necessários mais testes para determinar se estes depósitos podem ser desenvolvidos comercialmente. 11.18 Na área do Sul, foram licenciados 14 blocos a seis companhias — Svenska (Suécia), Black Star Petroleum (Reino Unido), Supernova (Países Baixos), Lime Petroleum (Noruega), SHA (Angola), e Larsen Oil and Gas (Dubai). Estas companhias têm efectuado a exploração em joint-ventures com a Petrolífera da Guiné-Bissau (Petroguin), a companhia pública de petróleo. Tem havido uma rotatividade significativa de licenças ao longo dos últimos oito anos, uma vez que uma série de companhias decidiram não renovar as suas licenças. Alguns especialistas da indústria acreditam que o país pode vir a produzir 30.000 a 60.000 barris por dia, o que, assumindo um preço médio de US$ 80 por barril, pode significar entre US$ mil milhões a US$ 1,5 mil milhões de exportações anuais, três ou quatro vezes o PIB do país. Os mais importantes “recursos prospectivos” foram anunciados no início de 2014 por parte da Far Ltd., uma companhia australiana, em três blocos situados em águas relativamente rasas na costa noroeste do país. Embora a companhia tenha anunciado o potencial de cerca mil milhões de barris, serão necessários vários anos de trabalho para confirmar e explorar a viabilidade do depósito. O início das perfurações está planeado para o final de 2014. Adicionalmente, a Petroguin tem esperanças para vários recursos de águas profundas com base em conclusões preliminares.147 146 Em Fevereiro de 2014, o embaixador Russo na Guiné-Bissau anunciou um programa de exploração para os minerais no país por companhias russas. No entanto não foram providenciados detalhes adicionais. 147 Fonte: http://www.upi.com/Business_News/Energy-Resources/2014/02/05/FAR-Ltd-sees-huge-oil- potential-in-Guinea-Bissau/UPI-39491391601067/ 211 3. ASPECTOS INSTITUCIONAIS E LEGAIS 11.19 Há dois novos diplomas no que respeita ao sector do petróleo e mineração que se encontram em vias de aprovação há vários anos e estão neste momento a aguardar a promulgação do Parlamento. A nova Lei do sector de mineração irá substituir a Lei de 2000, que se tratava de um diploma competente, embora com lacunas, algumas das quais ainda não foram preenchidas. A nova Lei do Petróleo irá substituir a Lei de 1982, que foi alterada algumas vezes ao longo dos anos. As novas leis e as instituições que as apoiam são discutidas nesta secção. Mineração 11.20 A mineração na Guiné-Bissau é actualmente coberta no âmbito da Lei de Mineração de 2000. A principal agência a cargo da mineração é a Direcção Geral de Geologia e Extracção Mineira (DGGM), que se trata de um departamento do Ministério de Recursos Naturais. A nova Lei de mineração encontra-se sob desenvolvimento e foi ao Parlamento no final de 2010. Ainda não foi promulgada. A Lei de mineração de 2000 tem várias falhas, algumas das quais foram atribuídas ao desenvolvimento da indústria na década de 2000, particularmente nas áreas de receitas fiscais relacionadas com o sector e desenvolvimento da comunidade local. Outra fraqueza da Lei relaciona-se com a ausência de um diploma ambiental moderno e a completa ausência de legislação sobre avaliações de impacto ambiental. No entanto, a Lei Ambiental de base foi aprovada em 2011 e as leis e regulamentos sobre as avaliações de impacto ambiental foram aprovadas em 2009. Foi também desenvolvida uma instituição com a responsabilidade de implementar estas avaliações, Célula de Avaliação de Impacte Ambiental (CAIA), que faz parte da Secretaria de Estado para o Ambiente e Turismo (SEAT). Os primeiros termos de referência para uma avaliação de impacto ambiental foram emitidos para os potenciais promotores do depósito de fosfatos em 2009. 11.21 De forma similar à lei de 2000, a Lei de Mineração de 2010 contém vários elementos que os investidores procuram: segurança da propriedade, uma estrutura fiscal relativamente estável, previsível, e generosa, a possibilidade de transferir a propriedade, e a capacidade de repatriar lucros. A principal dificuldade para as companhias de mineração é de que as licenças de exploração são concedidas através de um acto do Ministro encarregue do sector (Artigo 22), que tem até 60 dias para tomar uma decisão. As royalties variam de 2 por cento (bauxite, minérios de ferro) até 5 por cento (minerais preciosos) e 7 por cento (urânio), com os outros minerais a serem taxados a 3 por cento. Isto é comparável com os níveis de royalties em outros países, embora a tendência recente seja ter algum tipo de escala progressiva em que os níveis de royalties sobem quando os preços se encontram particularmente elevados (ou bem acima dos níveis de tendência). Adicionalmente, é concedido um período de isenção fiscal de três anos a partir do início da produção. Tendo em conta as provisões de depreciação, isto pode significar que a empresa não paga impostos sobre os lucros durante cinco a seis anos.148 11.22 A principal fraqueza da Lei de 2010 (tal como no diploma predecessor) diz respeito a tópicos relacionados com o aumento dos benefícios socioeconómicos locais e nacionais de uma operação de mineração. Embora seja necessário uma avaliação de impacto, não há menção de avaliação de impacto social. No entanto, a DGGM mencionou que na Guiné-Bissau a avaliação de impacto ambiental é definida como incluindo os impactos ambientais e sociais. Não há menção de emprego regional ou local na mina, e a formação e treino de nacionais limita-se ao Capítulo 4 (Artigos 58 e 59), o capítulo mais curto da Lei, e que contém apenas três frases, que são bastante vagas no que respeita às obrigações da companhia de mineração. A descrição do que deve ser 148 O acordo actual entre a GB Minerals e o Governo a respeito do depósito de fosfato pede uma isenção fiscal de cerca de 10 anos. 212 incluído no contrato de mineração também não se refere de todo ao emprego, formação, ou desenvolvimento da comunidade (Artigo 70). No entanto, na sua autorização para desenvolver a mina, a companhia deverá incluir um programa social para os cidadãos nacionais, que se deverá contemplar contratação, formação profissional, e condições de emprego, incluindo medidas de habitação, escolarização, e assistência médica para os empregados e suas famílias (Artigo 33). A única referência para o abastecimento local refere que os bens e serviços devem ser adquiridos se forem competitivos (Artigo 18). Não há referência à formação ou ao aumento da aquisição de bens nacionais ao longo do tempo. As ligações a jusante e a montante não são mencionadas na Lei. 11.23 Existem muito poucas menções sobre desenvolvimento comunitário na Lei — em contraste com todas as leis de mineração desenvolvidas desde o virar do século - e com apenas uma pequena menção de que as disponibilidades que constem do Fundo Nacional de Mineração, depois de satisfeitas todas as obrigações da DGGM, devem ser usadas para o desenvolvimento sustentável de projectos na região da mina (Artigo 63). O programa social acima mencionado é destinado aos cidadãos nacionais e não dá preferência especial aos membros da comunidade local. De facto, se um membro da comunidade local não trabalha na mina, a família não tem direito a nenhum dos benefícios de saúde ou educação de acordo com a Lei. Adicionalmente, não há requisitos para as consultas das partes interessadas, particularmente de discussões tripartidas que envolvam os representantes da comunidade local, governo e empresa. 11.24 Em suma, o foco na Lei da mineração está concentrado fortemente nas primeiras duas (de cinco) etapas da cadeia de valor da indústria extractiva, que se foca no aumento do investimento e na capacitação para monitorizar e regular a iniciativa. É dada muito pouca atenção ao uso e alavancamento de oportunidades disponibilizadas para o sector - através de novas actividades empreendedoras e infra-estrutura - para aumentar os benefícios que as operações de mineração podem trazer para o país. 11.25 Mesmo com as melhores Leis e regulamentações na área de mineração, o sector enfrentaria ainda problemas significativos na Guiné-Bissau. A DGGM tem uma escassez de recursos para cumprir o seu mandato. Todo o seu equipamento foi destruído na Guerra Civil, e o staff de dez profissionais foi deixado com recursos inadequados para desempenhar as suas funções. No entanto, a situação está a melhorar para a DGGM. O Governo da China construiu um complexo de escritórios novos para o Ministério de Recursos Naturais (e diversos outros ministérios). O Governo da Roménia comprou equipamentos para digitalizar os mapas geológicos assim como computadores para todo o staff. Está agora a providenciar treino e formação para o uso do equipamento. O Banco Mundial está prestes a lançar um grande programa de assistência (US$ 3,1 milhões) para modernizar a DGGM, o que irá simultaneamente modernizar processos e equipamentos para formar o capital humano. Petróleo 11.26 A principal Lei do Petróleo foi introduzida em 1982, com pequenas revisões em 1985 e 2006. Foi preparada uma nova Lei, mas que tem estado a aguardar a promulgação por parte do Parlamento ao longo de três anos. 11.27 Uma vez que as descobertas de petróleo na GB têm sido todas offshore, as questões de desenvolvimento não são tão complexas como no caso da mineração, e as oportunidades de ligação são mais reduzidas. No entanto, algumas potenciais áreas de exploração situam-se nos parques nacionais que rondam as ilhas offshore. Entre outros benefícios, estas águas são importantes para a pesca e as praias contêm importantes zonas de nidificação das tartarugas marinhas. Adicionalmente, existe uma área turística nascente nestas ilhas pitorescas com um forte potencial para a expansão de longo prazo. Antes de realizar alguma acção significante, a companhia petrolífera deverá preparar um estudo tipo avaliação de impacto ambiental e apresentá- 213 lo à Petroguin, a companhia petrolífera, que deverá distribuir o estudo a todas as partes interessadas e pedir uma avaliação à CAIA. 11.28 A nova Lei do petróleo permite a licitação de blocos, contratos de serviço, e contratos de partilha de lucros.149 Todas as licenças vão para a Petroguin ou aqueles em associação com esta empresa. A licitação competitiva para as licenças é a modalidade preferida, mas a negociação directa com a Petroguin é também permitida. 11.29 Os investidores são obrigados a recrutar e formar trabalhadores nacionais, mas os requisitos são bastante vagos. Além de uma referência a “boas práticas de reservas petrolíferas” não há nada específico no que concerne à adesão aos standards de segurança. Não há artigos especiais sobre desenvolvimento comunitário na Lei do Petróleo uma vez que a exploração de depósitos potencialmente viáveis tem sido sempre offshore. Tendo em conta a dimensão da economia da Guiné-Bissau, não parece provável que se concretizem ligações significativas da indústria com o tecido local, mesmo que sejam descobertos depósitos comercialmente viáveis. 11.30 O maior constrangimento notório da nova Lei é o estabelecimento e autorização de instituições responsáveis pela gestão do sector. As melhores práticas internacionais pedem normalmente o estabelecimento de três entidades: um ministério com a responsabilidade geral do sector, um regulador independente, e uma companhia petrolífera nacional. A Lei não autoriza o Ministro a agir na definição de políticas, negociação de contratos, aprovação de planos de desenvolvimento, e outras responsabilidades normais. O papel definido para a Petroguin na Lei é muito amplo e inclui responsabilidades normalmente reservadas para um ministério ou regulador. Este papel combinado é reminiscente do papel originalmente definido para a Petrobras no Brasil. Em anos recentes o Brasil reconheceu os problemas relacionados com ter o monopólio associado à concessão das licenças a definir as regras das suas próprias operações e tem implementado legislação que segrega os diferentes papéis da Petrobras, quebrando assim o monopólio na posse das licenças. A missão da Petroguin, conforme definida nos estatutos, é orientada apropriadamente em torno de questões comerciais. No entanto, o Artigo 11 dos Estatutos definem a Petroguin como o seu próprio regulador de facto. As empresas licenciadas entregam royalties em espécie à Petroguin, mas não há nada explícito acerca das responsabilidades da Petroguin para com o Estado na gestão do fluxo de produção. 11.31 As exigências de transparência sob a Lei limitam-se à divulgação de dados de licenciamento, impostos recebidos, e despesas do Estado. Estas devem ser expandidas para incluir o volume do petróleo produzido, transportado, refinado, consumido, etc. Além da divulgação de dados, a nova Lei teria a ganhar com a inclusão de uma declaração ampla que afirme que o sector será gerido com transparência enquanto princípio orientador. 4. IMPULSIONAR O CRESCIMENTO PARTILHADO 11.32 Existe potencial para que o sector de indústrias extractivas desempenhe um papel importante no desenvolvimento socioeconómico da Guiné-Bissau. Com o desenvolvimento de apenas dois grandes depósitos de minerais, este sector teria grandes impactos macroeconómicos e microeconómicos no país. Os constrangimentos que ambas as operações enfrentam são uma mistura de preços internacionais das mercadorias, finança global, e a inexperiência das companhias de exploração. A Lei de mineração e as regulamentações não são um impedimento; as comunidades afectadas poderiam apoiar os desenvolvimentos se beneficiassem de apoios suficientes, e algumas partes interessadas do ambiente não se opõem à mineração per se, mas 149 O restante desta subsecção foi preparada por David Santley, Especialista Sénior de Petróleo na Divisão de Gás, Petróleo e Mineração do Banco Mundial. 214 querem simplesmente garantir que é bem gerida. Neste sentido, a sociedade civil já está a pressionar para que a Guiné-Bissau se torne um membro da Iniciativa para a Transparência das Indústrias Extractivas (EITI). Nesta secção, são realizados alguns cálculos sobre o impacto em diversas variáveis macroeconómicas do desenvolvimento de dois grandes depósitos conhecidos. São analisadas as acções governamentais que melhorariam estes desenvolvimentos de forma sustentável. Por fim, são discutidas as reacções potenciais das diversas partes interessadas. 11.33 A Tabela 11 indica os resultados dos cenários concebidos para o depósito de fosfatos de Farim e para o depósito de bauxite de Boe. Os números de emprego incluem 20 estrangeiros a trabalharem em cada depósito. As restantes três linhas incluem os efeitos directos e indirectos para as contribuições de cada depósito. 11.34 Para estimar os efeitos multiplicadores destes depósitos na economia da Guiné- Bissau, foram assumidos certos dados e premissas oficiais. Estes incluem: (i) o imposto de vendas é 15 por cento, o imposto sobre o lucro empresarial é 25 por cento, e existe uma isenção fiscal a respeito do imposto sobre o lucro empresarial de três anos; (ii) 50 por cento das receitas governamentais geradas nas minas são utilizadas em emprego, com 50 por cento das despesas remanescentes a serem utilizadas em bens domésticos; (iii) é aplicado um efeito de multiplicador fiscal de 2 na despesa de bens e serviços; (iv) 14 por cento das aquisições das minas são realizadas junto de empresas nacionais (ajustando ao conteúdo local) e as receitas destas empresas têm um efeito multiplicador de 1,67; (v) para os empregados nacionais, estima-se que os trabalhadores com menos qualificações tenham um salário de US$ 1200 por ano, trabalhadores com competências médias de US$ 2400, trabalhadores com competências elevadas US$ 4800 e os trabalhadores na área administrativa e de gestão na ordem dos US$ 12.000; assume-se que os empregados nacionais poupem 10 por cento do seu rendimento e que as suas despesas tenham um efeito multiplicador de 1,67; (vi) os empregados que tenham um salário superior a US$ 4000 pagam 10 por cento de impostos sobre o rendimento, e os que têm um salário de cerca de US$ 15.000 pagam 20 por cento de imposto sobre o rendimento; (vii) ambas as operações de mineração incluem custos de transporte de 5 por cento, que são acrescentados à estimativa dos custos operativos; e (viii) a contribuição para o PIB é uma soma dos lucros empresariais e a estimativa de contribuição para o PNB. Tabela 11: A mineração pode ter um grande impacto no emprego e receita do Governo. (emprego em pessoas, o restante em milhões US$) Farim (fosfatos). Boe (bauxite) Total** Preço do Produto (US$/t) 100 125 150 30 40 50 125/40 Emprego Directo* 1.000 1.000 1.000 1.000 1.000 1.000 2.000 Emprego Total 12.696 15.052 18.391 7.903 9.570 11.274 24.622 Receitas Fiscais (US$ M) 37,0 46,2 60,3 19,4 26,1 32,9 72,3 Contribuição PNB (US$ M) 48,0 58,0 71,2 29,3 35,9 42,7 93,9 Lucros Empresariais (US$ M) 31 51,0 71,3 10,9 27,3 44,2 78,3 Contribuição para PIB (US$ M) 73,7 105,1 141,5 40,1 63,3 86,9 168,4 Balança de Pagamentos (US$ M) 60,1 65,6 75,2 37,2 40,5 43,9 106,1 * Assume-se que 20 são estrangeiros; inclui trabalhadores no porto e nas actividades de transporte para o porto. ** Soma: da média dos preços dos produtos para cada depósito. Fonte: Estimativas do staff do Banco Mundial. 215 11.35 As estimativas para o depósito de Farim incluem um investimento de capital no total de US$ 170 milhões na mina, um porto dedicado, e uma estrada de 10 quilómetros. A criação de emprego será na ordem dos mil postos de trabalho na mina e no porto. Nestes cenários, a Farim produz 1.000.000 de toneladas de fosfatos por ano e os preços mundiais variam entre US$ 100 e US$ 150 por tonelada. No preço médio de US$ 125 por tonelada, as receitas brutas da Farim seriam na ordem dos US$ 125 milhões por ano. O total de efeitos orçamentais relacionados com o depósito de Farim são de cerca de US$ 46,2 milhões por ano (o que inclui uma royalty proposta de 3 por cento no fosfato, entre outras contribuições fiscais). A contribuição estimada para o PNB é de US$ 58 milhões e a contribuição estimada para o emprego é de 15.052 empregos. Com um preço assumido do fosfato em US$ 125 por tonelada, o crescimento total do PIB é de US$ 105,1 milhões, ou um aumento de cerca de 12 por cento. 11.36 Os planos para o depósito de Boe incluem um investimento de capital no total de US$ 321 milhões para a mina, um porto dedicado, e uma estrada de 106 km. A criação de emprego será na ordem dos mil postos de trabalho (700 empregados na mina e 300 empregados no porto). Neste cenário, o depósito do Boe produz cerca de 2.000.000 de toneladas de bauxite por ano e os preços mundiais para a bauxite variam entre US$ 30 e US$ 50 por tonelada. No preço médio de US$ 40 por tonelada, as receitas brutas do Boe seriam na ordem dos US$ 80 milhões por ano. O total de efeitos orçamentais relacionados com o depósito de Boe são de cerca de US$ 21,2 milhões por ano (o que inclui uma royalty proposta de 2 por cento na bauxite, entre outras contribuições fiscais). A contribuição estimada para o PNB é de US$ 35,9 milhões e a contribuição estimada para o emprego é de 9.570 empregos. Com um preço assumido da bauxite em US$ 40 por tonelada, o crescimento total do PIB é de US$ 105,1 milhões, um aumento de cerca de 7,5 por cento do PIB. 11.37 Em suma, a abertura destas duas minas teria impactos significativos na economia da Guiné-Bissau. Embora se assuma que 86 por cento dos bens e serviços necessários nas minas sejam adquiridos internacionalmente, os cálculos sugerem que o emprego cresceria em aproximadamente 24.000 postos de trabalho - e isto não inclui quaisquer externalidades associadas à melhoria das infra-estruturas. Adicionalmente, as receitas fiscais cresceriam em aproximadamente US$ 56 milhões para US$ 93 milhões - um intervalo de cerca de 77 por cento a 121 por cento das receitas (utilizando dados de 2010). Haveria um aumento líquido nas receitas de divisas externas entre US$ 87 milhões e US$ 119 milhões; o PIB cresceria num intervalo entre aproximadamente US$ 114 milhões para US$ 223 milhões, representando entre 13 a 26 por cento do PIB. Estas estimativas são relativamente conservadoras. O remanescente desta secção descreve como é que estes efeitos podem ser amplificados. a) Promover as ligações com a economia local 11.38 Muitos países têm beneficiado de grandes oportunidades de criação de negócios associados ao sector da mineração, particularmente de aquisições de produtos nacionais e de aproveitamento dos materiais derivados. Embora o último seja o mais óbvio, os grandes ganhos de valor acrescentado, emprego, e formação on-the-job serão provenientes do primeiro, particularmente tendo em conta que diversas competências necessárias para companhias que vendem bens e serviços às operações de mineração - tais como manutenção e reparação de máquinas, tubos, construção, vestuário industrial, catering - são facilmente transferíveis para outras indústrias. No Chile em 2011 registavam-se 720.000 empregos no sector da mineração e outros 40.000 na indústria relacionada, mais de 10 por cento na força de trabalho inteira (Caixa 13). 11.39 Numa escala mais pequena, as companhias de mineração trabalham frequentemente com os Governos locais e regionais para providenciar mais benefícios, económicos e sociais, às comunidades locais na sua área. Tendo em conta o número relativamente pequeno de 216 empregos nas novas operações de mineração, a maioria das empresas, voluntariamente ou devido a legislação e pressão do Governo, providenciam outros benefícios às comunidades locais. Estes surgem principalmente via programas de responsabilidade social corporativa, desenvolvimento de infra-estrutura local, fundações, e pagamentos focalizados de impostos. No entanto o que as comunidades mais desejam é mais empregos e programas para aumentar o emprego local estão a tornar-se obrigatórios para operações mais substanciais de forma a obterem a “licença social” para operarem. O Programa Newmont Abafo Linkages no Gana (Caixa 13) é um dos exemplos de maior sucesso em África de uma companhia de mineração que procura relacionar-se com as comunidades para aumentar os benefícios locais. 11.40 Adicionalmente, os projectos de mineração frequentemente trazem infra-estruturas associadas, que podem ser utilizadas por outras indústrias. Isto é particularmente verdade para o caso dos minerais a granel que necessitam de ferrovias ou boas estradas e portos para exportar os seus produtos. No entanto, as companhias podem ter outras razões fortes associadas ao custo para preferir ter infra-estruturas dedicadas ao invés de partilhadas. É importante que exista um diálogo contínuo acerca do desenvolvimento das infra-estruturas de transporte para verificar se há possibilidade para o sector público alavancar os desenvolvimentos do sector privado. 11.41 Todas as grandes minas necessitam de energia substancial e diversas minas desenvolvem a sua própria oferta de energia que pode beneficiar as comunidades. Tendo em conta a reduzida disponibilidade de energia na Guiné-Bissau (ver capítulo 2), deverá haver boas probabilidades para alavancar a produção de energia desenvolvida nas operações de mineração para providenciar energia à área da comunidade local. Por exemplo, em Farim, onde existe uma população substancial, as linhas de electricidade estão intactas mas não existe uma central de produção activa. Um pequeno aumento na dimensão da central de produção exigida na mina geraria electricidade suficiente para o sector PME assim como para as famílias. Caixa 13: Promover as ligações com a economia local: experiências dos clusters mineiros do Chile e Gana A Região II do Chile é um dos exemplos mundiais de maior sucesso de um cluster industrial construído em torno das indústrias mineiras. No desenvolvimento deste cluster na cidade de Antofogasta, as companhias mineiras e os Governos trabalharam em conjunto para maximizar as ligações positivas com a mineração para o desenvolvimento local. Em 1992 foi estabelecida uma corporação para o desenvolvimento produtivo constituído por um consórcio de 10 grandes empresas e 2 universidades para providenciar serviços de apoio para o crescimento produtivo e tecnológico das PMEs em Antofagasta. Até 1995, o incentivo dominante para criar as novas ligações com a economia local foi através de instrumentos financeiros tais como créditos de longo prazo e co-financiamento da CORFO, a Agência Chilena para o Desenvolvimento Económico. Em 1995 a CORFO e a União Europeia providenciaram financiamento para uma nova iniciativa, o Programa para Desenvolver Fornecedores para o Crescimento Industrial da Região II, que promoveria uma maior integração das PMEs na cadeia de abastecimento de grandes empresas. O núcleo deste programa foi constituído por um subsídio para grandes empresas na Região II que participaram no desenvolvimento de fornecedores, exigindo que as próprias companhias assumissem responsabilidade na formação e integração dos fornecedores locais. Em 1997 esta iniciativa tomou um grande passo em diante quando a Associação de Indústrias de Antogafasta (AIA) e o Serviço para a Cooperação Técnica (SERCOTEC), uma subsidiária da CORFO, se uniram para construir um programa desenhado para responder às necessidades de qualificação das PMEs que abasteciam a indústria mineira. A SERCOTEC providenciou programas de crédito, consultoria técnica, subcontratação, formação de gestão, e assistência às exportações e marketing. A AIA providenciou a estrutura organizacional, incluindo programas e cursos de formação especializada, tais como o “Programa para Avaliar e Qualificar os Fornecedores da Indústria 217 Mineira”. O objectivo foi o de aumentar a competitividade dos fornecedores regionais para que estes estivessem aptos a manter e fortalecer as ligações produtivas com as empresas mineiras. O apoio ao desenvolvimento dos fornecedores mineiros é providenciado por uma parceria público-privada. Em 2002 a Antofagasta estabeleceu um Comité Executivo para encorajar o desenvolvimento do cluster mineiro na região. Esta parceria público-privada focaliza-se deliberadamente na promoção dos fornecedores locais, ajudando-os a ajustar as suas práticas de acordo com as necessidades das empresas mineiras que operam no Chile e em outros locais. Em 2007, um comité público-privado - o Conselho Estratégico para o Cluster Mineiro - foi criado para identificar as necessidades das empresas do sector mineiro. Este Comité indicou a necessidade de promover as associações de fornecedores e de melhorar a pesquisa e desenvolvimento (R&D), capital humano e o ambiente de negócios. Desde então o Governo tem introduzido diversas medidas para apoiar a expansão das empresas fornecedoras do sector mineiro, incluindo um centro de R&D focado em mineração na Universidade do Chile e um parque científico em Antofagasta. Em Abril de 2011 o Ministério da Mineração uniu a BHP Bilinton e a CODELCO num novo programa denominado “Estratégia para o Desenvolvimento de Fornecedores de Classe Mundial à Indústria Mineira”. O objectivo é transformar 250 empresas baseadas no Chile em fornecedores de nível mundial até 2014. A CORFO comprometeu-se em investir US$ 45 milhões ao longo de 3 anos com financiamento adicional de outros parceiros. O Programa de Aquisições Locais da Newmont Ghana Gold Ltd (NGGL) A NGGL é um dos grandes contribuintes para a economia do Gana, gerando quase 10% das suas exportações e 4,5% do seu IDE em 2010. Desde meados de década de 2000, a NGGL tem efectuado esforços deliberados para adquirir mais inputs localmente. A empresa realiza este propósito ao aumentar o seu próprio conhecimento de bens e serviços oferecidos no Gana; desenvolvendo oportunidades de ligação a potenciais fornecedores; utilizando a licitação aberta de forma mais frequente, e aplicando a preferência no acesso a licitações, dando preferência geralmente a companhias locais, seguidas de companhias de propriedade do Gana, empresas participadas por capital do Gana, empresas registadas no Gana, e empresas internacionais nessa ordem. Em paralelo, a NGGL, com apoio financeiro do IFC, lançou em 2007 o Programa de Ligações de Abafo, que é constituído por três elementos: 1. Fornecedores Locais e Desenvolvimento de Firmas para Contratação: Reforça a capacidade de determinadas micro, pequenas e médias empresas para que estas consigam vencer competitivamente contratos com a NGGL e outras empresas regionais e nacionais. 2. Desenvolvimento Económico Local: Suporta as actividades não mineiras para garantir uma economia diversificada e sustentável. 3. Capacitação Institucional: Apoia as associações empresariais locais e os serviços de consultoria para enfrentar a ausência e disponibilidade reduzida de apoio empresarial. Também apoia a definição de standards relativamente às aquisições locais com a NGGL e encoraja que outras instituições como a Accion Microfinanças a providenciar apoio às empresas locais. Em apenas dois anos o Programa de Ligações de Abafo apoiou 99 companhias, e licitou com sucesso contratos avaliados em quase $6 milhões criando 439 empregos no processo. Fonte: McMahon, G. e S. Moreira (2014), ‘The Contribution of the Mining Sector to Socioeconomic and Human Development,’ Extractive Industries for Development Series #30, Washington, D.C.: Banco Mundial. 218 b) Financiar programas de assistência social 11.42 As receitas do sector das indústrias extractivas podem facilmente financiar programas de assistência social. Com base no custeio de um programa de transferência monetária conforme descrito no capítulo 6, seria necessária cerca de 15 a 20 por cento da receita das indústrias extractivas para financiar um programa de transferência monetária equivalente a cerca de 1,5 por cento do PIB, o que reduziria a pobreza extrema em 10 pontos percentuais. Para colocar a riqueza dos recursos em perspectiva, uma experiência hipotética sugere que utilizar toda a receita fiscal relacionada com as indústrias extractivas num programa de transferência monetária (cerca de 8,5 por cento do PIB) poderia reduzir a pobreza absoluta em cerca de 13 pontos percentuais e quase erradicar a pobreza extrema na totalidade (para cerca de 3 a 5 por cento). Naturalmente, apenas uma fracção das receitas dos recursos naturais deveria ser utilizada em programas de transferências monetárias de forma a deixar margem suficiente para outras despesas - nomeadamente investimento público -, para reforçar a riqueza nacional - tendo em conta as futuras gerações -, e para salvaguardar a estabilidade macroeconómica. No entanto as propriedades desejáveis dos programas de assistência social, incluindo a redução da pobreza e os efeitos potencialmente catalisadores no crescimento do rendimento local, tornam as receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas uma fonte expediente de recursos para tais programas. c) Transferências directas de dividendos 11.43 As transferências monetárias financiadas com receitas da mineração podem ser estendidas para a população como um todo, iniciando assim um programa de transferência directa de dividendos. Os pagamentos directos de dividendos são controversos mas encontraram recentemente novos defensores.150 Os mecanismos de dividendos directos têm sido implementados em algumas regiões desenvolvidas e ricas em recursos, tais como Alberta e Alasca, onde os cidadãos recebem uma porção fixa das receitas dos recursos de forma uniforme e universal. A Mongólia experimentou também com um programa semelhante. Os pagamentos de dividendos directos vão além das transferências monetárias porque não são focalizadas na pobreza: todos os cidadãos têm o direito a uma quota igual de todas as receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas. 11.44 Existe um argumento de que as transferências directas de dividendos podem melhorar a qualidade da governação - uma vertente atractiva para Estados frágeis. Um mecanismo em que todos os cidadãos recebem regularmente uma porção das receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas pode ajudar a solidificar o contrato fiscal entre cidadãos e o Governo ao criar um círculo de participação com interesses declarados em seguir a forma como é que o Governo gere as finanças públicas.151 Uma vez que os cidadãos ganham expectativas acerca dos pagamentos de dividendos, exigem mais transparência na gestão por parte do Governo das receitas fiscais associadas às indústrias extractivas. Adicionalmente, a probabilidade de um comportamento rentista - uma característica comum de países ricos em recursos mas institucionalmente fracos - é significativamente reduzida uma vez que, ao alocar uma quota publicitada de recursos à população em geral, o Governo está também a partilhar informação mais 150 Ver McGuirk, E., Rajaram, A. e Giugale, M., (2014), Devarajan, S. e Giugale, M. with Ehrhart, H., Le, T. e Nguyen, H. (2013), Devarajan, S. et al (2011) ‘Direct Redistribution Taxation and Accountability in Oil - Rich Economies: A Proposal’ in Center for Global Development Working Paper 281, Moss, T. (2011) ‘Oil to Cash: Fighting the Resource Curse through Cash Transfers’ in Center for Global Development Working Paper 237, Gillies, A. (2010) ‘Giving Money Away? The Politics of Direct Distribution in Resource -Rich States’ in Center for Global Development Working Paper 231, Sala-i-Martin, X. e Subramanian, A. (2003) ‘Addressing the Natural Resources Curse: An Illustration from Nigeria’ em NBER Working Paper. 151 McGuirk, E., Rajaram, A. e Giugale, M., 2014. 219 específica com o público sobre a natureza desta receita proveniente dos recursos. Mais informação pública, além de um sentimento de pertença no processo de decisão pública, irá gerar melhor supervisão por parte da população, o que por sua vez irá melhorar a responsabilização e eficiência do gasto público. Isto não é o mesmo que dizer que os dividendos directos podem substituir os esforços para melhorar a capacidade institucional do Governo. De facto, tal esquema poderia melhorar estes esforços uma vez que despoletam uma busca, por parte um base mais ampla de cidadãos, da responsabilização pública.152 Algumas pesquisas recentes do FMI sugerem que os efeitos positivos de distribuir as receitas das indústrias extractivas (incluindo os programas de assistência social e as transferências directas de dividendos) podem mesmo justificar cativar estas despesas - o que não é normalmente considerado uma boa prática - de forma a “garantir que estes programas são sustentados ao longo do tempo, ganham o apoio da população, e aumentam a responsabilização do Governo para o uso da riqueza de recursos.”153 11.45 O rendimento das famílias proveniente das transferências directas de dividendos e potenciais melhorias na governação podem melhorar o crescimento partilhado. Algumas estimativas para a Guiné Equatorial sugerem que os pagamentos de dividendos directos de apenas 10 por cento das receitas das indústrias extractivas poderia ser equivalente a US$ 600 por pessoa. 154 Apenas 10 por cento das receitas de recursos naturais da Guiné Equatorial seriam cerca de uma vez e meia superiores à profundidade média da pobreza, o montante necessário para um pessoa pobre escapar à pobreza - num país onde três quartos vivem debaixo da linha de pobreza. 155 Num país como a Guiné-Bissau, a transferência directa de pagamentos de dividendos beneficiaria os pobres de forma desproporcionada tendo em conta a prevalência da pobreza. Aplicar os argumentos para transferências monetárias e crescimento do rendimento local às transferências de dividendos poderia sugerir que tal mecanismo poderia, também, impulsionar os rendimentos locais. Adicionalmente, o círculo virtuoso entre a melhoria da governação e a actividade económica poderia promover o crescimento partilhado, conforme argumentado nos capítulos 1 e 4. Embora as transferências de dividendos disponham teoricamente de características atractivas, é necessária mais pesquisa para explorar se podem realmente cumprir o seu propósito. Uma das preocupações chave centra-se no alcance do equilíbrio certo entre tornar as transferências suficientemente volumosas para encorajar a supervisão dos cidadãos, e a mitigação do risco de inflação e de desincentivo ao trabalho. No entanto, considerando que irá levar alguns anos para que o sector de indústrias extractivas gere receitas significativas para a Guiné-Bissau, há tempo suficiente para conduzir análises adicionais. d) Investir e poupar para o futuro 11.46 Para promover a riqueza nacional, será importante investir em indústrias extractivas de forma prudente. Conforme o capítulo 7 argumenta, há o perigo particular de esgotar os recursos naturais, e assim usar uma fonte de riqueza nacional sem desenvolver outras fontes alternativas. Idealmente, as receitas fiscais de indústrias extractivas não devem financiar o consumo. Isto significa que o balanço orçamental operacional (receita menos despesas correntes) deverá ser positivo, sem a contribuição das receitas do sector das indústrias extractivas. Isto significa também que as receitas são investidas em despesas de capital, para construção de activos físicos. No entanto, trata-se apenas de uma regra aproximada. Por exemplo, pagar a professores ou trabalhadores do sector da saúde (despesa corrente) é um investimento em educação e assim no 152 Devarajan, S. e Giugale, M. com Ehrhart, H., Le, T. e Nguyen, H, 2013. 153 Gupta,S. Segura-Ubiergo, A. e Flores, E. (2014) ‘Direct Distribution of Resource Revenues: Worth Considering?’, IMF Staff Discussion Note SDN/14/05. 154 Ibid. 155 Ibid. 220 stock de capital humano do país. Os programas de assistência social, conforme o capítulo 6 argumenta, podem aumentar o capital humano e têm também um efeito no investimento das famílias. As transferências directas de dividendos podem ajudar a construir a denominada riqueza intangível através da melhoria das instituições. 11.47 Uma quota-parte das receitas fiscais de indústrias extractivas deve ser poupada. Investir o volume total destas receitas em outras formas de capital não é fácil. Por um lado, o Governo tem capacidade limitada, conforme demonstrado no capítulo 4. Investir a riqueza de recursos - especialmente recursos não renováveis - é um processo sofisticado e a maior capacidade governamental correlaciona-se com mais investimentos públicos. A poupança das receitas fiscais das indústrias extractivas para uma altura em que o Governo esteja em melhor posição para realizar investimentos que promovam a riqueza nacional é uma opção para garantir que a riqueza de recursos naturais não é esgotada. Por um lado, sobrecarregar a economia com despesa alimentada no aumento da receita de recursos naturais pode resultar no “Mal Holandês” (Dutch Disease), onde o preço dos bens não transaccionáveis e serviços cresce mais rápido do que o preço dos bens transaccionáveis, tornando as exportações locais menos competitivas. Uma taxa de câmbio real mais forte iria prejudicar o sector do caju e tornar mais difícil o desenvolvimento dos sectores da produção de arroz e do turismo, ou qualquer outro sector orientada para as exportações. O “Mal Holandês” teria um efeito altamente nocivo no emprego e, provavelmente, na pobreza. Iria certamente reduzir o potencial para crescimento partilhado. Para prevenir o “Mal Holandês”, o Governo poderia considerar no futuro o estabelecimento de um fundo soberano - isto seria especialmente pertinente caso a exploração do petróleo iniciasse e quando as receitas fiscais associadas fossem particularmente volumosas. 5. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS 11.48 O Governo da Guiné-Bissau tem cinco áreas de preocupação no que concerne ao desenvolvimento das indústrias extractivas: (i) implementação de políticas que motivem as empresas da indústria para a exploração e extracção; (ii) que o país receba uma quota-parte justa das rendas dos recursos naturais (através de receitas fiscais e desenvolvimento de infra-estruturas) e que estas receitas sejam geridas de uma forma transparente; (iii) os recursos serem explorados de uma forma ambientalmente sã; (iv) promover um número significativo e crescente de ligações à economia local no âmbito do desenvolvimento destas indústrias; e (v) as comunidades locais receberem uma quota-parte justa como compensação por acolher os projectos. 11.49 No que diz respeito às políticas de indústrias extractivas, as novas Leis e regulamentações da mineração e petróleo são suficientemente pró-investimento para atrair empresas de exploração. Tendo em conta a subida secular dos preços dos minerais ao longo dos últimos 10 anos, poderá ser argumentado que as leis são demasiado pró-investidores. O maior desafio nesta altura é desenvolver a capacidade da DGGM de implementar as Leis e regulamentações, desenvolver um cadastro efectivo, e providenciar aos potenciais investidores a informação geológica base do país, que actualmente se encontra cerca de 25 anos de atraso em termos de actualizações. A provisão de uma parte das royalties à DGGM seria um bom primeiro passo nesta direcção. 11.50 O regime fiscal para as indústrias extractivas é similar ao de vários outros países, com a excepção da proposta da Lei esboço de conceder uma isenção fiscal de três anos, que a maioria dos países já não inclui. O Governo poderia considerar uma royalty progressiva ou imposto para capturar uma percentagem mais elevada das rendas quando os preços das mercadorias estejam muito elevados, embora tendo em conta o estado inicial da indústria, terá de ter cautela para não assustar os investidores. De forma mais importante, o Ministério das Finanças terá de ter a capacidade de contabilizar de forma adequada o montante que é devido ao Governo. 221 Até que ganhe experiência suficiente, o Governo poderá ter de depender de empresas internacionais de contabilidade. O Governo deverá também promover a adesão da Guiné-Bissau à EITI, com assistência dos doadores se necessário. Entretanto, as provisões legais e regulatórias para os processos de licitação e alocação de licenças de exploração, incluindo regras de despesas mínimas por detentores das licenças, devem ser revistas para garantir justiça e transparência. 11.51 Há Leis actualmente em vigor no que concerne aos aspectos ambientais das indústrias extractivas, incluindo regras para o encerramento quando o recurso é exaurido. O principal desafio será desenvolver a capacidade da SEAT e CAIA para que estas possam monitorizar adequadamente e aplicar leis e regulamentações ambientais. O Banco Mundial já está a apoiar a CAIA com actividades de capacitação. Este tipo de capacitação é um desafio de longo prazo, particularmente tendo em conta que provavelmente irá existir rotatividade na indústria e emigração das pessoas que ganhem estas competências. As provisões legais no que respeita ao encerramento das minas devem ser revistas e devem ser desenvolvidas regulamentações detalhadas. 11.52 Tendo em conta a base industrial muito reduzida que actualmente existe na Guiné- Bissau, irá levar algum tempo antes que o país possa mover-se horizontalmente na cadeia de valor e desenvolver um grande número de ligações com o tecido económico local, particularmente no que diz respeito às aquisições de bens e serviços. No entanto, aqui é onde se concentram a maioria dos empregos, especialmente na mineração, com cerca de 2 a 10 empregos na indústria de fornecimento às minas por cada emprego na mina propriamente dita. Ambas as minas de fosfatos e bauxite, se desenvolvidas, podem utilizar entre US$ 50 a US$ 100 milhões por ano em bens e serviços, a maioria dos quais seria teria de ser importados (86 por cento segundo as simulações supramencionadas). As partes interessadas da Guiné-Bissau tornaram-se cientes do desafio de aumentar o “gasto doméstico”, como é notório no desenvolvimento do Grupo de Jovens de Farim e da WGPEI. A última organização quer estender o trabalho realizado no Mali (com o apoio da FIAS) e Burkina Faso e Gana (com o apoio do Banco Mundial) no que concerne à ligação local com as necessidades de aquisições da indústria de mineração de ouro e do potencial mineral específico da Guiné-Bissau, fosfatos e bauxite. No curto prazo muito pode ser feito no que concerne à preparação de programas standards de formação internacional em áreas onde irá existir uma procura elevada se o sector das indústrias extractivas for desenvolvido (e.g. soldadura, reparação de camiões pesados, instalação de condutas, electricistas, etc.). As companhias de mineração, o Governo, e as agências doadoras de todos os tipos vão ter de trabalhar de forma próxima em vários programas de formação necessários para a empregabilidade e fornecimento à indústria mineira. É igualmente importante que as partes interessadas, em ambas as comunidades e a nível nacional, estejam plenamente cientes das oportunidades disponibilizadas pelas operações extractivas e no que é necessário de forma mais ampla para poder tirar partido delas. 11.53 A competitividade das empresas de mineração domésticas é seriamente afectada pelo estado precário da infra-estrutura, incluindo energia, transporte rodoviário, e acesso ao porto. A este respeito, as infra-estruturas necessárias para as actividades das indústrias extractivas devem ser integradas com o planeamento das infra-estruturas do Governo. Embora seja importante não colocar demasiadas exigências nas operações mineiras, é possível com pequenas despesas expandir as infra-estruturas em dimensão para providenciar acesso às PMEs, particularmente no que concerne à energia (ver Capítulo 2). 11.54 As comunidades locais carregam a maioria do peso das externalidades negativas geradas nas indústrias extractivas, sejam estas ambientais, influxo de migrantes, e impactos de saúde, particularmente doenças sexuais. Em todo o mundo as comunidades estão a exigir uma quota maior dos benefícios das indústrias extractivas. Estes podem ser provenientes da transferência de uma maior quota das receitas fiscais gerada nas operações, mas não tão 222 importantes, especialmente para a mineração, quanto o aumento no emprego e rendimento que as operações podem aportar. 11.55 O Governo pode empreender uma série de importantes iniciativas, por vezes com a assistência de outras partes interessadas, para aumentar o benefício das operações de indústrias extractivas que se atribuem às populações locais.  Os investimentos em infra-estruturas são vitais para gerarem ligações entre o potencial fornecedor e as minas e para providenciar um fornecimento adequado de energia (ver capítulo 2).  Será importante desenvolver a capacidade do Governo (ver capítulo 4) para envolver as companhias de mineração de forma eficiente e para o bem maior do país; a capacitação é também necessária para garantir que as receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas são investidas de uma forma que constrói a riqueza nacional.  Devem ser providenciados recursos adequados às agências (tais como a CAIA) com o mandato de aplicar obrigações ambientais e sociais; isto poderia incluir fundos para a formação de inspectores de indústrias extractivas e especialistas ambientais de agências doadoras.  Uma parte significativa e bem definida das receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas pode apoiar o orçamento para garantir o financiamento de programas de assistência social, que devem ser contidos no orçamento (ver capítulo 6). Através da focalização adequada, os programas de assistência social podem também mitigar os potenciais efeitos negativos das actividades das indústrias extractivas.  A grande maioria de empregos de baixa qualificação devem ir para os membros qualificados da comunidade local; isto irá provavelmente implicar formação de literacia (ver também o capítulo 3).  Devem ser empreendidos esforços, incluindo programas de formação, por parte das companhias de mineração no sentido de aumentar ao longo do tempo o número de membros mais qualificados da comunidade local com emprego nas minas e, mais importante, para aumentar a capacidade das PMEs locais de venderem bens e serviços às minas (ver também capítulo 3). O Governo - apoiado pelos doadores - poderá querer estabelecer programas de formação profissional com o foco no sector de indústrias extractivas.  Em geral as obrigações das empresas e do Governo nacional para com as comunidades locais devem ser melhores definidas, incluindo os mecanismos de participação para discutir assuntos cruciais como o realojamento, emprego, formação.  Deve ser estabelecido um sistema de mediação para as inevitáveis disputas que surgem.  Devem ser feitas provisões nas Leis ambientais e/ou da indústria extractiva que providenciem espaço para a sociedade civil ter acesso e monitorizar o desempenho ambiental e social das operações das indústrias extractivas.  A colocação de uma garantia financeira para reclamação ambiental deverá ser obrigatória para todas as operações de indústrias extractivas de média e larga escala - actualmente é uma questão que fica à discrição do Ministério da Energia e Recursos Naturais.  No longo prazo, será importante providenciar um quadro para a poupança das receitas fiscais relacionadas com as indústrias extractivas, potencialmente através de um fundo soberano.  Ainda no longo prazo, o Governo deverá reconsiderar a isenção fiscal para as companhias de mineração. 223 CAPÍTULO 12: BIODIVERSIDADE, ÁREAS PROTEGIDAS, E CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL E PARTILHADO LIDERADO PELO TURISMO 1. INTRODUÇÃO 12.1 Ao longo dos últimos catorze anos, a Guiné-Bissau investiu consideravelmente na conservação da sua biodiversidade e ecossistemas importantes. Reconhecendo o papel vital que estes desempenham no sustento das famílias locais, e na base das actividades económicas regionais e locais, assim como na contribuição para a saúde e diversidade do ambiente global, o país embarcou num processo de estabelecimento de um Sistema Nacional das Áreas Protegidas (SNAP) assim como na construção do quadro institucional humano e financeiro e na capacidade financeira para o suster. As áreas protegidas ao abrigo do SNAP estão previstas para serem usadas como pólos de desenvolvimento local, apoiando as populações locais e actividades económicas sustentáveis, assim como para conservação de biodiversidade e ecossistemas. Estas áreas apoiam uma população de mais de 70.000 e indirectamente apoiam as actividades económicas nacionais e regionais aportando benefícios globais. Actualmente, o SNAP inclui cinco parques nacionais costeiros e marinhos e uma área de comunidade marinha protegida, cobrindo 470.000 hectares, equivalente a cerca de 15% do território nacional. Cerca de cinco áreas terrestres vão ser acrescentadas como parte do complexo Dulombi, Boe, e Tchetche (DBT), aumentado a cobertura total para 26% do território nacional. Adicionalmente, o Arquipélago de Bijagós foi reconhecido inter alia como uma Reserva de Humanidade e Biosfera da UNESCO (MAB). Embora tenham sido realizados avanços significativos no âmbito da gestão e conservação destas áreas e correspondentes activos, a Guiné-Bissau ainda enfrenta um desafio para garantir que o progresso é mantido e é sustentável no longo prazo. 12.2 Como resultado deste investimento, e à luz das culturas únicas encontradas no país, o turismo e ecoturismo sustentável na Guiné-Bissau têm o potencial de se tornar uma fonte de crescimento económico e emprego. A biodiversidade e áreas protegidas do país providenciam múltiplos bens e serviços que sustentam vários sectores, conforme descrito no capítulo 7. No entanto, uma área com potencial considerável que ainda não foi devidamente explorada é o turismo, especificamente turismo sustentável e ecoturismo. O ecoturismo, uma divisão do turismo sustentável, inclui experiências de turismo que incluem quatro pilares da sustentabilidade: económico, financeiro, social/cultural e ambiental. O ecoturismo foca-se em actividades baseadas na natureza e cultura e destaca os ambientes e culturas únicas do destino. Actualmente alguns projectos pequenos e privados (praia de Varela) e projectos de demonstração por ONGs (Orango e Cantanhez) estão a emergir em localidades chave. Ao aproveitar a biodiversidade única, rede de áreas protegidas, e cultura, a Guiné-Bissau tem o potencial de criar um destino único de ecoturismo na África Ocidental que irá trazer benefícios económicos ao país, contribuir para a redução da pobreza, promoção da prosperidade partilhada, e aumento das oportunidades para o desenvolvimento de negócios de pequena escala. 12.3 O turismo pode também desempenhar um importante papel em trazer valor aos serviços e bens do ecossistema que as áreas protegidas providenciam, gerando rendimentos directos para a conservação das áreas protegidas e criando opções de subsistência para as comunidades locais. A maioria das partes interessadas, incluindo o Governo, Banco Mundial e outros parceiros, tais com o Fundo Mundial da Vida Selvagem (WWF), Fundação MAVA e União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), apoiam a promoção dos activos de capital natural para o desenvolvimento através da protecção do ambiente natural, envolvimento com comunidades locais, e salvaguarda das culturas locais. Quando efectuado de forma correcta, o desenvolvimento do turismo sustentável constrói um sector do turismo que abraça práticas de negócio ecologicamente sustentáveis, éticas e socialmente equitativas e também empresas que são 224 económica e financeiramente viáveis. Este tipo de turismo pode incluir o ecoturismo, turismo com base na comunidade, ou turismo a favor dos pobres. O termo ecoturismo é utilizado aqui para referir actividades turísticas pequenas, ao invés de actividades turísticas de larga escala, e um foco em questões ambientais, sociais, culturais e económicas.156 12.4 Este capítulo procura explorar a oportunidade de colher o poder da conservação da biodiversidade através do desenvolvimento do ecoturismo de forma a conseguir a redução da pobreza, prosperidade partilhada, e benefícios ambientais de larga escala. As seguintes secções vão abordar: o estatuto e desafios que a biodiversidade e áreas protegidas da Guiné-Bissau enfrentam; as oportunidades e constrangimentos que o sector do turismo enfrenta; e, por fim, uma proposta para o caminho em diante. 2. BIODIVERSIDADE E ÁREAS PROTEGIDAS 12.5 Embora um pequeno país, a Guiné-Bissau abriga uma biodiversidade excepcional (i.e., uma abundância e variedade de organismos vivos) e ecossistemas de significância local e global. Este capital natural resulta da geografia única do país: um país costeiro que se situa numa zona de transição entre a savana árida do Subsaariana no Nordeste e os ecossistemas húmidos e tropicais de florestas no Sul, que beneficiam de chuvas substanciais e rios. Esta região única é largamente costeira, caracterizada por uma malha de pequenas bacias hidrográficas, assim como o arquipélago de Bijagós, que se destaca na placa continental vasta de cerca de 70.000 km2. Estas áreas constituem o habitat de uma larga diversidade e tipos de ecossistemas, incluindo manguezais, restingas e lodaçais, águas estuarinas rasas e florestas Guineenses sub-húmidas, todas as quais são conhecidas por serem focos de alta biodiversidade na costa ocidental Africana. No interior, especificamente nas áreas do Sul e Sudeste do país, uma região florestal constituída por trechos densos e abertos de florestas, interlaçadas com savanas arborizadas, alberga também uma biodiversidade significativa e providencia um refúgio para muitas espécies migratórias que atravessam as savanas do Oeste Africano. 12.6 A Guiné-Bissau é relativamente única na medida em que se encontra entre os últimos países da África Ocidental onde o desenvolvimento tem tido um impacto negativo limitado no ambiente, e, consequentemente, este ainda não está significativamente degradado. Embora isto seja em parte devido ao desenvolvimento económico limitado até à data, também reflecte um reconhecimento por parte do Governo e seus parceiros sobre a futura importância social e económica da biodiversidade do país. 12.7 Os ecossistemas do país não apoiam apenas a riqueza da biodiversidade, mas também providenciam serviços valiosos para a população do país. A zona costeira, em particular os 338.652 hectares de ecossistemas de manguezais - segundo apenas em relação à Nigéria em termos de área de manguezal total em África -, servem como locais de reprodução e berçário para os stocks comercialmente valiosos de peixe, providenciam stocks de carbono que podem potencialmente ser vendidos no mercado global, e almofadas contra a subida do nível do mar e picos de tempestades que resultam da mudança climática. Estes, em conjunto com as florestas terrestres e savanas arborizadas, providenciam também uma variedade de bens e serviços às populações locais, tais como alimentação, abrigo, plantas medicinais tradicionais, e combustíveis. Contribuem para garantir fornecimentos de água limpa e resiliência contra a mudança climática. As diversidades étnica e biológica que caracterizam o país deram azo à 156 No passado, o termo ecoturismo já havia sido largamente utilizado e sem discriminação por organizações que procuravam “lavar” as suas práticas não éticas e insustentáveis. No entanto, os profissionais da indústria do turismo estão a procurar retomar a palavra e restaurar a definição original de ecoturismo que apoia os quatro pilares da sustentabilidade: económica, financeira, social/cultural, e ambiental. 225 emergência de tradições culturais ricas, notavelmente no arquipélago de Bijagós, e estas características culturais, ecológicas e de biodiversidade são reconhecidas como serem de significância nacional e internacional. Figura 96: A maioria das áreas protegidas na Guiné-Bissau encontram-se ou vão situar-se no Sul do país, assim como nas ilhas (áreas protegidas oficializadas, áreas protegidas por oficializar, e corredores) Fonte: BISSASIG-Célula SIG-INEP/GPC 2011. 12.8 Diversas espécies animais descobertas na Guiné-Bissau são globalmente significantes e identificadas na Lista Vermelha na IUCN como globalmente ameaçadas ou em perigo. A zona costeira do país é a sede inter alia de cinco espécies de tartarugas marinhas, peixe-boi, mero, patim, peixe-serra comum e grande, hipopótamos oceânicos, chimpanzés, e um número considerável de espécies de aves migratórias. Notavelmente, as Áreas Protegidas de João Vieira e Poilão no Arquipélago de Bijagós (ver a Figura 96) constituem a maior zona de nidificação de tartaruga verde na África Central e Ocidental, e a terceira maior do Atlântico. Adicionalmente, as florestas do interior das ilhas acomodam diversas espécies endémicas, raras e ameaçadas de pássaros, plantas, répteis e mamíferos, incluindo o mabeco, o crocodilo anão, leão, elefante africano, grandes ungulados como o búfalo africano, hipopótamos, chimpanzés, macacos, macaco do tipo colobus vermelho e colobus rei. 12.9 O Arquipélago Bojama-Bijagós é uma reserva reconhecida de Humanidade e Biosfera (MAB) da UNESCO devido à excepcional combinação de activos biológicos e 226 naturais. Esta área, que inclui 88 ilhéus e Bissau, inclui três áreas protegidas (João Vieira e Poilão, Parques Nacionais Marinhos do Orango, e Comunidade Marítima Protegida de Urok) e é a segunda mais importante área da África Ocidental para as aves marinhas migratórias (depois de Banc d’Arguin na Mauritânia). É reconhecida como uma Zona Húmida de Importância Internacional sob a convenção RAMSAR, assim como uma Área Importante de Aves pela Birdlife International, além de ser também um local de Património Mundial da UNESCO. Outras áreas protegidas são igualmente significantes: O Parque Natural de Cufada é uma zona designada como de importância internacional pela convenção de zonas húmidas da RAMSAR (Convention on Wetlands of International Importance), e o Parque Nacional da Floresta de Cachéu e a lagoa de Vendu Tcham no parque natural proposto de Boe também foram propostas como zonas ao abrigo da RAMSAR. No Sul, o Parque Nacional de Catanhez é reconhecido pela WWF como representativo de um dos 200 ecossistemas mais importantes do mundo. A riqueza da biodiversidade e as tradições culturais ricas destas áreas de apoio constituem um activo natural significativo para o país que, se protegido, tem o potencial para servir como a espinha dorsal de uma futura indústria do turismo. 12.10 Reconhecendo a importância crítica desta biodiversidade, ecossistemas e activos naturais, o Governo, em conjunto com os parceiros internacionais e nacionais, tem, ao longo dos últimos 15 a 20 anos desenvolvido uma abordagem e um quadro institucional para a sua conservação e uso sustentável. Os principais feitos até à data incluem: (i) o estabelecimento e operacionalização do SNAP, constituído por seis áreas protegidas,157 que cobrem 15 por cento do território nacional e providenciam benefícios tangíveis a mais de 70.000 pessoas (área que será expandida a 26 por cento do território nacional em 2014); (ii) estabelecimento de um Instituto de Biodiversidade e Áreas Protegidas (IBAP) autónomo do ponto de vista financeiro, administrativo e patrimonial, com um mandato e capacidade crescente para gerir estas áreas protegidas, e trabalhando em conjunto com o Governo local e sociedade civil (ONGs, comunidades locais); e (iii) pilotagem de um Fundo para Iniciativas Locais de Ambiente (FIAL), um mecanismo de partilha de benefícios que procura aliviar a pressão sobre a biodiversidade e ecossistemas apoiando simultaneamente as comunidades locais a melhorar o seu bem-estar. 12.11 Em conjunto, estes instrumentos têm demonstrado um sucesso crescente na redução da pressão na biodiversidade e ecossistemas das áreas protegidas, o principal factor motivador dos quais é a actividade de subsistência insustentável dos pobres rurais, embora as futuras ameaças incluam potencialmente o desenvolvimento do sector extractivo. Estes sucessos foram alcançados apesar da instabilidade política crónica que tem afectado o país. Um dos factores chave destes ganhos é de que as áreas protegidas não são vistas apenas como áreas de conservação, mas também pólos de desenvolvimento local, onde a adopção de abordagens participativas a favor do uso sustentável e conservação de recursos podem encorajar o desenvolvimento e redução da pobreza. As ONGs nacionais desempenham um papel importante e activo no país para salvaguardar os activos culturais e ambientais, e conseguiram parcerias efectivas com o IBAP para gerir as zonas protegidas e promover a boa governação. 12.12 O Governo reconhece também a necessidade de garantir financiamento estável para a conservação da biodiversidade e gestão do SNAP no longo prazo. Até à data, o estabelecimento e gestão das áreas protegidas tem dependido exclusivamente do financiamento 157 Actualmente, o SNAP inclui cinco parques nacionais costeiros e marinhos: Parque Nacional Florestal do Manguezal de Cachéu, Parque Nacional Florestal de Cantanhez, Parque Nacional dos Lagos de Cufada, Parque Nacional Marinho de João Vieira e Poilão e o Parque Nacional Marinho de Orango; e a Área Protegida Marinha da Comunidade de Urok, a primeira área de comunidade marinha protegida e um modelo regional para a gestão comunitária participativa. Cerca de cinco áreas terrestres vão ser declaradas como protegidas em 2014 como parte do complexo Dulombi, Boe, e Tchetche (DBT). 227 externo dos doadores, o que deixa os ganhos consideráveis de conservação e áreas protegidas sujeitos a recuos. À luz da procura competitiva por recursos limitados do orçamento nacional, uma das estratégias chave para garantir a sustentabilidade destes esforços reside no estabelecimento de um trust fund de conservação, a Fundação BioGuinea (FBG), com recursos suficientes para providenciar um fluxo de receitas estáveis para suster o núcleo das áreas protegidas e de actividades de gestão da biodiversidade de forma contínua, salvaguardo-as de eventuais de défices orçamentais públicos e reduzindo a dependência do financiamento imprevisível dos doadores. 12.13 A Fundação BioGuinea (FBG) é um produto de um esforço dinâmico e participativo iniciado em 2007 e suportado por diversos parceiros nacionais e internacionais, incluindo inter alia o Governo, GEF, Banco Mundial, União Europeia, PNUD, Fundação MAVA, IUCN, FIBA, WWF, ONGs locais, e sociedade civil. Estabelecido legalmente em 2011 sob a Lei Inglesa e do País de Gales, trata-se de uma “fundação privada com utilidade pública” e foi reconhecida em 2012 por parte do Reino Unido e Guiné-Bissau como uma instituição de caridade.158 Os principais objectivos da FBG são de gerir a dotação e os fundos de maneio com o objectivo de garantir um financiamento estável e sustentável para a conservação da biodiversidade e ecossistemas da Guiné-Bissau e também para promover o desenvolvimento socioeconómico das comunidades. O FBG está actualmente a ser operacionalizado e a colecta de fundos está em curso para garantir o capital inicial de arranque. Embora o foco prioritário seja na colecta do capital de dotação (por exemplo, através de donativos directos ou swaps dívida por natureza) a Fundação é também concebida para gerir os fundos de garantia e receita corrente. O Governo irá continuar a procurar assistência da comunidade global para estabelecer o fundo de dotação, mas irá também procurar gerar a sua própria receita, como, por exemplo, através de concessões turísticas em áreas protegidas, venda de créditos de carbono, taxas de entrada nos parques, e potenciais receitas fiscais das indústrias extractivas (capítulo 11). 3. TURISMO: O POTENCIAL POR EXPLORAR 12.14 As vantagens comparativas da Guiné-Bissau no que respeita ao turismo situam-se nos recursos naturais e activos culturais. A biodiversidade rica encontrada em todo o país pode ser combinada com recursos culturais fortes, tais como a hospitalidade natural da população local e a diversidade cultural do país, para criar uma oferta turística única. Os recursos culturais na Guiné- Bissau incluem uma culinária diversa e interessante, muitos festivais culturais, danças e músicas tradicionais, e artesanatos autênticos. A somar ao potencial de turismo baseado em produtos de cultura e natureza, o país está bem posicionado para receber turistas da Europa. A Guiné-Bissau situa-se aproximadamente na mesma longitude da Europa, significando isto que não há alterações significativas nos fusos horários além de que a duração dos voos é reduzida. Quando os voos directos estão disponíveis de Lisboa, o tempo de viagem é apenas de quatro horas. Em termos de marketing, o país já criou uma imagem internacional de marca com base nos seus recursos e ecossistemas naturais. A reputação existente pode ser alavancada e refinada para incluir as atracções baseadas na natureza e cultura e mostrar verdadeiramente o destino único que a Guiné- Bissau representa. 12.15 Apesar de diversas iniciativas de pequena escala do sector privado, a Guiné-Bissau não começou ainda a aproveitar o seu potencial para o turismo. O país tem tido um passado violento, sofrendo instabilidade política permanente, e é um dos mais pobres e frágeis do planeta. Embora à primeira vista estas condições possam não parecer favoráveis para o turismo, uma série de países têm conseguido alavancar com sucesso o turismo e sair da pobreza. Notavelmente, 158 O FBG foi desenhado no cumprimento das recomendações chave no que respeita a trust funds por parte do GEF e Aliança de Finanças para a Conservação (Conservation Finance Alliance). 228 Moçambique e o Ruanda desenvolveram os seus sectores de turismo nos últimos 10 anos apesar de alguma instabilidade civil recente. A Caixa 14 ilustra o estado precário do sector do turismo na Guiné-Bissau actualmente. 12.16 A Guiné-Bissau tem uma amplitude notável de activos para criar pacotes de turismo interessantes. Alguma da vida selvagem do turismo é bastante rara (tais como os hipopótamos oceânicos em Orango ou os chimpanzés no Parque Nacional de Cantanhez). Os ambientes marinhos e fluviais da Guiné-Bissau oferecem oportunidades para o turismo de aventura, tal com canoagem ou kayaking. A pesca desportiva, e observação de aves ou tartarugas atraem turistas que são tipicamente de alto rendimento e dispostos a pagar um prémio para a oportunidade de ver determinados tipos de peixe ou pássaros. Tanto a pesca desportiva como a observação de aves (Bijagós) têm o potencial de serem actividades turísticas interessantes. Existem três grandes centros de observação para as aves migratórias e de nidificação na África Ocidental: Senegal, Mauritânia e Guiné-Bissau, e nenhum destes aproveitou ainda devidamente este potencial. Caixa 14: Investigar o estado do turismo na Guiné-Bissau As estatísticas para o turismo na Guiné-Bissau são escassas e de qualidade inconsistente. O ano mais recente para o qual existem dados completos da Organização Mundial do Turismo das Nações Unidas (UNWTO) é 2007. Dos dados existentes, é claro que o turismo não é actualmente uma actividade económica importante ou uma fonte de receita significativa na Guiné-Bissau. As chegadas internacionais na Guiné-Bissau atingiram 35.000 viajantes em 2012, e as receitas de turismo alcançaram US$ 2,8 milhões em 2006, sendo que a despesa média por visitante foi estimada em US$ 546, também em 2006. Em 2004, a contribuição da despesa em turismo para o PIB foi de somente 0,8 por cento, ao invés que a contribuição do turismo para o PIB em toda a região da África Subsaariana foi de 5,9 por cento. Não existem estatísticas internacionais produzidas sobre o emprego de turismo na Guiné-Bissau, mas os indicadores proxy (0,2 trabalhadores por chegada) sugerem que podem existir 3.600 empregos nos negócios de turismo no país. Existem sete hotéis de standard internacional em Bissau e cinco nas ilhas de Bijagós. Em 2004, o número de unidades de alojamento no país foi de 3.533 e não parece ter mudado muito entretanto. A escassez de dados completos do turismo limita a capacidade de identificar mercados alvo, reconhecer as tendências e despesas, detectar barreiras de acesso para mercados específicos, e ganhar uma compreensão de outras medidas chave do turismo. Os dados existentes indicam que as chegadas internacionais aumentaram em anos recentes, mas isto poderá ser devido às forças de manutenção da paz e viagens associadas. Uma vez que os dados detalhados têm cerca de sete anos, não é possível verificar as tendências associadas aos objectivos das viagens para a Guiné. No entanto, em 2007, o número de visitantes de lazer (11.700) excedeu marginalmente os viajantes em negócios (9.300). Isto poderá apontar para o potencial das viagens de lazer, ou indicar viajantes que representam de forma errada o objectivo da sua visita devido à confusão nos formulários de imigração ou políticas restritas de vistos. Outros objectivos das visitas incluem a visita a amigos e familiares, que representam cerca de 30% dos viajantes para o país em 2007 (9.100). Os cinco mercados de topo de longa distância para a Guiné-Bissau são: Portugal, França, Suécia, Itália, e Espanha. Portugal é o mais importante mercado de longa distância e atrai visitantes que têm família ou ligações históricas com o país. A França é o segundo maior mercado fonte, com os visitantes franceses a serem atraídos para a Arquipélago de Bijagós e actividades de pesca. A maioria dos visitantes viajam ao longo de um eixo Norte/Sul com pouca ou nenhuma mudança de fusos horários para chegar à Guiné-Bissau. 229 12.17 A cultura da Guiné-Bissau oferece uma oportunidade valiosa para experiências culturais que podem acrescentar variedade e profundidade a uma visita, tais como o exemplo do Pays Dogon do Mali ou a tradição de cantos do Senegal e do Mali. Existem numerosos festivais que podem oferecer o potencial para criar visitas interessantes. O caso clássico de Bali na Indonésia onde o turismo e a cultura têm desenvolvido em conjunto pode ser replicado numa escala mais pequena na Guiné-Bissau. Em Bali, a cultura tradicional Hindu tem-se adaptado ao turismo e o turismo tem conseguido muitos benefícios da cultura e religião Hindu sob a forma de danças e música, máscaras faciais, e esculturas. A ambição para alcançar uma simbiose deste tipo pode parecer irrealista no contexto actual da Guiné-Bissau, mas irá tomar forma ao longo do tempo à medida que o turismo for crescendo. 12.18 A Tabela 12 providencia dados comparativos que ilustram os resultados que a Guiné-Bissau pode esperar no médio a longo prazo, com um compromisso de que o turismo seja baseado em práticas de gestão sustentável. O Ruanda e Cabo Verde são mais pequenos que a Guiné-Bissau em termos de massa terrestre, mas ambos conseguiram desenvolver uma indústria internacional de turismo. No seguimento dos tumultos civis, a indústria de turismo do Ruanda emprega agora 66.500 pessoas e emprega indirectamente 174.500 pessoas. O vizinho da Guiné- Bissau, Senegal, tem construído uma indústria do turismo baseada em grandes recursos centrados na música e na cultura. O Senegal recebe actualmente mais de 1 milhão de turistas anualmente com uma taxa de crescimento anual notável de 10 por cento. A Tanzânia é um exemplo de outro país que, muito à semelhança da Guiné-Bissau, realizou um investimento massivo na conservação da biodiversidade marinha e terrestre; o turismo neste país representa um dos melhores recursos naturais e de oferta cultural em África, com mais de um milhão de turistas que visitam anualmente e emprego directo e indirecto para mais de 1.200.000 em toda a economia de indústria de turismo. Tabela 12: Actualmente, a Guiné-Bissau está bem atrás de potenciais competidores em termos de fluxos turísticos Botsuana Cabo Guiné- Ruanda Senegal Tanzânia Verde Bissau* Chegadas internacionais (000s). 2.145 336 3,5 504 900 754 Taxa de crescimento para o turismo 3,94% 8,89% 62,5% 18,39% 2,05% 1,2% (chegadas) Contribuição do Turismo para o PIB 8,2% 42,3% n/a 8,6% 10,9% 13,1% (directa + indirecta) (%) Receitas do turismo internacional (US$ 78 278 13** 202 453 1.255 milhões) Quartos de Hotel 6.693 5.891 3.533 4.232 20.000 n/a Ocupação dos quartos (%) 48,1% 49,99%† n/a n/a n/a n/a Emprego total do sector do turismo 56,4 72,0 n/a 147,4 268,5 690 (directo + indirecto) (000s) Área terreste (quilómetros quadrados) 566.730 4.030 36.120 26.338 196.190 945.087 Nota: Anos considerados para as taxas 2008-10 2008-10 2005-08 2009-11 2008-10 2008-10 de crescimento * Dados de 2007, o último ano para o qual estão disponíveis dados de turismo. ** Dados de 2010. † Taxa de ocupação por quantidade de camas. Fonte: Base de dados de Turismo de África, UNWTO, WTTC. 12.19 O desenvolvimento do turismo em torno de recursos naturais e culturais irá inegavelmente impactar estes activos, mas as recompensas de crescer o turismo são superiores aos riscos. O turismo irá impactar nos recursos culturais e naturais da Guiné-Bissau, e este impacto pode ser positivo ou negativo. O impacto positivo inclui a protecção ambiental; geração de receitas para as áreas protegidas; a conservação de instalações e recursos culturais, arqueológicos e históricos; a melhoria da gestão ambiental; e a concepção correcta de infra- estruturas. No entanto, se o desenvolvimento do turismo não for bem gerido, a base natural, 230 cultural e social do qual o turismo depende irá provavelmente deteriorar. As florestas costeiras podem ser destruídas para abrir caminho para hotéis, e o habitat das espécies em perigo pode ser perdido. Com um aumento no turismo, a caça e a pescas terão de ser reguladas de forma a controlar o número de turistas e o seu impacto. A gestão errada do turismo tem sido associada a uma variedade de efeitos nocivos de natureza social e cultural, tais como um aumento do crime, a difusão de doenças, aumento na desigualdade na riqueza, prostituição, e maus tratos de mulheres e crianças. Uma abordagem focalizada ao desenvolvimento do turismo irá garantir que os recursos existentes são convertidos em activos economicamente produtivos em simultâneo com a mitigação dos impactos negativos. 12.20 O turismo não pode crescer de forma sustentável sem coordenação e apoio. O desenvolvimento do turismo é considerado pelo Governo como uma das ferramentas para alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) de redução da pobreza e sustentabilidade ambiental, e é também um dos principais sectores discutidos no DENARP. No entanto, não existe um Ministério do Turismo, e o desenvolvimento do turismo é relegado para a Secretaria de Estado de Ambiente e Turismo sob o Ministério de Recursos Naturais e Indústria. Os serviços de apoio ao turismo, tais como o planeamento, marketing, quadros regulatórios, e monitorização, são inadequados. Não existe uma estratégia focalizada para o crescimento sustentável do sector e um quadro de políticas claras e implementáveis. Adicionalmente, o ambiente actual de negócios não é conducente ao desenvolvimento de um sector privado vibrante de turismo. As estatísticas disponíveis para o sector são limitadas e de qualidade inconsistente; é impossível construir o turismo na ausência de dados sobre os quais se possam basear as decisões públicas e privadas. O principal papel do Governo no desenvolvimento do turismo deverá ser criar um quadro de políticas que encoraje o desenvolvimento do sector privado em simultâneo com a manutenção da sustentabilidade económica, ambiental e cultural. 12.21 O turismo tem o potencial real para ser uma fonte de crescimento partilhado na Guiné-Bissau. No entanto, devem ser enfrentados uma série de desafios para que o desenvolvimento do turismo possa ser iniciado. Os esforços em curso para criar uma base para o turismo em áreas protegidas devem ser complementados por acções que respondam aos constrangimentos mais significativos para o desenvolvimento do turismo. Existem vários desafios fundamentais que atravessam o sector como um todo, incluindo aumentar a eficiência e as percepções de segurança e saúde no país.159 No que diz respeito à questão de segurança, apesar da instabilidade política na Guiné-Bissau, trata-se de um destino seguro comparado com muitos outros países da África Subsaariana, e os crimes relacionados com o turismo são reduzidos. No entanto as questões de saúde - tais como a malária, cólera, VIH/SIDA - permanecem uma preocupação a somar à recente epidemia de Ébola na região. 12.22 Os serviços essenciais ao turismo também permanecem um desafio na Guiné-Bissau. Existem actualmente apenas quatros companhias aéreas a operar no país, nenhuma das quais oferece uma ligação directa à Europa - embora, no seguimento das recentes eleições, espera-se que TAP possa resumir a sua rota Lisboa-Bissau. O país tem beneficiado de várias iniciativas de reabilitação de estradas ao longo dos últimos cinco a dez anos. No entanto, estes têm sido focados nas principais estradas que ligam os centros regionais com a capital, Bissau. As ligações às áreas protegidas permanecem pobres. De forma similar, o acesso marítimo de e entre ilhas é limitado e frequentemente perigoso. O ferry para Bubaque, o principal activo turístico do país, só opera semanalmente, e o serviço é frequentemente interrompido por meses consecutivos. Outro desafio está ligado à má infra-estrutura, particularmente energia eléctrica, que é auto-fornecida pela 159 Twining-Ward, L. (2009) Sub-Saharan Africa Tourism Industry Research, Unpublished Draft Final Report, Banco Mundial. 231 maioria das empresas principalmente através de geradores. Isto aumenta de forma significativa os custos operacionais para os operadores de turismo, custos estes que consequentemente são passados para os clientes. Existe também uma escassez crónica de alojamento, alimentação, e bebidas, assim como de lojas para consumo, particularmente no interior do país. A escassez de infra-estrutura é também complementada por competências reduzidas de turismo e hospitalidade por parte dos empregados de front-office, que agem como o principal ponto de contacto para os turistas. Finalmente, o ambiente administrativo para as empresas permanece desafiante, apesar de se ter registado progresso recente na área dos registos e telecomunicações (Internet e telefones móveis - ver capítulo 2) e serviços de pagamento com a introdução da rede de cartões de crédito Visa e máquinas automáticas. 12.23 Existe a necessidade de transformar os activos de turismo em produtos de turismo através do desenvolvimento de produtos. Apesar da riqueza dos recursos baseados na natureza e cultura existem actualmente muito poucos produtos de turismo. Os hotéis têm os seus próprios programas de publicidade e algumas actividades, tais como a pesca desportiva, dependem de contactos directos através da Internet. Em destinos turísticos de sucesso e sustentáveis, o desenvolvimento de produtos está no cerne da construção de um sector turístico vibrante. Ao empacotar produtos de forma criativa e mantendo-se cientes das tendências de mercado, os países podem multiplicar as suas probabilidades de terem sucesso. Os operadores de viagens e outros intermediários conduzem esta actividade em colaboração com outros agentes intervenientes no turismo, tais como, por exemplo, companhias aéreas, de excursões, e de actividades culturais. Actualmente existem apenas cerca de oito operadores de viagens/excursões no país. Em destinos desenvolvidos, os operadores de viagens providenciam um empacotamento dinâmico e criativo de produtos, sendo que no entanto na Guiné-Bissau os operadores se limitam a emitir bilhetes e não se focaram na criação de pacotes integrados. 12.24 Têm emergido esforços para apoiar o sector. Em 2012, um projecto de ecoturismo, financiado pela MAVA e implementado pela IUCN em conjunto com a IBAP, foi lançado para apoiar o desenvolvimento do ecoturismo nos parques nacionais. Entre as actividades do projecto foi preparado e consta um diagnóstico das potenciais oportunidades e constrangimentos de cada uma das áreas protegidas. O projecto procura desenvolver, através de um processo altamente consultivo, uma Estratégia Nacional de Marketing de Ecoturismo nas áreas protegidas. Em paralelo, no terreno, diversas ONGs começaram a trabalhar com as comunidades locais no desenvolvimento de pequenas actividades de pequena escala de ecoturismo, actividades culturais como o teatro de comunidade, revitalização dos eventos tais como o Carnaval de Bijagós, e na produção de artesanatos locais. Embora o turismo possa aumentar a procura de produtos e serviços locais e providenciar uma série de actividades informais e formais de geração de rendimento (Caixa 15), o sector enfrenta o desafio de como estender os benefícios aos pobres e às comunidades locais em simultâneo com o respeito das tradições e direitos locais. Caixa 15: O Impacto dos Empregos do Turismo nos Rendimento das Aldeias Na década de 90, os aldeões em torno da recentemente estabelecida Reserva de Caça de Madikwe na província do Noroeste da África do Sul ganharam cerca de US$ 2,6 milhões de todas as actividades económicas, excluindo agricultura comercial. Até 2003, quando a capacidade de camas na nova reserva já havia atingido 386, os residentes estavam a ganhar entre US$ 1,3 e US$ 1,6 milhões por ano do turismo. O total de rendimentos das aldeias aumentou entre 50 a 62 por cento devido ao turismo, mesmo quando a reserva e a economia ligada ao turismo ainda estavam em desenvolvimento. Os salários locais de turismo eram cerca de três vezes a média dos rendimentos na área, e as mulheres recebiam 50 por cento dos salários. Fonte: Mitchell, J. e Ashley, C. (2010) Tourism and Poverty Reduction: Pathways to Prosperity, ODI e Earthscan Publications, Londres. 232 12.25 Neste contexto, embora uma indústria moderna de turismo possa representar uma fonte importante de crescimento para o futuro da Guiné-Bissau, existe o risco de que esta seja sobrecarregada pelos constrangimentos e se perca a visão das oportunidades associadas ao desenvolvimento. Estes constrangimentos actuais podem ser entendidos como oportunidades: a infra-estrutura pobre tem dificultado o acesso aos parques naturais, protegendo assim os ambientes frágeis; a sazonalidade significa que a gestão e staff beneficiam de uma época baixa para ser usada para férias, formação e manutenção ampla. A indústria turística, conforme representada nos parques naturais, pode ser um íman não apenas para turistas mas também para negócios e fornecedores locais - por exemplo, existem diversas ligações entre a agricultura e o turismo - e o turismo é considerado uma exportação invisível, uma vez que aporta divisas estrangeiras. Os investimentos em infra-estruturas para o desenvolvimento sustentável do turismo também responderiam às necessidades das populações locais, acrescentariam ao seu bem-estar, e provavelmente encorajariam a descentralização. 12.26 A Guiné-Bissau ainda tem a possibilidade de tomar vantagem destas abordagens estratégicas nas etapas iniciais de desenvolvimento, antes que o turismo cresça; quando as fases de pós-desenvolvimento e investimento privado descolarem, será demasiado tarde para que o Governo efectue mudanças pequenas e razoáveis. A Guiné-Bissau ainda tem a maioria das cartas, e deverá usá-las de forma eficiente e equitativa. Identificar nichos 12.27 A maioria dos estudos apontaram para três a cinco áreas na Guiné-Bissau ou nichos em que o turismo parece estar a emergir, e, com uma notável excepção (Bissau), situam-se directamente ou em torno das áreas protegidas existentes. Os critérios para a selecção dos nichos a serem desenvolvidos incluem: o valor intrínseco do activo para o turismo; actividades e itinerários potenciais para os turistas na área; impacto ambiental e proximidade das áreas protegidas; capacidade de alojamento da área; défice de instalações actuais e de infra-estrutura; facilidade de acesso e potencial de crescimento; problemas sociais locais. Os principais locais são:  Arquipélago de Bijagós: Este trata-se claramente da jóia da coroa da Guiné-Bissau. Diversos resorts emergentes situam-se no Arquipélago de Bijagós (sete lodges de pequena escala com um total de 89 quartos). A Reserva da Biosfera do arquipélago foi estabelecida em 1996 para proteger os manguezais, pescas, e um sistema único de custódia dos terrenos. A Reserva tem mais de 80 ilhas diferentes e 240.000 habitantes, dos quais 70 por cento são de Bijagós. A população de Bijagós tem o seu próprio sistema elaborado de gestão dos terrenos, e consideram diversas ilhas como sagradas.160 O turismo é actualmente concentrado na pesca desportiva. Diversos visitantes internacionais que vão à ilha são Franceses, muitos dos quais voam directamente para as ilhas a partir de Cap Skirring no Senegal. O arquipélago tem três áreas protegidas, cada uma das quais oferece atracções únicas e um grande potencial como um princípio organizador do turismo.  O Parque Nacional de Cantanhez na parte Sudeste do país oferece a possibilidade de observar vida selvagem, incluindo chimpanzés, elefantes de floresta, e outros pequenos ungulados. A maior cidade da região é Buba e oferece acesso a actividades de observação de aves nas lagoas adjacentes de Parque Nacional de Cufada, assim como ao Parque Nacional de Cantanhez. A localidade de Cantanhez situa-se a seis horas de Bissau utilizando uma estrada não pavimentada que oferece um trajecto difícil, mesmo nas alturas mais favoráveis. Também, devido à natureza plana do terreno, a vida selvagem é difícil de observar. Ainda 160 Curiosamente, muitos residentes de Bijagós são agricultores ao invés de pescadores. Esta é uma oportunidade importante de desenvolver ligações entre a produção local de agricultura e o turismo. 233 assim, Cantanhez representa um pólo na parte Leste do país que pode ser desenvolvido enquanto destino turístico.  Varela/São Domigos/Cachéu: Esta região, adjacente a Cap Skirring do Senegal, está a emergir como um destino de sol, mar, praia e ecoturismo, principalmente na parte Norte do parque. As aldeias de Elia, Djobel e Bolol, e parte da comunidade florestal de cobiana no Sul do Parque, representam potenciais atracções de ecoturismo identificadas durante o diagnóstico realizado sobre o potencial e os constrangimentos do ecoturismo nas áreas protegidas; alguns pequenos estabelecimentos (hotéis) foram já construídos. A região cobre naturalmente a vila fronteiriça de São Domingos e a zona protegida de Cachéu, que conserva um conjunto extensivo de manguezais ao longo do Rio Cachéu e também vida selvagem, incluindo espécies raras (hipopótamos, antílopes, javalis, etc). Iniciou-se a construção de uma ponte sobre o Rio Cachéu e a estrada foi melhorada, e ambas as obras vão facilitar substancialmente o acesso de Varela para Bissau. Já foram efectuados investimentos com um volume estimado de US$ 9 milhões na capacidade de alojamento próxima das praias. No entanto, estas já estão a sofrer erosão e a desintegrarem-se para o mar devido à ausência de restrições à construção adequadas (em muitos países a construção não é permitida no espaço de 25-50 metros de distância dos marcos de maré alta). Isto realça a necessidade de regulamentações numa fase inicial, idealmente antes que a construção das instalações de alojamento inicie. Será necessário um plano de desenvolvimento local/regional para a área para determinar as capacidades de absorção, planeamento de uso territorial, loteamento e necessidades de infra-estruturas. Uma parte integral do processo de planeamento passaria por elaborar regulamentações que governem o uso da região assim como a formação dos oficiais públicos encarregues com a gestão da área.  Bissau, a cidade capital. A maioria dos turistas chegam via Bissau, tornando esta cidade o hub de facto para o turismo no país. O principal aeroporto internacional é localizado em Bissau, como são também os grandes hotéis, assim como o potencial para o ponto focal do turismo. A maioria dos locais fora de Bissau podem ser alcançados a partir da capital, com viagens terrestres que podem durar até seis horas. A cidade necessitaria de desenvolver serviços de turismo, tais como informação sobre os locais nacionais; uma série de serviços de alojamento; restaurantes e bares/cafés; uma loja geral (com um posto de correio, e possivelmente loja de câmbios e máquinas automáticas); reservas de excursões; possivelmente um centro de conferências; e um grupo/associação para apoiar os interesses do sector do turismo. Acautelar contra os riscos 12.28 Embora os benefícios de desenvolver o sector do turismo da Guiné-Bissau possam ser substanciais, será importante conter as externalidades negativas. Especialmente num país com uma governação fraca, a aplicação da Lei pode resultar em formas indesejáveis de turismo, incluindo turismo sexual. A prostituição - assim como o consumo de drogas - pode aumentar se o turismo não for bem gerido. Adicionalmente, o turismo pode resultar em outros efeitos negativos na sociedade uma vez que os turistas “competem” com os locais por produtos como alimentos e imobiliário, aumentando assim os preços para os locais. O planeamento cuidadoso e o fortalecimento das agências encarregues de aplicar a Lei será importante para garantir o máximo benefício proveniente do desenvolvimento do turismo. 234 Pilotar o sucesso 12.29 O desenvolvimento de todos os locais mencionados acima seria demasiado ambicioso para o orçamento do Estado, e assim a priorização de acordo com os critérios das partes interessadas será crítica. O foco em apenas um local poderá providenciar um quadro através do qual se possa avaliar o potencial do turismo para os outros locais a serem intervencionados de seguida. É recomendável o foco em acrescentar valor (e despesas) a um fluxo limitado de visitantes, ao invés de simplesmente maximizar o número de visitas. O benefício de um foco de valor acrescentado já foi demonstrado no desenvolvimento do turismo com sucesso em outros destinos, tais como a Tanzânia. Assumindo que o objectivo é utilizar os parques naturais como uma âncora para o futuro desenvolvimento e para aumentar o turismo enquanto fonte de crescimento e redução da pobreza em simultâneo com a geração de rendimentos para a preservação das áreas protegidas, uma intervenção piloto poderia incluir um plano geral ( master plan) para o local de destino (que cobrisse o parque nacional e áreas circundantes); estudos de mercado e de viabilidade para as actividades propostas (pescas desportivas, observação de tartarugas e aves, sol e areia, observação de vida selvagem, passeios pedestres, etc.) assim como um estudo de tarifas para as taxas dos parques (se aplicável) e contratos-modelo de concessão (lodges, restaurantes, etc.). 12.30 Uma das partes importantes da proposta seria definir a estrutura organizacional do projecto; um dos modelos sugeridos é apresentado na Figura 97. Com isso em mente, a abordagem piloto poderia determinar o melhor modo de acesso, utilização de terrenos e loteamento, infra-estrutura, e regulamentações. Uma parte do projecto-piloto seria a formação de staff do IBAP e da Direcção do Turismo para planear o sector do turismo e colocar em prática as medidas institucionais necessárias para implementar e gerir a parte pública do projecto. Se exequível, o Governo deveria procurar providenciar o quadro regulatório mas, idealmente, deveria licitar as obras de turismo ao sector privado. À medida que o projecto-piloto avance, outros locais podem ser acrescentados em linha com a capacidade do Ministério de os absorver. 4. IMPLICAÇÕES NAS POLÍTICAS 12.31 A Guiné-Bissau tem uma dotação nacional de recursos naturais e culturais que pode apoiar o desenvolvimento do sector do turismo, se o processo for gerido de forma eficaz. O progresso na gestão dos parques e da biodiversidade é a prova do que é pode ser alcançado num curto espaço de tempo. Se este esforço for mantido, o desenvolvimento de uma indústria moderna de turismo na Guiné-Bissau na base da biodiversidade e cultura ricas pode representar uma fonte de crescimento substancial no futuro e, de forma mais importante, providenciar uma fonte de financiamento segura para os esforços de conservação da biodiversidade e do sistema de áreas protegidas. 12.32 Ao invés de impor uma abordagem top-down, colher o potencial da biodiversidade e áreas protegidas para o turismo deve ser uma actividade bottom-up, que construa de forma orgânica sob as actividades incipientes já em curso. De facto, a abordagem de curso prazo não seria tanto “desenvolver o turismo” mas mais uma de encorajar os esforços em curso e garantir que estes são responsáveis, equitativos e sustentáveis. Embora o turismo seja predominantemente uma actividade do sector privado, o Governo tem um papel chave enquanto autoridade de políticas, regulador e fornecedor de infra-estruturas, além de, neste caso, ser também o gestor da base de capital natural da indústria potencial. 235 Figura 97: A garantia dos direitos da comunidade nos parques nacionais é possível e importante Agência de Conservação Pública Em áreas em torno de parques e reservas naturais, o - Focalização no know-how ambiental; objectivo do turismo com base em comunidades é - Gestão de Áreas Protegidas; proteger o direito das comunidades de utilizar os seus - Fornecimento de infra-estrutura de base; terrenos. Isto pode ser realizado através de joint-ventures - Optimização da geração de rendimentos; e outros mecanismos. Mesmo que o terreno seja posse do Trust representativo da Comunidade Estado (por exemplo, um parque nacional), deverá ser - Estrutura legal e representativa estável; possível criar uma hierarquia de envolvimento, - Direitos de concessão e usufruto de 45 anos; providenciar incentivos a todas as partes interessadas, e - Obtidos através de convites para propostas focalizadas proteger os direitos de cada. Esse modelo é demonstrado (call for proposals); no exemplo infra. Uma das abordagens poderia ser: a - Instrumentos de fundos para desenvolvimento; agência de conservação nacional ou organização nacional - Gere as subconcessões; de parques transfere determinado local para a autoridade - Distribui os benefícios associados. de gestão. A autoridade de gestão assina um acordo de Operador Parceiro Privado cedência e arrendamento com o trust ou conselho - Subconcessão de operação de 10 a 15 anos; representativo da comunidade que por sua vez contrata os - Providencia equipamentos e capital operativo; operadores privados, tais como hotéis e restaurantes. Se o - Capacidade e experiência comprovadas; regime de posse for seguro e a gestão for positiva, este - Designado via concurso; modelo flexível oferece formas de alcançar os objectivos - Sujeito a obrigações de empowerment; públicos e gerar lucros privados. - Devolução após 15 anos. 236 12.33 A chave para construir uma indústria viável de turismo na Guiné-Bissau é iniciar a identificação dos activos e problemas associados, decompondo-os em pequenas secções que possam ser trabalhadas individualmente. Em termos de activos, é importante analisar como é que a vantagem comparativa pode ser transformada numa vantagem competitiva - nomeadamente, como é que biodiversidade, áreas protegidas, e herança cultural do país podem ser transformadas num activo produtivo. O desafio pode ser decomposto em duas partes interrelacionadas: (i) preservar os activos do turismo: como manter e fortalecer a gestão e conservação dos activos naturais e culturais, focando na biodiversidade e no SNAP; e (ii) capitalizar os activos: como fortalecer o ambiente de estímulo e catalisar o surgimento de um sector do turismo sustentável e com sucesso. Para este fim, a estratégia para mover a agenda de turismo em diante na Guiné- Bissau tem três eixos principais: (i) Proteger e conservar o capital natural e social do país; (ii) Colocar em prática o ambiente de estímulo e capacidade institucional para o desenvolvimento do turismo; (iii) Identificar um projecto-piloto e testar modelos para o desenvolvimento participativo do turismo. Protecção e conservação do capital natural, social e cultural do país 12.34 Os esforços para conservar e gerir a biodiversidade da Guiné-Bissau, assim como os activos ecológicos e culturais, têm resultado em ganhos significativos. A decisão para focalizar no ecoturismo é baseada nos sistemas actuais de gestão das áreas protegidas que o Governo colocou em prática. Os activos naturais e culturais formam a espinha dorsal do futuro desenvolvimento do turismo e devem ser geridos e protegidos. Os esforços governamentais para gerir as áreas protegidas do país têm sido exemplares. Ao longo dos últimos 14 anos, o Governo, com o apoio dos seus parceiros, tem percorrido um longo caminho para colocar em prática as fundações legais, institucionais e físicas necessárias para proteger esta base de recursos. O estabelecimento do IBAP; a salvaguarda de biodiversidade e activos naturais e culturais no SNAP; o desenvolvimento e aplicação de abordagens de gestão participativas, assim como os incentivos à comunidade e mecanismos de partilha de benefícios; e os passos tomados para estabelecer um mecanismo sustentável de longo prazo de financiamento têm sido conseguidos num horizonte temporal curto, apesar da instabilidade política crónica. A abordagem da Guiné-Bissau à gestão das áreas protegidas demonstra o potencial para emergir como exemplo de boa prática para a África Ocidental e deverá ser integrada em todo o desenvolvimento futuro do turismo. 12.35 A manutenção e fortalecimento deste ritmo de melhoria na gestão dos recursos naturais nas áreas protegidas é crítica se as pressões actuais e futuras são para ser contidas e os ganhos mantidos ao longo do tempo; estas reformas são também essenciais para realizar o desenvolvimento da indústria do turismo. A conservação da biodiversidade e as actividades de gestão dos parques não são actividades pontuais, nem podem ser interrompidas e depois retomadas numa fase posterior. É crítico que os esforços do IBAP e seus parceiros para gerir a biodiversidade e áreas protegidas no terreno sejam sustentadas e fortalecidas. Ao longo dos últimos 10 anos, o IBAP evoluiu rapidamente de um recém-nascido para uma agência de pleno direito das áreas protegidas. Embora a gestão das áreas protegidas tenha melhorado consistentemente conforme medido na ferramenta do GEF de avaliação da eficácia da gestão (Management Effectiveness Tracking Tool), existe uma necessidade contínua de mais capacitação do staff e dos sistemas de seguimento das áreas protegidas e de gestão assim como para melhorias nas infra-estruturas e equipamentos. A capacitação dos parceiros do IBAP associados às áreas protegidas é igualmente importante; os esforços para incentivar a mudança de comportamentos e partilhar os benefícios com as comunidades seriam substancialmente melhorados se as actividades do tipo FIAL fossem resumidas (a instigação de novas actividades foi suspensa em 2011 devido à conclusão do financiamento do projecto). Estes desafios podem ser magnificados na extensão do SNAP de 237 forma a incluir o Complexo DBT proposto; o IBAP irá necessitar de apoio para enfrentar este desafio. 12.36 A estratégia Nacional da Guiné-Bissau para as áreas protegidas e Conservação da Biodiversidade de 2014 a 2020 identifica claramente os desafios perante o sector e aponta três pilares chave para acção: (i) consolidar o IBAP e fortalecer as suas parcerias em linha com a futura evolução do SNAP, incluindo o reforço das capacidades institucional, legais, e de recursos humanos para a conservação da biodiversidade, criando condições para o financiamento sustentável da conservação da biodiversidade e gestão do SNAP no longo prazo, e também para a implementação de um modelo de gestão participativo para a Reserva de Biosfera de Bolama- Bijagós; (ii) fortalecer a gestão do SNAP, incluindo a melhoria da gestão participativa das áreas protegidas e promoção do desenvolvimento sustentável; e (iii) fortalecimento do seguimento e monitorização da conservação de espécies prioritárias e habitats, incluindo a melhoria da base de conhecimento científica e conhecimento público do valor das espécies e ecossistemas. A ameaça crónica subjacente a estes três pilares é o desafio de garantir financiamento estável e contínuo. 12.37 O desafio crítico passa por desenvolver os meios para gradualmente mudar para fontes de financiamento sustentáveis, estáveis e flexíveis que estejam aptas adaptar-se às prioridades em evolução do SNAP em simultâneo com o fortalecimento do IBAP e da capacidade dos seus parceiros ONGs e da comunidade de gerirem estes recursos no terreno. A dotação da Fundação BioGuinea é a base da estratégia de financiamento sustentável da estratégia. As estimativas recentes,161 baseadas nas 6 áreas protegidas existentes e no Complexo DBT que irá ser formalizado, sugerem uma dotação de US$ 50 milhões (€ 37 milhões). 162 O alcance desta meta é um propósito de longo prazo, a ser alcançado em etapas ao longo do tempo. Entretanto, será necessário garantir apoio técnico e financeiro para: (i) garantir que o IBAP e respectivos parceiros das áreas protegidas (incluindo comunidades locais) têm os recursos e a capacidade no curto e médio prazo para suster e fortalecer a gestão em curso do SNAP no terreno; (ii) garantir a operacionalização plena do Fundação BioGuinea, incluindo permitir a identificação e exploração de oportunidades de financiamento inovadoras; e (iii) garantir capital de arranque para o fundo de dotação. 12.38 As necessidades totais de financiamento para proteger e conservar a rede de áreas protegidas, e o potencial associado de turismo, estão estimadas ao longo dos próximos anos na ordem dos US$ 23 milhões (17 milhões de Euros). Deste montante, aproximadamente US$ 11 milhões (8 milhões de Euros) serão necessários para financiar os custos de gestão centrais do SNAP (que irá ser expandido). Cerca de US$ 1,8 milhões adicionais (1,4 milhões de Euros) vão ser necessários para operacionalizar na íntegra a Fundação BioGuinea e apoiar a colecta de fundos que se focam não só no fundo de dotação mas também em outras fontes inovadoras de geração de receita. Por fim, serão necessários um mínimo de US$ 10 milhões (7,5 milhões de Euros) para financiar a meta de capital de 5 anos do fundo de dotação; um montante que se estima ser suficiente para garantir os custos recorrentes de gestão dos dois parques marinhos prioritários do Arquipélago de Bijagós. 12.39 Apesar de existirem perspectivas actuais para garantir financiamento para a conservação da biodiversidade e gestão do SNAP, persistem gaps significativos de 161 As estimativas apresentadas neste capítulo são baseadas na estratégia de financiamento esboço para a expansão do SNAP e FBG. Estes dados representam um cenário onde todos os custos básicos recorrentes e de investimento são satisfeitos; no entanto, os fundos para as iniciativas comunitárias são excluídos. Estes dados devem ser consideradas indicativos. 162 Os retornos sob o capital de dotação são estimados em 5,9% e pretende-se que cubram 50% dos custos recorrentes de operação, com o restante a ser providenciado por fundos permanentes e rotativos de uma série de fontes (orçamento do Governo, doadores, swaps de dívida por natureza, concessões de mineração, etc.). 238 financiamento de curto, médio e longo prazo. Diversas iniciativas com base em projectos estão previstas no pipeline, incluindo um projecto piloto VCS REDD “carbono azul” focado nos Parques Nacionais de Cantanhez e Cacheu; assim como as operações EU GCCA+ e GEF 5, todas em preparação. Se realizados, estes projectos pode providenciar apoio em todos os três eixos, no entanto os montantes previstos e a segmentação geográfica significam que os gaps financeiros vão no entanto continuar a persistir. Colocar em prática o ambiente de estímulo e capacidade institucional para o desenvolvimento do turismo: 12.40 O desenvolvimento do turismo com sucesso na Guiné-Bissau irá depender de um ambiente de apoio de políticas e regulatório, protecção dos recursos naturais e culturais do país, e atenção às comunidades locais e suas aspirações - todos os quais são exequíveis. O turismo é uma actividade do sector privado mas exige um sector público disponível e o financiamento público das infra-estruturas. Existem poucos profissionais formados na área e pode ser necessário um programa de formação de capacidades no planeamento de turismo e formulação de políticas para iniciar o processo. Deve ser prestada atenção específica à capacitação das instituições públicas, tais como a DGT e IBAP, assim como ONGs locais e parceiros de implementação local, alguns dos quais serão agentes intervenientes importantes no desenvolvimento e gestão de uma indústria sustentável de turismo. As ONGs são críticas para o desenvolvimento do turismo em países tais como a Guiné-Bissau, onde o objectivo de tais esforços é de conseguir benefícios acrescidos para as comunidades locais. A somar à capacitação institucional pública e dos parceiros da sociedade civil (ONGs e comunidades), é essencial também construir a capacidade das associações do sector privado, o que irá facilitar o desenvolvimento efectivo do sector privado. Isto também incluirá a implementação de um sistema fiável de colecta de dados, uma vez que os dados financeiros e económicos são um elemento essencial da política de turismo. Assim, esta intervenção irá identificar as necessidades gerais de capacitação, encontrar ferramentas apropriadas de desenvolvimento de capacidades, e providenciar assistência técnica para instituições vocacionais para garantir o avanço no plano da educação. 12.41 O Estado deverá reforçar o seu papel de regulação e política enquanto conduz o sector privado para desenvolver e investir em intervenções relacionadas com o turismo. O eixo de desenvolvimento do turismo da Guiné-Bissau foca-se no estabelecimento deste ambiente de estímulo. Isto irá incluir inter alia o desenvolvimento de fóruns público-privados e ministeriais para estabelecer a visão de futuro do turismo do país, refinar o quadro de políticas e regulatório, e fortalecer a base de recursos institucionais e de recursos humanos existente para melhorar a tomada de decisões e de elaboração de políticas. O Governo deverá garantir legislação adequada para proteger os direitos da comunidade através do planeamento estratégico e participativo. A análise de opções para institucionalizar o diálogo público-privado entre agências governamentais e o sector privado para enfrentar questões de políticas (standards, licenciamento, tributação, incentivos e formação) é uma área fértil para explorar. 12.42 Com a multiplicidade de agências públicas e privadas e integração crescente do turismo e da biodiversidade, seria útil um quadro mais formal para a comunicação, troca de ideias, e clarificação dos objectivos e políticas. Na ausência deste, pode gerar-se um clima de incerteza e mesmo de suspeição mútua que pode gerar um enviesamento para o investimento privado de muito curto prazo e empresas a migrarem para o sector informal. Por outro lado, a consulta permite aos participantes assumirem a responsabilidade conjunta de opções de políticas e podem encorajar o investimento de longo prazo. A Guiné-Bissau poderia criar um Comité Interministerial para enfrentar as questões imediatas e facilitar o fluxo de informação entre as agências (e.g., IBAP, Direcções de Silvicultura, Turismo e Pescas, Obras Públicas, e Finanças). Tal Comité poderia também ter um grupo de trabalho para analisar problemas e providenciar soluções para tomada de decisões ministeriais. 239 12.43 A visão para o turismo e promoção associada desempenham um papel importante na disseminação e na criação de notoriedade para o destino e para os activos do turismo. No curto prazo, o Governo pode querer identificar a visão para o turismo na Guiné-Bissau focando-se em aspectos prioritários que são emergentes, ao invés de uma estratégia plena para todo o país. Uma série de países africanos têm estratégias viáveis de turismo que se baseiam em 150.000 a 200.000 visitantes anuais. Iniciar de forma pequena trata-se simplesmente de reconhecer os constrangimentos orçamentais disponíveis para o investimento, e também a incapacidade do país de absorver demasiadas iniciativas em simultâneo. Qualquer que seja o local escolhido, o objectivo será de desenvolver o turismo como ferramenta para garantir a sustentabilidade das áreas protegidas ao integrar os recursos naturais com as dotações culturais, com a participação das comunidades locais para providenciar uma experiência turística sustentável. 12.44 O financiamento total necessário para colocar em prática os elementos chave de um ambiente de estímulo ao longo dos próximos 5 anos estimam-se na ordem dos US$ 5 milhões. Identificar um projecto-piloto e desenvolver e testar modelos para o desenvolvimento participativo do ecoturismo. 12.45 A intervenção de projecto-piloto irá desenvolver e testar abordagens replicáveis ao desenvolvimento do ecoturismo. Irá focar-se na implementação de uma iniciativa de ecoturismo numa das áreas de nicho baseada nas reservas de natureza, tais como o arquipélago de Bijagós, enquanto irá apoiar actividades de estímulo em Bissau, tais como o ponto de entrada turístico no país. As intervenções específicas podem incluir: (i) preparação de um plano integrado (masterplan), incluindo a identificação do local com maior potencial (uso territorial, zonas, infra- estruturas, etc.) e estudos de viabilidade (avaliação de produto, mercado, e actividades potenciais) para os locais escolhidos; (ii) estabelecimento de ambientes de estímulo específicos ao local também relacionados com a infra-estrutura; (iii) pilotar um quadro para licitar obras de infra- estruturas para o sector privado (i.e., definir as regras do jogo). O projecto-piloto deverá focar-se em criar valor acrescentado ao capital natural, social e cultural existente através da promoção do turismo de alto valor/e volume reduzido e ligações ao longo da cadeia de valor. As lições aprendidas do projecto-piloto podem providenciar um quadro para futuros desenvolvimentos de locais turísticos. Deverá ser dada atenção especial às abordagens que promovem a inclusão das comunidades, geração de receita local, e retenção de benefícios localmente. Será também importante examinar as lições aprendidas e as melhores práticas de outros desenvolvimentos de ecoturismo em África antes de iniciar o projecto-piloto. 240 APÊNDICE: O PLANO PARA A REFORMA 1. Um novo começo - mas por onde começar? Este CEM argumentou que as condições são favoráveis para a Guiné-Bissau tentar um novo arranque e virar a página sobre o crescimento anémico e pobreza: o novo Governo foi instalado através de eleições livres e justas, votadas por uma considerável maioria; o país foi totalmente readmitido na comunidade internacional e os parceiros de desenvolvimento estão a retomar o seu apoio; existe novamente um sentimento de optimismo no ar e a esperança que o país possa construir sob o progresso que realizou entre 2009 e Abril de 2012. Terra Ranca! No entanto os desafios são imensos. Os constrangimentos para o desenvolvimento abundam, conforme este CEM demonstrou. Muitos destes estão institucionalmente entrincheirados, e os interesses poderosos não estão interessados em abdicar das suas rendas. Os obstáculos entrelaçam-se entre os sectores e as reformas isoladas serão provavelmente apenas gotas no oceano, com o sistema a reverter de volta a um equilíbrio ténue de instabilidade política, governação fraca, uma economia em estagnação, e pobreza. Este CEM providencia um número amplo de recomendações de políticas que podem ajudar a quebrar o círculo vicioso que está subjacente a esta armadilha de equilíbrios precários. As seguintes secções providenciam uma série de sugestões com potencial para a agenda de retoma. 2. É crucial que o Governo restaure a confiança. Um Governo funcional, que forneça de forma eficiente e fiável os serviços públicos, é algo que os Guineenses não têm vivenciado. Por outro lado, a legitimidade do Governo tende a ser reduzida, o que aumenta as suas vulnerabilidades à remoção extrajudicial por grupos de interesses potencialmente pequenos mas organizados. A história de golpes militares frequentes é um testemunho disto. Conforme o Relatório de Desenvolvimento Mundial de 2011 argumenta, a construção da confiança em Estados frágeis é chave e a Guiné-Bissau não é excepção. Existem uma série de medidas que o Governo pode tomar para reconstruir a confiança - e aumentar a sua legitimidade. Uma das quais é o pagamento atempado dos salários da função pública, o que irá reduzir as greves do sector público, manter as escolas e hospitais abertos, e assim recuperar a confiança não apenas dos funcionários públicos mas da população como um todo. Outra é a implementação rápida de programas de assistência social que reforcem a presença do Estado, mesmo em comunidades rurais e remotas, e demonstrem a motivação do Governo para ajudar os pobres a escapar da pobreza. 3. À semelhança do reforço da confiança, devem evitar-se novos retrocessos. É necessária uma agenda ambiciosa para quebrar o círculo vicioso da fragilidade e estagnação da prosperidade, mas as ambições aumentam as expectativas; e as expectativas podem rapidamente resultar em desilusões. Num país frágil como a Guiné-Bissau, com uma governação fraca e capacidade reduzida, os desapontamentos e retrocessos parecem inevitáveis. Estes seriam nocivos para a legitimidade do Governo e minariam ainda mais a confiança no Estado. O risco de retrocessos pode ser contido com uma estratégia baseada nos três S’s: (i) seleccionar (Select); (ii) fortalecer (Strenghen), e (iii) Partilhar (Share). 4. A selecção implica uma revisão de quais são no momento as melhores aptidões do Governo. Onde os recursos forem limitados e a capacidade fraca, é mais sensato realizar algumas actividades de forma correcta do que diversas actividades de forma errada. A construção da confiança evita as desilusões. O Governo pode assim avaliar qual é o seu core-business e o que é que pode ser deixado a outras partes interessadas. O Governo deverá, conforme é reconhecido claramente no Programa de Estabilização e Crescimento do Governo elaborado em 2014, providenciar serviços básicos. Tais serviços incluem a segurança, justiça, educação e saúde, assim como infra-estruturas físicas básicas tais como a energia, estradas, um porto operacional, e as TIC. Onde os custos fixos forem proibitivamente elevados para os investidores privados - tal como no sector de produção do arroz -, o Governo tem também um papel a desempenhar. 241 5. Deverá ser devolvida mais responsabilidade aos cidadãos. O foco em áreas chave significa que o Governo terá que limitar a sua acção em outras. De facto, num país onde o clientelismo e a corrupção frequentemente impedem as forças de mercado, limitar a mão do Estado pode injectar nova vida nas empresas privadas. O limite à intervenção do Estado significa, por exemplo, a redução da burocracia, regulamentações empresariais menos onerosas, e um clima de investimentos mais estimulante. Significa também que devem ser disponibilizados mais recursos para o cidadão privado. O estímulo ao fluxo de remessas é uma situação de ganhos mútuos onde os fluxos adicionais de financiamento entram no país sem custos para o Governo. De facto, o elemento de capital de risco das remessas num país como a Guiné-Bissau pode mobilizar receitas domésticas adicionais no longo prazo assim que os novos negócios arranquem e se afirmem. Os programas de assistência social, por outro lado, podem providenciar receitas para os mais pobres, fornecendo-lhes uma oportunidade para terem um papel mais activo no esforço para saírem da pobreza. O Capítulo 6 apresentou provas de outros países que demonstram que os pobres tomam decisões acertadas e que os mecanismos de transferências monetárias podem aumentar substancialmente o crescimento dos rendimentos locais. Os impostos só se justificam se o Governo os usar de forma produtiva. O FUNPI é um exemplo de um imposto que não parece beneficiar o bem comum. A extinção do FUNPI iria aumentar o rendimento disponível dos agricultores de caju, do qual estes necessitam para alimentar as suas famílias, investir nas suas quintas, e trabalharem para sair da pobreza. 6. Fortalecer a capacidade que o Governo tem de desempenhar o seu mandato é também indispensável. Para que se forneçam serviços públicos de base, é importante agregar os recursos necessários e garantir a eficiência das despesas. No que toca ao último ponto, as reformas na área da gestão das finanças públicas (GFP) podem apoiar o Governo no planeamento do orçamento e também na redução das fugas financeiras, salvaguardando os recursos para o seu devido uso. Em simultâneo, no entanto, as despesas devem ser efectuadas da forma mais eficiente possível. A revisão da alocação de todos os funcionários públicos em todos os sectores - assim como das políticas de contratação e formação - irá permitir que o Governo reajuste a sua força laboral para providenciar o melhor nível de serviços públicos tendo em conta o envelope de recursos. Por fim, aumentar este envelope de recursos irá ser importante para garantir um sector público funcional. As licenças de pesca e, no futuro, as receitas provenientes da mineração são formas progressivas de receita doméstica que não têm impactos adversos na pobreza ao invés de outras medidas fiscais como o FUNPI. Um Governo capacitado estará apto a implementar a Lei, incluindo a protecção de stocks de peixe e de recursos madeireiros; um Governo capaz poderá financiar todas as despesas correntes orçamentadas, incluindo salários da função pública, mas também outras despesas tais como vacinas, livros escolares, ou manutenção das estradas; um Governo competente estará apto a investir em infra-estruturas físicas; e um Governo competente poderá financiar as suas obrigações de dívida. Um Governo competente, eficiente, e estável na Guiné-Bissau parece utópico no actual estado de fragilidade e governação pobre. No entanto a perseverança e uma vontade firma de efectuar as reformas - conforme visto em outras experiências africanas - pode de forma lenta mas segura melhorar a governação, construir a confiança e legitimidade, e efectuar uma contribuição decisiva e sustentável para quebrar o círculo vicioso. 7. A partilha do trabalho significa a alavancagem de recursos. Em simultâneo com o reforço da governação e de aumento das capacidades, os Guineenses podem contar com um vasto número de parceiros disponíveis para os apoiar. Os doadores não providenciam apenas financiamento para os projectos do Governo mas também fornecem assessoria, especialmente através de assistência técnica. Em certa medida, isto pode compensar os gaps de capacidade - idealmente, o apoio dos doadores irá também reduzir estes gaps. No entanto o Governo só poderá colher os benefícios destes apoio se coordenar de forma efectiva as acções dos doadores. A coordenação dos doadores deverá ser um dos investimentos chave do Governo para garantir que 242 pode alavancar os recursos dos doadores para que estes causem o máximo impacto. A coordenação importa não apenas para os doadores. O envolvimento das ONGs e a coordenação das suas acções podem providenciar ao Governo um espaço considerável para implementar uma série de políticas sociais importantes, incluindo em áreas relativamente remotas. Outros tipos de apoio poderão vir de organizações regionais, tais como a CEDEAO, com quem a Guiné-Bissau pode coordenar as suas políticas e assim alavancar importantes iniciativas regionais, incluindo em infra-estruturas, agricultura, e mesmo segurança e governação. Por fim, é importante notar que os investidores estrangeiros têm o know-how e recursos que o Governo frequentemente não tem. Por exemplo, os investidores estrangeiros podem estar melhor equipados para desenvolver a indústria de processamento do caju. A industrialização pode ser entregue ao sector privado, desde que o Governo garanta um acordo equitativo para ambas as partes. 8. Este CEM apresenta uma sugestão de agenda de trabalhos para a maioria das agências públicas. Todas as recomendações dos capítulos pretendentes são importantes, embora algumas sejam mais importantes do que outras. A Tabela A1 providencia uma lista de recomendações de política com uma sugestão de ordem de priorização. Tendo em conta a natureza do reduzido equilíbrio de status quo, é importante que se enfrentem um número de constrangimentos simultaneamente. Para isto, a regra dos três S’s pode alavancar recursos de uma forma que evite sobrecarregar o Governo. A tabela também sugere a agência líder para as reformas, embora algumas destas reformas sejam relevantes para múltiplas agências. A escolha de uma mão cheia de áreas prioritárias para as reformas permitirá aos Ministérios uma maior focalização, dependendo do respectivo nível de capacidades. Partilhar o trabalho com os doadores e outras organizações, mas também com agências transversais, pode resultar num esforço que quebre o círculo vicioso, reduza a pobreza, e aumente a prosperidade partilhada; e pode também permitir que a Guiné-Bissau viva o salto económico que outros países em África estão a vivenciar - actualmente é o continente que mais cresce no planeta. Tabela A2: Recomendações de políticas por prioridade e por agência implementadora Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências 1. Governação / sector público Governação / sector público: recomendações-chave Gestão das Revitalização do Comité do Tesouro 4 Elevada Finanças Ancorar a reforma e os esforços de capacitação a uma 4 Elevada Públicas Estrutura de Supervisão e Implementação da Reforma (ROIS) Transpor as directivas GFP da UEMOA para a Lei 4, 5 Elevada Nacional Melhorar a fiabilidade e calendarização das 4 Elevada projecções macroeconómicas e de orçamentação plurianual Fortalecer a auditoria interna 4 Elevada Fortalecer o Tribunal de Contas 4 Média Melhorar o controlo financeiro e orçamental para 4 Elevada melhorar a preparação do orçamento, gestão de compromissos, controlo e contabilidade, assim como relatórios atempados e fiáveis de execução Ministério da orçamental Economia & 243 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Melhorar a gestão e controlo de pagamento, relatório 4 Elevada Finanças intra-anuais mais atempados e fiáveis de execução e respectiva reconciliação com os relatórios de execução orçamental publicados pela Direcção do Orçamento Fortalecer as instituições aquisições públicas, 4 Elevada incluindo através do staffing e relatórios de procedimentos adequados Operacionalizar o SIGFIP (IFMIS) 4 Elevada Estabelecer uma Unidade de Parcerias Público- 4 Reduzida Privada no Ministério das Finanças e Economia Receita Abolir o FUNPI 4 Elevada Explorar impostos menos regressivos 4 Reduzida Melhorar a eficiência da colecta no porto 4 Elevada Melhorar a administração e processos tributários 3, 4 Média Negociar acordos de licenciamento de pesca mais 4 Média favoráveis Aplicar a Conta Única do Tesouro 4 Média Despesas Pagar aos funcionários públicos atempadamente e na 3, 4 Elevada totalidade do montante devido Conter as despesas correntes 4 Elevada Eliminar os subsídios ao gasóleo/diesel para a EAGB 2 Média Administraçã Fortalecer a capacidade de seguimento e aplicação da 11, Elevada o DGGM, SEAT, CAIA e IBAP 12 Realocar os funcionários públicos, onde possível, 4 Média para rebalancear áreas que têm poucos recursos humanos versus outras que têm recursos humanos a Ministério do mais Serviço Civil e Formalizar os funcionários públicos não oficiais, 4 Média Administração especialmente em áreas com falta de recursos da Reforma / humanos Ministério da Melhorar as ferramentas de gestão dos recursos 4 Média Economia & humanos e procedimentos de contratação (considerar Finanças / a terciarização da contratação para o serviços Escola Nacional públicos para uma empresa independente) de Fornecer formação para fortalecer a capacidade dos 4 Média Administração funcionários públicos. Pública Considerar a redução do volume do sector público 4 Reduzida através de dispensas voluntárias e práticas selectivas de contratação Estatísticas Fortalecer o quadro institucional e de coordenação 4 Reduzida através de: (i) melhoria do quadro institucional e organizacional, e (ii) fortalecimento da coordenação estatística. Aumentar a capacidade de produção de dados dos 4 Reduzida Ministério da actores do SEN através de (i) envolver pessoal Economia & qualificado nas estatísticas e demografia, e (ii) Finanças melhorar as condições de trabalho dos agentes Secretaria de estatísticos em todo o SEN. Estado para o Melhorar a produção de dados através de: (i) 4 Reduzida Planeamento & 244 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências produção de dados desagregados sociodemográficos e Integração económicos para 2011-2015; (ii) produção de dados Regional administrativos - fiáveis e frequentes - para 11 INEC domínios prioritários do DENARP; e (iii) melhorar a qualidade geral da produção do SEN. Promover, disseminar e utilizar as estatísticas através 4 Reduzida de: (i) melhoria no arquivamento e disseminação dos dados estatísticos, e (ii) advogar o uso de estatísticas. Empresas Estatais e Parcerias Público-Privadas (PPPs) PPPs Elaborar os documentos legislativos básicos para 2, 4 Média Ministério da facilitar as PPPs Economia & Estabelecer uma unidade PPP 4 Média Finanças/ Empresas Implementar um quadro governativo efectivo para 2 Média Ministério da Estatais todas as empresas estatais, especialmente a EAGB e a Energia e (SoEs) APGB Indústria/ Secretaria de Estado dos Transportes e Comunicações/ Petroguin Na área de energia, elaborar um quadro legal e 2 Média Ministério da regulatório que promova a transparência e eficiência Energia e do fornecimento e distribuição, e promova boas Indústria/ práticas ambientais e sociais. CAIA/ Secretaria de Estado do Turismo 2. Infra-estruturas Energia Garantir a oferta de energia fiável e de baixo custo Investir em nova capacidade de geração 2 Elevada Desenvolver interconexões regionais/bilaterais que 2 Elevada Ministério da providenciem energia de base de capacidade de Energia e reserva através do OMVG. Indústria/ Investir para preparar as redes de distribuição para 2 Elevada EAGB/ fornecimento adicional de electricidade Ministério de Implementar programas de eficiência energética 2 Média Recursos Considerar o uso de cascas de castanha de caju para 8 Reduzida Naturais/ gerar energia Secretaria de Estado do Ambiente Restaurar o cash-flow do sector Estabelecer um programa rigoroso de redução de 2 Elevada perdas coordenado com a melhoria na qualidade de serviço, incluindo medidores, eliminação de conexões ilegais através de acções com os clientes, e dentro da 245 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências empresa pública EAGB Investir na geração, transmissão e distribuição para 2 Elevada melhorar a qualidade de serviço em áreas onde o programa de redução de perdas esteja a ser implementado e para satisfazer a procura futura Ministério da Investir em tanques de armazenagem de fuelóleo 2 Elevada Energia e pesado Indústria/ Reduzir as despesas de combustíveis, incluindo 2 Média EAGB acabar com o furto de gasóleo para uso em carros e camiões privados Implementar um plano de recuperação financeira que 2 Média tome em conta os passivos de curto prazo e a dívida de longo prazo, incluindo um plano para reduzir os atrasados públicos e privados e mecanismos para evitar que se voltem a acumular Implementar um sistema de contabilidade fiável 2 Média Petróleo Desenvolver uma estratégia para a promoção Gás 2 Média Petróleo Liquidificado (GPL) para o uso em áreas urbanas e rurais Rever e aplicar os contratos correntes com as 2 Média companhias de distribuição de produtos petrolíferos Ministério da Rever a cadeia de abastecimento para todos os 2 Média Energia e produtos com o objectivo de promover a redução de Indústria/ custos EAGB/ Avaliar os estragos ambientais da cadeia de 2 Reduzida Petroguin distribuição de produtos petrolíferos e identificar medidas remediais, desenvolver em particular um plano para gerir os impactos sociais e ambientais do uso de GPL Eliminar o subsídio para o gasóleo/diesel 2 Reduzida Ministério da Economia & Finanças/ Ministério da Energia e Indústria / Petroguin Porto de Reabilitação Bissau Dragagem e remoção de naufrágios 2 Elevada Reabilitação dos cais e o aprofundamento da 2 Elevada profundidade do mar diante do cais e no canal de aproximação Resolver a disputa legal do anterior concessionário 2 Média TERTIR para atrair novos investidores Ministério dos Reabilitar a superfície de terminal de contentores 2 Média Transportes e actualmente usada para importação e exportação de Comunicações / contentores APGB Reabilitar as infra-estruturas, tais como o sistema de 2 Média esgotos, estação de bombagem de água potável, e estação de energia eléctrica Desenvolver muros de segurança e um portão de 2 Média 246 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências segurança de acordo com os standards do ISPS Desenvolver superfícies de armazenagem para 2 Reduzida contentores refrigerados, contentores não abertos e mercadorias perigosas Sustentabilidade Financeira Conduzir uma revisão bottom-up da estrutura de 2 Reduzida tarifas portuárias de forma a adoptar um mecanismo Ministério da adequado de transferência financeira entre o Economia & concessionário e o senhorio, Autoridade Portuária, e Finanças de forma a garantir a solvência financeira de ambos Conduzir um exercício de redimensionamento do 2 Reduzida Secretaria de quadro de pessoal que deverá ser cuidadosamente Estado do avaliado, devidamente financiado, e implementado Transporte e antes do concurso para a concessão para que se Comunicações / consiga reduzir o nível de risco percebido associado a APGB esta operação Estradas Reabilitar a infra-estrutura existente de estradas, 2 Elevada Ministério das incluindo estradas de ligação Obras Pública e Fortalecer as instituições encarregadas da 2 Reduzida Planeamento monitorização dos trabalhos de construção e Urbano / reabilitação Secretaria de Fortalecer a estrutura institucional do fundo das 2 Reduzida Estado dos estradas e garantir que os fundos são utilizados Transportes e apenas para os fins propostos Comunicação Telecomunica Desenvolvimento de infra-estruturas: ções Promover sinergias entre os sectores da electricidade, 2 Elevada Ministério da água, e transporte para casos onde os projectos que Economia & apontem a reconstruir o stock de infra-estrutura Finanças / estejam a ser preparados ou implementados. Isto Ministério da implica considerar o desenvolvimento de redes de Energia e base regionais fiáveis ao permitir o acesso à Indústria/ capacidade excedente de fibra adjacente à rede de EAGB/ electricidade sob o projecto regional de energia Secretaria de WAPP/OMVG. Estado dos Transporte e Comunicações / Ministério dos Recursos Naturais /Ministério dos Obras Públicas e Planeamento Urbano Revisitar a viabilidade técnica e financeira de uma 2 Elevada Ministério das conexão ao cabo submarino através de um consórcio Obras Públicas de operadores suportados por doadores e Planeamento internacionais, e comparar com a opção Urbano / ARN / WAPP/OMVG; Secretaria de Aumentar os investimentos em redes de infra- 2 Elevada Estado de estruturas terrestres, inclusive, quando apropriado, Transportes & através de PPPs entre operadores privados e o sector Comunicações 247 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências público; Diálogo, diagnóstico e estratégia Desenvolver um plano nacional para o 2 Elevada desenvolvimento das telecomunicações e banda larga, especificando os objectivos e propondo um plano de acção para os próximos 5 a 10 anos. Estabelecer um diálogo com os operadores para: i) 2 Média identificar os principais desafios ao desenvolvimento do sector TIC; ii) elaborar um mapeamento das redes existentes; e iii) discutir soluções possíveis para melhorar o acesso a infra-estruturas existentes e implementar novas infra-estruturas em áreas com serviço reduzido (incluindo através de PPPs). Este Secretaria de diálogo, que tem duas dimensões, deve ser Estado dos coordenado no Ministério do Transportes e Transportes e Telecomunicações e facilitado pela ARN: Comunicações./ multissectorial (estradas, água, electricidade) e ARN regional (através da integração de redes e projectos regionais), incluindo o projecto OMVG de electricidade. Conduzir um inquérito para identificar os principais 2 Reduzida obstáculos ao fornecimento de acesso de banda larga às famílias e negócios Conduzir uma revisão do sistema tributário existente 2 Reduzida no sector TIC (incluindo telecomunicações e banda larga). Regulação e concorrência Aumentar a concorrência através da reestruturação da 2 Elevada empresa incumbente (GuineTelecom / Guinetel) iniciada em 2008. Implementar um ambiente legal e regulatório 2 Elevada Secretaria de actualizado Estado dos Conceder novas licenças: licenças de operadores de 2 Elevada Transportes & infra-estruturas (e.g., companhias de torres de Comunicações / telecomunicações) licenças; licenças fixas, ISP, ARN licenças 3G. Aplicar as regulamentações a partilha das infra- 2 Média estruturas entre operadores (Bitstream, local loop unbundling) 3. Programas de assistência social Conduzir uma análise, diagnóstico e uma avaliação 6 Elevada Ministério da de necessidades para informar sobre as linhas mestras Mulher, Família do programa, assim como a sua concepção. e Coesão Social Estabelecer critérios transparentes de segmentação 6 Elevada / Ministério da Investir em mecanismos de implementação e de 6 Elevada Economia & seguimento robustos Finanças Desenhar uma avaliação de impacto adjacente 6 Elevada 4. Recursos naturais e ambiente 248 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Melhorar a base de conhecimento, governação e 7, 10 Elevada Ministérios da sistemas de tomada de decisão, especialmente nas Agricultura e áreas das pescas, florestas, sectores minerais Desenvolviment Rever, actualizar e disseminar o quadro legislativo 7 Elevada o Rural, para o seguimento e aplicação Economia & Fortalecer a transparência e cooperação com as 7 Média Finanças, Organizações da Sociedade Civil Recursos Incluir os riscos de mudanças climáticas no 7 Média Naturais / planeamento e tomadas de decisão. Secretarias de Integrar abordagens de contabilização do capital 7 Reduzida Estado de natural nos sistemas de gestão e planeamento Pescas e Considerar o estabelecimento de um fundo soberano 11 Reduzida Economia de gestão da riqueza Marítima, Ambiente / Petroguin 5. Desenvolvimento do Sector Privado Desenvolvime Melhorar o ambiente de estímulo aos negócios (Business-enabling nto do Sector environment) Privado Garantir a sustentabilidade do Balcão Único 3 Elevada Rever e racionalizar os procedimentos de 3 Elevada importação/exportação/trânsito, incluindo aquelas que supervisionem o comércio internacional, Ministério da regulamentações sobre investimento industrial, e Economia & barreiras internas de comércio (checkpoints de Finanças / segurança). Ministério do Garantir que as novas regulamentações associadas ao 3 Elevada Comércio e ambiente de negócios são implementadas Artesanato, nomeadamente através da disseminação da Ministério do informação (e.g: pré-licenciamento do comércio Interior internacional) Estabelecer um diálogo estrutural com o sector 3 Média privado em todas as reformas que apontem a fortalecer o sector privado Fortalecer o mecanismo de arbitragem de disputas, 3 Reduzida tais como o tribunal comercial e um centro de arbitragem Aumentar a produtividade do trabalho e diversificar a economia Melhorar a formação e licenciamento de professores 3 Elevada Ministério da Alavancar o apoio das ONGs no sector da educação 3, 5 Elevada Educação Desenvolver a formação vocacional em colaboração 3, 11 Reduzida Nacional / com grandes empresas Ministério do Estabelecer competições de planos de negócios e 3 Média Serviço Civil & complementá-las com a formação dos Administração empreendedores seleccionados da Reforma Modernizar as regulamentações do mercado laboral 3 Reduzida Melhorar o acesso a financiamento 249 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Fortalecer a promoção, autorização, inspecção, e 3 Média supervisão da Instituições de Microfinanças (IMFs) por parte do Ministério das Finanças e Economia em conjunto com o BCEAO Fortalecer a capacitação e formação das IMFs 3 Média Mobilizar recursos financeiros de fontes domésticas e 3 Reduzida Ministério da internacionais, e conceder esses recursos às IMFs Economia & numa base competitiva Finanças / Estabelecer um fundo de garantia de crédito que torne 3 Reduzida BCEAO possível a concessão de créditos por parte das IMFs sem necessidades significantes de garantias Supervisionar as IMFs de acordo com as melhores 3 Reduzida práticas internacionais Criar uma agência de informação de riscos de crédito 3 Reduzida similar àquela que o BCEAO dispõe para bancos 6. Remessas Permitir a entrada de novos bancos internacionais e 6 Elevada especialmente de Organizações de Transferências Monetárias Tratar os migrantes como qualquer outro investidor 6 Média estrangeiro potencial e providenciar incentivos financeiros, legais e regulatórios para que aumentem Ministério da o volume e frequência das suas remessas, e os Economia & encorajem a usar novos canais de remessas Finanças / electrónicos e móveis. Ministério dos Permitir a dupla ou múltipla cidadania a migrantes 6 Média Negócios Guineenses, sua família imediata, e descendentes Estrangeiros e Delegar a autoridade para formular e implementar 6 Reduzida Comunidades, estas políticas relacionadas com a Diáspora a um Ministério da ministério híbrido reconstituído (e.g., Ministério dos Justiça / Negócios Estrangeiros e da Diáspora). BCEAO Estabelecer uma base de dados que controle a 6 Reduzida dimensão, localização, e atributos geográficos da Diáspora, assim como o volume total de remessas e a sua composição e usos dentro da Guiné-Bissau 7. Parcerias Fortalecer a coordenação dos doadores, garantir a 5 Elevada Ministério da apropriação e liderança do Governo Economia & Fortalecer os mecanismos de coordenação com 5 Elevada Finanças / Organizações da Sociedade Civil Ministério dos Negócios Estrangeiros 8. Caju Atrair investimento externo para fábricas de 8 Elevada Ministério da processamento Economia & Finanças 250 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Atrair investimentos externos 8 Elevada Ministério dos Negócios Estrangeiros Melhorar as estradas de acesso aos campos de caju 2, 8 Elevada Ministério das Obras Públicas / Ministério da Agricultura Melhorar a capacidade técnica da força laboral 3, 8 Média Ministério da local que trabalha nas instalações de Educação processamento Enfrentar os constrangimentos de coordenação e 8 Média financeiros no estabelecimento de fábricas de processamento ao nível da comunidade Ministério da Serviços de extensão para os agricultores 8 Média Economia & Disseminação das informações de preços para os 8 Média Finanças agricultores Desenvolvimento de armazéns na comunidade 8 Média Facilitar a introdução de recibos de depósito em 8 Reduzida armazém 9. Arroz Programa de investimento Identificar terrenos públicos nas terras baixas ao 9 Elevada Ministério da longo de grandes rios (principalmente o Geba e o Agricultura e Corubal) para investimentos, e para desenvolver o desenvolviment cultivo irrigado de acordos de PPPs o rural/ Conduzir a monitorização topográfica para 9 Elevada Cadastro / identificar terrenos aptos para cultivo Ministério das Obras Públicas e Planeamento Urbano Construir estradas de acesso rural para os campos 2, 3, Elevada Ministério das de cultivo de arroz 5, 9 Obras Públicas Conduzir terraplanagens em áreas identificadas 9 Média e Planeamento onde seja necessário Urbano / Construir diques 9 Média Ministério da Construir estações de bombagem 9 Média Agricultura e Contratar e supervisionar a preparação do 9 Reduzida Desenvolviment equipamento de irrigação para arrendar aos o Rural/ pequenos agricultores Cadastro / Envolver os investidores privados dispostos a 9 Reduzida Ministério da arrendar os terrenos Economia & Finanças Providenciar crédito e serviços de extensão Investir em melhores sementes, fertilizantes e 9 Elevada pesticidas, e assistência técnica para a gestão das áreas de plantações. Ministério da Implementar sistemas de donativos parciais 3, 9 Média Agricultura e (matching grants) para estimular a produção de Desenvolviment arroz o Rural 251 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Conduzir pesquisa sobre variedades de alto 9 Elevada rendimento de arroz adequadas para a Guiné- Bissau Providenciar assistência técnica aos agricultores, 9 Média fornecida por empresas privadas 10. Pescas Procurar alcançar a sustentabilidade ecológica ao 7, 10 Elevada minimizar os potenciais impactos adversos e pressões relacionadas com as actividades de pesca; Permitir a recuperação de stocks ou populações 7, 10 Elevada exauridas. Participar em esforços colaborativos para a gestão 10 Elevada e desenvolvimento das pescas sustentáveis na Secretária de região da África Ocidental. Estado das Extrair recursos de forma prudente e prevenir a 4, 10 Média Pescas e invasão e pilhagem das águas territoriais do país ao Economia colocar em prática um sistema efectivo e Marítima / sustentável de seguimento, controlo e vigilância Secretaria de contínua, reduzindo assim as incidências de pesca Estado do ilegal, não regulada e não relatada. Ambiente / Continuar o esforço de fortalecimento do Governo 10 Média IBAP / CAIA para aplicação dos regulamentos sob o WARFP; Explorar o uso conjunto de navios de vigilância ou 10 Média aeronaves de países vizinhos Realizar reformas do quadro institucional e legal, 10 Média acompanhadas por melhores práticas de governação e uso e gestão sustentável de recursos pesqueiros, conduzidos de uma forma participativa e transparente. Estabelecer parcerias com ONGs para introduzir 5, 10 Média potenciais pescadores ao comércio pesqueiro Incluir princípios de abordagens baseadas no 10 Reduzida ecossistema às pescas e respectivos processos de gestão 11. Indústrias extractivas Desenvolver um sistema eficiente de cadastro para 11 Elevada providenciar aos potenciais investidores informação geológica de base Fortalecer a capacidade do SEAT e da CAIA para 11 Elevada monitorizar adequadamente e aplicar as leis e regulamentações ambientais Providenciar um ambiente de estímulo às empresas 3, 11 Média de Micro e PMEs para que forneçam serviços e produtos ao sector de mineração Investimentos em infra-estruturas para gerar 2, 11 Média ligações entre o potencial fornecedor e as minas e para providenciar um fornecimento adequado de energia 252 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Estabelecer uma quota-parte das receitas fiscais do 6, 11 Elevada Ministério de Governo provenientes da mineração que devem Recursos apoiar o financiamento de programas de assistência Naturais / social, programas estes que devem ser contidos no CAIA orçamento Exigir às companhias de mineração que formem 3, 11 Reduzida empregados locais Definir de forma mais adequada as obrigações das 11 Média companhias de mineração e do Governo nacional em relação às comunidades locais Estabelecer um sistema de mediação para disputas 11 Média entre companhias de mineração, governo e comunidades Efectuar provisões nas leis ambientais e/ou da 11 Média indústria extractiva que providenciem espaço para a sociedade civil ter acesso e monitorizar o desempenho ambiental e social das operações das indústrias extractivas. Desenvolver um mecanismo que ligue as receitas 11 Média das indústrias extractivas a programas de assistência social ou de provisão de serviços básicos Colocação de uma garantia financeira obrigatória 11 Média para reclamação ambiental para todas as operações de indústrias extractivas de média e larga escala Desenvolver um mecanismo que promova a 11 Reduzida poupança das receitas provenientes das actividades Ministério da das indústrias extractivas, potencialmente através Economia & de um fundo soberano Finanças Reconsiderar a isenção fiscal de 5 anos para as 11 Reduzida companhias de mineração 12. Turismo & áreas protegidas Proteger e conservar o capital natural e social/cultural do país Desenvolver uma estratégia para o 12 Média Secretaria de desenvolvimento do sector do turismo, tendo em Estado do conta a preservação do stock de capital natural, Turismo / IBAP social e cultural do país / DGIP Consolidar e fortalecer o IBAP e respectivos 12 Média Ministério da parceiros das ONGs Agricultura e Fortalecer a gestão do SNAP, incluindo com a 12 Média Desenvolviment promoção de uma gestão participativa das áreas o Rural / IBAP / protegidas e promoção do desenvolvimento CAIA sustentável Fortalecer a monitorização e conservação de 12 Média Ministério da espécies prioritárias e habitats, incluindo a Agricultura e melhoria da base de conhecimento científico e de Desenvolvi- conhecimento público sobre o valor das espécies e mento Rural / ecossistemas Secretaria de Estado do 253 Área Recomendação Capí- Prioridade Líder tulo Agências Ambiente / IBAP Colocar em prática um ambiente de estímulo e capacidade institucional para o desenvolvimento do turismo: Desenvolver um fórum interministerial para 12 Reduzida Secretaria de estabelecer a visão futura do turismo nacional Estado do Turismo / DGPIP Explorar opções para institucionalizar o diálogo 12 Reduzida Ministério da público-privado entre agências governamentais e o Economia & sector privado Finanças / Secretaria de Estado do Turismo / Câmara de Comércio, Indústria, Agricultura e Serviços / Secretaria de Estado do Turismo / Ministério do Comércio e Artesanato Identificar um projecto-piloto e testar modelos para 12 Reduzida Secretaria de o desenvolvimento participativo do turismo Estado do Turismo / DGPIP / IBAP Providenciar assistência técnica e apoiar as 12 Reduzida Ministério da instituições de formação vocacional Economia & Finanças / Secretaria de Estado do Turismo (A ordem das recomendações não reflecte a ordem dos capítulos mas segue uma priorização implícita) 254